Capítulo 1:

" (...) sinais corporais com os quais se procurava evidenciar alguma coisa de extraordinário ou de mau acerca do estatuto moral de quem os apresentava. Tratava-se de marcas corporais, feitas com cortes ou com fogo, que identificavam de imediato um escravo ou um criminoso, por exemplo. O conceito atual é mais amplo; considera-se estigmatizante qualquer característica, não necessariamente física ou visível, que não se coaduna com o quadro de expectativas sociais acerca de determinado indivíduo."

(Stigma - Notes on the Management of Spoiled Identity, 1963 – adaptado)

O vento frio a acordou, fazendo a pele descoberta se estremecer. Abriu os olhos lentamente, retirando os fios castanhos de seu rosto e olhou a sua volta: o quarto em que estava não se parecia em nada com o que havia encontrado quando se mudara para lá; os mofos haviam sido retirados, assim como as teias de aranha, poeira e qualquer outro vestígio que pudesse dizer que aquele cômodo não era habitado há algum tempo. No lugar dele livros haviam tomado espaço, assim como a grande cama de dossel que já pertencia ao quarto, um sofá e um tapete felpudo em frente a elegante lareira de mármore. No canto, a esquerda, ainda possuía uma escrivaninha que no momento se encontrava entulhada de papeis.

Levantou da cama, que rangeu levemente, e se dirigiu a janela aberta. O vento que entrava desta deixava claro que o mês de outubro se encontrava no fim, assim como o resto de clima ameno. Fechou a janela e encostou sua testa nela, vendo o vidro se embaçar em razão de sua respiração. Então hoje era o grande dia. O primeiro dia do treinamento pós-guerra aos comensais ou partidários de Voldemort que haviam se arrependido ou oferecido informações a Ordem antes da guerra terminar.

Respirou fundo e levou seu dedo até a têmpora esquerda, sentindo-a latejar. Olhou para frente, vendo as folhas das poucas árvores se balançando em razão do vento que persistia do lado de fora. Abaixou a cabeça e olhou para seu braço esquerdo que estava estendido, deixando seus dedos da mão direita acariciarem a cicatriz neste. Mudblood

Suspirou; aquilo não era nada, nada comparado aos horrores psicológicos e sentimentais que aquela guerra havia causado. Podiam ter se passado meses desde a noite da vitória - se assim pudesse ser chamada uma noite em que tantas pessoas inocentes e amigas morreram - mas os gritos e visões dos diversos massacres que presenciara não a abandonavam. Toda noite era a mesma história: acordava assustada, suada e demorava horas a fio até conseguir dormir novamente. Essa triste rotina a acompanhou por algumas semanas, até que se se rendera a uma poção do sono. E era esse vício que a permitia descansar durante a noite.

Caminhou até sua bolsa, revirando-a atrás do frasquinho de poção para dor. Esse era o preço de uma noite de sono: os efeitos colaterais do uso contínuo da poção haviam de manifestado há um mês, tentando avisá-la de que era hora de parar com aquilo. Mas quem disse que ela se importava? Sabia dos riscos, de todos, mas não aguentava mais os gritos e suplícios que a perseguiam durante a noite. Uma dor de cabeça parecia um preço pequeno a se pagar por evitar isso.

Trocou de roupa e se dirigiu até a cozinha. Descia as escadas do Largo Grimmauld tentando se lembrar de quando fora que se acostumara com aquela casa fria e escura. Ela ainda servia de sede para a Ordem, depois das veementes recusas de Harry de se mudar para lá. No fim, resolveram que sua melhor utilidade era mesmo como quartel general - e atual morada de Hermione desde que ela revertera a memória de seus pais.

Chegou a cozinha, encontrando Harry e o Sr. Weasley numa árdua discussão sobre o desencadeamento de alguma operação.

"Sr. Weasley, o senhor não pode estar falando sério." - dizia Harry enquanto retirava os óculos e massageava com o polegar e o indicador o lugar onde estes se encontravam. – "Por que ele? Seria a pior escolha pra ela esse momento."

"Se alguém tem capacidade para isso é ela, Harry." - O Sr. Weasley se sentou na cadeira em frente ao menino e continuou. – "Você sabe como ela é forte, como ela é persistente. E você o conhece! Sei que você sabe que não temos outra opção."

"Mas é exatamente isso o que eu estou falando!" - esbravejou – "Eu o conheço! Eu sei como ele é e sei como ela está! Sei do quanto ela é capaz mas sei do quanto ela não está capaz agora." - terminou suspirando e olhando pra porta, encontrando os olhos de Hermione.

Hermione se calou. Era esperta e sabia que os dois falavam dela, mas o olhar que recebeu de Harry a fez perceber que talvez fosse melhor não dizer nada. Passou pelos dois murmurando um 'bom dia' e caminhou até o fogão lhe servindo um pouco de chá. Fingiu não perceber a troca de olhares entre Harry e o Sr. Weasley; qualquer que fosse o assunto sabia que logo logo chegaria nela, e no momento não estava nada propensa a discussões.

Seus pensamentos foram interrompidos pela rápida entrada de Quim na cozinha. Após a morte de Lupin, ele virou o principal encarregado de preparar as missões e documentações da Ordem, e há quem dissesse que ele se tornaria Ministro da Magia. Hermione não duvidava nem um pouco disso.

"Já fizemos os principais entrelaces e decidimos o destino dos comensais" - disse ele colocando uma pilha de papéis sobre a mesa - "tem certeza que acha que Azkaban não é a melhor opção para os Malfoys, Harry?"

"Eles são uns filhos da puta, mas eu não estaria aqui se não fosse por Narcisa." - Harry respondeu também se servindo de chá e voltando a se sentar na mesa - "acho que o que discutimos seria o melhor para todos. É claro que eles mereciam pagar mais do que isso, mas acredito que eles também não vão ficar nada satisfeitos com essa sentença." - terminou tomando um pequeno gole de sua caneca.

"Então estamos acertados." - disse Quim distribuindo os papéis da pilha entre Harry e o Sr. Weasley - "Lucius ficará contido na Mansão Malfoy, sem permissão do uso de varinha, com monitoramento 24 horas por dia e vigiado por aurores até segunda ordem. Narcisa ficará sem o uso de varinha e em regime por tempo indefinido com Molly... é isso mesmo, Arthur?"

"Sim, Quim. Não me pergunte os motivos mas Molly quis assim. Pelo que conheço da minha mulher ela deve ter uma razão importante por querer cuidar do tratamento da Sra. Malfoy, então acredito que seja uma boa escolha."

"Confirmado. E quanto a Draco Malfoy, também ficará sem permissão para portar uma varinha, com regime indefinido sobre os cuidados..."

"Não decidimos muito bem sobre o que fazer com o Malfoy, Quim." Harry se levantou e chegou mais perto de Quim sob um olhar reprovador do Sr. Weasley - "não acho que seja uma boa ideia o destino dele."

"E qual seria esse destino?" - Sem poder se conter, Hermione perguntou, franzindo as sobrancelhas. O que poderia ser pior do que Narcisa com Molly?

"Achei que havíamos chegado a uma conclusão, Harry." - disse o Sr. Weasley sem responder a pergunta de Hermione - "achei que todos concordássemos que a melhor maneira de resolver o problema de Malfoy seria o fazer perder pelo menos parte do preconceito contra trouxas."

"E o senhor acha que a doninha é capaz de perder algum tipo de preconceito? O Malfoy odeia sangue-ruins!"

Hermione se contraiu com as palavras de Harry e sentiu sua cicatriz no braço esquerdo arder. O gesto passou despercebido pelo amigo, mas não por Quim.

"Não esperava que você se comportasse dessa maneira." - falou enquanto também levantava de seu lugar e encarava Harry nos olhos. - "Todos nesta sede se comprometeram a ajudar no que fosse, todos sabem dos riscos e todos estão dispostos a mudar alguma coisa." - Harry tentou desviar os olhos mas o Sr. Weasley o impediu - "Olhe para mim, Harry. Não foi você que acreditou na mudança dos Malfoy? Ou mudou de ideia?"

"Não mudei de ideia, só não acredito que-"

"Ora, Harry" - Quim o interrompeu - "Você realmente não acredita em qualquer chance de mudança no Malfoy ou simplesmente prefere jogar um garoto de 18 anos na prisão por antigas brigas de escola?"

Harry suspirou e sentou-se na cadeira vazia. Colocou a cabeça entre as mãos enquanto o resto das pessoas presentes na cozinha fazia silêncio. Por fim levantou-se e olhou diretamente para Arthur.

"Tudo bem, concordo com vocês." - lançou um olhar a Hermione antes de se virar novamente para o Sr. Weasley e completar. - "Mas não pense que Rony ficará satisfeito com isso." - completou se dirigindo a saída da cozinha.

Porém, antes de chegar até a porta a voz de Hermione o fez parar.

"Afinal de contas, qual o problema com a pena do Malfoy?"

Harry se virou e olhou para a amiga.

"O problema é que o Malfoy precisará, assim como Narcisa, de um guardião em tempo integral." - e completou perante ao olhar de indagação de Hermione - "E a guardiã dele será você."

Neste momento Hermione desejou não ter perguntado.


N/A: E esse é o primeiro capítulo, gente! Comecei a escrever essa fanfic no dia 01/04/13 (já tem um tempinho, né?) mas acabei parando por causa de tempo e da universidade.

Tenho um carinho muito especial por ela e resolvi arriscar e postar! :)' Caso vocês gostem, me falem, que ai eu continuo escrevendo e postando os outros capítulos para vocês.

Então até o próximo!

PS: A fanfic não foi nem de perto betada, então já me desculpo pelos erros.

Beijos, Duda.