Geração Condenada
Escrito por Sofia e Xana
Disclaimer: Se a história e as personagens originais fossem nossas, não seriam tão maltratadas. O Remus nunca teria passado 12 anos sozinho, o Pettigrew nunca teria traído os Potters e o Sirius, certamente, nunca teria ido para a prisão por crimes que não cometeu.
Tudo aquilo que reconhecem pertence a J. K. Rowling, génio da literatura inglesa, que adora fazê-los sofrer e a nós com eles. Morgan e Julia pertencem, logicamente, a elas próprias.
Feedback: Muito apreciado. Digam tudo aquilo que acham. Praises, flames, tudo é bem aceite desde que seja justificado.
Resumo: No tempo dos Marauders, duas irmãs são separadas pela rivalidade entre Slytherins e Gryffindors e têm que aprender a viver num mundo para o qual não estavam preparadas.
Timeline: Durante os anos dos Marauders na escola. Quarto ano, especificamente.
Notas: Não inclui informações reveladas em Harry Potter e a Ordem da Fénix, por uma questão de enredo e porque ainda estamos em fase de negação.
Dedicação: Sirius Black, quem mais? (Yes, I'm still in denial...)
Capítulo 1
Morgan olhava para o comboio, absolutamente maravilhada. Apesar de já não ser a primeira vez que o via, mas sim a quarta, não conseguia parar de olhar para ele daquela forma. À sua volta, dezenas de crianças dos primeiros anos despediam-se dos pais com lágrimas nos olhos. É sempre difícil deixar aqueles de quem gostamos mas, durante a guerra, o medo de os perdermos torna-se muito maior. Mas ela não queria pensar nisso, não agora.
Reparou noutras pessoas do seu ano e ao ver quem eram, praguejou em silêncio. Não queria problemas logo no primeiro dia. Os terríveis Marauders aproximaram-se e, ao passarem por ela, empurraram-na para o lado, como se não tivessem espaço suficiente para passar. Morgan tropeçou na mala que estava a seu lado, desequilibrou-se e caiu redonda no chão, ouvindo as gargalhadas gerais.
Levantou-se, com um olhar feroz, humilhada logo no primeiro dia por Sirius Black. Como o detestava.
— Não me olhes assim, querida... — começou Black. O seu olhar era frio, insensível. — Não queres arranjar problemas aqui, pois não? Ainda nem chegamos ao castelo. Aí é que as coisas vão aquecer, Slytherin.
O primeiro instinto de Morgan foi pegar na varinha, que estava na bolsa do manto. Mas, ao aperceber-se que Black estava a tentar provocá-la, de modo a causar-lhe problemas no início do ano lectivo, acalmou-se, pelo menos exteriormente. Agarrou na pesada mala e afastou-se deles, furiosa, enquanto ouvia mais gargalhadas atrás de si.
Entrou numa das carruagens, transportando a mala até um dos compartimentos. Em seguida, fechou a porta com toda a sua força, ao mesmo tempo que gritava para as paredes:
— Estúpidos Gryffindor!!!
Atirou-se para um dos bancos, suspirando de desespero. Não compreendia aquelas atitudes. Não compreendia o motivo porque tinham que estar sempre em conflito uns com os outros. Ela nunca lhes tinha feito nada e, no entanto, desde o primeiro dia de aulas, era posta de lado, como se não fizesse parte daquele mundo.
Tudo porquê?
Porque o Chapéu Seleccionador a tinha posto em Slytherin. Tudo por causa de uma equipa, de um nome... Desde esse dia que sofria constantes humilhações por parte de Sirius Black e o resto dos Marauders: James Potter, Remus Lupin e Peter Pettigrew.
A irmã, Julia, muito pelo contrário, tinha sido aceite de imediato. Tinha passado no "teste", era uma Gryffindor. Julia era uma rapariga trabalhadora, estudiosa, óptima aluna, a preferida de todos os professores. Mas, ao mesmo tempo, conseguia ser simpática, divertida, quebrar regras de vez em quando, e isso fazia com que toda a gente gostasse dela.
Contudo, ela desistira de uma parte dessa atenção pela irmã. Detestava a forma como Black e o seu grupo a tratavam. E por isso, começou a detestá-los também. Julia conhecia a irmã e sabia que ela não merecia ser tratada daquela maneira.
Mas não era só ela que pensava assim. Lily Evans, a melhor amiga de Julia e também Gryffindor, não suportava o que aqueles rapazes faziam a certas pessoas apenas por não gostarem delas, e, no caso de Morgan, simplesmente por ser uma Slytherin. Isto juntou-a a Julia e a Morgan, e as três passaram a ser objecto das "brincadeiras" dos Marauders. Apesar de tudo, elas davam-se muito bem, e sempre que podiam estavam juntas.
A este grupo juntou-se, um pouco mais tarde, Severus Snape, o melhor amigo de Morgan. Também ele fazia parte dos Slytherin e tinham começado a falar numa aula de Poções, em conjunto com os Gryffindor.
Durante as aulas, não era permitido grupos com elementos de casas diferentes, e Morgan vira-se obrigada a juntar-se a um Slytherin, enquanto que a irmã ficava com Lily. Mas Severus, como ela depois descobriu, era excelente em Poções e essa aula acabou por torná-lo num dos seus melhores amigos.
Black tinha lançado um balão explosivo para dentro do caldeirão dela, fazendo com que toda a zona à volta dele se enchesse de um líquido viscoso e esverdeado. Severus ofereceu-se para ajudar Morgan a limpar tudo, e eles rapidamente se tornaram inseparáveis.
Algum tempo depois, já Severus era objecto de situações humilhantes por parte dos Marauders. Isso levou-o a juntar-se às outras raparigas, criando o seu próprio grupo. A missão era simples: Vingança! Os quatro não iriam deixar aquelas brincadeiras sem resposta, e criavam também situações embaraçosas para os Gryffindors.
Mas o facto de Morgan e Severus andarem com Gryffindors também os afastou dos restantes Slytherins. Nunca, desde a criação de Hogwarts, Gryffindors e Slytherins se tinham tornado amigos. E com uma muggleborn no grupo, ainda por cima. Era um ultraje para ambas as equipas, fazendo com que Julia, Morgan, Lily e Severus estivessem sozinhos naquela guerra.
E assim se passaram os três anos, numa luta constante entre os dois grupos. Agora, os Marauders tinham começado em grande o quarto ano lectivo. Mas eles não se ficariam a rir por muito mais tempo, ela estava certa disso.
Morgan pensava sobre tudo isto, sozinha no compartimento, quando a porta se abriu, e Severus Snape apareceu. Um sorriso iluminou o rosto da rapariga, que se levantou imediatamente, correndo para abraçar o melhor amigo. Severus envolveu-a nos seus braços, com um ar de preocupação. Ao separarem-se, finalmente expressou o seu desassossego.
— Estás bem? — pergunta suavemente. — Pareces acabada de sair de um vulcão. Ou melhor... pareces um vulcão pronto a entrar em ebulição.
E de facto, parecia. Com os cabelos em desalinho, flutuando à volta da cara ao sabor do vento, que entrava pela janela aberta do compartimento, e a face vermelha de raiva e fúria, Morgan parecia um animal selvagem, pronto a atacar. Quem não a conhecesse bem ficaria completamente petrificado pelo fogo dos seus olhos, mas Severus Snape não era qualquer pessoa. Severus conhecia-a melhor do que a si próprio e imediatamente reconheceu a dor por detrás daquela máscara de cólera.
Black tinha "atacado" de novo. O problema não era ele, ou as suas estúpidas "brincadeiras", mas o ódio entre Slytherins e Gryffindors, ou entre Slytherins e as outras equipas. Para o resto da escola ser Slytherin significava seguir Voldemort. Cada um era julgado não por aquilo que era, ou pelos seus actos, mas pela casa a que pertencia. Gryffindors eram os Aurors, sempre do lado do bem. Slytherins eram Devoradores da Morte, a reencarnação do mal.
Poucos segundos passaram. Morgan preparava-se para responder quando a porta se abriu com um estrondo. Separando-se com um salto, eles olharam em volta embaraçados, tentando parecer inocentes.
— Apanhados! — exclama Julia sorrindo, ao entrar no compartimento seguida por Lily.
Severus, ainda um pouco corado, pegou nas malas das duas raparigas e trouxe-as para dentro, fechando a porta atrás de si. Voltou-se então para as duas raparigas recém chegadas. Lily e Julia ainda riam do que tinha acontecido, sussurrando comentários que só as duas pareciam entender.
— Com que então, menina Julia...
— Sim, Severus? — perguntou inocentemente.
Ele abanou a cabeça, revirando os olhos e sentou-se num dos bancos, o mais longe possível de Morgan. Isto ainda serviu de pretexto para mais sussurros e risinhos da parte das duas raparigas.
Morgan encolheu os ombros, ligeiramente corada, e focou o olhar na janela, sem observar muito bem o que se passava lá fora. Julia sorriu e foi ter com ela, abraçando-a. Lily também a seguiu, mas sentou-se no banco à beira das duas, olhando para Morgan com um sorriso de simpatia.
— Já soubemos o que passou... Pena que não tivéssemos estado lá contigo... Eles nem teriam ousado olhar-te — disse Julia, de sobrolho franzido.
Ao ouvir isto, Severus levantou-se logo, com um ar espantado.
— O que aconteceu? Não me digas que aqueles parvos dos Marauders fizeram alguma coisa logo no primeiro dia!
Lily levantou-se e pôs os braços à volta dos ombros de Severus, tentando acalmá-lo. Aquele tipo de situações revoltavam-no profundamente e ele tinha muita dificuldade em controlar-se.
— Sev, relaxa. Eles vão pagar bem caro tudo o que fizeram. Especialmente aquele James Potter.
— Potter? — perguntou Severus espantado. — Pensei que tivesse sido o Black.
— E foi — respondeu Julia. — Mas sabes como é a nossa Lily. A sua grande paixão sempre foi, e será, o famoso e rico James Potter.
— Julia!! — Lily gritou indignada. — Ainda continuas com esses disparates? Sabes muito bem o quanto eu odeio o James Potter.
— Cheira-me que esse ódio vai terminar em casamento — Julia brincou.
Severus engoliu em seco e tentou rir-se da expressão de choque de Lily.
— E tu, Julinha, com o charmoso Sirius Black! — Morgan decidiu entrevir.
Julia abria e fechava a boca sem conseguir articular qualquer palavra ou som. Lily pôs-lhe a língua de fora e Morgan sorriu inocentemente. Brincadeiras deste tipo eram mais que frequentes entre o grupo. Severus, não sendo do tipo de ficar de fora de discussões tão importantes, decidiu meter a sua colherada.
— Já que estamos a planear casamentos...
— Vais pedir a minha mana em casamento! Finalmente. Parabéns Sev. Parabéns maninha — interrompeu Julia, como sempre.
Morgan corou, mas Severus não pareceu nada embaraçado.
— Julia, Julia... Depois da décima vez deixa de ser engraçado. Eu ia abençoar o casamento entre Morgan Welling e Remus Lupin, claro. Assim vocês casam todas com melhores amigos.
Olhando para a expressão no olhar das três raparigas, ele rapidamente decidiu mudar o tema de conversa. Com 14 anos, achava-se novo demais para morrer, e três contra um era um verdadeiro suicídio.
Fizeram planos de vingança, contaram histórias do Verão, discutiram o trabalho de casa e os livros para o novo ano, falaram sobre a guerra e os medos de cada um, e muito mais. Enfim, renovaram o pacto de amizade eterna e lealdade completa e quando se aperceberam, já estavam a chegar à estação de Hogsmeade.
O comboio começou a abrandar, ouvindo-se o chiar dos travões em todas as carruagens. Com um último apito, a máquina parou e as portas abriram-se.
Logo de imediato, dezenas de crianças saíram do comboio, entusiasmadas pelo novo ano que se aproximava. Depressa se gerou uma confusão tremenda, com os prefeitos de cada casa a gritarem pelos alunos do primeiro ano, tentando em vão reuni-los.
Malas circulavam por todo o lado, aumentando ainda mais o ambiente caótico, os mantos esvoaçavam ao sabor frio e gélido do vento nocturno. Finalmente, os prefeitos conseguiram juntar todos os alunos do primeiro ano e levaram-nos para os barcos, de forma a poderem passar o lago e chegar ao castelo.
Julia espreitou pela janela, constatando que já estava tudo mais calmo, agora que o primeiro ano tinha sido organizado. As carruagens esperavam pelos restantes alunos, tendo já algumas avançado em direcção ao castelo, transportando os segundos anos.
Virou-se então para os amigos, que estavam a vestir o manto e a colocar o chapéu sobre a cabeça, falando entre si sobre o facto de terem crescido no Verão. Observou-os por momentos, já preparada e com um sorriso nos lábios.
Como é que pessoas tão diferentes tinham uma amizade tão unida como a deles? Apesar da exclusão social de que eram alvo por parte dos restantes alunos, não trocariam a sua amizade por nada.
Sorriu novamente e comentou: — Meninos, já deve estar tudo à nossa espera. Era melhor irmos indo, não acham?
Lily calou-se subitamente, olhando-os com os olhos muito abertos. Não conseguia suportar a ideia de chegar atrasada onde quer que fosse. Era um pensamento vergonhoso, e só lhe apetecia bater com a cabeça numa parede por tamanha falta de responsabilidade. Deu um salto e pegou na mala, arrastando-a para o corredor, ao mesmo tempo que gritava:
— Mas de que raio estão vocês à espera? Não têm vergonha de chegarem atrasados?! Estamos no quarto ano, não nos podemos desleixar!
Julia, Severus e Morgan olharam-se entre si, com um ar divertido. Ao fim de uns segundos, encolheram os ombros e pegaram também nas suas malas, seguindo Lily até fora do comboio.
Quando lá chegaram, já estavam a embarcar os quartos anos e eles correram para uma das carruagens, rindo das suas figuras, a arrastar as malas pesadas.
Finalmente chegaram ao castelo e subiram as escadas em grande entusiasmo, até à entrada. Estavam ansiosos por saber qual seria a nova música do Chapéu Seleccionador, se haveria novos professores, qual seria o discurso de Dumbledore...
Logo à entrada, tiveram de se separar. Lily e Julia seguiram para a mesa dos Gryffindor, enquanto que Morgan e Severus se dirigiram à mesa oposta, sentando-se frente a frente na ponta da mesa dos Slytherin.
Mal se tinham sentado, a porta do Grande Salão abriu-se, e a Professora McGonagall entrou, seguida pelos alunos do primeiro ano. Eles seguiram-na quase até ao fundo do salão, e ela alinhou-os de frente para os outros estudantes, com os professores atrás.
Olhando à sua volta, eles observavam tudo com um ar de encanto, sussurrando entre si, como se tivessem acabado de entrar num sonho e tivessem medo de acordar.
McGonagall, entretanto, tinha já colocado o banco em frente à mesa dos professores e apressava-se a pousar o Chapéu Seleccionador em cima deste.
O silêncio encheu rapidamente a sala. Curiosos, os novos alunos olhavam uns para os outros, tentando adivinhar como a cerimónia iria ser feita. Um movimento súbito do Chapéu fez com que olhassem para ele e viram um rasgão junto da aba abrir-se como uma boca enorme e este começou a cantar:
Era eu ainda um jovem chapéu
Quando quatro feiticeiros me abordaram
Pediram-me para me juntar a eles
Numa escola que mais tarde formaram
Nesta escola de magia e feitiçaria
Ambiciosos, os quatro fundadores
Criaram as suas próprias casas
De acordo com os seus valores
Gryffindor do lado dos corajosos
Valentes e de cabeça no ar
Não medem as suas acções
Atiram-se sem pensar
Ravenclaw, buscando inteligência
Empenho e responsabilidade
Consideram-se acima dos outros
Abusam da sua habilidade
Hufflepuff, os mais desastrados,
Tratam todos com extrema simpatia
Não têm problemas com ninguém
Vivem sempre numa enorme alegria
Slytherin, perspicazes e astutos
Com vontade de poder
Julgados do lado do mal
Utilizam incorrectamente o seu saber
Para escolher os alunos,
Aqui estou eu para ajudar
Ponham-me na vossa cabeça
Que eu digo-vos onde vão ficar.
Todos aplaudiram entusiasticamente quando ele acabou a canção e ele fez uma vénia a cada uma das quatro mesas, ficando quieto logo a seguir. A professora McGonagall, após desenrolar uma enorme folha de pergaminho, disse aos alunos do primeiro ano:
— Quando eu chamar o vosso nome vocês sentam-se no banco e põem o Chapéu. Depois do Chapéu anunciar a vossa equipa vão sentar-se na respectiva mesa.
Todos os alunos começaram a tremer, nervosos. Encostaram-se uns aos outros, enquanto esperavam ansiosamente pela sua vez de se dirigir ao banco e colocar o Chapéu sobre as cabeças.
A professora McGonagall começou:
— Graham Bell.
Um rapazito magro, alto e moreno, a tremer dos pés à cabeça por ser o primeiro aluno a ser chamado, dirigiu-se ao banco e sentou-se, colocando o Chapéu na cabeça. Passados uns tempos, o Chapéu gritou: RAVENCLAW!!! etoda a mesa dessa equipa vibrou, enchendo o Grande Salão de gritos entusiasmados.
Logo de seguida, e sem esperar muito tempo, McGonagall continuou...
— Emma Cauldwell.
Uma rapariguinha pequenina aproximou-se do banco e sentou-se, sendo imediatamente escolhida para os Gryffindor. Outros alunos foram chamados, todos muito nervosos, e Laura Dobbs, Stewart Guerin e Eleanor Kent, tornaram-se Hufflepuff, Gryffindor e Slytherin, respectivamente.
Julia olhava para os alunos, sem dar muita atenção à distribuição. O seu olhar estava desfocado e concentrado num só ponto, a irmã. Lembrava-se, como se tivesse sido no dia anterior, da sua própria selecção. Ainda sentia aquele aperto no coração ao ver Morgan sentada numa mesa diferente da sua.
Morgan e Julia entraram no Grande Salão juntas, rodeadas por alunos do primeiro ano, como elas. À sua beira, encontrava-se um rapaz muito tímido, de cabelo quase branco e uns olhos cor de avelã, muito franzino e com um ar fraco. Tinha vindo com elas no compartimento da carruagem, mas não abrira a boca uma única vez.
Do outro lado estava outro rapaz, Sirius Black. De cabelos negros como o carvão e olhos azuis como um céu sem nuvens, já devia ser conhecido por praticamente todos os alunos, pois comportava-se com um extremo à vontade.
Tinham também compartilhado a viagem com uma rapariga ruiva, Lily Evans. Falaram durante o tempo todo, nervosas pelo facto de não conhecerem ninguém. Depressa se tornaram amigas e prometeram que mesmo que ficassem em equipas diferentes, nunca se separariam. E ali estavam elas, à espera que o Chapéu acabasse a canção e fossem chamadas para o colocar na cabeça.
Os primeiros alunos começaram a ser chamados e iam-se dirigindo para a casa que o Chapéu gritava. Julia lembrava-se apenas de alguns alunos que foram seleccionados e, na sua maioria, Gryffindors.
— Sirius Black — chamou a professora McGonagall.
O rapaz, todo despachado e acenando às pessoas conhecidas durante o caminho até ao banco, sentou-se confiante, colocando o Chapéu na cabeça, com um sorriso. Quase de imediato, o Chapéu gritou com toda a força: "GRYFFINDOR!!!"
A mesa dos Gryffindor encheu-se de palmas e gritos, acolhendo Sirius Black com grande entusiasmo.
Outros alunos se seguiram, até que chegou a vez de Lily, que avançou num passo decidido, apesar de por dentro estar a tremer de nervosismo. O Chapéu também não demorou muito tempo a escolher a equipa e, com um grito, mandou-a para os Gryffindor.
Lily levantou-se e dirigiu-se para a mesa dos Gryffindor, radiante. Tinha-lhes dito no comboio que após ter lido vários livros sobre Hogwarts, incluindo o tão famoso «Hogwarts, uma história», achava que a equipa que melhor se adaptava à sua personalidade era Gryffindor. E estava certa.
A mesa aplaudiu a sua chegada e a professora McGonagall prosseguiu. Vários alunos foram seleccionados para Ravenclaw e Hufflepuff e Julia começava a ficar impaciente.
— Remus Lupin — chamou a professora McGonagall muito devagar, como se as palavras lhe custassem a sair.
Estranho, pensou Julia, de todos os nomes que chamou, foi a primeira vez que ela agiu assim. Porquê? Curiosa, olhou em volta, tentando descobrir quem ele era. Ao seu lado, o rapaz com cabelo cor de areia aproximou-se do banco, cabisbaixo. A professora McGonagall pegou no Chapéu Seleccionador e, sem olhar para ele, colocou-o na sua cabeça, afastando-se rapidamente.
"GRYFFINDOR!!" Gritou o Chapéu imediatamente após ser colocado.
Ele levantou-se, e sem tirar os olhos do chão, dirigiu-se para a mesa dos Gryffindor, passando mesmo em frente da professora McGonagall.
Intrigada, Julia observou McGonagall com atenção. Tinha ficado pasmada com a sua reacção àquele particular aluno e, uma vez mais, a professora agiu como se ele tivesse uma doença contagiosa, ao dar um passo para trás rapidamente, quando ele passou por ela ao dirigir-se para a mesa.
O salão ficara completamente silencioso, e todos observavam Remus a sentar-se. Ninguém aplaudiu. Só quando Sirius Black, sentado à frente dele, lhe estendeu a mão e se apresentou com um grande sorriso, é que os sussurros começaram, e a selecção continuou.
Ao seu lado, Morgan deu-lhe uma cotovelada. — O que é que achas que se passou? — perguntou.
— Não sei — Julia respondeu, encolhendo os ombros. — Foi muito estranho... Acho que ele esconde qualquer coisa. Mas ela não foi nada simpática, foi quase como se estivesse a anunciar a toda a gente para se afastar dele por ele ser perigoso.
— Pelo menos já sabemos o nome dele — Morgan comentou, com os olhos ainda fixos em Remus.
A selecção tinha prosseguido e vários alunos pertenciam já a Slytherin. Morgan e Julia continuaram a falar, distraídas, não ligando aos nomes que se seguiram. De repente, ouviu-se um estrondo, alguém a espatifar-se no chão e, espantadas, olharam à sua volta, tentando saber o que se tinha passado.
Não precisaram de perguntar, a resposta era bastante óbvia. No chão, caído mesmo em frente à professora McGonagall, com o nariz quase encostado aos sapatos dela, estava um rapazito gordo e desastrado, de cabelos muito loiros e encaracolados, e com a cara vermelha de embaraço.
Sussurros percorreram o salão, todos comentando a triste figura que Peter Pettigrew — Ah, Já viste que nome? — fizera. Até McGonagall olhava para ele com simpatia, ajudando-o a levantar-se e a sentar-se no banco, colocando-lhe o Chapéu em cima da cabeça.
Pareceu ficar horas ali sentado, todos a olharem-no fixamente, à espera da miserável equipa que o teria como membro. Quando todos pensavam que talvez ele não pertencesse ali, o Chapéu faz finalmente a sua escolha: "Gryffindor." Não gritou, não o disse com entusiasmo mas com a resignação de alguém que aceita o seu destino.
Mais murmúrios percorreram o Grande Salão, enquanto ele se dirigia para a sua mesa, olhos brilhando de entusiasmo por pertencer àquela que era considerada a melhor casa de Hogwarts. Ninguém batia palmas, mas ele não se importou. Sentou-se ao lado de Remus, tentando atrair a atenção dos dois rapazes.
Abanando a cabeça, McGonagall continuou. Todos prestavam a máxima atenção, não querendo perder um espectáculo como o do aluno anterior, caso se tornasse a repetir.
— James Potter.
Na mesa dos Gryffindor, Sirius Black levantou-se com um salto.— Hey Jamie, aguenta-te aí! Já falta pouco. — disse-lhe com um grande sorriso.
Corado, James Potter aproximou-se da professora McGonagall muito embaraçado. Típico do Sirius fazer aquela manifestação toda só para chamar a atenção.
— Psst... Já viste o cabelo dele? Ele já não se deve pentear há anos — Julia comentou com a irmã, que riu baixinho.
De facto, o cabelo de James era muito invulgar. Negro como o carvão, era mantido ao comprimento das orelhas e estava todo no ar. Dava-lhe um ar selvagem e perigoso, o que contrastava com os seus olhos castanhos, escondidos atrás de um par de óculos redondos muito simples.
James sentou-se, pôs o Chapéu e segundos depois era escolhido para os Gryffindor. Sirius, que tinha permanecido em pé durante o tempo todo em que ele era seleccionado, correu a abraçá-lo, sob o olhar austero da McGonagall, murmurando frases sem sentido ao ouvido do melhor amigo.
À volta deles ouviam-se fragmentos — divertido... vão ver... invisível... comida... — e muitas outras coisas difíceis de apanhar devido à velocidade com que Sirius falava.
James, contudo, pareceu entender e, apesar de envergonhado por estarem todos a olhar para eles, sorriu e os dois caminharam para a mesa dos Gryffindor, com os braços de cada um nos ombros do outro.
Todos os alunos riram do comportamento de Sirius, certos que os sete anos seguintes iriam ser muito interessantes e divertidos. O seu lema parecia ser regras-existem-para-serem-quebradas, o que prometia um grande espectáculo.
Depois do show Black/Potter, a selecção ficou muito mais aborrecida. Vários alunos foram seleccionados para as várias casas, nenhum com particular interesse para Julia, e ela dedicou-se a admirar a beleza e grandiosidade do Grande Salão. Tinha crescido entre histórias sobre a magnificência daquela escola, mas agora que a via, compreendia que palavras não chegavam para descrever aquele lugar tão especial.
Mal recebera a sua carta de admissão, correra, mais a irmã, à biblioteca, para lerem tudo o que encontrassem sobre a história de Hogwarts, das equipas, dos fundadores, dos fantasmas...
Estar ali, naquele lugar mágico, prestes a ser seleccionada era um sonho tornado realidade. E já faltava tão pouco para pertencer à sua equipa, para começar um novo capítulo na sua vida, onde poderia ser ela própria, sem se preocupar com as opiniões dos pais ou da sociedade, ou com aquela maldita guerra.
Estava completamente mergulhada nos seus pensamentos, que quando se apercebeu, apenas faltavam três alunos serem seleccionados. Ela, a irmã e outro.
Ele tinha cabelo muito preto, pelos ombros, que lhe escorria pela cara abaixo, obstruindo a visão completa da mesma. Os olhos eram escuros como a noite, observando tudo e todos, e sobressaíam naquela face pálida como o mármore, sinal das poucas vezes em que teria visto a luz do sol.
Estava vestido todo de preto e mantinha-se a um canto, escondido nas sombras, com uma expressão fria no rosto. Mas os seus olhos... Aqueles olhos negros mostravam tantas emoções, escondiam tantos segredos...
Julia ansiava saber mais sobre esta estranha personagem, as razões por detrás de tanta solidão. Olhou para a professora McGonagall, esperando o nome que ela se preparava para chamar.
— Severus Snape — chamou McGonagall, franzindo as sobrancelhas em sinal de reprovação.
Snape! Os olhos de Julia alargaram-se com espanto. De todos os nomes que poderiam ser, tinha logo de ser aquele. Os pais dela nunca iriam consentir numa amizade entre eles, ela sabia disso. Mas ele parecia tão interessante, muito mais cativante que aquele Black qualquer coisa que só sabia exibir-se. Ela não conseguia tirar os olhos dele, atraída para ele como uma abelha para o mel.
Ele aproximou-se do banco lentamente, como se caminhasse sobre o ar, o manto flutuando atrás dele. Sentou-se e colocou o chapéu, esperando o veredicto final.
"SLYTHERIN!!" Gritou o Chapéu Seleccionador com entusiasmo.
Severus levantou-se, tirando o Chapéu, e um pequeno sorriso encheu a sua face por instantes. Julia não pode deixar de reparar no quanto ele era bonito quando sorria, e prometeu a si própria que o faria sorrir mais vezes.
Toda a mesa dos Slytherin aplaudiu, e Severus dirigiu-se para lá, passando mesmo em frente a Julia. Os seus olhos cruzaram-se, e por momentos pareceram ver a alma um do outro. Depois, ele continuou o seu caminho, deixando-a a perguntar-se a si mesma o que raio se tinha passado.
— Mana!! — sussurrou Morgan, olhando-a de forma estranha. — Sabes quem ele é? O que raio é que se passou?
— Agora não posso, é a minha vez. Eu explico-te mais tarde.
Morgan não pareceu satisfeita com a resposta, mas não teve escolha. Severus sentara-se na mesa, e o salão estava silencioso outra vez. McGonagall olhou para o pergaminho e continuou com a selecção.
— Julia Welling.
Julia aproximou-se da professora McGonagall, sentindo os olhos de todos presentes no salão a observarem-na. Pareceu-lhe demorar séculos a chegar até ao banco. Sentou-se e colocou o Chapéu na cabeça, perguntando-se como seria a selecção feita. Esperou.
— Hum... — disse uma voz ao ouvido dela — que temos aqui? Muito corajosa, vejo. Talento e inteligência... Lutas até ao fim por aquilo que acreditas... Queres provar o que vales, mas pensas no bem dos outros acima do teu.. Onde é que eu te vou pôr?
Agarrada ao banco, de olhos fechados e muito concentrada, Julia repetia sem parar — Põe-me em Slytherin... Slytherin, por favor...
— Queres Slytherin, hem? — ouviu novamente a vozinha. — Será por causa daquele teu amigo?
Mordendo o lábio inferior, Julia sentiu-se corar.
— Receio que Slytherin não seja lugar para ti — o Chapéu continuou. — Um grande destino espera-te, pequena. Para isso precisas de estar onde pertences, junto dos que pensam como tu. Quando ao teu amigo... Acho que estarem em diferentes equipas não será um obstáculo, não achas?
Não sei, Julia pensou.
— Não te preocupes... Tudo acontece exactamente como está previsto. Com todas as tuas características só podes ser...
"GRYFFINDOR!!" Gritou o Chapéu entusiasticamente.
Julia ouviu toda a mesa dos Gryffindor aplaudir, e tirou o Chapéu, pousando-o outra vez no banco. Pareceu-lhe vê-lo sorrir levemente para ela, como se lhe dissesse para ser forte que tudo iria correr bem, mas imediatamente esqueceu a ideia absurda.
Caminhou para sua nova equipa num passo decidido, sem pestanejar, e quando se sentava, reparou que alguém a observava na mesa oposta à sua. Levantando ligeiramente a cabeça, o seu olhar cruzou-se com o de Severus Snape.
Ele acenou-lhe ligeiramente com a cabeça, e ela sorriu involuntariamente. Estavam em casas completamente opostas, inimigas desde o tempo dos fundadores e, apesar de não se conhecerem, acabavam de se cumprimentar respeitosamente. O que estaria a acontecer no mundo...
Viu a expressão de espanto no rosto da irmã pelo canto do olho, e voltou o olhar para ela, tentando transmitir-lhe força com o pensamento. Ela era a última a ser seleccionada e isso seria capaz de pôr qualquer um com os nervos à flor da pele.
Ao vê-la instalada, McGonagall olhou para Morgan e prosseguiu.
— Morgan Welling.
Ela aproximou-se do Chapéu rapidamente, querendo acabar o mais rápido possível com aquilo. Sentou-se, e pondo o Chapéu, esperou.
Agora que sabia como a selecção era feita, Julia estava curiosa em saber o que a irmã estaria a ouvir. Quais seriam as suas características? Ficaria ela também em Gryffindor?
Ao aperceber-se da hipótese de poderem ficar separadas, Julia sentiu o coração apertar-se dentro do peito. Nunca se tinha separado da irmã por mais de algumas horas. Estavam habituadas a partilhar tudo, desde o quarto onde dormiam, livros e brinquedos, até aos mais íntimos segredos. E se ficassem separadas?
O Chapéu parecia estar a fazer uma análise muito profunda. Cada segundo que passava era uma eternidade para Julia, que se sentia cada vez mais longe da irmã. Paranóia. Pura e simples.
Mas não era. Quando o Chapéu gritou as palavras que ela mais receara ouvir, não soube como reagir.
"SLYTHERIN!!"
Julia, ainda em estado de choque, observou a irmã a tirar o chapéu, entregá-lo à professora McGonagall e caminhar até à mesa dos Slytherin, que alternavam os olhares entre as duas gémeas, agora separadas pela rivalidade entre as suas casas.
Morgan, não parecendo importar-se com os olhares dos outros, sentou-se no canto da mesa dos Slytherin, dois lugares à frente de Snape. Julia pareceu finalmente cair em si, sentindo os olhos encherem-se de lágrimas. Não sabia o que pensar.
Por um lado, sentia-se perder a irmã, a sua companheira de sempre, para as rivalidades entre casas. Os olhares depois da selecção tinham sido bastante óbvios. Mas por outro lado, sentiu uma inveja tão grande invadir-lhe o peito, um sentimento de fracasso a apoderar-se dela, porque a irmã tinha conseguido exactamente aquilo que ela tinha falhado. Ficar em Slytherin.
Mas não, não podia pensar assim. A irmã não tinha culpa, ela sabia disso. E imediatamente se envergonhou de ter pensado semelhante coisa sobre a sua irmã, sangue do seu sangue. Não era justo, até porque a irmã estava sozinha. Ela tinha a Lily, já tinha feito uma amiga.
Durante o resto do banquete, não disse uma única palavra. Lily pareceu entender, e comeram as duas em silêncio. Não se riu das piadas que Black dizia, tentando animá-la, e encolheu os ombros quando James lhe perguntou se estava tudo bem.
Não, é claro que não está tudo bem!!, apeteceu-lhe gritar. Mas não o fez. Aquelas pessoas não tinham obrigação de aturar o seu mau humor, e ela detestava fazer cenas e ser o centro das atenções.
Depois do discurso do Dumbledore, foi com os outros alunos do primeiro ano para a torre dos Gryffindor, recolhendo imediatamente para o dormitório. Não viu a irmã até à manhã seguinte, quando veio tomar o pequeno almoço no Grande Salão. Não lhe disse nada sobre o pedido que tinha feito ao Chapéu Seleccionador, não valia a pena...
— Julia? — a voz de Lily trouxe-a de volta à realidade. Tinha recordado durante muito tempo, já só faltavam seleccionar três alunos.
— Pensando no teu casamento, amiga?
— O quê? — olhou para Lily e ela piscou-lhe o olho. — Desculpa... estava distraída.
— Pois, eu reparei. Algum problema? — perguntou, preocupada.
— Não, estava só a pensar na nossa selecção.
Lily acenou com a cabeça, dizendo que entendia. Julia voltou a concentrar-se na selecção actual, prometendo a si própria que não se iria distrair em mais viagens para a terra das memórias.
— Owen Madley — chamou a professora McGonagall.
Owen era loiro e tinha olhos azuis esverdeados. Ao contrário dos que tinha observado, aproximou-se do banco muito confiante, e pôs o Chapéu na cabeça. Pelos vistos havia sempre um Sirius Black em cada geração.
"HUFFLEPUFF!!" Gritou o chapéu, e ele correu para a mesa da sua equipa.
Os últimos dois alunos a serem seleccionados foram Malcolm Valenti e Orla Whitman, Slytherin e Ravenclaw respectivamente. Finalmente acabou, pensou Julia, este ano parecem ser muitos mais.
McGonagall levou o Chapéu e o banco do salão, e Dumbledore levantou-se. Todos se calaram, imediatamente.
— Para todos vocês, bem-vindos a um novo ano em Hogwarts, escola de Magia e Feitiçaria — Dumbledore disse, de braços abertos e olhos brilhando. — Como se costuma dizer, primeiro o prazer e só depois o dever... Por isso, toca a empanturrar!
— Finalmente!! — gritou Sirius Black da mesa dos Gryffindor. — Já não sentia o estômago.
Gargalhadas soaram no Grande Salão, e a comida apareceu. Depois de encher o prato com um pouco de tudo, Sirius olhou para os amigos. Estavam sentados na ponta da frente da mesa, James ao lado de Sirius, Remus na frente deste e Pettigrew ao lado de Remus, na frente de James.
— Continuando a nossa conversa — disse Sirius enquanto mastigava o seu empadão de carne. — digam-me lá, como vão em relação às raparigas? Muitas conquistas este verão?
James abanou a cabeça, revirando os olhos em sinal de desespero. Aquele Sirius era sempre a mesma coisa. Mas que tema embaraçoso! Podia esperar até chegarem ao dormitório, mas não... Tinha de ser mesmo ali no Grande Salão, para toda a escola ouvir. Não que ele estivesse interessado em saber com quantas raparigas os amigos tinham andado durante as férias, mas sim para se gabar da quantidade delas que conseguia ter.
Suspirou ao ver a cara de Remus e, uma parte dele, teve pena do amigo. Sabia que ele não tinha muita facilidade com as raparigas, talvez devido a ser o que era. Faltava-lhe confiança em si próprio, tinha medo da reacção dela se descobrisse que ele era um lobisomem. Eles bem lhe diziam que se ela gostasse mesmo dele não se afastaria dele só por causa daquilo, mas de nada adiantava. Não tinham conhecido uma única namorada de Remus durante aqueles três anos de escola.
Peter, com a sua face rechonchuda e um bocado mais moreno do que o costume, tom que não condizia nada com o seu cabelo loiro, quase amarelo, saltitou logo no banco, entusiasmado. Estas manifestações de alegria eram muito habituais no rapaz, que tentava sempre estar à altura dos amigos.
— Vocês nem imaginam! Este verão, enquanto tive de férias com os meus pais, conheci uma prima linda! Cabelo loiro, olhos azuis, corpinho bem constituído, tudo no sítio certo, nas proporções certas! Uma beleza! Fui-me aproximando dela e, lá para a segunda semana, começamos a andar! Nem vos conto... Uma delícia de rapariga.
— Aposto que tinha para aí uns 10 anos para aceitar andar contigo... — comentou Sirius em voz alta, encolhendo os ombros. Tentava ter paciência com Peter, mas havia limites! Sempre a inventar coisas para se gabar... Se não fosse o James, já o tinha posto de parte.
Gargalhadas soaram de todos os lados, ao ouvirem o comentário de Sirius. Peter fez um ar magoado e calou-se, concentrando-se na comida que tinha no prato, sem fazer qualquer esforço para a comer. Às vezes Sirius conseguia ser mesmo mesquinho...
James lançou a Sirius um ar severo, fazendo-o sentir-se culpado. Pronto, tinha excedido mais uma vez os limites... mas Peter conseguia sempre irritá-lo.
— Hum... Não teve lá muita piada, confesso... — disse-lhe, tentando parecer sincero.
James aproveitou o momento para desviar a conversa, mostrando uma lista que tinha feito durante as férias, com ideias para partidas para pregaram à Evans, às Welling e ao Snape. O ambiente desanuviou imediatamente. Se era coisa que nunca faltava a James era imaginação. Todos riram, até Remus, que parecia finalmente em casa.
Sirius olhou para James como se o Natal tivesse vindo mais cedo. Pegando na lista, seleccionou logo as suas preferidas, planeando logo as vitimas de cada uma e a altura certa para as pregar. Os outros Marauders sabiam que agora era impossível recuperar a atenção dele. Sirius parecia perdido num mundo à parte, como se já imaginasse a expressão na cara de Welling... Ah, Julia iria pagar! Os olhos azuis brilhavam de entusiasmo e parecia ter perdido o apetite.
O banquete estava no fim e o resto da comida dos pratos e da mesa desapareceu. O professor Dumbledore levantou-se mais uma vez e o salão ficou num silêncio total.
— Agora que já comemos e bebemos, tenho alguns notícias para vos dar sobre o ano escolar que começa — anunciou. — Os alunos dos primeiros anos ficam a saber que a floresta proibida é, como o nome indica, proibida a todos os alunos. Aproveito para o lembrar a alguns alunos antigos.
Os olhos de Dumbledore brilharam na direcção de Sirius Black e James Potter que se limitaram fazer um sorrisinho malandro enquanto acenavam com a cabeça, como se estivessem contentes por não serem esquecidos.
— O senhor Filch, o encarregado, pediu-me também para vos recordar a todos que não deve ser utilizada magia nos corredores, entre as aulas. E para finalizar, os desafios de Quidditch terão início na segunda semana deste período. Todos os que estiverem interessados em jogar pela sua equipa deverão contactar Madame Hooch.
— E agora, antes de irmos dormir, vamos cantar o hino da escola! — gritou entusiasmado. Os sorrisos dos outros professores ficaram imediatamente parados.
Era sempre uma experiência irreal o início de cada ano lectivo com aqueles Marauders como alunos. Todos os anos preparavam um espectáculo diferente.
Dumbledore fez um pequeno gesto com a varinha, e uma longa fita dourada saída de lá de dentro, ergueu-se bem alto sobre as mesas e, serpenteando, transformou-se em palavras.
— Escolham a vossa melodia — disse. — E comecemos!
E todos os alunos, menos os Slytherins, que nunca se humilhariam daquela forma no meio de toda a gente, juntamente com Dumbledore e alguns dos professores, cantaram:
Hogwarts, Hogwarts, infalível, Hogwarts
Ensina-nos, por favor
Quer sejamos já velhos e calvos
Ou jovens em pleno vigor
Nossas mentes precisam de ser
Repletas de coisas interessantes
Pois estão vazias e cheias de ar
Como balões gigantes.
Ensina-nos o que tiver valor
Faz-nos lembrar paz e tormenta
Dá o teu melhor, enche por favor
Toda a nossa massa cinzenta!
Os alunos terminaram o hino em alturas diferentes. Por fim, quando o último aluno acabou o último verso, os quatro Marauders levantaram-se, e subindo para cima da mesa (Pettigrew e Lupin um pouco relutantes) posicionaram-se ao lado uns dos outros, os braços nos ombros do companheiro do lado, e começaram a cantar o hino da escola. A melodia que escolheram foi... We are the champions.
A escola toda observou-os de boca aberta, como que petrificados, e até o Julia estava impressionada. Balançando-se de um lado para outro, fazendo pleno uso dos pulmões, eles eram o verdadeiro retrato de felicidade, e a música escolhida não podia ser mais apropriada.
Quando eles terminaram, o salão encheu-se de aplausos, e eles fizeram a sua vénia teatral, descendo da mesa em seguida. Os professores, esses tiveram atitudes diferentes.
Os olhos de Dumbledore não conseguiam brilhar mais e a sua expressão era de divertimento. McGonagall parecia comovida, tendo-se esquecido até de tirar pontos por terem subido para cima da mesa. O professor Flitwick continuava a bater palmas, só faltando mesmo levantar-se e gritar "Bravo! Bravo!" a plenos pulmões.
— Ah! A música — disse por fim Dumbledore, limpando olhos. — É uma magia para além da que fazemos aqui. E agora são horas de ir para a cama. Toca a andar!
Os primeiros anos seguiram os prefeitos das suas casas, e os alunos mais velhos levantaram-se pouco depois. Julia e Lily seguiram um pouco atrás dos Marauders, que iam rindo e fazendo comentários para um pedaço de pergaminho que estavam a ler.
Segundo tinham ouvido durante o jantar, era uma lista de partidas que Potter tinha elaborado. As mãos de Julia desejavam tocar naquela lista, ela ansiava saber o que era tão divertido para os fazer rir assim... Mas também, pensou, eles riem-se sempre por tudo e por nada, têm sempre motivos para andar bem dispostos. Conseguem sempre sair ilesos de todos os problemas em que se metem.
Tinham chegado ao retrato da Dama Gorda e, depois de dizerem a senha, entraram para a sala comum dos Gryffindor. Os quatro rapazes sentaram-se imediatamente nos sofás à frente da lareira, e Lily seguiu para o canto habitual das duas raparigas, situado o mais longe possível dos diabinhos de Gryffindor.
Julia, porém, caminhava muito lentamente, como se estivesse à espera de alguma coisa. Black escolheu esse momento para se levantar e, passando o mais colado possível a Julia, esfregando-se literalmente nela, tentou ir para as escadas que davam para o dormitório dos rapazes do quarto ano.
— Hey!! — gritou Julia vermelha de raiva. — Vê lá por onde andas. Parece que não tens espaço suficiente...
— Welling, o mundo é pequeno demais para nós os dois. Aliás... Duvido que o universo inteiro chegasse para impedir que a tua presença imunda me incomodasse — disse ele irritado. Era considerado o "deus grego" das raparigas, do primeiro ao sétimo ano, em todas as casas, e o seu ego não o deixava aceitar que não tinha qualquer efeito sobre Julia Welling.
Julia olhou-o com desdém. Mas pareceu ter subitamente uma ideia, porque os seus olhos imediatamente brilharam e ela lançou-lhe um sorriso tímido e um pouco brincalhão.
Sirius sentiu que a sua boca se abria e percebeu que devia parecer um peixe fora de água, mas estava admirado demais para se preocupar. Welling tinha...
Ela aproximou-se dele lentamente, como se o estivesse a observar por inteiro, e quando estava mesmo colada a ele, olhou-o nos olhos, a mão dela tocando levemente a dele, parando para agarrar suavemente a lista que ele se preparava para guardar no dormitório.
Durante segundos, nada aconteceu. Depois, Julia puxou a lista com toda a sua força, correndo para o dormitório das raparigas quando o conseguiu. Sirius pareceu acordar de repente do hipnotismo dos olhos de Welling e correu imediatamente atrás dela.
— Welling, eu mato-te!! — gritou. — Dá cá isso!
Lily e os outros Marauders estavam indecisos entre correr para ajudar os amigos, ir observar a cena ou desatarem a rir. Decidiram-se por um misto das três, correndo para observar a cena e rir da figura dos amigos.
Era conhecimento geral que Julia e Sirius eram a melhor fonte de divertimento conhecida na terra. Quando aqueles dois se confrontavam, era impossível alguém ficar indiferente ou infeliz.
No dormitório, Julia erguia a mão com o pergaminho no ar, acenando a Black com ele, com um grande sorrisinho na cara. Sirius, por outro lado, estava furioso. Parecia com vontade de a matar com as suas próprias mãos.
Uma cama separava-os. Julia estava de um lado, encurralada contra a parede. Sabia que mais cedo ou mais tarde iria ter que devolver a lista, que nem sequer tivera tempo de ler. Mas ver a reacção de Sirius tinha tido muito mais piada...
Sirius preparava-se para a "atacar". Com os cabelos pretos todos em desalinho, num penteado que rivalizava com o do próprio James Potter, olhos brilhando de raiva, parecia um daqueles cães que atacam quando alguém perturba o sossego do seu lar.
Julia teve nesse momento a ideia de pegar fogo ao pergaminho, desejando incitar ainda mais aquele rapaz a quem tão poucos conseguiam provocar reacção. Mas algo lhe disse que se o fizesse estaria a passar a barreira invisível entre o perdoável e o imperdoável, sim porque toda a gente sabia a importância que Sirius dava às partidas, e a ideia de arranjar um inimigo por causa de uma coisa tão insignificante era absolutamente abominável.
— Relaxa, querido — disse com uma voz irritantemente doce. — Não sabia que era capaz de provocar uma reacção assim tão forte em ti... E isto tudo por causa de um simples pergaminho com uma lista de partidas idiotas. Imagino como seria se eu tentasse provocar outro tipo de reacção...
Sorriu sugestivamente, piscando-lhe o olho. Em seguida, estendeu-lhe o pedaço de pergaminho e caminhando para a porta, reparou que todos a observavam. Riu-se para Lily, acenando-lhe para entrar, e segurando na porta, olhou para Black.
Apertando o pergaminho na mão direita, ele praticamente voou para fora do dormitório, lançando-lhe olhares de ódio. Julia fechou a porta, e dirigiu-se para a cama, deitando-se de barriga para cima. Lançando um olhar para Lily, suspirou.
— Este ano promete ser interessante — comentou, os olhos a fecharem-se de cansaço. Segundos depois adormeceu, e só acordou no dia seguinte.
