N/A: Ok, a brincadeira (que eu peguei emprestada de outra autora – não lembro qual, mas, seja quem for, dou os devidos créditos, obrigada!) é a seguinte. Ativar o shuffle (ordem aleatória de músicas) no seu WMP (ou seja lá que programa você usar) e deixar 10 músicas tocarem. No tempo de cada música, você deve escrever um drabble com base na música em questão.
Bem, eu mudei um pouco as regras. Primeiro que minha escrita não flui tão fácil assim, logo, míseros três minutos sequer fariam cócegas. Logo, eu extrapolei (e muito) o tempo da música (rs). Segundo, eu não me dou bem com drabbles, logo, a coisa saiu muito maior do que o originalmente planejado (sorriso amarelo). Não sei de que tamanho os próximos 9 sairão (se saírem) – comigo nunca há garantias nesse terreno. Ao final de cada um, revelarei qual foi a música em que me baseei (as dez músicas já foram sorteadas) – só ressaltando que as 'histórias' serão aleatórias, podendo acontecer a qualquer momento do seriado, sem ordem cronológica. Além disso, podem ou não ser fiéis aos acontecimentos do seriado – tudo depende do meu humor (sorriso de gato).
De qualquer forma – enjoy.


.I.


O despudor só revelou minhas piores intenções
Elas sempre se escondem nas conversas francas.

"Aquele pirralho…"

O tom de voz quase cruel, pouco comum em se tratando de quem estava falando, conseguiu trazê-lo de volta do limbo pelo qual seus pensamentos vagavam nos últimos quinze minutos. Não exatamente atentos à eterna falação do melhor amigo, não exatamente distantes do diner, barulhento àquela hora da manhã. Sabia a quem Michael reservava aquele tipo de recepção. Não precisava erguer o olhar da xícara de café, que estivera encarando pelos mesmos quinze minutos sem beber, para confirmar. Ainda assim o fez.

Por alguns instantes, achou que seus olhares se cruzariam de imediato – mas então se lembrou das idiotices que Hollywood alimentava a menininhas de quinze anos e por pouco não espirrou o café frio pelo próprio nariz. E não só pelo gosto horrível daquilo que Debbie chamava de café.

Pigarreando para não engasgar, observou silenciosamente o garoto adentrar a lanchonete, dirigir-se ao balcão e colocar o avental, os olhos azuis sempre pregados ao chão. Brian franziu a testa. O Justin que conhecia tinha aquela atitude maior que o mundo, brilhante demais para curvar-se diante de qualquer coisa ou qualquer um. Entrava em um lugar para ter sua presença reconhecida, um ar quase imponente, beirando o arrogante, emanando de si.

Se ele estava se escondendo por trás da franja loira, que cobria parcialmente o rosto – ele está deixando o cabelo crescer, observou, distraidamente –, algo estava obviamente errado. Pois o Justin que conhecia nunca se escondia, nem mesmo depois das agulhadas mais venenosas de Brian. E, naquele momento, Justin sequer parecia capaz de estar entre as mesmas quatro paredes que ele, que dirá enfrentá-lo e jogar todas as suas mentiras na sua cara, arte que o loiro aparentemente vinha aperfeiçoando desde que o conhecera, dois anos antes.

Em vez da imponência natural, Justin estava se conduzindo como se carregasse uma grande vergonha.

Só então Brian registrou que, em momento algum, Michael parara de falar.

"… atrevimento desse merdinha, aparecer aqui depois do que ele fez… como se já não fosse suficiente…"

"Michael…" Zen Ben, sempre a voz da moderação.

A segunda coisa que Brian percebeu foi que não era o único a acompanhar cada movimento de Justin desde que ele entrara na lanchonete. Todos na sua mesa estavam fazendo o mesmo – exceto pelos olhares especulativos de Ted, que estavam sobre ele, Brian, e que preferiu ignorar. Se quisesse ser analisado, pagaria uma merda de um psiquiatra.

Considerando que Michael não estava fazendo questão de falar baixo ou os outros, de serem ao menos discretos, rapidamente compreendeu a mudança de comportamento do loiro. Nada como ser o objeto de fascínio em uma exposição de aberrações, pensou, amargo.

"Ele deveria ter vergonha de entrar aqui depois daquele showzinho de ontem à noite!"

Os comentários de Michael estavam ficando particularmente – e intencionalmente – altos. A tensão quase imperceptível que repentinamente surgira nos ombros de Justin, naquele momento de costas para eles, era prova mais do que suficiente. Brian ergueu uma sobrancelha. Ali estava aquela palavra novamente.

"E por que seria isso?" Direto ao ponto.

"Ahn?", Michael interrompeu a ladainha com um olhar confuso em sua direção, pego desprevenido.

"Por que Justin deveria ter vergonha de aparecer aqui?", explicou, ligeiramente irritado. "Até alguns minutos atrás, era um lugar público."

E ali estava o olhar. Dessa vez, havia algo além da necessidade de se fazer de vítima – ou, no caso, de fazê-lo de vítima. Em retrospecto, percebeu que aquela expressão só surgia quando Justin estava envolvido e a situação era aparentemente favorável a Michael. Brian expirou longamente.

"Brian, depois de ontem—"

"Eu estava ontem, Mikey", interrompeu, a expressão fechada. "Aonde você quer chegar?"

Todos se remexeram em seus lugares, obviamente desconfortáveis. Como sempre, Michael foi o único a não captar a mensagem.

"Aquele pirralho deixou você, no meio da festa que você preparou para ele, para ir atrás do tocador de rabeca!" Michael lançou uma tentativa de olhar fulminante para o loiro atrás do balcão, naquele momento ocupado em servir café para um cliente. "Esse… esse merdinha não tem o direito de estar aqui!"

"Michael!", foi a vez de Ted chamar a atenção.

"O quê?!", ele voltou-se para o amigo, irritado. "É verdade!"

Brian teve de conter-se para não revirar os olhos.

"Controle seus impulsos de drama queen, Mikey. Sequer são oito da manhã."

E, claro, o olhar furioso – ou quase – imediatamente se voltou para ele. Finalmente.

"Por que você está fazendo piada disso, Brian?! Esse… esse fedelho largou você e tripudiou de tudo que você já fez por ele até hoje na frente de todas aquelas pessoas! Como você pode ficar sentado aí, como se nada tivesse acontecido, enquanto ele desfila por aí com o novo namoradinho?"

Brian colocou a xícara de volta sobre o pires com um pouco mais de força do que pretendia, mas foi o suficiente para que as investidas de Michael freassem bruscamente, os olhos do melhor amigo arregalados.

"Antes de tudo, eu não sou uma mala para ser largado, Mikey. Segundo, onde merda você quer chegar com tudo isso, além de chamar a atenção desse lugar inteiro?" Cerrou os olhos quando o amigo abriu a boca, sua expressão deixando claro que estava prestes a desfiar novos comentários da mesma classe dos anteriores. "Apenas cale a boca e vá cuidar dos seus gibis. Você não tem idéia do que está falando."

Ignorando a expressão indignada do amigo, levantou-se e empurrou Ted e Emmett sem cerimônias até conseguir sair da mesa. Enquanto cruzava a lanchonete lotada em direção à saída, lançou, sem pensar, um último olhar na direção de Justin. Para sua surpresa, seus olhares de fato se encontraram. E a expressão nos olhos e rosto do loiro amargou ainda mais seu humor já arruinado.

Resignação também não era algo que o loiro costumava exibir com freqüência.

Precisando descontar sua frustração em algo ou alguém, não hesitou ao cruzar com uma figura já conhecida na saída.

"O café está pior do que lama, Debbie." E, antes que a mulher pudesse sequer registrar suas palavras, já havia desaparecido pela porta a passos apressados.

Só quando estava a poucos passos do jeep permitiu-se parar momentaneamente e respirar fundo. Merda. Esfregou os olhos para afastar a imagem perturbadora desse novo Justin que acabara de ver pela primeira vez. Para afastar os comentários irritantes de Michael que ainda ecoavam nos seus ouvidos. E, aparentemente, o nome era o feitiço, pois exatamente quando estava colocando os óculos escuros e recompondo a máscara de indiferença, foi a voz de Michael que ouviu chamando-o de longe.

Ignorando-o, continuou em direção ao carro. A mensagem não foi clara o suficiente.

"Brian, será que dá pra esperar?!", Michael exclamou, a poucos passos dele, ofegante.

"Não, não dá. Vá para o seu maridinho e me deixe em paz, Michael. Eu preciso trabalhar", rebateu sem virar-se, abrindo a porta do carro.

"Brian, espere!", e, de repente, Michael estava segurando a porta do carro, impedindo-o de sair dali antes que começassem tudo de novo. "Eu não acredito que você vai sair daqui com raiva de mim pelo que aquele fedelho fez! Ele—"

Perdendo a paciência, Brian jogou sua pasta dentro do carro e bateu a porta com força, voltando-se para o amigo antes de avançar e quase cuspir as palavras diretamente no rosto dele.

"Ele não fez nada, Michael! Será que isso é tão complexo que simplesmente não entra na sua cabeça?"

"Como assim, não fez nada?! Ele—"

"Cale a boca, ok?", Brian interrompeu sem rodeios.

Michael franziu a sobrancelha, novamente indignado. Deus, eu consegui o que eu queria, não?, Brian perguntou a ninguém em particular, comprimindo o estreito espaço entre os olhos na tentativa de afastar aquela dor pontual que, naquele ritmo, provavelmente viraria uma dor de cabeça. Gritar não resolveria nada. Obviamente.

"Mikey, me diga uma coisa: quando alguém o empurra em direção a um precipício, o que você faz?", tentou, o mais calmo possível.

"Ahn?"

Muito eloqüente, Mikey.

"Um precipício, Michael. Quando alguém o empurra em direção a um, o que você faz?", insistiu.

"O que isso tem a—"

"Só responda à droga da pergunta!", ralhou, impaciente.

"Está bem! Jesus!", o homem fez uma careta. "Eu empurraria de volta, acho."

"E se isso não funcionasse?" Diante da expressão confusa, Brian respirou fundo. "Você ficaria cada vez mais próximo da borda, certo?"

"Acho… que sim? Brian, o quê…?"

"O que você faria, então? Se estivesse cada vez mais perto de cair e se perder lá embaixo, por mais que você lutasse contra a pessoa que o está empurrando?"

"Eu… eu tentaria… não sei… parar essa pessoa?" Michael encarou-o diretamente, e a óbvia confusão do amigo fez Brian acalmar-se um pouco mais. Quando voltou a falar, tentou soar mais compreensivo.

"E se você não tivesse mais forças para isso? Não tivesse como lutar, porque essa pessoa é muito mais forte do que você?"

Pela primeira vez, Michael realmente parou para ponderar a situação antes de responder, pelo que Brian agradeceu a qualquer entidade que quisesse ouvi-lo. Ainda havia esperanças. E, quando os olhos castanhos do amigo encararam-no intensamente pela primeira vez desde o início da conversa, Brian assentiu discretamente. Ele estava começando a entender.

"Eu tentaria sair dali", Michael enfim disse, e não havia mais descrença em sua voz, apenas um início de compreensão – e aceitação.

Brian sorriu curtamente, mas sabia não haver qualquer traço reconfortante no gesto, apenas um reconhecimento quase melancólico.

"Você correria. Eu correria. Qualquer um correria, porque, no final, qualquer um quer sobreviver. Instinto de sobrevivência, Mikey." Parou. "De auto-preservação. Quando nada mais dá certo, você precisa correr para salvar o que ainda tem."

Michael entreabriu os lábios, mas nenhum som foi emitido. Ele ainda encarava Brian intensamente, buscando algo.

"É isso que as pessoas fazem, Mikey. Empurram umas às outras em direção aos seus precipícios pessoais, por qualquer motivo que seja. E é muito nobre achar que se pode evitar cair. Talvez alguns consigam, isso não vem ao caso. O que importa é que, na maioria das vezes, você tem que admitir a derrota e correr antes de se perder completamente."

Brian sorriu amargamente. Michael apenas piscou, sem reação.

"Eu preciso ir. Vá tomar o resto seu café, ou aquilo que Debbie finge ser café."

"Ok", Michael assentiu, sorrindo fracamente antes de abraçá-lo. A intensidade do gesto não passou despercebida por Brian.

Finalmente dentro do carro, trancou as portas antes de ligar o motor. Lançando um último olhar pelo vidro ao amigo, ainda parado onde o deixara, Brian sorriu afetadamente antes de passar a marcha e partir. Seus pensamentos já estavam longe dali novamente, exceto por um.

Você realmente conseguiu o que queria, Kinney.


N/A: Música de Terminal Guadalupe, De Turim a Acapulco. Reviews são sempre bem-vindas (e necessárias)! Até.