1: Spiral não me pertence, o que é muito triste! çç

2: Esta fic foi inspirada no filme "Enquanto Você Dormia", que eu recomendo para quem ainda não tiver assistido.

Cap. 1

Aconteceu na primeira semana depois das minhas férias, quando voltei a trabalhar. Eu sou um advogado talentoso, é essa pelo menos a percepção dos meus colegas de trabalho... O meu nome é Ayumu Narumi, e até pouco tempo atrás o que eu sabia de uma família era das que eu via pela televisão. Sempre fui muito concentrado no que eu faço, e nada nunca podia me atrapalhar.

A formação de uma família não é algo que conta. No dia eu estava saindo de carro da minha casa, então eu vi um tumulto na rua principal. As pessoas ao redor estavam aflitas, mas não parecia batida. Parei o carro e fui direto pra dentro da multidão, metade por estar curioso e a outra metade por ver que ninguém mais parecia estar prestando ajuda se não ligando pra ambulância.

Assim que consegui passar fiquei estático quando vi a garota que sangrava na calçada, a repórter que eu assisto todo dia. Na mesma hora o socorro chegou, mas não perceberam a bolsa jogada no chão ao longe e não deu outra; peguei a bolsa, abri e procurei por algo que a identificasse. Achei os mais diversos tipos de coisas, mas nenhum dinheiro.

Foi quando escutei falarem sobre o assalto que ela sofreu antes. Nem faço idéia do que me deu, não pensei duas vezes em dizer para os homens que estava com ela e entrei naquela ambulância! Passei o caminho todo observando ela, e também me perguntando por que tinha deixado o carro sem pensar sequer em chamar o reboque ou nos meus afazeres em casa.

Logo que descemos, ela foi atendida por uma enfermeira e o médico de plantão do hospital, que me pediu pra esperar em um dos bancos daquela sala enquanto levavam a garota para uma sala mais próxima. Alguns minutos mais tarde, uma das enfermeiras que estavam me observando chegou perto.

- Você está com aquela moça que entrou agora?

- Ah... – eu ia responder não, mas hesitei – Estou sim.

- Percebi logo, porque parecia preocupado com ela. – ela se sentou do meu lado sorrindo – Você não precisa ficar nervoso. Os médicos aqui são ótimos!

- Que bom. Ela é o tipo de garota com quem eu gostaria de me casar.

- Entendo, ela parece ser gentil. Quer comer algo?

- Não, tudo bem comigo. – devolvi o sorriso – Eu vim ver se ela estava bem, a família deve estar preocupada, e é difícil me imaginar perdendo alguém de quem eu goste, então...

- Oh sim, eu sei... Eu vou ver se já pode entrar alguém.

- Obrigado. – ela levantou e foi na direção do quarto. Um minuto depois e a enfermeira magra voltou.

- Você já pode entrar, mas ela ainda está sedada e não irá ouvir o que você falar. – agradeci com a cabeça e levantei. Ela me guiou ao quarto claro do outro lado do primeiro corredor.

- Não sabia que precisavam de tantos fios só para alguns ferimentos superficiais no braço e na cabeça. – murmurei no momento em que olhei a agulha na veia do braço esquerdo da garota estranha e uma máscara no rosto dela – Acho que você deu muita sorte por se ferir só com isso se o homem tinha um revólver de verdade. – continuei, sentando na cadeira ao lado da cama e deixando a bolsa na mesinha de madeira – Por que eu vim mesmo? Eu nem te conheço, você não me conhece... E pra variar, eu tô falando com uma garota estranha sedada em um hospital numa segunda-feira e matando o trabalho. – ri.

- Um... – por um tempo ela se mexeu, mas não acordou.

- Além de sortuda, você é bonita... – eu tinha que admitir que estar enfurnado naquela sala não era tão ruim – É bom ir embora. – comecei a me levantar, mas foi então que, antes de alcançar a porta, entraram várias pessoas de uma vez que se amontoaram perto dela, nervosas. Nenhum me viu, já que eu estava atrás deles, então resolvi sair devagar, mas fui pego.

- Ei, quem é você? – a voz de uma garotinha me parou.

- Quem Rio? – um cara ruivo falou e me viu. A minha intenção de escapar foi por água abaixo – Ei, quem é esse? – o resto se virou; eu fiquei sem reação. Mas aí veio a enfermeira de antes, sorrindo e com a alta do médico.

- Oh, ele é o noivo dela! – se nem eu sabia o que dizer na hora, como cada um deles deve ter reagido?

- O quê? – mas foi só o que todos pronunciaram.

- Ah, esta é a alta do médico. Quando forem embora é só passar na recepção e assinar a quantia no xeque. – dito isso ela se foi e eu fiquei na pior.

- Hiyono está noiva? – continuou outra mulher – Como essa menina noivou e não me contou?

- Calma Madoka. – pediu um homem ao seu lado – Você pode falar com ela em um momento mais conveniente.

- Olha... – eu interrompi – Eu sei que vocês querem ficar um tempo com ela, então eu... – logo fui arrastado de volta.

- Não, não, espera! Não ligue pra minha cunhada; eu sou o tio da Hiyono, Kanone. – apertamos as mãos e ele seguiu sorrindo – Aquele ali no canto é o meu sobrinho, Eyes, o que está do lado da Hiyono é o Kousuke, meu filho para todos os efeitos – notei que no instante ele pareceu se zangar -, estas são as outras duas filhas do meu irmão Kiyotaka e da esposa dele, Madoka, a Rio e a Ryoko. Qual o seu nome?

- Ah, eu sou o Ayumu, Ayumu Narumi! Muito prazer.

- O prazer é nosso; desculpe essa surpresa, mas nós não fazíamos idéia que a Hiyono estava noiva. – o pai riu.

- Um... – antes que tivesse tempo de responder, Hiyono acordou finalmente – Onde é que eu estou?...

- Ah, querida, está no hospital! – respondeu a tal Madoka – Você fraturou o braço e bateu a cabeça na queda do tiro do assaltante que tentou te roubar durante a entrevista, lembra?

- Sim, eu lembro...! – tocou a cabeça – Quem é ele? – na hora em que ela me apontou, atrás de todos, congelei.

- Não se lembra do seu noivo? – o Kousuke estranhou.

- Noivo? – ela repetiu – Mas que noivo?

- Parece que ela está com amnésia. – diagnosticou Eyes.

- Oh não! E por que ninguém nos avisou?

- Acho que não sabiam mãe, mas vamos levar a Hiyono pra casa depois que falarmos com o médico.

- Boa idéia Ryoko. Vamos Rio! – as três saíram do quarto e sobraram apenas os homens da família para eu me livrar.

- Eu vou deixar vocês conversando um pouco com ela, e eu vou falar ali com a enfermeira sobre a taxa de pagamento.

- An não, você não precisa pagar nada!

- Não, tudo bem. O senhor também não precisa me dever nada. – sai antes que alguém me respondesse e fui direto pra enfermeira que armou a confusão – Preciso falar com você.

- Sim, o que o senhor quer? – disse ao nos afastarmos.

- Por que disse a eles que eu sou o noivo dela?

- O quê? Mas então você não é? – suspirei nervoso.

- Claro que não! Quando eu disse que era?

- Naquela hora em que fomos conversar e você disse que...

- O que eu falei foi numa suposição; não estamos noivos!

- Oh... – foi só o que ela disse antes de alguns segundos.

- O que eu faço? A família dela pensa que estamos juntos.

- Não pode contar a verdade para eles?

- Não tem como! A mãe dela ficou nervosa só de saber que a filha noivou sem contar a ninguém, imagine o que eles fariam se descobrissem a verdade!

- Eu sinto muito, se quiser eu posso explicar!...

- Não, esquece. Eu dou um jeito como puder. Obrigado.

- Certo então. Mais alguma coisa?

- Sim, coloque a conta do quarto dela no meu nome!

- Certo. Até. – assim que me virei suas irmãs e a mãe já tinham voltado e estavam me chamando para entrar.

- Sinto muito por não me lembrar de você. – Hiyono disse quando cheguei perto da cama – Mas vamos ter tempo para relembrar, certo? – ela sorriu. Eu pensei primeiro que deve ter sido pela pressão dos olhares de todos, mas agora percebo que sorri de volta porque eu senti que devia.

- Hiyono, você já recebeu a alta do médico e podemos ir.

- Certo Eyes, eu já vou! Droga, eu não posso descansar um pouquinho que você já vem me enchendo? – o bico que ela fez levou todos nós a rir antes que levantasse.

Eu não podia ficar mais tempo lá, então falei que estava bem atrasado pro trabalho e sai de carro. Lembro que passei o caminho inteiro pensando em como ia desfazer este cruel mal entendido, imaginando as reações de cada um ao contar que a repórter da família não estava comprometida comigo. Tentei esquecer tudo por um tempo curto e me concentrei no meu trabalho na corte.

Consegui novamente a liberdade do meu cliente depois de passar horas acordado só para investigar o mistério dos assassinatos. Não foi surpresa ouvir espanto de todos quando desvendei o caso! Hoje de manhã eu acordei e vi que a casa estava limpa. Não que seja do meu feitio deixá-la desarrumada, mas uma pessoa havia feito o favor de organizar tudo antes de mim.

O despertador não estava mais ligado no horário que planejava acordar e fazer o café, no que só comprovava minha teoria. Levantei, troquei de roupa e desci as escadas em espiral de frente para a entrada sem porta da cozinha, que é à direita do banheiro e ao lado da porta da frente. Senti um cheiro bom de queimado vindo dela e logo tratei de entrar.

Não sei o que me surpreendeu mais: as panelas pretas ou a cozinheira.

- O que você está fazendo aqui? – ela se assustou e deixou cair a colher que segurava na pia, mas antes queimou a mão.

- Você já acordou? Desculpe, eu pretendia te fazer o café.

- Parece que você não teve sucesso. – suspirei, soltando um riso, e peguei um pano molhado para enrolar na mão dela – Hiyono, não tente fazer tudo sozinha se não consegue!

- É isso que você me dizia quando eu me queimava?

- Mais ou menos, mas você se zangava mais! – resolvi mentir mais.

- Mesmo? Que bom, achei que fosse só agora! – virou o rosto, bufando. Suspirei outra vez e a sentei.

- Como foi que você entrou na minha casa?

- Com a chave extra debaixo do tapete, ora! – tomei a chave logo que ela a levantou na mão – Que clichê.

- E você não acha que isso seja invasão de privacidade?

- Não se nós somos noivos, não é? – não pude contestar.

- Senta na cadeira que eu te sirvo waffles. – ela sorriu.

- Ah, eu adoro waffles! Pode ser com mel? – ri e afirmei com a cabeça – A casa é muito vazia. Você devia comprar um gato ou um cachorro.

- Sem animais de estimação, eu não posso cuidar de nenhum! – comecei a procurar talheres limpos.

- Mas por quê? – ela protestou – Os bichinhos são uma alegria em casa!

- Se é assim, por que você não tem nenhum? – lembrei de tê-la ouvido reclamar alguma coisa do tipo antes de sair do hospital.

- É porque eu também não tenho tempo pra cuidar de um, mas...

- Então, caso resolvido! – virei de volta o rosto pro fogão.

- Ei, você é advogado, não juiz! – vi naquele instante que não era o único que sabia de certos assuntos não mencionados.

- Mas você sabe que eu sempre ganho os meus casos.

- Até comigo? – olhei com o canto dos olhos na sua direção. Seu beiço me deu um motivo pra sorrir e eu acabei me aproveitando do fato de que ela acha que está com amnésia.

- Sempre! – ela pareceu ficar surpresa e levantou de uma vez da cadeira.

- Já que é assim eu vou embora, senhor Ayumu! – virou-se.

- E os waffles? – nessa hora eu já estava preparando o primeiro.

Ela estancou no meio do caminho e encolheu os ombros. Sabia que tinha pegado bem no ponto fraco; na verdade, notei que ela come demais desde que aceitou engolir a comida do hospital, mesmo sendo horrível! E garotas que são tão enérgicas assim costumam gastar bastante energia. Hiyono deu meia volta e sentou outra vez, abrindo um guardanapo e colocando sobre as pernas.

- Eu posso esperar terminar os waffles. – segurei uma gargalhada.

- Imaginei que diria isso. – ela, é claro, não gostou nada do que eu disse.

Assim que terminou os waffles, sendo que passou a deglutição toda sem falar uma única vez comigo, limpou os lábios. Senti um enorme impulso de beijá-la naquela hora, e ainda não sei por quê. Hiyono levantou e eu fiquei olhando, como estava fazendo desde que tinha começado a comer.

- Eu vou embora. – abriu a bolsa. Só então ela se tocou – Esqueci a chave!

Lembro ainda de ter rido bem alto e dela reclamar. Agora, depois de tanto tumulto, já está anoitecendo e ela dormiu no sofá. Já fechei todas as cortinas pela claridade, e observando-a dormir percebo que não é tão irritante assim.