Oi gente! Era pra eu ter postado isso sexta, no niver do Naruto, mas DEU TUDO ERRADO. Aniversário de parente pra ir, cliente pra atender, trovões pra me deixar longe do pc. Sábado a luz vai embora e ainda ter um vendaval que derrubou mais de cem mangas (minha casa tem um pomar S2) e algumas ferraram o telhado de casa, deixando uma sujeira linda pra eu limpar ¬¬ (fica a dica: não tenha casa grande). Domingo o nyah ferrou comigo S2 E hoje eu só tive tempo agora ¬¬' Pero aqui está a nova fic!
Yay, ela tem elementos do fandom de Supernatural (a série dos lindos irmãos Winchester) e uma ou outra coisa tirada de Kuroshitsuji ou D gray man. Eu estou bem empolgada com o projeto yay espero que gostem ^^
Queria agradecer MUITO MUITO MUITO MUITO a minha beta Kitsune Lyra que tem se dedicado bastante a esse projeto junto comigo, sofrendo muito porque eu optei por ser Itanaru/naruita em vez de Narusasu como er, sem spoilers hauahuahuahauhauhaa
Sem mais chateação, a fic!


UM

Vestígio


Ves·tí·gi·o

(latim vestigium, -ii, planta do pé, pegada, passo, marca)

substantivo masculino

1. .Rastro; pegada.

2. Aquilo que fica ou sobra do que desapareceu ou passou. = INDÍCIO, RASTRO, TRAÇO

3. Quantidade muito pequena. = TRAÇO


Sasuke


Ele estava correndo por um corredor com a iluminação precária, havia uma taurus na sua mão e o peso da arma não era algo desconhecido para ele, mesmo que uma voz no fundo da sua cabeça dissesse que ele nunca pegou num revolver antes. "É um sonho", sua mente dizia, "tem que ser um sonho", mas ele não se sentia em um sonho. Sasuke parou de correr quando chegou a uma sala.

Você treinou tiro ao alvo. Não tem porque estranhar nada.

Tudo estava silencioso, mas havia outros ali, em algum lugar daquele prédio. Itachi estava ali também, em algum lugar. A coisa também estava ali, com garras prontas para rasgar a sua pele e dentes afiados para devorá-lo vivo. O pensamento lhe fez estremecer. A adrenalina corria em suas veias, enquanto Sasuke observava atentamente o corredor atrás de si: estava vazio. Ele entrou na sala, pisando macio no chão de concreto.

A sala era grande, talvez do tamanho de um auditório, havia móveis encobertos com um lençol já amarelado, muitas folhas secas e poeira, o cheiro úmido e mofado só não era pior porque as grandes janelas estavam sem o vidro. O silêncio era incômodo, Sasuke queria controlar a sua respiração, mas por mais que tentasse não fazer barulho, seu corpo parecia que não respondia a esse comando. Mesmo seus passos não eram silenciosos o bastante e a crescente sombra que invadia a sala lhe pregavam peças.

Foi quando ele viu.

Seu coração passou a bater lentamente, sua respiração quase parando totalmente quando ele percebeu que na parte mais sombria da sala havia um homem sentado sobre uma cadeira, de costas para ele. "É isso" ele pensou, sabendo por instinto que correu para encontrar aquela pessoa. O medo cedeu lugar à adrenalina que veio junto da certeza que ele encontrou o objetivo daquela missão.

Sim, missão. Eu e os outros viemos aqui porque...

Seu coração estava disparado, as mãos suadas seguravam o revolver como se sua vida dependesse disso, mas apesar dele saber que precisava se aproximar mais, suas pernas tremiam. Sasuke respirou lenta e profundamente, tentando não fazer barulho, mas com um movimento suave o estranho ergueu o braço com a mão aberta em sua direção e foi como se uma rajada de vento o forçasse a ir para trás até que suas costas bateram de encontro à parede e a arma voou de sua mão.

Sasuke observou o revolver cair há uns dez passos de onde ele estava, seus olhos arregalados. Uma arma simplesmente não voava assim! Não havia vento, não havia nada que o prendesse a parede, mas ele não conseguia se mover. O desespero começou a invadi-lo em uma corrente intensa de compreensão que aquele era o fim se ele não fizesse alguma coisa, qualquer coisa para mudar aquilo. Sasuke tentava dar um passo a frente, mas havia uma força invisível o mantendo contra a parede.

Por mais que Sasuke tentasse mover seus braços para frente, ele não conseguia fazer nada contra o campo de força que o prendia. O som de passos suaves foi ouvido; o estranho caminhava em sua direção. Sasuke grunhiu com ódio, forçando seu corpo a ir para frente e correr

até a arma

para longe dali, mas era como lutar contra um peso que era maior que do que ele poderia suportar. Com desespero, seus olhos vasculharam a sala em busca de qualquer coisa que pudesse ajudar, a arma caída estava muito longe dele.

-MALDITO ME SOLTA! –ele berrou com ódio. –QUEM É VOCÊ?

-Cala a boca fedelho. –mandou o homem com uma voz gutural profunda, que fez os cabelos da sua nuca se arrepiarem. O desconhecido estava de frente para si e o rosto dele... Sasuke conhecia aquele rosto, mas não era quem achava que era.

Era outra coisa controlando aquela pessoa.

-Você...? –Sasuke balbuciou. –O que...?

-Não me envolva em seus encontros sentimentais pirralho. –zombou o estranho, mas dessa vez a voz mudou. Era a voz dele. Mas o brilho avermelhado daqueles olhos em nada lembravam os olhos que Sasuke tão bem conhecia.

O estranho, que ainda estava com a mão aberta erguida em sua direção, começou a fechar a mão e a pressão em seu corpo quadruplicou a intensidade antes mesmo que ele pudesse gritar em dor. Sasuke ofegou sentindo de repente como se todos os seus órgãos fossem espremidos, quase o colocando em choque pela dor intensa que seu corpo emitiu. Em poucos segundos, ele sentiu uma tontura extraordinária que veio acompanhada pela vontade de vomitar, sua visão oscilando por causa da dor que sentia. Ele sentia que sua camisa estava ficando úmida e o cheiro férreo do seu sangue lhe atingiu com força, aumentando ainda mais a vontade de regurgitar.

Sasuke não conseguia respirar, se mexer doía, sua garganta ardia como se estivesse completamente arranhada. Ele abriu a boca, tentando respirar para conseguir minimizar a agonia que sentia pela falta de ar, mas a compressão era tão forte que Sasuke percebeu que o vômito era mais sangue e ele começou a engasgar.

-N...!

De algum lugar não muito distante, o som de um disparo retumbou na sala. O homem tremeluziu, sangue manchava o lado esquerdo do peito dele. No mesmo momento que o vermelho se tornou azul, a compressão surreal parou e enquanto Sasuke caia sem forças no chão, ele viu Itachi segurando uma arma.

Suado e com o coração acelerado, Sasuke acordou. Ele levou uma das mãos ao rosto, afastando a franja negra da testa, enquanto percebia que dormiu sentado. Uma dor aguda e intensa nas suas costas indicava que ele ficou tempo demais inclinado sobre o processo de capa cor de rosa de cinco volumes que ele usou para dormir. Que ótimo: ele dormiu no escritório.

Ainda bem que era sexta feira e ninguém o incomodava na sala de reuniões, onde ele trabalhava. Sasuke piscou, ajeitando-se melhor na cadeira e colocando os pensamentos em ordem. "Foi um pesadelo" ele pensou, respirando calmamente enquanto limpava os olhos. Não era de seu feitio dormir no trabalho, talvez a rotina de dois estágios e a faculdade estivessem finalmente cobrando o seu preço. Ou talvez fosse só o estresse que aquela época do ano lhe causava porque era a única resposta lógica e coerente para tudo o que estava acontecendo nos últimos tempos. Não havia nada com o que ele deveria se preocupar, especialmente agora que a época das provas tinha acabado.

"Tudo vai voltar ao normal" Sasuke pensou, afastando tudo o mais da sua mente. Com vagar, enquanto bocejava baixinho, Sasuke se levantou e foi em direção ao banheiro. Um dos advogados do escritório tranquilamente se servia de café na pequena copa. Suigetsu estava de costas para ele, o que deu tempo para Sasuke se recompor um pouco mais.

-Oi Sasuke, tudo bom? –perguntou o advogado quando o viu.

Sasuke apenas assentiu com a cabeça, dando a volta na mesa redonda que ficava ao lado da entrada do toalete. Entretanto, antes que ele pudesse chegar ao banheiro, a mão de Suigetsu se fechou no seu ombro esquerdo impedindo-o de prosseguir e Sasuke se virou para encarar o outro.

Os olhos de Suigetsu estavam negros, das pupilas até o branco dos olhos.

Por um momento, com um choque de incompreensão terrível, Sasuke ficou observando aqueles olhos anormais, sentindo que todo o ambiente ficou ainda mais gelado. "Não seja estúpido!" ele pensou com raiva de si mesmo, piscando com força e assim que o fez os olhos de Suigetsu voltaram ao tom lilás habitual. Algo em sua expressão fez com que o advogado desse um riso malicioso irritante e Sasuke fechou a cara.

-Tem certeza de que está bem? –inquiriu Suigetsu com a voz amena, até mesmo divertida. –Você parece que viu um demônio...

-Não seja tolo, isso não existe. –respondeu Sasuke com seriedade, tirando a mão do advogado do seu ombro e virando-se em direção ao banheiro. –Com licença.

Suigetsu murmurou alguma coisa, mas Sasuke não prestou atenção, preferindo fechar a porta do banheiro e se isolar do advogado. Ele lavou o rosto, esfregando os olhos com força para espantar os resquícios do pesadelo.

Coisas estranhas aconteciam naquela época do ano, ele deveria estar acostumado com isso, mas não estava. Devia ser apenas estresse e nada mais. Mas talvez não fosse, entretanto, não havia uma resposta para esses eventos incomuns. Pensar muito nesse assunto o fez lembrar de que não visitava os pais já fazia uns bons quatro meses. Sasuke respirou fundo, concentrando-se no que precisava ser feito e deixou o banheiro.

Aquilo que não tem solução, solucionado está.


O bom de trabalhar à sexta feita pelo período da tarde é que bastava acabar o serviço e todos poderiam ir embora cedo. Sasuke terminou de fazer as alegações finais do processo que usou como travesseiro às quatro horas e isso lhe deu tempo mais do que suficiente para resolver suas pendências.

Ele não sabia se ficava satisfeito ou frustrado que o lugar parecia a mesma coisa de sempre e não muito digno dos seus pais. Apesar de ser bem no centro da cidade, até mesmo sendo possível escutar os carros descendo a ladeira atrás de si, o lugar tinha aquele silêncio sepulcral e o ar de abandono que o fazia parecer o portal para outro mundo. Quase ninguém ia ali, como se precisasse de um motivo para visitar aqueles que ali estavam.

Seja qual fosse o motivo, Sasuke deu de ombros e seguiu o corredor A-4, passando pelo concreto escorregadio pela quantidade de musgo que nasceu ali junto do mato. Ele caminhou até ficar lado a lado com uma enorme mangueira florida, o cheiro adocicado das flores enchia suas narinas e Sasuke bufou, seguindo até a sombra da árvore. Um mato com pequenas e delicadas flores brancas nasceu ao lado da jazida de mármore preto da família Uchiha. Sasuke sorriu com isso: era o tipo de flor que a sua mãe gostava.

Mikoto Uchiha adorava flores silvestres. Não era do tipo de mulher que gostava de rosas ou lírios, mas do tipo que gostava de receber cravinhos-de-cemitério laranjas, trompeta de anjos, não importando se eram das brancas ou das rosadas, jacintos, hortênsias e outras flores sem grandes significados. Por ela, Sasuke aprendeu o nome das flores que todo o resto do mundo esquecia.

-Oi mãe, oi pai. –ele murmurou para o vazio.

A foto sorridente da sua mãe e o retrato carrancudo do pai, ao menos, continuavam imóveis, como era para ser. Com um suspiro pesaroso e se sentindo um péssimo filho por não ter trazido flores aos dois, Sasuke se aproximou ainda mais da jazida, até quase tocar os retratos congelados, protegidos das intempéries por um vidro.

Fazia três anos que ele fazia o mesmo trajeto durante o mês de agosto, mas o tempo não deixava a dor menor. Bastava Sasuke se olhar no espelho ou então tomar alguma decisão que ele se lembrava dos dois. Ele era um adulto e a ordem natural era essa: os pais deveriam deixar os filhos para tentar a sorte no mundo.

O que deixava Sasuke arrasado era a falta de respostas.

A morte era uma consequência natural, todos passariam por isso um dia, mas o caso dos seus pais era além do senso comum. Há dois anos, no mês de agosto, ele voltou para a casa tarde, chegou em casa com tudo escuro e quando ele ligou a luz só viu os corpos dos seus pais na sala, ambos sem vida. Havia vestígios de que algum desconhecido entrou na casa, mas a polícia não conseguiu encontrar nenhum suspeito. Nem mesmo isso!

E nem era isso o pior: a causa da morte era desconhecida. Seus pais não sofreram nenhuma lesão contundente ou cortante, não sofreram com falta de ar, nem mesmo foram torturados. Eles não foram queimados, nem mesmo envenenados ou afogados. Não respiraram fumaça ou qualquer gás tóxico. Os dois estavam com a saúde perfeita, não havia nenhuma doença e nenhum problema cardíaco. Na cena do crime não havia nenhum inseto ou bicho peçonhento, nem qualquer planta venenosa ou substância tóxica. O laudo pericial foi inconclusivo para a causa da morte e todos comentavam que era como se seus pais tivessem morrido de medo, mas ninguém morre de medo.

As pessoas morrem por ataques cardíacos causados pelo medo, algumas morrem por AVC ou ficam tão apavoradas que tiram suas vidas quando o desespero é grande desse jeito. Mas não houve nem isso: seus pais morreram de pavor.

Desde então nada foi como antes.

O que quer que fosse a causa da morte dos seus pais se proliferou. Tatuya, uma garota bonitinha com quem ele fazia dupla no primeiro período da faculdade, morreu da mesma forma quase oito meses depois da morte dos seus pais. Um rapaz da sua turma chamado Kimimaro morreu no final do primeiro semestre com a mesma causa, mesmo sem nunca ter trocado mais do que umas poucas palavras com Sasuke após a simulação de júri que valia a nota de filosofia e Introdução ao Estudo do Direito. As pessoas no campus o chamavam de viúva negra por causa da onda de mortes misteriosas que o cercavam, ninguém nunca tendo coragem de falar com ele ou qualquer outra coisa.

Mas as mortes continuavam mesmo com as pessoas que Sasuke sequer sabia o nome. Um grupo de calouros do primeiro período morreu do mesmo modo no trote que a sua turma fez quando ele estava no segundo semestre. Foi quando as cartas com recortes de revista começaram a aparecer na pequena quitinete onde vivia. Ele chegou ler as primeiras, mas depois simplesmente passou a incinerá-las porque não fazia sentido.

Nem a polícia, nem as câmeras de vigilância chegaram ao autor das cartas. As câmeras sempre apresentavam falhas e a polícia nunca conseguiu chegar ao nome de um suspeito, o que era, no mínimo, algo que Sasuke esperava, visto que o assassino dos seus pais até hoje estava imune.

Como um estudante das leis, a única coisa que ele queria era justiça pelo que aconteceu e, mais do que isso, o seu maior desejo era...

-Eu só queria entender tudo o que aconteceu... –ele murmurou, passando o indicador pelo rosto sorridente da mãe.

-É melhor não entendermos algumas coisas. –uma voz grave soou retumbante atrás dele e Sasuke estremeceu com o susto, se virando para trás.

Encostado na mangueira, carregando um buquê de hortênsias azuis, estava o seu meio irmão mais velho. Itachi mantinha um sorriso ameno no rosto, mas de alguma forma isso não parecia sincero. O irmão deu passos aveludados em direção à jazida, depositando as flores num vasinho.

-O que você 'tá fazendo aqui? –Sasuke perguntou friamente.

Itachi ergueu a sobrancelha, lhe lançando um olhar tranquilo, com aqueles olhos que eram do mesmo tom que os seus, mas aqueles cílios longos eram definitivamente da sua mãe. Em mais aspectos do que um, Itachi era parecido com ele. Ambos tinham o mesmo tom de pele claro, o mesmo cabelo escuro, os mesmos olhos negros e o mesmo formato do rosto.

Era frustrante.

Porque ao mesmo tempo em que uma parte de si ficava feliz em ser irmão de Itachi e ter várias semelhanças com ele, outra parte não queria isso e desprezava o homem que agora se sentava ao seu lado. Uma parte de Sasuke se sentiu irremediavelmente abandonada quando Itachi decidiu viver com o pai biológico quando Sasuke mais precisava dele.

-Ela era a minha mãe, Sasuke. –respondeu Itachi bondosamente. –Eu sempre venho aqui quando posso.

-Meio irônico você dizer isso quando nunca ligou para ela depois que trocou de família! –resmungou Sasuke com uma raiva gelada, gostando de ver o brilho de tristeza que por um momento foi refletido nos olhos do irmão mais velho.

-O que está feito está feito. –foi a resposta do mais velho. –Não muda o fato que eu a amava e que eu sinto tanta falta dela quanto você. Por que isso agora?

O que conseguia ser ainda mais frustrante era o modo como Itachi ainda conseguia ler as suas expressões como se nunca tivesse se afastado um dia sequer da sua vida. E se por um lado Sasuke o odiava imensamente por isso, por outro ele se sentia tremendamente aliviado por não estar sozinho em meio a tanto sofrimento. Itachi mexia com seus sentimentos de uma maneira tão ímpar que, às vezes, Sasuke ficava perdido no meio daquilo.

Naquele momento, ele estava frustrado, mas também estava feliz que o irmão estava vivo. Às vezes Itachi passava meses sem dar uma informação que fosse e, por mais que Sasuke tentasse se convencer de que isso não importava, a verdade era que importava. Ele supunha que era isso o significado de ser uma família: quando alguém que você não quer se importar faz diferença na sua vida.

-Eu estou cansado. –respondeu Sasuke com sinceridade e seu irmão deu um daqueles sorrisos compreensivos que sempre fazia com que suas defesas, construídas após muitos meses de distanciamento, se dissolvessem facilmente. –Como estão as coisas?

Foi à vez de Itachi suspirar cansado, parando de encará-lo em prol de observar o céu. O irmão deixou o cabelo crescer desde que saiu da casa da mãe há oito anos e agora o comprimento estava na altura da cintura de Itachi. Ás vezes, Sasuke se perguntava se Itachi cortaria o cabelo para vender, aquilo daria uma boa grana, sem falar que seu irmão ficaria bem melhor sem aquele cabelo todo. Sasuke realmente não entendia como alguém poderia contratar Itachi com aquele corte de cabelo tão despojado.

Como se percebendo que estava sendo encarado, Itachi se virou para ele, lançando outro sorriso, mas dessa vez era um daqueles risos genuínos que atingiam o olhar. Sasuke se viu ficando frustrado de novo consigo mesmo por não conseguir detestar Itachi, mesmo sabendo que o irmão faria de novo: seria um bom irmão e depois ia sumir no mundo, sem prestar contas, sem avisar, sem qualquer sinal de vida até simplesmente brotar perto da sua casa e os dois começarem o ciclo de novo. Sasuke estava farto disso!

-Bem, que tal se a gente for comer alguma coisa? –convidou Itachi gentilmente. –Vou ficar uns dias por aqui, pensei que desse para a gente fazer alguma coisa junto hoje.

Não, eu não quero. Você pode poupar o seu dinheiro que eu...

-Todas as sextas têm uma pequena feirinha perto daqui, onde tem umas lanchonetes baratas e limpas. –respondeu Sasuke com prontidão, se levantando num pulo. –A comida não é lá essas coisas, mas...

-Seria ótimo. –cortou Itachi com gentileza.

Sasuke suspirou, sabendo que não conseguiria evitar o irmão porque Itachi era a pessoa mais escorregadia que ele conheceu na vida. Só que nem mesmo isso conseguia mudar o fato de que os dois eram irmãos e Sasuke amava Itachi. E ele sabia que Itachi o amava, mas as coisas nunca eram como ele queria e Sasuke odiava quando não estava no controle da situação. Os dois se levantaram, fizeram um minuto de silêncio pelos pais, e depois seguiram caminho.

Itachi o guiou até onde a velha SD preta de cabine dupla estava estacionada e Sasuke indicou o lugar da feirinha. O lugar ainda não estava cheio de gente, mas ficaria quando o sol caísse no horizonte e cedesse lugar à noite. Ainda assim, havia algumas barraquinhas abertas e Sasuke escolheu comer em uma mais afastada dos vendedores de bolas e balões. Ele não gostava de criancinhas, nem queria comer com aqueles humanos em miniatura correndo e gritando e pulando ao seu lado. Os dois fizeram o pedido e em pouco tempo a comida já estava pronta.

-O que aconteceu para você ficar daquele jeito mais cedo? –perguntou Itachi depois de tomar uma boa colherada do caldo que pediu.

O irmão nem tinha terminado de comer o salgado e já namorava um sorvete feito daquelas máquinas antigas, com garrafões de cores coloridas. Típico. Se por um lado Itachi era capaz de ler Sasuke, Sasuke também conseguia ler Itachi, parecia uma troca equivalente ao menos.

-Nada.

Itachi parou de olhar para a máquina de soverte e voltou a encarar o irmão mais novo, dessa vez erguendo a sobrancelha.

-Eu estou bem, ok? Só estou cheio de coisas para fazer. –respondeu Sasuke contrariado. -Dois estágios, cuidar da casa, ir bem na faculdade, a semana de provas só terminou ontem, mas ainda tenho trabalhos para fazer e tudo o mais. Ainda tem essa prática jurídica que sou obrigado a fazer aos sábados, ter que encontrar tempo para ver umas audiências e... É só estresse, ok?

-Sei... –murmurou Itachi não parecendo comprar o que ele disse, mas pelo menos não forçou outra resposta.

Sasuke se serviu de uma boa porção de carne grelhada em tiras com cebola, pensando em qual seria o próximo tópico da conversa, embora ele soubesse que Itachi, em algum ponto, fosse voltar a algum assunto relacionado a ele e não a sua própria vida.

-Além disso, você não respondeu a minha pergunta. –pontuou Sasuke apontando o palito de dente para Itachi. -Como estão as coisas?

O irmão tomou uma colher do caldo tranquilamente, dando mais uma olhada na máquina de sorvetes antes de suspirar pesadamente e lhe responder.

-O mesmo de sempre. –foi a resposta que fez Sasuke revirar os olhos. -Só trabalhando muito, nada novo até aí.

-E o seu irmão? Aquele que você vive tendo atrito? –inquiriu Sasuke, vendo como Itachi sempre estremecia quando ele direcionava a conversa para aquele ponto. -Conseguiram fazer algum progresso?

Agora Itachi esboçou alguma reação, embora fosse a de sempre: decepção e tristeza. Sasuke ficava sempre exultante quando via isso. Itachi era o seu irmão, podia ter todos os defeitos do mundo, mas era seu irmão mais velho. Não importava que seu pai fosse Fugaku Uchiha e o pai de Itachi um cara chamado Minato, Itachi viveu mais tempo com ele e a mãe do que com aquela gente "esquisita", palavras do seu pai.

Acima de tudo, ele gostava quando Itachi era ignorado por essa família, porque aí ele se lembrava qual era o lugar dele, o lugar para onde deveria voltar. Mas Itachi nunca voltava, não completamente. Sasuke deveria se sentir horrível por ter esse tipo de pensamentos, mas a verdade é que não, ele não conseguia se sentir mal por isso.

-Não, tudo na mesma. –respondeu Itachi em tom pesaroso. -As coisas com ele são...

-Complicadas. –finalizou Sasuke com agilidade, tomando um gole de suco. -Eu sei, você sempre diz isso.

Itachi suspirou parecendo ser muito mais velho do que realmente era. O irmão era só três anos mais velho que Sasuke e ele tinha feito vinte anos no mês passado.

-Então significa que você deveria começar a acreditar. –pontuou Itachi em tom conclusivo, voltando a comer o caldo, sem mais encarar o irmão mais novo.

-Eu acredito, só não entendo porque você tem que se importar tanto. –respondeu Sasuke com franqueza. -Se ele não se importa com você, pare de se importar com ele.

Dizendo isso, Sasuke comeu um pouco mais da carne que começava a esfriar. Itachi era vegano e nem chegou perto do seu prato. O engraçado era que Itachi não era assim até ir morar com o pai.

-As coisas não são tão simples assim, irmãozinho. –rebateu Itachi com a voz cansada. -Nem tudo é branco ou preto.

-As coisas são simples assim, só você que não vê. –esclareceu Sasuke, olhando fixamente para o irmão.

-Sasuke, eu realmente não quero falar disso agora. –pediu Itachi com a voz machucada e Sasuke se sentiu um com um pouco de remorso por forçar a barra. -Será que podemos conversar sobre outra coisa?

-Que seja feita a vossa vontade. –respondeu Sasuke com ironia.

Mas ele se arrependeu do que disse quando, mesmo com sua frieza, Itachi lhe deu um sorriso gentil e agradecido. Era sempre assim: Itachi era esquivo, escorregadio, mas ainda assim Sasuke não conseguia deixar de se sentir feliz por ele estar ali.

-Bem vindo de volta, nii-san. –ele murmurou baixinho, sem encarar o irmão.

Dessa vez, quando Itachi sorriu satisfeito e feliz, Sasuke não escondeu o seu sorriso por detrás da mágoa que ficou da última vez que o irmão foi embora.


Os dois ficaram até tarde conversando na pracinha, Itachi comeu pelo menos três sorvetes daquela máquina antiga; Sasuke apostava que na idade de quarenta anos o irmão ia desenvolver diabetes. O avô materno deles tinha a doença e Itachi comia muito doce, talvez para compensar o fato que Sasuke os detestava.

No fim acabou ficando tarde demais e Itachi o convidou a dormir na cabana onde estava hospedado. Sasuke tentou não se sentir ofendido com isso, mas a verdade é que ficou. Itachi sempre poderia pedir abrigo na sua quitinete, mas o irmão nunca ficava lá. Do tempo que Sasuke começou a viver sozinho aos dezessete anos, Itachi só colocou os pés lá uma vez. Porém o que mais deu raiva foi ver que o lugar onde Itachi ficava tinha dois quartos, ambos com duas camas. A cama ao lado da ocupada por seu irmão não era ocupada, mas as do outro quarto estavam desorganizadas e com roupas jogadas a esmo.

-Então finalmente vai me apresentar a eles? -inquiriu Sasuke depois que tomou um banho.

Itachi deu um sorriso misterioso e Sasuke soube ali que não encontraria a família paterna do seu irmão. Também era algo esperado. Itachi propositalmente não misturava as duas famílias, mesmo que Sasuke não tivesse ideia do porque, ainda assim ele se sentia agradecido por isso. Sasuke dormiu na cama desocupada do quarto de Itachi e, ao menos naquela vez, ele ficou livre dos pesadelos de sempre.

Sábado normalmente era um dia para dormir até tarde, mas Sasuke não tinha esse luxo. Aos sábados ele tinha aula no núcleo de prática jurídica de tarde e de noite ainda teria aula prática na universidade. Com a semana sendo tão corrida, ele só poderia fazer a lição da semana passada no dia da entrega do trabalho e por isso ele precisava acordar sempre às oito da manhã. Para sua surpresa, Itachi já estava acordado quando ele levantou e o irmão se prontificou em lhe dar uma carona até a quitinete. Sasuke achou justo chamar Itachi para tomar café da manhã lá e ficou feliz quando o mais velho aceitou.

Itachi dirigia tranquilo pela rodovia, mesmo que estivesse cheia de carretas, os dois em um silêncio confortável. Sasuke decidiu ligar o rádio e a voz grave de Jhonny Cash soou meio estática entoando "you are my sunshine". Na mesma hora Sasuke desligou o rádio.

-Pensei que gostasse de Jhonny Cash. -comentou Itachi, erguendo a sobrancelha.

-Não essa música. -respondeu Sasuke olhando a estrada. -Péssimas memórias.

-Sua ex?

Sasuke não respondeu. Itachi pensava que ele namorou uma garota, Naru, mas na verdade foi um cara. Nawaki Uzumikaze foi o único relacionamento da sua vida, um namoro de um ano que terminou porque seu namorado era um egoísta que nunca entendia os sentimentos de Sasuke. Fazia três anos que ele não via nem sinal do ex e Sasuke preferia assim, mas esse tempo não foi capaz de cicatrizar a ferida.

Itachi entendeu o recado e não fez mais perguntas. Porém as surpresas desagradáveis não acabaram ali: bastou Sasuke abrir a porta da sua quitinete que viu que sua casa foi invadida. Todos os móveis foram revirados, suas roupas, livros, utensílios de cozinha e tudo o mais estava no chão amontoado. O mais estranho é que seu notebook, a sua televisão e os demais eletrônicos não foram levados. Sasuke correu até seu quarto, onde viu que o envelope onde guardava o dinheiro estava intacto.

-Que merda! -ele olhou para a sujeira com raiva, pensando em todo o trabalho que teria de ir fazer boletim de ocorrência.

-Levaram alguma coisa? -perguntou Itachi entrando na quitinete, aparentando estar desconfiado.

-Não! Mas olha essa bagunça! -resmungou Sasuke com raiva. -Eu não posso faltar a aula de prática hoje e nem fiz a inicial que pediram!

-Se quiser, eu ajudo a arrumar. -se ofereceu Itachi. -Nenhum dos outros vão morrer por ficarem um dia sem pão.

Sasuke agradeceu a ajuda e os dois passaram o resto da manhã arrumando o apartamento. Ainda sobrou uma hora para Sasuke fazer a inicial e Itachi tentar fazer o almoço, Sasuke não esperava nada menor do que um desastre natural disso. Apesar de ser algo que ele odiava fazer, Sasuke buscou um modelo na internet e o copiou quase que completamente. Sabia que ia ganhar uma nota baixa, mas melhor nota baixa do que nota nenhuma.

As coisas não melhoraram muito do lado do seu irmão: o ovo frito estava sem sal e o arroz empapado. Normalmente demorava umas seis tentativas até seu irmão acertar o ponto da comida e Sasuke não tinha esse tempo.

-Você realmente precisa ir? -perguntou Itachi quando eles terminaram de comer.

-Esse trabalho vale nota. -respondeu Sasuke objetivamente, colocando a peça impressa na mochila, junto com uma barra de cereal. -Lógico que tenho que ir.

Itachi pareceu ponderar isso por um momento.

-Eu te dou uma carona. -afirmou Itachi. -De noite você 'tá livre? Faz tempo que a gente não passa um tempo juntos.

Mesmo achando essa proposta muito estranha, Sasuke concordou em só assistir ao primeiro tempo da aula noturna e vir embora para cara. Quando ele chegou ao núcleo de prática jurídica, a tarde começou a passar mais lentamente, o suficiente para Sasuke incrementar o seu trabalho até se sentir satisfeito com o resultado.

Depois de fazer um lanche rápido, ele foi à universidade, que ficava bem na divisa entre o distrito onde morava e a capital. Era o tempo suficiente para tirar uma soneca no ônibus e Sasuke assim o fez, acordando apenas quando a parada se aproximou. Ele subiu as escadas do primeiro andar correndo e ainda assim chegou dez minutos atrasado para a aula, mas o professor ainda não tinha chamado seu nome e Sasuke respirou aliviado, jogando a mochila de qualquer jeito na primeira carteira perto da porta.

Somente após o seu número ser chamado, Sasuke percorreu o longo corredor até o banheiro para lavar o rosto e se livrar dos resquícios do sono. Enquanto estava lá, deu uma queda de energia, deixando tudo escuro. Sasuke esperou e a luz voltou rapidamente, mas falhava, como se estivesse com interferência. Ele imaginava se a luz iria embora, ao menos ele não perderia aula à toa. Um trovão fez as janelas tremerem e Sasuke imaginava como iria embora para casa se chovesse e fosse embora à luz. A estrada era perigosa demais e ele não poderia pedir carona a Itachi.

Antes de abrir a porta, ele pensou como a faculdade estava silenciosa naquele momento. Sempre que ia embora a luz, sempre dava para ouvir os outros reclamando, mas Sasuke ignorou esse pensamento. Ele abriu a porta da sala de aula, entrando na sala o mais discretamente que pode e

Olhos negros, todos eles...

todos os rostos se viraram em sua direção em sincronia. Sasuke engoliu um seco, tentando controlar seus batimentos cardíacos porque aquilo não era real, inconscientemente ele segurou firme a maçaneta. A luz fraquejava, diminuindo e voltando, enquanto o vento forte batia contra a janela. Não era real, só outro pesadelo. Por um instante, Sasuke ofegou, fechando os olhos com força, mas quando ele voltou a ver todos ainda estavam com os olhos negros, alguns sorrindo perversamente.

-Agora pegamos você bonitinho! -afirmou o professor com uma voz gutural cínica que Sasuke nunca tinha ouvido o homem usar.

O pavor começou a invadi-lo e em um surto Sasuke agarrou a sua mochila, se virando para sair, mas a porta não abria. Ele girou a maçaneta, empurrando a porta, mas esta não abria, era como se estivesse trancada. O professor deu uma risada alta, cheio de um escárnio cruel e a luz finalmente foi completamente embora. Sasuke xingou e os alunos da sala começaram a rir e a debochar dele, mas não era a risada habitual deles e isso fez com que Sasuke começasse a se sentir verdadeiramente assustado. Aquilo não poderia estar acontecendo, mas ele sabia que era real.

-Droga...!

Sasuke tentou abrir a porta de novo, ouvindo os passos macios do professor e o som das carteiras sendo arrastadas enquanto os outros vinham em sua direção. Um trovão cortou o céu, iluminando a sala em um clarão justamente quando Sasuke olhava para trás e via os rostos sorridentes deformados pela falta de luz vindo em direção a si.

-ABRAM ESSA PORTA! -ele rugia, batendo contra a superfície plana com todas as suas forças, mas a porta sequer se movia. -ABRAM A PORTA!

-Não é assim que as coisas funcionam... -murmurou um homem que sentava a sua frente desde o início da faculdade e que gostava de provar aos outros que era o mais inteligente da turma.

-Nós vamos cuidar direitinho de você... -continuou uma garota do grupo das patricinhas que tentavam seduzir os professores para ter uma boa nota. –O chefe quer você inteirinho...

-Ele só não especificou o seu estado de saúde... –debochou um garoto que era o piadista da turma. –Nós vamos nos divertir Uchiha...

As luzes de emergência começaram a funcionar e Sasuke constatou com crescente pavor que todos estavam muito mais próximos dele do que ele julgava ser tolerável. Eles vinham por todas as direções e não havia para onde correr. Ele se agarrou a mochila como se sua vida dependesse disso, enquanto olhava para aqueles olhos negros repletos de malícia. Era o fim. Ele sabia que era o fim.

Foi quando o alarme de incêndio foi acionado e água começou a cair dos pequenos buracos no teto, todos pararam de vir em sua direção e começaram a se contorcer no chão gritando em dor. Gritos viscerais que ecoavam no fundo da sua mente, vindos daqueles corpos estrebuchando no chão com expressões de agonia intensa. Para Sasuke era só água. Ele não entendia o que estava acontecendo, mas fosse o que fosse, aquilo era letal para os outros.

Ele forçou a maçaneta outra vez e a porta se abriu como se nunca tivesse ficado travada e Sasuke correu em direção as escadas, o corredor inteiro estava molhado. Nas outras salas, havia outras pessoas gritando em agonia, tentando se livrarem da água ao abrirem as portas. Uma garota quase conseguiu arrastá-lo para dentro de uma sala e Sasuke correu pelo meio do corredor, quase caindo no chão por causa do piso liso e molhado. A luz voltou completamente no primeiro andar, deixando Sasuke temporariamente cego, mas sua mão se fechou firme no corrimão da escada e ele logo começou a descer o primeiro lance o mais rápido que podia.

-Não o deixem ir! -alguém berrou e Sasuke ouviu as outras portas se abrindo enquanto ele desaparecia pela escada, tentando não escorregar e cair com o piso molhado.

Quando faltava três degraus para descer, os portões de entrada da faculdade se fecharam em um movimento rápido e sobrenatural, as portas das outras salas de aula se abriram no mesmo momento e vários alunos com olhos negros começaram a vir em sua direção. Quase que imediatamente as luzes no primeiro andar começaram a falhar outra vez e Sasuke sabia que teria pouco tempo até elas irem embora definitivamente. Ele desceu os últimos degraus com agilidade e correu em direção a sala do laboratório, alguns passos a sua esquerda; não havia ninguém naquele horário.

Sasuke abriu a porta rapidamente, ouvindo a madeira bater contra a parede enquanto ele entrava na sala com pressa, ao mesmo tempo em que os outros tentavam entrar na sala para pegá-lo. Usando toda a força que a adrenalina e o instinto de sobrevivência lhe davam, Sasuke tentava trancar a porta forçando-a com o ombro até ouvir um 'clic' e em seguida ele apertou o botãozinho que ficava no centro da maçaneta para trancá-la. Ele deu um passo para trás no mesmo minuto que o vidrinho da portinhola quebrou e braços tentavam agarrar seus cabelos. Horrorizado, Sasuke começou a empurrar as carteiras para fazer uma barreira entre a porta e ele.

O barulho das carteiras sendo arrastadas não se sobrepunham as vozes dos alunos, nem mesmo ao da estática das caixas de som que todas as salas tinham. Uma voz masculina começou a entoar um cântico em latim e os gritos de agonia por todo o prédio aumentaram o volume. Sasuke se afastou da porta e caiu de joelhos no chão, tapando os ouvidos com força, mas ainda assim conseguia ouvir os rugidos de fúria, pragas e bem no fundo rosnados inumanos praguejando alguma coisa em um idioma que ele não conhecia e nem tinha vontade de saber. A pressão em seus ouvidos era tremenda e tanto barulho começava a fazer a sua cabeça doer, ele não entendia o que era aquilo, ele só queria que parasse! Ele se lembrou do irmão perguntando se ele realmente tinha que ir para a faculdade e agora ele desejava ter ouvido as palavras de Itachi.

E então tudo parou.

Tão de repente quanto começou, tudo ficou extremamente silencioso. Até mesmo os trovões pararam de cair. Não havia tempestade a caminho, nem vento. Tudo simplesmente parecia desligado e de alguma forma isso parecia ser ainda pior do que a situação anterior.

Cuidadosamente, Sasuke destapou os ouvidos, respirando de forma entrecortada. Seu coração estava acelerado e Sasuke não sabia o que esperar disso, se era só uma trégua ou se era a sua chance de sair correndo. Mas quais eram as suas opções? Ele não sabia dirigir, a faculdade ficava na divisa de dois municípios e não havia outra pessoa lúcida ali, todos tinham aqueles olhos negros inumanos.

Mas se ele ficasse ali, ele ia morrer.

Sasuke odiava quando a situação não estava ao seu controle e ele odiava mais ainda quando não conseguia tomar uma decisão. Ele não era uma pessoa indecisa, muito menos covarde. O fato era que as chances dele de sair vivo dali eram maiores fora daquele prédio, tudo o que ele precisava era de um plano. Na guarita sempre havia uma bicicleta para o zelador poder se locomover pelos pavilhões da faculdade que, apesar de não poder ser comparada àquelas dos estados mais ricos, ainda assim tinha uma área grande. A sala do laboratório ficava no primeiro andar, na direção da guarita, bastava correr pelo pátio e a primeira ala do estacionamento que ele chegaria lá. O único problema era que o pátio não lhe dava proteção alguma e ele não sabia o que esperar do estacionamento, mas as suas chances ali, trancado naquela sala, não eram boas também. Acima de tudo, ele não poderia trazer Itachi naquela circunstância e ele não acreditava que a polícia iria tomar alguma atitude.

Decidido a tentar esse plano, Sasuke colocou a mochila de peito (não poderia correr o risco de alguém puxá-lo pelas costas) e caminhou em direção à janela. A janela de vidro duplo era revestida com aquela película escura e Sasuke não estava muito certo se haveria ou não gente com aqueles olhos do lado de fora da faculdade, ainda assim ele olhou ao redor e não viu ninguém. Apesar da janela estar trancada, Sasuke sentiu uma rajada de vento frio sobre sua mão e ele olhou para baixo a tempo de ver uma fumaça completamente negra adentrando na sala e se amontoando a sua frente. Uma risada fria e maliciosa soou baixinha, parecia sair diretamente da fumaça e Sasuke imediatamente soube que aquelas coisas que estavam atrás dele não eram nada se comparado àquilo.

O mais rápido que ele pôde, Sasuke deu a volta na sala, empurrando as carteiras para longe da porta com pressa e ouvindo o som metálico de quando elas caiam no chão. Ele ousou olhar para trás e o corpo de um homem era formado conforme a fumaça entrava na sala. Lembrava muito a múmia daquele filme antigo do Brendan Fraiser e Sasuke não dispunha de nenhum gato para afastar aquela coisa. Sasuke estava quase destrancando a porta quando sentiu seu corpo ser puxado para trás com tanta força que não havia como resistir a isso e antes mesmo que ele se desse conta, suas costas bateram com força contra a parede.

Sasuke bateu a cabeça em um estrondo que o deixou tonto alguns segundos, suas costas ardendo pelo baque que levou. Ainda assim ele dava graças por ter deixado a mochila virada para frente.

-Me perdoe pelo mal jeito Sasuke-kun... –sibilou o homem com sua voz baixa e rouca, ainda assim perigosa. -Mas eu não poderia deixar você ir sem que termos nos apresentado devidamente...

O homem começou a dar passos macios em sua direção, Sasuke engoliu um seco, sentindo todos os pêlos do seu corpo se eriçarem ao pressentir o perigo que aquele ser emanava. A pele do homem era tão branca que parecia emitir luz própria e contrastava com o cabelo escuro que caia solto pelos ombros vestidos pelo terno, mas o mais apavorante eram aqueles olhos amarelados, como o de um reptiliano. Sasuke tentou se mover, mas não conseguia se descolar da parede, igual em seus sonhos, mas em seus pesadelos os olhos não eram amarelos, eram vermelhos

cor do sangue

e não era aquele homem. O desconhecido passou a língua nos lábios e Sasuke constatou o quão anormalmente grande ela parecia e se sentiu cheio de repulsa. O homem quebrou a distância entre eles e delicadamente segurou o seu queixo. O outro tinha dedos tão frios que era como ser segurado por um cadáver e o pensamento lhe deu calafrios, mas Sasuke sustentou o olhar do homem.

–Você é uma valiosa peça nesse jogo... –murmurou o homem com uma voz divertida, passando a unha afiada em sua bochecha que começou a arder no mesmo momento com o corte que foi feito. -Parece que hoje é o meu dia de sorte...

O homem então começou a se aproximar do seu rosto, estendendo a língua em direção da sua bochecha machucada e Sasuke fechou os olhos esperando o pior. Antes do toque gelado acontecer, a porta foi aberta com um empurrão e o som de um estampido alto que o deixou atônito. A força que o mantinha contra a parede se desfez no mesmo instante e Sasuke se viu caindo de bunda no chão. Simultaneamente, ele ouviu o mesmo baque de algo sólido batendo contra a parede e um grunhido de dor, enquanto alguma coisa, provavelmente a arma, caia em algum lugar da sala.

-Ora ora, eis aqui um rosto conhecido. –disse o homem sorrindo um pouco mais. –Sozinho dessa vez, Naruto-kun? Seu irmão não vai vir salvar você?

-Você continua insuportável! –grunhiu outro homem, mas Sasuke piscou incrédulo ao reconhecer aquela voz. –Cobra desgraçada!

Sasuke olhou diretamente para o outro homem e mesmo que estivesse escuro ele sabia que não tinha como se enganar. O cabelo claro arrepiado, as roupas de segunda mão, aquela rosto que ao mesmo tempo em que era bonito e também era idiota... Era Nawaki. "O que ele 'tá fazendo aqui?" pensou Sasuke sem entender o que seu ex-namorado, depois de três anos sem qualquer sinal, fazia ali. Não fazia o menor sentido e Sasuke estava achando quase graça na situação.

-Sasuke...? –perguntou Nawaki finalmente reparando que ele estava na sala. -O que...?

-Velhos conhecidos? –inquiriu o homem em um tom divertido, olhando primeiro para Sasuke e depois olhando para Nawaki.

Foi quando seu ex começou a gritar. Não era um grito igual aos outros que ele escutou naquela noite, mas era um grito de pura dor. Sasuke viu o rosto de Nawaki fazer caretas de sofrimento, enquanto a roupa do seu ex aparentava ficar úmida e em pouco tempo ele sentiu o cheiro férreo e enjoativo de sangue. Nawaki soltou um gemido sofrido e em seguida começou a respirar de forma ofegante, lançando um olhar de puro ódio ao homem dos olhos amarelos.

-Dessa vez eu vou terminar com você, Naruto-kun. –continuou o homem como se falasse sobre o tempo. -É uma pena que eu não vou ver a cara do seu irmão mais velho quando ele ver seu corpo. Como vê, tenho negócios com o Sasuke-kun...

Nawaki deu uma risada forçada, que terminou com ele gemendo baixinho em dor. O homem ficou sério, mas Nawaki nunca teve uma noção de perigo e Sasuke sabia muito bem o quanto o seu ex era idiota nesse sentido. Os dois poderiam não estar nos melhores termos, mas, merda, era seu ex! Ele amou aquele homem e Sasuke não o queria morto! Ele começou a olhar para os lados em busca de alguma coisa que pudesse ajudar e viu alguns passos da mesa do professor uma arma. Era a sua melhor chance.

-Sua tara por Uchihas não tem fim, hein? Mas advinha: eles acham olhos amarelos fora de moda. –retrucou Nawaki com a voz rouca pela dor, ainda assim lá estava aquele sorriso zombeteiro que durante muito tempo irritou Sasuke. -Urg...!

O homem deu mais alguns passos em direção a Nawaki, fazendo seja lá o que fosse, enquanto seu ex tentava não gritar em dor. Sasuke ouvia as gotas do sangue de Nawaki caírem no chão e isso lhe deu coragem para correr até a arma e, sem nem pensar no que estava fazendo, ele atirou em direção ao desconhecido. A arma disparou com um estampido alto, Sasuke quase caiu para trás com o impulso que o revolver deu para trás, o cheiro de fuligem invadiu suas narinas com força. Sasuke tinha fechado os olhos com força por instinto, mas ouviu quando o peso de Nawaki foi liberado e ele caiu no chão com um último grunhido de dor.

-Nawaki! –Sasuke chamou, abrindo os olhos e ficando cego com a quantidade de luz na sala. Ele piscou outra vez vendo que o desconhecido tinha ido embora, mas seu ex nem se mexeu no chão.

Sasuke começou a se rastejar no chão, engatinhando para o rumo do ex-namorado quando ele ouviu o barulho cortante do portão sendo aberto com força. "Estão vindo!" Sasuke pensou com desespero, ficando em pé, alguns passos distantes de Nawaki. Dentro da sua mochila, o seu celular começou a tocar e Sasuke se amaldiçoou por não ter deixado o toque no silencioso. Mais rápido do que ele queria, a porta foi aberta de novo e Sasuke atirou sem nem pensar, dessa vez um pouco mais preparado para o solavanco da arma que da primeira vez.

-Sasuke? –chamou Itachi parecendo totalmente atônito. –Você 'tá bem?

Com alívio, Sasuke abriu os olhos e percebeu que Itachi estava mesmo ali. Com uma arma em mãos. Naquele momento, Sasuke nunca se sentiu mais aliviado na sua vida, suas pernas até mesmo tremiam com o alívio. Itachi olhava diretamente para ele, parecendo chocado em encontrá-lo ali. Atrás de si, Nawaki grunhiu.

-Arg, era só o que faltava! –murmurou Nawaki com raiva, virando o rosto para longe da entrada. –A mamãe ganso...

-Oi, imbecil, você não pode se mexer! –resmungou Sasuke quando viu que o ex namorado estava tentando se levantar. Agora com a luz ligada, Sasuke percebia que a camisa do outro estava empapada de sangue. –Temos que chamar o médico! Itachi!

Mas seu irmão parecia congelado na porta. O mais velho tinha abaixado a arma e olhava de Sasuke para Nawaki como se estivesse em um pesadelo particular, o que não era nada condizente com a personalidade esquiva de Itachi.

-Ah não enche Suke! –ralhou Nawaki ficando de pé, não aceitando a sua ajuda. Sasuke não deixou de notar o velho apelido que o outro usava para chamá-lo. –Não preciso de médico, só de uma porra de vodka.

Sasuke não conseguiu controlar a risada depois dessa.

-Você nem bebe, Nawaki! –afirmou Sasuke com divertimento. –Nem a porra de uma cerveja!

-Eu só bebo pra fins terapêuticos! –resmungou Nawaki em tom resoluto. –E eu disse que meu nome é Naruto!

Mas isso foi irrelevante quando Itachi falou de novo.

-Você vai ter toda a Vodka do mundo quando chegarmos em casa, mas agora nós temos que sair daqui. –inquiriu Itachi de maneira objetiva. -Como estão os ferimentos Naruto?

-Soldado Uzumaki a frente e operante, nii-san. –rebateu Nawaki com ironia e Sasuke olhou de Nawaki para Itachi, notando como os olhos do irmão se estreitaram em tristeza pela frieza do seu ex. –O Menma 'tá vindo com a caminhonete?

Enquanto Sasuke pensava, um carro estacionou no pátio, o motorista ouvia ACDC tão alto que os vidros da sala estremeciam com o barulho. E subitamente Sasuke fez o link que faltava. "Ah não..." pensou Sasuke começando a encaixar as pontas soltas. O pronome de tratamento, o jeito como Itachi empalideceu quando viu Nawaki machucado... "Não pode ser...".

-Vamos, não é muito seguro aqui. –disse Itachi em tom definitivo.

Sem acreditar que durante um ano inteiro ele namorou o irmão mais novo de Itachi, Sasuke seguiu o irmão mais velho sentindo que não havia uma música mais perfeita para aquele momento: I am in a highway to hell.


YAY espero que tenham gostado e tenham ficado tão empolgados com esse plot quanto eu ^^ Ah dica: NÃO VOU entrar em nenhum mérito religioso na fic e, se puder, até mesmo evitarei o 'incesto é pecado aos olhos de Deus' porque não quero trabalhar nisso. Se for pra entrar nesse mérito, vou usar o que me passaram na faculdade, ok?
Eeeeeeenfim! Me digam o que acharam da fic! Eu estou super empolgada e quero saber se vocês gostaram!
Ah! Não prometo nada (essa semana tenho plantões no escritório corporativo e iniciais a redigir, além de alguns processos de onze volumes me aguardando... arg), mas há uma boa chance de eu att isso segunda feira. Pelo menos é o que eu pretendo né? ^^" Não sei se vai dar certo, mas vou me esforçar lol
Hasta luego povão!