Agradeço ao meu querido carneirinho Orphelin pela revisão e pelo apoio! Espero que todos gostem desta side, e já fica o aviso: Se não entendeu e quer entender esta fic, é recomendável ler "A Coleira Vermelha do Destino", "Insólito Amor", "Lar, Doce Grego Lar", e "Encanto Grego". Grande abraço a todos, muito obrigada!
Prólogo
Londres não era tão fria quanto a cidade natal de Sage, mas, ainda assim, ele sentia como se fosse morrer congelado pela sensação de completo abandono que experimentava naquele lugar. Mesmo depois de dois meses, continuava sentindo-se miserável, apesar da alta soma de valores que recebia por seu trabalho. Só que nada era o mesmo sem o calor de sua louca família por perto. Tudo bem que tinha conseguido uma oportunidade irrecusável, daquelas que aparecem uma vez na vida e que se tornam sonhos obsoletos se não forem agarradas no momento certo, mas a solidão, para ele, era um duro preço a ser pago por sonhar alto e não ter os negócios da família como única ambição de vida.
Sage, desde sempre, queria mais; queria conhecer o mundo; queria uma profissão que lhe agradasse e para a qual realmente tivesse talento; queria ser dono e administrador do próprio negócio; queria fazer proveito de tantos idiomas que havia aprendido ao longos dos anos preso à sua vila; e, especialmente, queria que a sua família lhe compreendesse. Para Sage, o entendimento de que ele só queria ser reconhecido pelos seus próprios talentos, por sua família, era o que o incentivaria no caminho que tanto sonhava em seguir. Dessa forma, vieram os primeiros obstáculos.
Por exemplo, quando conseguiu uma bolsa de estudos para cursar Administração na Inglaterra, todos foram contra. Sage, na época, até conseguiu despistar o irmão gêmeo e chefe da família, Hakurei, garantindo a este que aquilo poderia ajudá-los na gerência da joalheria fundada pelos seus antepassados. Logo, acabou mudando-se para Londres, mas com a promessa de que visitaria os parentes e a noiva todas as férias. E tudo correu bem, tanto que ele aproveitou algumas folgas para levar a futura esposa consigo para a Inglaterra, país para o qual desejava se mudar com ela. Sage sonhava em formar sua própria família com ela, em terem filhos que o entenderiam e viveriam sem a pressão conservadorista à qual ele próprio estava sujeito no Tibete.
Lekyi, sua noiva, estava animada em conhecer aquele país, aliás, em conhecer toda a Europa. E, de cara, percebeu que tudo naquele lugar era bem diferente do Tibete, como: clima, economia, cultura, etc. Nada lhe era familiar, mas, ao mesmo tempo, tudo lhe era interessante. Teve, naqueles momentos, a sincera vontade de desbravar todo o continente europeu e de ajudar o futuro marido a alcançar seus sonhos, prometendo a este que o apoiaria quando chegasse a hora de enfrentar a família Kahdro. Nesse ponto, as dificuldades se levantaram, outra vez, entre Sage e seus objetivos.
Quando Sage retornou para o Tibete, disposto a celebrar o casamento com Lekyi e levá-la de volta para Londres em sua companhia, a noiva se recusou a segui-lo. Ela estava diferente, de alguma forma, e por algum motivo que ele não soube distinguir. Chegou a explicar para ela, pacientemente, que ele também tinha seus receios e medos, mas que juntos eles conseguiriam superar aqueles obstáculos. Como ela continuou relutante com a ideia, ele fez questão de ressaltar a promessa por ela mesma feita, de que se mudaria e o ajudaria. Sage disse que ela estava faltando com a palavra. Lekyi, em contrapartida, acusou o outro de estar sendo egoísta. E, assim, os dois acabaram sentindo-se ofendidos, um com o outro.
Mas o golpe de misericórdia veio quando Sage garantiu que partiria de volta para Londres independentemente da decisão dela. Confusa e ofendida, Lekyi achou melhor não contar a Sage que esperava um filho dele, mesmo porque não acreditava que ele teria coragem de cumprir com o que havia dito. Esperaria um momento mais calmo para contar a novidade, que não chegaria, pois, chateado, Sage chorou copiosamente, por sentir-se completamente só e incompreendido, e retornou até a casa de Lekyi para devolver-lhe a aliança de noivado que ele próprio usava. Não demorou e ele partiu para a Europa, depois de ter comunicado aos parentes a sua decisão. Hakurei, a princípio, não acreditou. Para o mais velho, aquilo era uma peça que o gêmeo queria lhe pregar. Já Shion acreditou, mas somente porque Sage lhe deixou uma carta com número de telefone para contato, pedindo ao mais novo que não repassasse o número a Hakurei e que lhe telefonasse caso alguma coisa anormal acontecesse durante a sua ausência.
Shion não percebeu quando, meses depois e em um acesso de raiva, Lekyi encontrou e queimou a carta com o número do telefone de Sage. A mulher se arrependeu e se desarrependeu várias vezes por aquela atitude, uma vez que estava emocionalmente instável devido à gravidez. Shion culpou-se pela perda da importante carta, pois havia decidido enfrentar a família e contar a Sage que este seria pai, de forma a acabar, de uma vez por todas, com aquela farsa sem sentido – mas na qual ele mesmo havia se colocado por livre e espontânea vontade. Para ele parecia claro o quanto Lekyi amava Sage, que a recíproca era verdadeira, e que eles conseguiriam se entender caso conversassem novamente. E, a essa altura, mais uma vez o destino mostrava o quão cruel pode ser.
Sage retornou ao Tibete apenas três meses depois de ter ido embora para Londres. Chegou disposto a convencer Lekyi a acompanhá-lo, ou, até mesmo, a retornar para o vilarejo e desistir de seus sonhos. Tudo para enfim se casar com ela. Foi recebido com olhares de esguelha, murmúrios dos vizinhos, sorrisos carregados de sarcasmo, mas se manteve forte e de queixo erguido, pelo menos até descobrir que seu irmão mais novo havia se casado com a mulher que ele amava e que eles estavam à espera de um filho. Sage não acreditou, mesmo vendo com os próprios olhos os dois vivendo juntos debaixo do mesmo teto. Angustiado como estava, perguntou à mulher se aquele filho não era dele e se ela não havia se casado com Shion apenas para não ser mãe solteira.
Shion quis gritar ao irmão que era aquilo mesmo o que havia acontecido, mas não teve coragem. Pensou, de repente, que a mulher poderia desaparecer junto com a criança que carregava no ventre, e que, por descumprir sua promessa, jamais teriam notícias daquele bebê. Lembrou-se que tanto ele quanto Hakurei prometerem, a ela, esconder a verdade de Sage. "Perdão, Sage!" foi tudo o que Shion conseguiu dizer, e com uma sinceridade que não passou despercebida aos olhos do mais velho; chorava de remorso ao ver as lágrimas que escorriam pelo rosto de Sage, que acreditava ter sido duplamente traído. "Eu não te perdôo, Shion...", e foi a resposta que o irmão mais novo ouviu antes de perder o mais velho de vista.
Hakurei também sentiu remorso ao encontrar o seu gêmeo aos prantos, e chorou de remorso e tristeza ao escutá-lo dizer "Se eu o tivesse escutado e não tivesse partido, nada disso teria acontecido. Perdoe-me, mas só me resta reconstruir a minha vida longe de vocês." O irmão mais velho concordou, abraçando o outro fortemente, e souberam – instintivamente – que não se veriam durante alguns anos. Às vezes, conseguiam comunicar-se mesmo sem palavras, quase que por telepatia. E assim, finalmente, quis o destino que acontecesse, parecendo disposto a manter aquelas pessoas em contínuo sofrimento.
Os anos se passaram e Sage nunca estranhou o fato de jamais receber fotos da criança de Shion e Lekyi, embora, Hakurei enviasse, com certa frequência, inúmeras fotos dos gêmeos Tokusei e Yuzuriha, e, posteriormente, de Atla também. Ele imaginava que Hakurei temia chateá-lo, imaginando que fosse relembrar a "traição" sofrida ao deparar-se com alguma foto do "sobrinho". Sage não sabia, realmente, era que Shion tinha passado meses em profunda depressão, quase sem se alimentar, reanimando-se somente após o nascimento do pequeno Mu, que ele logo segurou no colo pela primeira vez. E, desde então, Shion e a criança tornaram-se inseparáveis, tanto que Lekyi teve vontade de fugir com o filho. Porém, a mulher não teve coragem de separá-los, até porque sabia que o marido de fachada não resistiria a mais uma tristeza como aquela.
Com o tempo, Lekyi arrependeu-se amargamente por ter escondido a verdade de Sage, mas já era tarde demais para voltar atrás, era o que ela pensava. Sentia-se culpada por Shion e Sage não conversarem mais; por ter separado Shion de Dohko, o que descobriu após algum tempo; pela tristeza constante de Hakurei em não ver mais o seu gêmeo; por ter feito Mu acreditar que Shion era seu verdadeiro pai; e, finalmente, por Shion ter se apegado tanto à criança que ela tinha certeza de que nem mesmo Sage a tomaria do irmão, mesmo que tivesse a oportunidade.
Lekyi foi embora do vilarejo, confidenciando apenas à irmã, Dakini, qual seria o seu paradeiro. Deixou uma imensa carta para Shion, contando a ele sobre seu arrependimento e lhe pedindo para que cuidasse de Mu junto a Dohko. Pediu desculpas tardias a todos, inclusive a Sage, deixando Shion incumbido da tarefa de contar ao irmão, o mais rápido possível, toda a verdade, para que eles desfizessem toda aquela confusão e mágoa.
E foi Hakurei quem conseguiu armar um encontro entre Shion e Sage, este último a quem com muito custo e com muitas chantagens o chefe da família conseguiu convencer a visitá-lo. Sage cedeu às pressões, dando a desculpa de que iria para conhecer Atla – o que não era uma total mentira –, mas quando chegou à casa de Hakurei, deparou-se com Shion, que segurava Mu nos braços. Não foi preciso que o irmão mais novo dissesse alguma coisa a Sage, pois o homem caiu ajoelhado no chão ao ver aquele garotinho de cinco anos. Estava ali a certeza de que aquele menino era seu filho, e não de Shion, visto que eram quase idênticos.
Só então uma aparente paz envolveu a família Kahdro nas semanas que se passaram, tanto que Sage já pensava em se mudar novamente para o Tibete, ficando mais próximo do filho. Aparente e passageira paz, porque, em pouco tempo, já existiam rumores a respeito da relação entre Dohko e Shion, o que deixou Sage alarmado para com a desconfiança de Hakurei sobre o irmão mais novo. Sage temia a reação do mais velho caso este descobrisse serem aqueles rumores verdadeiros, então, conversou a sós com Shion, dizendo ao irmão que o apoiaria caso ele realmente estivesse com Dohko. Todavia, que eles não encontrariam mais sossego naquele vilarejo enquanto estivessem em um relacionamento homossexual. Agiu silenciosamente, contando com a discrição dos outros dois e a falta de conhecimento de Hakurei acerca daquele assunto. Tudo estaria previamente resolvido antes mesmo de o mais velho se atentar para aquela novidade, era com isso que Sage contava, mal sabendo, ele mesmo, que as coisas não seriam tão simples assim.
Primeiro, Sage achou estranho encontrar Mu na casa de Hakurei. Depois, perguntou a Dakini onde estava seu irmão. Foi quando teve uma forte intuição de que algo terrível estava para acontecer e fez todo o caminho de volta para a casa de Shion, encontrando o irmão mais novo em prantos enquanto o mais velho esmurrava Dohko sem que este oferecesse qualquer resistência. Gritou com o mais velho, mas de nada adiantou. Desesperado, deu uma chave de braço no pescoço do irmão gêmeo, puxando-o à força para longe de Dohko, e recebeu uma cotovelada e um forte soco na cabeça como resposta. A confusão estava armada. Sage empurrou Hakurei no chão e o esmurrou, numa tentativa insana de que o outro voltasse a si, mas de nada adiantou.
Ambos rolavam pelo chão enquanto um tentava se levantar e o outro o impedia com o peso do próprio corpo. Sage já estava tonto, em razão dos golpes que recebia na cabeça, quando Hakurei conseguiu se levantar, voltando-se ameaçadoramente na direção do Dohko e Shion. Sage teve de se reestabelecer para ir atrás do irmão, sacudindo-o e pedindo que parasse e prestasse atenção para o que estava fazendo. Foi ignorado novamente. O mais velho, tão machucado quanto o próprio Sage, gritava impropérios para Shion, dizendo que tiraria Mu dele, porque ele não uma pessoa decente para cuidar de um garoto.
Shion se humilhou, atirando-se aos pés de Hakurei, e implorou que não lhe tomassem a criança. Sage, nessa hora, desferiu um soco tão forte no rosto do gêmeo que este se desequilibrou, caindo no chão mais uma vez. Porém, o mais velho simplesmente levantou-se, avisando que não devolveria Mu, e deixou a todos para trás.
Sage tentou acalmar Shion, dizendo que não permitiria que ninguém tirasse Mu dele e pedindo ao casal que eles pegassem seus pertences e fugissem para o vilarejo vizinho. Nesse ínterim, Sage prometeu a Shion que tomaria Mu de Hakurei e lhe devolveria o garoto, convencendo-os de que era a melhor solução temporária para o problema. Mas quando chegou à casa de Hakurei, Dakini estava tão assustada que pediu a Sage para ir embora com as crianças até que o marido recobrasse a consciência. A mulher, transtornada depois de tomar conhecimento dos últimos acontecimentos, chamou Hakurei de covarde e seguiu a mesma direção que o cunhado e os filhos, deixando, para trás, o chefe da família em estado de choque.
Durante a viagem, porque Sage decidiu levar a todos para o vilarejo vizinho, onde Shion e Dohko estavam, o homem levava Mu e Atla no colo, deixando Yuzuriha e Tokusei aos cuidados da mãe, que carregava a menina no colo e o garoto ao seu lado, sentado no assoalho da pequena carroça. Prosseguiam a viagem em silêncio, os mais velhos ainda pensando em toda aquela confusão. E tudo aconteceu em questão de segundos, quando a carroça começou a tombar desfiladeiro abaixo, sem que ninguém tivesse tempo para pensar no que fazer. Dakini apenas abraçou os filhos gêmeos com força, tal qual o próprio Sage, que passou os braços em volta do filho e sobrinho mais novo. No final, Sage só percebeu que havia perdido a consciência porque, ao abrir os olhos, deparou-se com Mu e Atla chorando enquanto estavam fortemente presos em seus braços. Ambos nada sofreram, diferentemente de Sage, que tinha os braços e as pernas cheias de contusões e feridas... de sangue. Levantou-se como pôde, tentando acalmar os garotos, e saiu à procura dos outros.
Encontrou o carroceiro, já morto, com a cabeça deformada acima de uma pedra. Não tardou a ser tomado pelo desespero e a começar a chorar, não encontrando sinal nenhum de Dakini e os gêmeos. Correu até a margem do rio, gritando desesperadamente pelos outros. Ouviu a voz da sobrinha a chamá-lo e correu até onde ela estava, deparando-se com Yuzuriha apoiada sobre o corpo da mãe para não se afogar. Deixou os garotos na grama e pediu a Mu para que não saíssem de lá, atirando-se no rio e nadando até alcançar Yuzuriha e Dakini, carregando-as para a margem; Yuzuriha foi agarrada em suas costas e Dakini foi puxada pela roupa. Sage já havia constatado a morte da cunhada.
Perguntou à sobrinha onde estava Tokusei e ela lhe respondeu, em prantos, que tentava acordar o irmão aos gritos enquanto ele boiava desacordado, longe do alcance dela. Sage voltou ao rio, nadando contra a correnteza e quase caindo na queda d'água. Buscava pelo sobrinho desaparecido, gritando o nome dele incansavelmente. Perdeu a noção do tempo na tentativa de encontrá-lo, descendo pela mata, até abaixo da queda d'água, e subindo totalmente derrotado ao não encontrar nenhum sinal dele.
Sage ficou terrificado ao olhar atentamente para o corpo sem vida de Dakini, pensando na semelhança dela com Lekyi e no quão difícil seria mostrar, para o irmão, o corpo da esposa. Todos choraram até o cansaço vencê-los. Foram precisas algumas horas até que conseguissem socorro também. Ainda com o rosto inchado pelos golpes de Hakurei, Sage correu até o irmão, ao vê-lo se aproximando desesperado, e o abraçou aos prantos, pedindo perdão por não ter conseguido salvar Dakini e Tokusei. Hakurei estava atônito, como se não conseguisse acreditar no que tinha acontecido, e acampou junto a Sage e outros moradores do vilarejo na beira do rio, realizando buscas por Tokusei durante duas semanas, tanto no rio quanto na mata. Mas nunca encontraram o corpo do garoto para cremá-lo.
Shion voltou temporariamente ao seu vilarejo natal, deixando Dohko no vilarejo vizinho, para evitar confusões naquele momento de imensa tristeza. Passados alguns meses desde o incidente, Sage partiu para Londres levando Shion, Dohko e Mu com ele. Moraram todos sob o mesmo teto durante dois anos, até que Shion e Dohko se adaptaram e estabilizaram financeiramente. Sage sentiu um vazio enorme quando o irmão, o cunhado e o "filho/sobrinho" se mudaram de seu apartamento. Era quase como sentir o mesmo abandono experimentado logo quando chegou à Inglaterra para estudar. Então, pensou que já era hora de encontrar alguma companheira para si, de formar uma nova família, mas não obteve muito sucesso em sua busca. Estava sendo difícil encontrar alguém interessante e, sobretudo, confiável.
Mas, por outro lado, a nova empresa fundada por Sage prosperou além do esperado, transformando-o em um dos mais bem-sucedidos empresários do setor de logística em Londres. Enquanto isso, Mu desconhecia a verdade sobre sua própria origem, admirando Sage como o "tio" presente que era, sempre compreensivo e divertido. Sage tomou, ainda, o lugar outrora ocupado pelo irmão mais velho, Hakurei, dedicando-se a cuidar constantemente de Shion para compensar os anos em que deixaram de se falar. E, nesse ritmo, eles aproveitaram maravilhosos dias, isto é, sem o conhecimento de que se aproximava, lenta e perigosamente, mais uma impetuosa tempestade sobre a família Kahdro. Nenhum deles cogitava o peso de que aquela verdade oculta teria sobre seus ombros em um futuro não muito distante.
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Fim deste capítulo!
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Até mais, grande abraço!
Nathalie Chan
