Os cabelos ruivos de Ron Weasley cintilavam aos primeiros raios de sol daquele domingo.

Contudo, como o domingo poderia ser tão bonito e ensolarado após as recentes perdas da guerra?

Era como a aurora de um novo tempo. Um tempo sem Lord Voldemort. Mas também sem Fred Weasley e tantos outros que se foram nas batalhas...

Ron não despertou, porque simplesmente não dormira. Não conseguia dormir há dias.

Observava a janela, pensativo, até que uma voz o retirou dos devaneios:

- Hora do café, querido – sua mãe carinhosamente o chamou.

A Sra Weasley não parecia nem a sombra do que era antes da guerra: cabelo um tanto bagunçado, olheiras profundas, muito mais magra... Marcas de dor. Nenhuma mãe deveria enterrar um filho.

- Já vou, mãe.

Passados apenas dez dias da Batalha de Hogwarts, muitos bruxos comemoravam pelas ruas, mas, na Toca, ainda se via o luto nos rostos, nos gestos, no silêncio.

Ron, ainda de pijamas, desceu as escadas para tomar o café da manhã, mas se deu conta de que foi um erro assim que chegou na cozinha: esqueceu que Hermione permanecera com eles desde o fim da guerra.

O rosto do rapaz enrubesceu e ele ameaçou correr de volta para o quarto para colocar uma roupa decente – ou talvez não aparecer até o Natal – mas a garota simplesmente disse:

- Não se incomode comigo, você está em casa. Não é como se eu fosse uma completa estranha, é? Quer dizer, estudamos 6 anos na mesma escola e pertencemos a mesma casa... – ela afirmou, com um sorriso.

- Ok, ok. – Ron interrompeu a garota – Bom dia, Hermione – ele disse, sério. O ruivo tinha grande dificuldade de sorrir ao amanhecer, pois costumava passar as noites num choro silencioso e a ela compreendia.

- Bom dia, Ronald.

Ela deu um beijo carinhoso na bochecha do rapaz quando ele se sentou ao seu lado; ele, entretanto, não soube muito bem o que fazer, principalmente pelo fato de sua mãe estar no mesmo cômodo.

As coisas com Hermione andavam muito bem, mas ele não sabia como avançar as etapas do namoro, pois ela era muito diferente de Lavender Brown. O próximo passo era sempre um mistério e ele nem ao menos teve coragem de contar à família. Bom, não foi tão necessário já que Harry contou à Ginny que tratou de espalhar aos quatro ventos.

Por fim, decidiu que segurar uma das mãos de Hermione seria suficiente e o semblante dela pareceu confirmar isso. Ela usava seu polegar para afagar a mão dele.

- Ron, não precisa ficar assim desconfortável toda vez que nos encontramos, sabia? – a garota sussurrou – Ainda sou eu... A Hermione. Seu pesadelo particular.

- Pesadelo, Mione? – as feições do rapaz pareceram mais tristes - Eu era um idiota e realmente me odeio por essa ser a sua primeira lembrança de mim...

- Mas essa não é a minha primeira lembrança de você! – ela o interrompeu, dando uma leve risada. – Pra falar a verdade, eu me lembro bem de um garotinho de nariz sujo que tentava mudar a cor de um animal asqueroso. – ela concluiu e tomou um gole de suco de abóbora.

- Bem, e eu me lembro de uma menina com cara de metida que estava procurando um sapo e acabou interrompendo a minha demonstração fabulosa... – o ruivo falou, gesticulando como se estivesse indignado, mas, ao final, sorriu.

- Metida? Eu? Francamente, Ronald... – ela fingiu protestar, mas acabou rindo. – O fato é que, se você não tivesse me chamado de pesadelo, eu não teria ido chorar no banheiro feminino e nós hoje dificilmente seríamos... Bem, nós. E, provavelmente, eu não seria amiga do Harry. Vocês seriam apenas meus colegas de casa.

- É, mas não por muito tempo, porque a gente não conseguiria sobreviver nem ao primeiro ano sem você, não é mesmo? Eu teria sido enforcado pelo visgo do diabo e o Harry...

- O Harry teria perdido a partida de xadrez! – lembrou a garota – Você subestima as suas habilidades, Ron.

Ele silenciou e resolveu terminar de se alimentar... Não concordava com a garota, mas ultimamente evitava discutir, não tinha disposição nem para isso.

Ao final da refeição, Hermione o esperou trocar de roupa para chamá-lo para conversar no quintal da Toca:

- Tenho uma boa e uma má notícia para te dar.

- Tudo bem, pode dizer.

- Bom, eu recebi uma coruja do Viktor e ele disse que já encontraram meus pais na Austrália.

Hermione informara sua situação ao Ministério da Magia australiano e eles foram bem solícitos se oferecendo para procurar seus pais, enquanto ela poderia ajudar os Weasleys nesses primeiros dias pós-guerra.

Contudo, a falta de notícia já fez a garota considerar largar tudo e ir logo atrás deles, apesar de saber que talvez não fizesse grande diferença num país de grandes dimensões como aquele e que ela absolutamente desconhecia.

- E o que Viktor Krum tem a ver com a busca dos seus pais? – questionou o ruivo com uma ponta de irritação.

- Ele me escreveu há alguns dias e eu contei sobre a minha preocupação com meus pais. Agora me mandou essa coruja informando que ajudou nas buscas e que eles foram encontrados. Mas essa não é a má notícia. Imagino que você já esteja prevendo...

- Eu vou com você – ele afirmou imediatamente.

- Não, você precisa ficar com a sua família...

- Não quero deixar você ir sozinha.

- Mas eu estarei com a equipe que ajudou a encontrá-los. Eles são aurores muito competentes...

- E Viktor Krum.

- É, e o Viktor. – ela fez uma pequena pausa e compreendeu - Ron, francamente...

- Hermione, por que você acha que ele resolveu ir procurar seus pais?

- Não importa. Ele sabe que só tem minha amizade. Quer dizer, eu falei de nós na carta...

- Falou? – perguntou o rapaz, incrédulo.

- Eu realmente não sei qual é a surpresa... Na verdade, eu falo muito de você pra ele. Desde que nos conhecemos, você sempre foi parte importante da minha vida. Mesmo antes que a gente pudesse entender o que isso significava exatamente.

- Mesmo assim, não quero ficar longe de você. Você precisa mesmo ir?

"Não jogue tão baixo, Ron" – a garota pensou, mesmo sabendo que não era um jogo.

- Eu também não quero. Mas vou tentar não demorar mais que 3 ou 4 dias... Olhe, eu não deixaria alguém desfazer o feitiço de memória por mim. Além disso, preciso checar com meus próprios olhos se eles realmente encontraram os meus pais.

- Três ou quatro dias, Hermione? Três ou quatro dias inteiros? Não podemos simplesmente aparatar...

- Bem, em primeiro lugar, eu não conheço a Austrália, o que não me daria segurança na aparatação, depois, meus pais vão ter acabado de ter a memória de volta, que perderam por conta da magia, não acredito que eles irão querer fazer uma aparatação acompanhada, então eu vou e volto de avião...

- Quê?

- Avião, Ron... É como um grande pássaro de ferro dos trouxas. Transporta as pessoas voando.
- E isso é seguro?

- Sim, é o meio de transporte trouxa mais seguro, na verdade. Fique tranqüilo.

- Eu continuo achando que é melhor eu ir também. Mas se você prefere que eu fique...

- Ah, por favor, Ronald, não torne isso mais difícil pra mim do que já está sendo... Não é como se eu estivesse querendo me afastar de você. Mas os seus pais e irmãos precisam do seu apoio.

- E quanto a mim, Mione? Quem vai me apoiar? – ele disse e segurou a mão da moça.

Seus olhos fixos um no outro foram lentamente se fechando à medida que seus corpos se aproximavam: um beijo intenso e quente como aquele dia, mas que já tinha o sabor da saudade.

Ron sentia que, não somente a sua boca, como também todo o seu corpo queimava como se estivesse em chamas, um desejo de trazer Hermione mais perto de si,...

Todavia, a garota rompeu o contato, tornando visíveis suas bochechas muito vermelhas e a saia levantada mais de um palmo.

- Não tão rápido, Ron. Não aqui no jardim.

- Eu sei, desculpa... Eu simplesmente não consigo me controlar quando estou com você. Ainda mais com essas lindas pernas tão expostas...

- MERLIN! RON! – ela ralhou e abaixou a saia para tornar a cobrir o que deveria. – Eu não estava assim antes... Você é realmente muito rápido.

De repente, um gnomo sobrevoa a cabeça do casal e cai 5 metros adiante.

- Harry! Há quanto tempo você está desgnomizando o quintal? – perguntou Hermione, constrangida.

- Tempo suficiente pra ver os meus melhores amigos se engolindo – ele afirmou em tom severo, no entanto, sorriu. - Não que isso agora não seja comum. Mas ainda é muito estranho...

- Cara, eu estou há tempos vendo você e a minha irmãzinha em situação parecida...

- É, eu sei. Não estou reclamando, já era hora. E a Hermione é como uma irmã pra mim também. Então estamos empatados, não é?
Os três sorriram.

A garota se voltou para Ron:

- Eu vou, mas volto. Você nem vai sentir...

- Eu já estou sentindo...

- Ai, meu Deus, Ron, por favor, facilite um pouco.

Ronald assentiu e a abraçou.

- Desculpe, Mione.

- Vocês poderiam pensar em facilitar pra mim também – falou Harry, se afastando para alcançar outro gnomo.

- Harry, desde quando você facilita pro Ronald? – Hermione interveio, rindo, sem soltar o namorado.

- E desde quando você defende o Ron, Hermione Granger? O que fizeram com você? – Harry brincou.

- Novos tempos, cara... Novos tempos. – Ron concluiu.