A J. K. Rowling
e aos fidelíssimos leitores
esta história é dedicada.
Agradecimentos:
Eduardo da Matta – por sua participação diária e seu útil conhecimento mitológico;
Marcelo Villares – quem lidera as idéias em multimídia e as torna realidade;
Familiares e amigos – pelo valioso apoio e, por vezes, pela inspiração.
«« PRÓLOGO »»
Dentro de suas vestes, uma mulher de certa idade encontrava-se demasiadamente desconfortável. Sentia as calças apertarem-lhe as pernas e o traseiro, como se um aspirador de pó a estivesse limpando minuciosamente. Não compreendia como aquelas pessoas suportavam trajes tão justos e escassos. Ela, particularmente, estava habituada a usar peças mais folgadas e cômodas, embora sempre estivesse trajando uma capa dentro de casa. Até mesmo sua filha costumava maldizer seus modos e às vezes a fazia experimentar um visual novo quando iam às compras. Não houve uma única vez em que esta insistência a tivesse feito mudar de idéia, contudo nesta ocasião, excepcionalmente, não havia escapatória e, o pior, tudo por sua livre e espontânea vontade.
Ao menos seu objetivo parecia conquistado, uma vez que nenhuma pessoa na rua a olhasse como se ela fosse uma senhora de hábitos estranhos e com roupas de cores fora de moda. Observando ao seu redor, a mulher notou que estava na rua onde seu destino certamente se encontrava e não tardou para encontrá-lo:
"Hotel Nação Unida"
O letreiro apagado indicava uma porta dupla de madeira e uma modesta soleira, cujo tapete verde-fosco exibia as palavras "Bem-vindo" em vermelho. A senhora entrou e viu-se em um saguão simples e deserto, com algumas poltronas carcomidas pelo tempo e uma recepção habitada por um rapaz moreno de não mais que vinte e cinco anos de idade.
— Bom dia, estou procurando por Laveda Biancco – disse ela ao recepcionista.
— Espere um momento, por favor – e o rapaz abriu um livro de registros, para em seguida dizer: — Ela está realmente hospedada neste hotel, senhora. Posso informá-la sobre sua visita antes de deixá-la subir?
— Na verdade – naquele instante a mulher pensava em algo para respondê-lo. — eu sou uma tia distante da senhorita Biancco e tive de me afastar por motivos bastante frágeis. Pensei em fazer uma surpresa à minha querida sobrinha, se você pode me compreender. Porém vou entender se eu não for permitida a surpreendê-la e alegrá-la da maneira em que eu tanto ansiei por dias e dias de solidão em um lugar muito, muito diante daqui e...
— Tudo bem, senhora – o recepcionista abriu um sorriso desajeitado. — Ela está no quarto de número oito, terceiro andar.
— Oh, serei eternamente grata, meu bom rapaz – e a mulher deixou-o, subindo as escadas.
Chegou ao segundo andar, onde pôde ver muitas portas idênticas com números prateados indicando os quartos. Subiu mais um lance de degraus e o primeiro número que notou fora o oitavo. Postou-se diante da porta e ergueu a mão para bater. Cessou. Pensou no quê poderia dizer à Laveda Biancco e pareceu chegar a uma conclusão no momento em que tirou um pedaço de maneira fina e comprida do bolso interno do casaco. Apontou-o para o vaso de plantas que ornamentava aquele trecho do corredor e imediatamente ele se transformou em uma cesta com inúmeros bibelôs coloridos. Pegou-a para si e bateu na porta.
Soube, então, que Laveda Biancco a olhava pelo olho-mágico da porta e disse a ela:
— Desculpe-me pelo incômodo. Estou vendendo belíssimos bibelôs que eu mesma fiz e o dinheiro que puder ser arrecadado será voltado à Clínica dos Idosos Esquecidos. Gostaria de sua ajuda, por favor – mostrou um tom lamurioso em sua voz.
A porta fora destrancada e aberta. O rosto lívido de uma mulher com os seus trinta e poucos anos surgiu na fresta. Seus cabelos eram negros e compridos, amarrados em um rabo-de-cavalo, e seus olhos eram bastante escuros e expressivos.
— Quanto custam? – ela indagou.
— Bem, eles custam... – e a senhora olhou para o alto sem motivos aparentes. Simplesmente pensava em algo, embora seu intuito fosse parecer uma senhora não muito sã. — Oh, gentil menina, estou com tanta sede... Se você pudesse me oferecer um pouco de água, eu a agradeceria tanto, tanto...
— Oh, é claro, por que não? Entre, por favor, entre – e então Laveda Biancco destrancou por completo sua porta e permitiu que a senhora entrasse em seus aposentos.
Não se tratava de algo luxuoso, de certo. Uma pequena sala de estar exibia-se, com um sofá róseo e duas poltronas na mesma cor. Uma lareira apagada havia ali e nas paredes existiam duas janelas não muito grandes, com cortinado floral e rendado. Além de tudo, um corredor guardava o restante do quarto de hotel e era decorado por quadros de flores estáticas.
— Sente-se, por favor – disse Laveda Biancco, indicando o sofá e lá a senhora acomodou-se.
A habitante do local desapareceu no corredor e a visitante pôs-se a observar a sala. Não havia porta-retratos nem algo que entregasse a vida de Laveda Biancco, o que fazia parecer que ela não estava hospedada no hotel há muito tempo, tampouco que demoraria a deixá-lo. Não tardou para Laveda retornar trazendo uma bandeja e um copo d'água consigo. Ofereceu-o para a senhora, que ao invés de aceitá-lo, falou:
— Gostaria de conversar com você agora, senhorita Biancco – então cessara sua atuação de senhora infeliz e cansada, incorporando a pessoa decidida que ela era na realidade. Isto assustou demasiadamente Laveda Biancco, cuja face expressou assombro.
— Quem é a senhora e o que pensa fazer em meu quarto? – ela deu alguns passos para trás. — Saia imediatamente! – e rumou à porta.
— Não se assuste, querida, não é a mim que você deve temer – aconselhou com sua voz idosa, não obstante, resoluta e calma. — Se você se sentar aqui comigo, poderei explicá-la tudo o que quiser saber – e adicionou, visando a mulher imóvel. — Confie em mim.
Com estas últimas palavras, Laveda Biancco sentiu-se subitamente segura e caminhou até a poltrona diante dela, onde se sentou.
— Diga, então, como sabe quem eu sou e como me encontrou.
— Eu poderia dizê-la que somos praticamente familiares, mas penso que este é um assunto em que poderemos tratar em um futuro próximo – ela sorriu delicadamente. — Estive buscando por você através de longos anos de minha vida e apenas fui capaz de encontrá-la há alguns dias. Preciso muito que você venha comigo ou sua vida correrá graves riscos – completou num tom sombrio.
— Do quê está falando? – Laveda Biancco gritou. — Não sei quem você é e eu não irei a lugar algum!
— Oh, sim, eu penso que você irá – disse a senhora. — E meu nome é Évora Fazinski, portanto agora já sabe quem sou eu.
— Não, eu não sei! – ela ficou de pé. — Saia da minha casa, antes que eu chame a segurança do hotel!
— Você realmente ansiará por minha saída após eu dizer que eu sou a única pessoa neste mundo capaz de salvá-la de Tom?
O rosto de Biancco se contorceu como se sentisse dor ao ouvir aquele nome. Ela nada disse.
— Estou ciente de toda a sua vida, cara senhorita Biancco – Fazinski abreviou calmamente. — Sei que está assustada e que não tem a quem recorrer neste momento. No entanto tem a mim, a partir de então, e juntas poderemos criar esta menina que aguarda por nascer. Ainda que não nos conheçamos há mais de vinte minutos, eu posso dizê-la sobre minha capacidade em desvendar o que sente. Sei que está com medo. Sei que está sozinha. Você não possui irmãos e seus pais se foram. Sua mãe fora levada pela mesma doença que resgatou seu pai deste mundo e que você somente escapou da morte graças aos remédios que Tom a ofereceu.
Fazinski fez uma pausa para tomar fôlego; Biancco sentou-se novamente, os olhos grandes mal piscavam.
— Tom não é como você pensava que fosse, não é mesmo? – indagou a senhora e a mulher assentiu com a cabeça. — Ele a obrigou a fazer coisas que você não queria, não foi assim? Oh, minha querida menina, gostaria muito que você compreendesse que eu não preciso enumerar todas as suas más recordações para prová-la o quanto eu sei sobre você.
— Quem é a senhora? – Biancco chorou, escondendo o rosto por detrás das mãos magras.
— Sou uma mulher que já sofreu bastante, tal qual você – de repente Évora pousou a mão sobre o ombro de Laveda. Esta última a olhou nos olhos, revelando a mulher exausta e entristecida na qual se tornara há muitos anos. — Estou aqui para salvá-la deste horror, querida. Definitivamente, confie em mim.
A senhorita Biancco cessou o choro e ergueu de uma vez por todas a cabeça; jazia terminantemente confiante de si mesma, de maneira como não se sentia há tempos. Por algum motivo, sentia-se amiga da senhora que outrora lhe estivera vendendo bibelôs e sabia que não deveria desconfiar da portadora daqueles de cabelos prateados e compridos. Sua bondade era notável agora e pedindo alguns minutos, Laveda correu ao quarto para arrumar suas malas. Mal poderia acreditar que deixaria aquele lugar que não a marcara por nada, a não ser pelas lágrimas que foram derramadas. Mal poderia acreditar que deixaria Tom Riddle para trás, como um borrão difuso em sua memória.
Era uma sala de estar decorada por inúmeras estantes de livros, passando a quase completa impressão de ser uma saleta de leitura. Naquele ambiente podia-se notar também um rádio sem antena e sem botões depositado a uma mesinha branca, três abajures – dois dispostos às poltronas próximas às estantes e um ao espaço onde as visitas certamente se acomodariam. Havia dois sofás amarelo-ouro com detalhes em vermelho, onde, num deles, via-se um homem ruivo sentado, os braços cruzados diante do peito e as longas pernas esticadas, sustentadas pela mesinha de centro. O semblante dele mantinha uma expressão de extrema irritação e seus olhos azuis permaneciam fixos na parede do outro lado da sala.
Um ruído de porta sendo aberta e de passos firmes, porém leves, pôde ser escutado. Quem chegara se dirigia à sala de estar, parecendo saber que alguém aguardava ali. Antes mesmo que o dono dos passos pudesse se revelar ao homem ruivo, este falou:
— Incrível como você tem demorado a chegar desde que começou a trabalhar no Ministério da Magia, Hermione!
— Oh, Rony, você não sabe o que finalmente foi descoberto! – ela pareceu não ouvir a reclamação que lhe fora feita e largou-se no sofá ao lado dele.
— Deixe-me pensar, vocês descobriram que trouxas não enxergam Hogwarts? – zombou.
— Nós descobrimos o último segredo de Dumbledore! – Hermione exclamou, tão radiante como Rony poucas vezes já a vira antes.
— Como, já que ele está morto?
— Esta é uma história sobre a qual poderemos falar depois – ela fez um gesto mostrando a falta de importância disto. — O que realmente importa é que elas foram encontradas!
— Elas? – Rony descruzou os braços. — As trouxas?
— Exato! Com alguns anos de atraso, é claro, porém nós conseguimos! E com esta informação os outros também estão localizados!
— Bem, acho que isso é ótimo – Rony descansou os pés no chão antes que sua esposa reclamasse deles sobre a mesa. — E o que irão fazer para trazê-las?
— Isto já está sendo devidamente providenciado – Hermione falou de um modo tranqüilo e satisfeito, repousando a cabeça no espaldar macio do sofá.
