MAKTUB

Maktub significa "está escrito". Uma espécie de conformação, típica da religião muçulmana, com aquilo que nos está destinado, como se ao nascer tivéssemos já delineada toda a nossa vida e não sejamos mais do que peões que se movem de acordo com o previamente estipulado.

I

Megumi encontrou Kaoru a arfar arduamente. Os seus órgãos vitais estavam a começar a entrar em colapso. A sua partida estava iminente. Apressada dirigiu-se para o restaurante e chamou Yahiko.

- Tae-san, Yahiko! Por favor, preparem-se, Kaoru está mal! Preciso que enviem com urgência um pedido para Kenji vir, Missao e todos os outros que estão longe!

Yahiko petrificou, nunca estamos preparados para ver partir alguém querido mesmo sabendo que essa pessoa está mal. Tae começou a chorar, Tsubame apareceu e abraçou a amiga

- Já? Porque já? Ainda agora perdemos Kenshin, não sei se conseguirei aguentar a partida de Kaoru – Tae lamentava entre soluços e lágrimas

- É o curso natural da vida. O importante é não mostrarmos essa tristeza em frente a Kaoru. Vou voltar para o dojo, ela não pode ficar sozinha – Apressada Megumi correu de volta

Tae e Tsubame enviaram pombos correio com a notícia. Yahiko ficou paralisado fincando os punhos no peito. Queria fazer alguma coisa perante tanta injustiça, mas, não havia nada a fazer, a impotência dominava-o!

A noite foi passada em claro pelo discípulo e pela médica. Queriam pelo menos dar-lhe o conforto de ter alguns amigos a sua volta nos seus últimos suspiros. Ambos rezavam para que Kaoru aguentasse algumas horas.

O dia acabou por nascer, um dia de Verão ensolarado e quente

Hiko recebeu as notícias ainda de manha e preparou o seu discípulo.

- Tens de voltar novamente a Tóquio. A tua mãe está mal…

Não precisava de dizer mais nada, o rapaz olhou-o e percebeu a mensagem. Ainda durante a manhã saiu para o centro de Quioto, para a estação de comboios.

Missao ao desembrulhar a mensagem caiu em lágrimas. A luz da sua querida amiga estava a apagar-se. Rapidamente preparou-se juntamente com Aoshi para partir. Os restantes membros tinham de permanecer na estalagem. Tinham casa cheia devido aos festivais de Verão que se avizinhavam.

Chegaram a Tóquio no dia seguinte, assim como outros amigos por ali espalhados. O dojo Kamiya voltou a estar cheio de gente. Desta vez por um motivo trágico.

Kaoru já não conseguia mover-se, sentiu vozes, ouvia passos urgentes de um lado para o outro.

Deu um leve sorriso ao lembra-se da sua casa cheia de vida, de amigos, a sua família. Uma súbita sensação de paz invadiu todo o seu corpo, Kaoru sentiu-se levitar.

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

Lembro-me de ter pessoas a minha volta, vultos! A minha capacidade de absorção estava nos limites… apenas percebia excertos de "coitadinha" e "nãos" prolongados. Sentia-me leve, sentia que as minhas preocupações e obrigações já não me perseguiam, sentia uma paz infinita. Percebi que por alguma razão a minha estadia no mundo tinha acabado, não tive remorsos nem saudades repentinas. Sentia-me bem, numa paz luminosa que me possuía. Quando todas aquelas vozes me pareciam já distantes ouço uma palavra esquecida, uma palavra doce que me fez regressar em segundos, que me avivou asperamente a memoria, que me aqueceu o coração "mãe" … Tocou-me na mão… uma sensação triste invadiu-me e lembrei-me, antes do último suspiro, onde estava, quem era e enfim, da minha vida. Pareceu um filme, muito rápido. Não foi preciso abrir os olhos para ver quem me pegara na mão, o meu filho, aquele que saiu de mim fruto de noites inesquecíveis de amor, fruto de uma vida cheia.

Esbocei um sorriso com a percepção da sua presença. Agora estou lúcida, mas a vida não tem hora nem minuto, as minhas forças continuavam gradualmente a abandonar o meu corpo...

Acordei numa sala, uma sala de espera, com cadeiras ocidentais. Na minha frente estava uma idosa, pelos seus traços deveria ser de algum pais ao sul da China, por incrível que pareça percebi o que ela disse, um sorriso acompanhado de "tão bela e nova… já aqui?!". Dei um sorriso pelo "bela" e para esconder a minha ignorância! Não fazia a mínima de onde estava. Passados minutos a senhora saiu por vontade própria pela única porta que ali havia. Fiquei sozinha, sentada numa sala quadrada, com cerca de 10 cadeiras. Não sei quanto tempo passou exatamente. Sei que mais ninguém entrou, ninguém mais apareceu…

Depois de ter reparado melhor vi um quadro pequeno pendurado na minha frente. Ilustrava um barco, uma praia e o que me parecia um bom dia de Verão. Os minutos foram passando, ninguém aparecia, nada se ouvia. Voltei aos meus pensamentos. Voltei a minha vida. Num gesto brusco levei a mão a cabeça e lembrei-me que afinal de contas estava morta. "Morri"! Então é esta sensação… Não fiquei triste, fiquei confusa. Estranho. Assim, ali fiquei talvez por uma tarde inteira, sentada, levantada. Durante todas aquelas horas dei por mim a pensar em tudo aquilo que deixei para trás. Lembrei-me de repente que o meu marido também estaria ali! Fiquei contente, fiquei impaciente, queria sair. Dirigi-me a porta, mesmo não sabendo onde ela levava, convicta de a abrir e sair dali. Antes de a abrir, ainda com a mão no puxador lembrei-me "estará ele doente ainda, estará ele ainda dominado por males passados!?" pensei muita coisa, talvez demais até. Larguei o puxador.

A verdade é que tive uma vida cheia, tudo decorreu de uma maneira exausta, ri muito, chorei demais, por mim, vivi de uma maneira que nem por sombras a trocaria. Sim, é verdade, de entre muitas sombras fui em tempos a mulher mais feliz. Encontro-me numa sala sozinha a refletir o rasto que deixei no mundo. A minha vida não seria nada sem ti, posso dizer que se não fosse para te conhecer que então preferia não nascer. Mas então o que me impede de abrir a porta e sair? Não sei. Ou se calhar não quero admitir. Apesar de negares, vivi a vida toda a sentir que estava a ocupar o lugar de alguém… Mesmo passados muitos anos, no meu interior eu sentia que assim era… Nunca me senti uma segunda escolha, senti que nos encontramos porque ela já não existia. Eu sei que não fui, mas a verdade é que, como seria se ela não estivesse morta!? Ninguém saberá. Estariam eles juntos depois daquela porta?

A medida que refletia pela sala, às voltas, ouvi um barulho estaladiço e olhei para baixo. Era um papel. Estranho, tenho a certeza que não estava ali. Dobrado em dois abri-o. "Antes de saíres por aquela porta escolhe: viver ou ficar na eternidade". Sentei-me na cadeira mais próxima. Tudo aquilo estava a ser bastante estranho, parece até que eu mesma me estava a batalhar por impulso de outra força. Senti uma sensação de medo. Voltei aos meus pensamentos, afinal pelos vistos tinha de escolher, mas, viver o que? Outra vida em outro lugar!? Com quem? E na eternidade? Não percebo.

Confundida dei por mim a adormecer.

Com um sobressalto minutos depois acordei. Tive um sonho, um sonho que representou uma fração da história. Depois de muitas saudades e o coração apertado voltei a encontrar-te na estrada para casa, devido a doença vinhas curvado e num esforço enorme para andar. Corri e abracei-te, enchias-me todo o corpo com a paixão que nem por um minuto decresceu. Deitado no meu colo debaixo de uma cerejeira tentei alegrar-te com as novidades do dojo, com as novidades da nossa família. E de todas as batalhas que passamos juntos a mais difícil continuou a batalhar dentro de mim ate a minha hora chegar: morreres nos meus braços. De todas as aflições e desgraças que me apareceram pela frente, perder-te e ficar eu no mundo sozinha, foi a mais terrível dor, implorei para ir contigo.

Acho que entendo agora, prefiro ficar na eternidade, penso que a tua escolha depois da vida tenha sido "voltar a viver", pela tua força, pela tua vontade de defender e restituir tudo aquilo que tiras-te a pais, a noivas, a filhos, ao mundo! Quero deixar-te viver, quero que encontres alguém para amar, que tenham uma vida juntos, que eu não esteja lá para atrapalhar. Se assim o meu pedido for justo. Nunca fui covarde, talvez o comece a ser agora. Tenho medo de te encontrar e viver outra vez uma vida de sofrimento. Sofrimento que tu carregavas e que, involuntariamente, me absorvia também. Sou covarde!? Talvez, a verdade é que fui eu quem passou horas, dias, meses e anos num lugar onde o único sol que havia eras tu. Quando não estavas era noite. Fui eu que esperei na estrada horas sem fim, com os meus olhos postos no horizonte imaginando que já não virias, que te tinham morto, ou que simplesmente te apeteceu voltar a andar pelo mundo. Prefiro guardar para todo o sempre todo o amor que tenho por ti, como me fizeste uma mulher e como só com um toque teu me fazias derreter num mar de carinho e exaltação dos sentidos. Vou deixar para trás um mundo do qual não quero repetir, tenho medo que seja pior do que o que vivi, tenho medo de te conhecer hoje e morreres amanha deixando-me afundada no escuro até a minha hora, tenho medo de te encontrar e tu nunca olhares para mim… prefiro não viver do que faze-lo ao teu lado e nunca te poder tocar. Todas as pessoas que me rodearam têm o meu eterno abrigado por me terem dado tantas alegrias e sorrisos, atos únicos de honra e amizade! Quero permanecer num sono eterno imaginando a pessoa que mais amei em todas as eras, todos os minutos que me olhas-te com esses olhos maravilhosos cheios de paixão.

Todos os momentos que vivi estão gravados numa linha de pensamento inapagável.

Espero que tenhas uma vida maravilhosa…

Dirigi-me para a porta, convicta da minha decisão. Lembrei-me da voz quente do meu filho, lembrei-me da sua mão rugosa resultado dos treinos diários com a espada. Ficará ele bem? Tantas ideias, tantas preocupações… Mas tenho de me concentrar, isso já nada me vale, já não tem mais significado para mim…

Abri a porta, estava escuro, parecia uma sala perdida no espaço. Não tive medo. Soltei um suspiro, o único medo seria esquecer-me de toda a minha jornada, para onde quer que estava a ir. Mas não, uma história tão magnífica não poderia morrer, nunca morrerá dentro de mim. Avancei convicta, andei dois passos para a frente, passei a porta. Esta fechou-se sozinha, estava escuro, não havia nada. Ouvi ecos longínquos, não soube definir de quem exatamente, talvez de crianças. Fiquei com medo, não via nada mas tinha a percepção de estar num espaço infinito. E agora, o que iria acontecer!? …

Esperei…

Ouvi um barulho grave ao fundo, parecia vir da direita... olhei mas não vi nada! Segundos depois esse mesmo barulho, idêntico a uma locomotiva, vinha já de todas as direções, tentei ver o que era para me desviar mas não conseguia. Estava cada vez mais próximo, até que senti correntes de ar frias em todo o corpo que me balançavam ferozmente enquanto todo aquele ruído enfurecedor não parava a minha volta, revoltante e irado. O medo apoderou-se de mim, prestes a gritar por ajuda enrolei os braços a minha volta

As forças fugiram-me e tudo aquilo parou de repente… Senti-me dormente e senti que a minha mente se apagou totalmente

"Kenshin…"

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

Ao descer as escadas Jinpu ouve um ruído. Olha para trás e vê um clarão. Um feixe de luz sai do templo em direção ao céu iluminando toda a área. Percebeu que algo tinha acontecido a Kaoru. Seguiu-se um relâmpago forte que atingiu o pequeno templo. Incendiou-se ferozmente. Jinpu recuou assustado, tinha medo de acreditar em tudo aquilo! - Os elementos estão-se a manifestar…

xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx

Bem, isto foi começado a bastante tempo. O segundo capitulo ficou sem qualquer efeito, foi apagado. Este primeiro foi ligeiramente alterado, a historia vai tomar outro rumo. A história desta vez foi reiniciada e terá uma conclusão. Espero que gostem e espero por todas as opiniões e sugestões.

Obrigada