Título P

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Resposta ao desafio "Seven Days" do fórum Pandora's Box.

Capítulo 1: Tortas de morango e Assombrações

Branco. Alvo. Límpido.

Entediante.

Então era assim depois da morte.

Bem, e ele pensando que coisas mais interessantes viriam. A idéia ridícula que as pessoas tinham do céu: harpas, anjos com cara de crianças com asinhas e que dormiam nas nuvens, onde estavam? Estaria ele no inferno? Se assim fosse, onde estariam os diabinhos, labaredas quentíssimas, forcados, etc?

Mas uma vez tinha lido que o mundo inferior era composto pelas coisas que a pessoa, ainda viva, odiava... Curioso.

E estranho. L não odiava o branco. Nem qualquer outra cor. Mas talvez a indiferença que sentia quanto a elas poderia ser considerado uma forte aversão?

Então uma coisa desviou seus pensamentos.

O quarto entrou em foco.

Isso é interessante.

XxxxX

Raito Yagami voltou do trabalho exausto, suado e mal-cheiroso.

E se tivesse que agüentar o palavreado de Misa Amane, modelo, recém-atriz de filmes e suposta namorada de Raito, filho do chefe da polícia japonesa, campeão de Tênis, o melhor aluno em sua classe, blábláblá.

Mas surpreendeu-se ao perceber que ela não estava. Bem, ela havia dito algo sobre "chegar tarde hoje, por isso não sinta saudade, Raito-kun! Eu ainda te amo, e não se preocupe, não vou estar com um amante! Beijo, tchau!". É, algo parecido com isso.

Colocou a maleta no lugar de sempre, assim como seu relógio. Metodicamente tirou os sapatos e colocou os chinelos, para em seguida jogar-se no sofá. Arrependeu-se logo em seguida – a preguiça o preencheu, mas o cheiro... Ugh! Nada de entrar mais em esgotos para perseguir suspeitos para Raito Yagami, não senhor.

Ainda bem que o sujeito foi preso e agora estava aguardando julgamento. Que ele pegasse pena máxima.

O cheiro começou a enjoar o jovem gênio, então ele decidiu tomar um banho e em seguida comer.

Bem, ele realmente merecia um banho.

No caminho, notou que Misa havia comprado uma torta de morango e a deixou encima da bancada da cozinha. Obviamente ela tinha comprado, visto que as habilidades dela na cozinha eram próximas ao zero absoluto. Mas Raito odiava, detestava,abominava morangos. Havia uma boa razão: ele era alérgico a eles. Houve um memorável dia em que sua irmã mais nova, Sayu, o fez comer um doce de morango à força e o pequeno Raito parou na Unidade de Tratamento Intensivo e quase morreu... Teve vontade de jogar a comida no lixo, mas era um desperdício.

E provavelmente Misa iria reclamar tanto que ele teria de comprar outra, afinal...

Decidindo ignorar aquilo, entrou no banheiro e se despiu, jogando o terno caríssimo em qualquer lugar. Misa provavelmente iria pegar depois. Raito não costumava ser tão desleixado, mas hoje ele estava completamente exausto e fedendo.

O banho não foi demorado, embora tenha lavado o cabelo castanho. O policial ia se secar quando notou uma falha na sua observação: não havia uma toalha seca para se enxugar. Amaldiçoou em voz baixa e saiu do banho molhando completamente o chão. A casa era dele, afinal. Ele podia fazer o que quisesse, mesmo sair nu por aí, dançando o can can.

Tirando a parte da dança, foi isso que Raito fez. Seguiu para seu quarto, onde sabia que haveria alguma coisa para se secar. Ao fazer isso, passou pela bancada da cozinha, mas não notou que uma fatia do bolo havia sido cortada.

Uma fatia grande da torta de morango, diga-se de passagem.

Entrou no quarto e novamente, não reparou na figura que comia ávida (deviam confiscar sua licença de detetive, Raito Yagami!), seguindo direto para o armário. Pegou uma toalha limpa e a deixou cair no segundo seguinte, quando sua mente processou que havia um homem sentado na sua cama, comendo a torta de Misa.

Ele ia dizer alguma coisa quando o estranho falou:

"Oh, o seu é pequeno." L observou.

Raito Yagami gritou de horror.

XXXXX

Depois de explicar a situação para alguns vizinhos (e já completamente vestido), garantir que nada estava errado, ter respirado profundamente várias vezes, contar até dez e tomar uns dois goles de uísque, Raito finalmente se acalmou.

E então a inquisição começou. Apontou, de uma forma rude, para o outro e perguntou:

"Quem é você e o que está fazendo aqui?"

"Ah, ambas boas perguntas que merecem boas respostas." O outro se serviu de outro pedaço da torta. Até que Misa chegasse, ela estaria toda consumida...

"Então responda!" Raito estava começando a se estressar de novo. Ah, o dinheiro da terapia contra raiva indo direto para o lixo...!

"Eu responderia, se..." L ergueu a colher e a apontou para o outro.

"Se...?"

"Se eu soubesse as respostas."

"... Você não sabe como veio parar em meu apartamento?"

"Não faço a mínima idéia." O estranho respondeu. "Você disse o seu nome?"

Yagami Raito começou a pensar. Observou o outro e a palavra que o definia era, definitivamente, estranho. Ele tinha cabelos e olhos negros e enormes olheiras, que à primeira vista pareceriam feitas por lápis de olho. E o vestiário era extremamente simples, composto apenas por um jeans e uma camisa branca com mangas, a qual estava manchada com uma coisa que se parecia terrivelmente com sangue.

Mas nem sapatos a criatura dignava-se usar. Ou meias.

L obviamente notou o olhar do outro sobre sua figura, porque disse: "Ah, eu não gosto muito de sapatos."

"Eu notei sua aversão a eles." E virou-se. "A propósito, meu nome é Raito Yagami."

"Isso é interessante."

"Por quê?"

"Yagami-san foi o nome do detetive que cuidou do meu caso."

"Caso...? Bem, pode ter sido meu pai. Que tipo de caso?"

"Meu assassinato."

XXX

O apartamento havia atraído Raito por causa de sua praticidade. Ficava a menos de dez minutos da estação de trem Y, na qual ia para o trabalho todos os dias. Era composto por uma suíte (no qual ele dormia) e um quarto (no qual a Misa acabava dormindo, após ser expulsa do quarto dele), uma cozinha e uma sala de estar, na qual o rapaz acabara de descobrir que estava sob efeito de alguma droga alucinógena, afinal, o homem a sua frente estava... morto.

Algum gás naquele esgoto devia estar o afetando, pensou.

"Seu... assassinato?" Ele repetiu, incrédulo.

"Sim. Que outro modo acha que eu teria morrido?" O rapaz deu outra garfada na quase terminada torta.

O primogênito dos Yagami teve de concordar com o suposto fantasma. Ele não parecia ter morrido de uma doença (embora realmente parecesse fraco fisicamente e estranhamente pálido) e aquilo explicava a mancha carmesim.

"É. Você pode ter razão."

"Eu sempre tenho razão. Mas você começou a acreditar que eu realmente estou morto?" E deu seu prato para Raito, que simplesmente levantou-se e colocou o pedaço restante para ele e serviu-se de um pouco de café que alguém havia feito. (Provavelmente ele, por causa das já citadas habilidades culinárias da modelo... Mas até ela sabia fazer café... Certo?)

"Bem... a outra opção seria eu estar sofrendo de um efeito de algum narcótico, mas há evidências de que o que você falou é verdade." Ele voltou para a sala e colocou o prato sobre a mesa, ao alcance do... espírito.

"Como assim?" L enfiou o último morango na boca e o devorou.

"Você não faz peso sobre a cadeira e não tem sombra. Mas é interessante o fato de que você consiga comer ou mesmo segurar o garfo." Raito sorveu um gole do café. Argh. Era a Misa que havia feito.

"Muita força de vontade, eu acho." Deu de ombros. E começou a fitar seus próprios pés, observando algo. "Você está certo sobre as sombras. Isso é interessante."

O detetive certamente não via nada de interessante no fato de não possuir sombras, então deixou sua mente vagar. Como era naqueles filmes de fantasmas que a modelo tanto insistia que os dois vissem? Ah sim, os espíritos dos mortos retornavam por que... ah, eles deixavam negócios inacabados neste mundo? Por Kami-sama, que clichê.

"Então, err... qual o seu nome mesmo?"

"Já disse que não lembro. Mas costumavam me chamar de Ryuzaki."

"... Ryuzaki? Só Ryuzaki? Nada mais?"

"Sim. Acredito que sim. Mas minha memória está confusa – o que é estranho – mas eu lembro-me de pouca coisa anterior à minha morte." O fantasma acabou com o prato, o que, pareceu à Raito, o deprimir um pouco.

"Bem, tirando esse fato... Qual é o seu negócio inacabado?"

"Raito-kun, eu não posso acreditar que você vê tantos filmes de fantasmas assim."

"Eu não vejo!" O rapaz se indignou. "Só responda, Ryuzaki!"

"Eu acho que..." o outro começou.

"Sim...?" O Yagami se aproximou inconscientemente, inclinando-se na cadeira.

"Estou com fome. Tem alguma coisa doce para comer por aqui?"

O moreno ficou estático por alguns segundos.

"Você... ficou preso ao mundo terrestre porque... não satisfez sua gula por doces?"

"Não consigo ver outra razão." O outro observou. "E então? Tem ou não tem? Eu particularmente prefiro morangos..."

Raito Yagami deu-se um tapa na testa. Depois de ter difícil no trabalho, e agora, estava preso a um fantasma glutão com uma tara por doces...

Que tipo de maldição tinha se abatido sobre ele?