"Luke! Luke!"

O garoto andou rapidamente até a parte da casa onde Flora o chamava. Geralmente ela não falava tão alto, então ele pensou que havia acontecido alguma coisa. Qual foi a sua surpresa ao constatar que ela estava ao lado da mesa do professor, aparentemente apenas curiosa.

"Flora? O que foi?"

"O que é isso?" falou Flora, apontando para a máquina na mesa.

"Isso? É o computador do professor." Luke logo notou que, por ter crescido isolada, Flora provavelmente não sabia o que era um computador. "Uh… é como uma máquina onde você pode acessar informações do mundo todo."

Os olhos da menina brilharam. Ela começou a bater palmas e falar com a sua voz aguda, mas que Luke havia aprendido a achar agradável. "Oh, por favor Luke! Me mostre como é!"

O garoto fez uma cara estranha, como se estivesse começando a ficar enjoado. "Não sei, Flora… o professor nunca disse se eu podia mexer nas coisas dele…"

"Mas eu quero ver!" Luke achava que Flora ia começar a chorar, então concordou.

"Mas só por alguns minutos.".

O sistema foi ligado, e Luke sentou-se na cadeira de Layton, com algum esforço. Flora simplesmente pegou um banquinho da cozinha.

"Onde está toda a informação?" Flora perguntou, inocente.

"Calma, Flora. É só pesquisar alguma coisa e… voilá!" Todo o drama que o menino fez para mostrar um simples resultado pode ter ajudado na reação de Flora.

"E o que acontece se você pesquisar sobre mulheres?" Perguntou ela, animada.

"Bom…", falou Luke, digitando a palavra. "Olha, tem uns vestidos e…"

Ambos se calaram.

"… O que eles estão fazendo?" Perguntou Flora, parecendo que ia vomitar.

"Eu… eu não sei… eles…"

"M-Meu deus… agora é um vídeo…"

"Nossa, isso… eles… como isso…"

"AAAH! APARECERAM MAIS!"

Luke fechou o vídeo, com o coração pulando.

"Eu não acho o computador tão divertido assim, Luke…" Flora parecia transtornada. Luke também não estava tão bem, mas agora ele tinha que arranjar algum jeito de inocentar o computador.

"Calma Flora, tem mais coisas além… daquilo. Tem alguns jogos divertidos aqui!"

"Jogos? Como… puzzles?"

"Uh… também. Olha, tem esse que eu sempre jogo quando estou em casa, deixa eu tentar achar…" Depois de algum tempo digitando, Luke sorriu para a garota "Aqui, tenta jogar."

Dando o seu lugar a Flora, Luke observou enquanto a garota tentava entender os controles. O jogo se chamava "SUSpeiTO", mas não tinha muito haver com o nome: Até aonde Luke havia jogado, consistia de um labirinto. Mas Flora estava indo muito bem, quase no fim.

"Luke, olha! Eu vou conseg-" E nesse momento, o jogo desapareceu, sendo substituído por a cara cinza de uma mulher horrível.

Um grito saído das caixas de som percorreu o apartamento, e Flora se jogou no chão de medo. Luke reagiu rápido: Fechou a janela do jogo e foi socorrer a amiga.

"Flora! Você está bem? Não se machucou? Tudo bem?"

"E-E-E… Eu… Aq-q-quilo…" A menina quase chorava. Jogou-se nos braços do amigo, morrendo de medo. "Luke! Desliga o computador, eu não quero mais ver ele!"

"Flora, desculpa, eu não sabia que acaba daquele jeito, por favor, se controla!"

"NADA DE BOM SAI DISSO" Luke, muito depois disso, iria se lembrar do momento como a maior demonstração de força vinda de uma mulher.

Ele viu Flora se levantar, com aparente raiva. Viu-a segurar a máquina…

… e a atirar pela janela.

Luke podia jurar que seu coração parava enquanto o metal quebrava o vidro, e os segundos que o aparelho levou para atingir o chão foram os mais longos de sua vida.

"F-Flora!"

"E-Eu… eu… eu joguei…" Flora parecia entender agora as conseqüências dos seus atos.

"V-V-VOCÊ JOGOU O COMPUTADOR DO PROFESSOR PELA JANELA!" Luke não conseguia não gritar. O medo lhe escapava pelos poros de tão abundante. Ele nunca havia dado motivos para o professor ficar nervoso. E nem queria.

"Eu não queria… eu fiquei com medo… eu… eu… des… desculpa…" A menina parecia não saber onde se esconder. O desespero nos seus olhos era palpável.

"O que nós vamos fazer… o professor vai… eu não sei nem o que o professor vai fazer!"

"Ele… ele não vai se importar, vai? Ele… vai me mandar de volta pra vila?" Luke deu um fim ao seu desespero quando notou que o de Flora era muito mais importante. Um cavalheiro sempre cuida dos problemas de uma dama primeiro.

"Não, Flora, claro que não! O professor e eu amamos você. Mas… olha, vamos lá embaixo, ver o estrago. Quem sabe ele caiu em algo macio…"

Ambos desceram as escadas dos três andares que separavam o apartamento da rua. O computador havia caído no beco entre aquele prédio e outro, e não parecia em boas condições. O monitor estava rachado, arrastado pela CPU. Agora, esta estava totalmente destruída: Não havia salvação para nada ali.

"E agora…" Luke se perguntou, tentando manter a calma. Se ele pirasse, Flora iria junto. "Acho que… podemos concertar… não é?'

"Luke…" Flora estava, mais uma vez, quase chorando.

"Certo… se nós pensarmos nisso como um puzzle… olha, uh… eu… nós podemos…"

A menina estava a ponto de gritar, pelo que Luke via.

"Olha, é só conseguir outro monitor e… arranjar uma CPU nova… ele nunca vai notar não é?"

Ela estava voltando ao normal. Graças, pensou ele.

"C-Certo… mas… onde se concerta isso?"

"Tem um homem do outro lado da rua que faz o serviço… se importa de subir com a CPU e remendar com fita adesiva?"

"Fita?" A surpresa na cara de Flora pareceu lavar o medo. "Vai resolver?"

"Claro! Não há nada que fita não resolva, não é?" Estamos tão perdidos…

Pelo menos Luke havia conseguido colocar um sorriso de volta na cara de Flora, que subiu esperançosa. Ele esperava que ela soubesse onde estava a bendita fita…

Chegou ao técnico às 13h:30. Faltavam 1h: 30min para Layton retornar de sua aula, e ele com certeza iria querer olhar alguma coisa no computador.

"Olá, uh… o que o senhor acha desse monitor?" Falou Luke, depositando-o no balcão. O técnico olhou a máquina por alguns segundos e decretou:

"É lixo. Jogue fora."

"Ahhh!" Luke tapou a boca, para não gritar mais. O técnico arquejou uma sobrancelha. "O senhor não pode mesmo concertar?"

"Bem, eu acho que posso… por 500 euros."

A cor desapareceu do rosto do menino enquanto ele sonhava com a sua mesada de 10 euros por semana.

"Ou… ah, esqueça."

A cor começou a voltar para o seu rosto enquanto ele bateu as mãos no balcão.

"Qualquer coisa! Por favor!"

"Bem, é meio bobo, mas… eu peguei esse puzzle há alguns dias e…"

Luke quase chorou. Bateu no balcão com a palma ao mesmo tempo eu que gritava:

"EU RESOLVO!" O grito pôde ser ouvido do outro lado da rua.

Uma hora depois, Luke saia do local com o monitor em perfeitas condições. Agora era só questão de arranjar alguém para concertar a CPU, ou pelo menos torcer para que Layton não descobrisse o defeito. Ele subiu as escadas com um sorriso, cuidando para não deixar a preciosa carga cair. Abriu a porta do apartamento com as costas.

"Floraaaa, eu conseg-" Luke parou no meio da sentença, ao observar uma cena inquietante: Flora ajoelhada no chão, colocando fita adesiva em cada lugar interno da CPU. Ligada na tomada.

"FLORAAAAA!" Ele gritou, largando o monitor e tirando Flora de perto da máquina. No mesmo instante, ela pegou fogo. "AAAAAAAAAH!" Luke fez a coisa mais instintiva na hora:

Ele agarrou a CPU com as duas mãos e a jogou pela outra janela.

Mais uma vez, o tempo parou quando ele observou o que estava acontecendo.

"NÃÃÃÃÃÃO!" Gritou, mas não havia mais tempo: A carcaça EM CHAMAS do computador jazia inerte no beco. Luke virou a cabeça para trocar um olhar desesperado com Flora, mas aí notou.

Ele havia entrado com um monitor completamente operacional em mãos. E não estava mais o segurando.

"OH NÃO" Exclamou ao ver o vidro espalhado pelo chão, e algumas peças de monitor espalhadas pela entrada. "Oh não, não, não…"

"Luke, desculpa, eu pensei que ia ser mais rápido se… eu sou tão estúpida…" Flora começou a choramingar baixinho. Luke suspirou, e abraçou-a como um bom amigo.

"Não se preocupa, Flora. Essas coisas acontecem. Venha, me ajuda a limpar isso tudo… o jeito é esperar o professor e… aguardar o que ele tem a dizer. Vamos, não chore. Não foi sua culpa."

A menina assentiu sem jeito, e foi para o armário pegar uma vassoura. Faltando alguns minutos para o professor chegar, Luke sentou-se no sofá, logo acompanhando por Flora. Ambos suspiraram.

"O que acha que ele vai dizer?" Flora perguntou, com medo.

"Não faço idéia… eu nunca vi o professor bravo com ninguém."

"Luke, foi minha culpa… eu vou falar pra ele e…"

"Não, Flora" Falou, cortando-a. "Um cavalheiro nunca deixa uma dama levar a culpa. Eu quem liguei o computador, e eu quem te disse para colocar fita nele… eu assumo tudo."

"Mas…" Flora não completou a frase, agradecida.

Luke bocejou, cansado. A corrida das ultimas horas havia exaurido suas forças. Escorou-se no braço do sofá, pensando em apenas fechar os olhos, mas acabou adormecendo.

Flora foi logo depois: acabou com a cabeça apoiada no ombro do garoto.

"Crianças? Cheguei. Olá?" Layton adentrou seu apartamento, estranhando a falta de barulho. Geralmente Luke estaria comemorando ter terminado o dever de casa, e Flora estaria na cozinha. E foi aí que viu os dois, dormindo no sofá.

Sorriu, pensando em como era um alívio saber que eles haviam se dado bem. E foi aí que notou a falta da sua CPU e de seu monitor. Estranhou, e estranhou ainda mais quando notou as duas janelas quebradas.

Um assalto? Mas as crianças parecem despreocupadas… Olhou por uma janela quebrada, com cuidado, e observou o corpo retorcido de metal branco na rua. Sua mente juntou dois mais dois.

Sem querer, soltou uma risadinha. Que acordou Luke e Flora. Luke arregalou os olhos quando recobrou totalmente os sentidos, enquanto Flora prendeu a respiração.

"P… professor!" Luke exclamou, começando a tremer. "Professor, por favor, me desculpa, o seu computador…"

"Agora, Luke…"

"Eu tentei concertar mas no fim não deu e…"

"Luke, meu garoto…"

"A culpa foi toda minha, Flora não teve nada haver com isso, eu juro, e ainda…"

"Luke, está tudo bem."

O garoto parou de falar, confuso. Não era um Está Tudo Bem que dizia Eu estou bravo, mas não vou descontar em você. Era um Está Tudo Bem que dizia… bom… está tudo bem.

"Mas… professor… o seu computador está…"

"Estava velho, sim. E deveras ultrapassado. Honestamente, eu estaria surpreso se ele estivesse funcionando completamente."

Luke não sabia o que pensar. Flora ainda não respirava direito.

"Estou tendo algum trabalho mantendo os arquivos de minhas aulas na faculdade, mas como aquele computador já havia dado o que tinha de dar, eu passei pelo centro da cidade para comprar um desses novos, portáteis." Layton tirou de sua mala um laptop, novo em folha, preto. Luke ainda não conseguia acreditar. "Eu comprei um para os dois também, visto que deve ser uma novidade para Flora, e que os jovens de hoje gostam de computação."

E finalmente, Luke decidiu como reagir:

"… …" Caiu do sofá, rolando no carpete da sala enquanto Flora dava alguns risinhos da situação cômica de seu melhor amigo.

"Agora, Luke, meu garoto… um cavalheiro não faz tamanha baderna…" Tentou falar Layton, mas ele próprio dava sua risadas.

De noite, Flora estava sozinha em seu quarto. Luke já havia ido para casa, e Layton estava dormindo. Ela tinha em mãos o laptop laranja e azul que o professor havia comprado para os dois, e estava criando coragem para abri-lo.

Quando finalmente o fez, a máquina a saudou rapidamente e perguntou-lhe o que ela gostaria de pesquisar.

A sua face estava completamente vermelha quando ela digitou "Mulheres".