Até Amanhã

Quase oito horas da manhã. Ela entrou no quartel, como sempre, um pouco adiantada. Esperava encontrar um ou dois companheiros de trabalho presentes, provavelmente dormindo sobre suas mesas, mas depois lembrou que todos haviam sido transferidos e apenas ela voltara para aquele escritório. As coisas ainda não tinha se normalizado totalmente.

Encostou na porta, obrigando –se, mentalmente, a despertar de uma vez para começar o trabalho e enfim empurrou-a.

Foi um choque. A tenente sentiu suas pernas fraquejarem ao avistar a figura que se encontrava atrás da mesa à sua frente.

"Coronel?!" Conseguiu pronunciar, baixinho, juntando todo o seu auto-controle. Não sabia bem ao certo o que dizer, afinal, não o via desde a ultima guerra, há quase um ano, em que ele, simplesmente, se mandou num balão, disposto a partir desse mundo. Dias depois, para o seu alivio, ela soubera que ele continuava por perto, em Ametris, ainda que não quisesse voltar ao trabalho. Ainda que, por mais que ela protestasse, não lhe dissessem onde ele se enfiara.

E agora ali estava ele, lindo, como sempre, e o que era mais estranho...TRABALHANDO.

Riza arqueou as sobrancelhas, sem saber se ria da situação ou chorava (ambas as opções bem improváveis, tratando-se de nossa querida primeiro tenente).

"Bom dia, tenente Hawkeye!" Foi tudo o que Roy disse, com a maior naturalidade do mundo, sem nem ao menos olhar para ela, e nem parar o que estava fazendo. Até mesmo sua voz soava com casualidade.

"Bom dia, coronel Mustang" ela respondeu batendo continência e com certa hostilidade na voz. Bem lá no fundo o que ela queria fazer era correr até ele e socar sua cara, dizendo que sentira saudades.

Porém, como sua consciência sempre vencia seu instinto, Riza se controlou, se dirigiu à própria mesa e ignorou o turbilhão de sentimentos que invadia seu peito.

Tinha tanta coisa para falar àquele homem. Tanto para contar, para questionar...

Suspirou pesadamente. Ela nunca soubera como lidar com seus conflitos, afinal.

Por fim, pegou alguns papéis e começou a preenchê-los, ainda pensando em algo para dizer ao seu superior. Assim se passou o dia, tão monótono quanto todos os outros, mas bastante confuso, para cada um. Hawkeye apenas se perguntava o porquê de todos os olhares indecifráveis e nada discretos que Roy a mandava por detrás das pilhas de papel. Nem queria pensar no quanto aquilo era surreal.

Ao fim do expediente ouviu-o dizer:

"Aleluia! Oito horas. Eu tinha até esquecido do quão cansativo é trabalhar nesse quartel."

"Também, depois de quase três anos afastado da burocracia, senhor..."

"É..." Ele sorriu, se espreguiçando e encarou-a, ainda sorrindo, meio enigmático."Então...Pode me dar uma carona, tenente?"

"Creio que isso continue a ser minha obrigação como subordinada, senhor."

"É, espero que sim."

Ela levantou-se e desamassou o próprio uniforme.

"Então vamos".

Sem contestar, o coronel apenas seguiu-a até o carro. A viagem deu-se exatamente do mesmo jeito silencioso. Riza tentava a todo custo, esconder o tremor em sua mão ao volante.

"Chegamos..."

"Sim senhor."

"Boa noite, tenente"

"Sim senhor."

"E... até amanhã."

"Sim..."

Há quanto tempo ela não esperava ouvi-lo dizer aquilo? Á quanto tempo não queria ter a certeza de vê-lo no dia seguinte novamente?! Foi como música que aquelas palavras entraram em seus ouvidos... e como música que a sua resposta saiu também, quase acompanhada de um sorriso.

"Até amanhã, coronel."

Ele sorriu, quando enfim ela falou como a Riza que sempre fora, e acenou com a cabeça antes de sair do carro.