Atenção: Essa fic foi um desafio da Uhura. Foi também por inspiração de Shakespeare. Então culpem a eles e não a mim!

Desafio: Albus e Minerva não são um casal no início da história. Albus, por qualquer motivo, deve procurar Minerva no meio da noite. Minerva deve ter em seu quarto ou em seu banheiro algo que a faça lembrar de Albus e que ela espera que ninguém saiba que está lá. Albus deve ver/encontrar isso (não necessariamente na mesma noite em que ele a procura). A história tem que acabar com um beijo *-*

n/a: Toda a fic será escrita em primeira pessoa, alternando o personagem do qual o ponto de vista será abordado.

Outro detalhe que eu gostaria de ressaltar é que, só para provar que o amor não tem idade, fiz essa história o mais atemporal que pude. Assim, você pode imaginá-la ocorrendo em qualquer período a partir de 1956 e antes dos anos 90. A escolha é sua.

Sem mais enrolações, lá vai:

O Caso do Livro Roubado

Capítulo 1: Albus

Passa da meia-noite, um frio de gelar os ossos, e eu ainda estou perambulando pelo jardim. Esperando. Um chocolate quente não cairia nada mal agora, mas eu não arredaria o pé daqui nem mesmo por isso. Mantenho-me em guarda e atento.

Porque... bom, eu ainda não sei o porquê. Devia estar em minha cama agora, afundando no sétimo sono, mas não consigo. É torturante ficar lá, remoendo essa amargura em meu peito. E, ainda que sejam igualmente terríveis os pensamentos ao ar livre e sob o sereno, aqui me parece menor essa sensação opressora de impotência. Ainda que não tenha a mínima intenção de fazer nada a respeito, daqui posso ao menos manter minha vigília.

Sei perfeitamente que minhas chances são muito poucas e posso sentir as entranhas revirando por conta disso. E mesmo assim permaneço, imóvel e invisível, olhando alternadamente do relógio de algibeira para os portões do castelo, e depois para a janela de minha melhor amiga, perfeitamente distinguível mesmo na escuridão. Eu sei bem qual é porque também já dormi ali... Mas infelizmente não desse jeito que você deve estar pensando. Era meu quarto antes de ser dela, nada mais.

Agora suponho que saiba de quem estou falando. Sim, Minerva. Mas ela não está lá agora. Saiu, horas atrás, pra um... um... encontro.

Dói até de pensar.

É a nona vez desde o conheceu, a segunda só nessa semana, em que ela saia assim com ele. E é perfeitamente possível, até mesmo natural, que essa altura os dois já estejam... Não!

Lawrence, até o nome já era o bastante para me causar náuseas. E pensar que fui eu quem os apresentou! Um conhecido do Departamento de Cooperação Internacional em Magia, que muito se gaba por integrar a Confederação Internacional dos Bruxos. Nem é propriamente bonito ou inteligente, muito menos engraçado. E começo a achá-lo, embora saiba que minha opinião está em muito prejudicada pelo despeito, terrivelmente chato. Duvido que saiba fazê-la rir como eu faço, que a deixe vencer no xadrez só para ver seu olhar triunfante, que esteja ridiculamente apaixonado como eu tenho estado...

O que ela poderia ter visto em alguém assim afinal?

Pelo menos um quarenta anos a menos que eu, tenho de admitir. Toneladas a menos de complicações e perigos também. E ele é sóbrio e discreto como eu, muitas vezes apontado como excêntrico e matusquela, jamais saberia ser, além de não sofrer nada da irritante exposição da imprensa ou da pressão que isso gera sobre mim. E também não são colegas de trabalho, tampouco amigos há tanto tempo ao ponto dela se dar a liberdade de contar sem nenhum embaraço que está namorando outro homem.

Ou seja, mesmo sendo indigno de tão formidável bruxa, Lawrence ainda está anos-luz à minha frente.

Porém continuo achando que ela mereça alguém melhor. Sei perfeitamente que eu também não sou esse alguém, e às vezes chego a pensar de que nunca haverá homem algum à altura dela. Não, qualquer ser humano neste mundo estaria muito aquém daquele padrão de mulher. Tão forte, tão íntegra, tão maravilhosamente perfeita... E que olhos!

Mas, mesmo que ainda possa ficar por horas divagando sobre as qualidades de Minerva, algo me toma a atenção de maneira abrupta e terrível. Porque nesse fatídico instante meus temores se confirmaram: a luz na janela da saleta de seus aposentos se acende, e (como me dói perceber isso), logo em seguida a de seu quarto. Normalmente Lawrence a deixaria no portão depois deles voltarem caminhando de Hogsmeade, desaparatando de não-quero-nem-saber-onde. Num dia de pouca sorte, como vinha sendo cada vez mais frequente ultimamente, ele ganharia um ou dois beijos de boa-noite antes de se despedir. E também vinham voltando cada vez mais tarde... Uma parte de mim, agora momentaneamente aliviada, temia que ela nem sequer se desse ao trabalho de retornar essa noite.

Contudo, se a luz se acendeu assim sem que tenham passado por mim na entrada, a única explicação lógica era que tivessem voltado por flu. E se vieram por flu, foi porque vieram por uma lareira. E lareiras ficam em quartos ou salas, não em lugarem públicos como restaurantes ou mesmo jardins por onde se possa caminhar e conversar livremente de maneira não-perigosa. E o motivo de tanta discrição, bem, não pode ser nada bom.

Não posso evitar de me sentir traído, roubado, prejudicado de todas as maneiras possíveis. Quem esse sujeito acha que é para aparecer do nada e roubar a minha (bem, não tão minha assim) amada Minerva? Fecho os olhos saboreando o gosto amargo da tristeza na garganta apertada. E que direito teria eu de reclamar por conta disso?

Olho novamente para a janela. Ah, quanta inveja! Que tipo de felicidade o ele estaria provando agora? Muito mais que um simples beijo de boa-noite, certamente.

No entanto, para minha grande surpresa, a janela se abre revelando uma Minerva McGonagall de olhos fechados, apreciando o gelado vento noturno em seus cabelos anormalmente soltos e – com mil anjos do céu! – aparentemente sozinha. Ela parece muito séria e até mesmo um pouco melancólica, ali, sob a luz do luar. Mas ainda é a coisa mais bonita que já vi na minha vida.

Nem por um momento entendo o que estou fazendo enquanto meus pés seguem desenfreados pra dentro do castelo, por corredores já muito conhecidos, indo dar nos aposentos que agora eram usados pela atual professora de Transfiguração. Só me dou conta da loucura que estou cometendo quando já tinha batido na porta, anunciando minha chegada. Então penso em correr, mas um "só um segundo" pronunciado pela voz dela prende-me ali enquanto reviro, em vão, meu cérebro em busca duma desculpa qualquer para dar. Desculpa essa que não vem.

– Albus! – ela exclama, surpresa.

Não imaginava me ver, decerto. No entanto o fogo na lareira me deixa contente de que também não espera mais ninguém via flu, ao menos por hora.

Mas, ah, como está linda! O penteado desfeito e o rosto um pouco molhado, livre da leve maquiagem com que saiu (sim, admito que eu estava espionando isso também) e ainda usando o vestido longo e negro, que evidencia o seus quadris de forma atordoante. Menos mal que não usou o vermelho, porque aquele sim é de fazer qualquer homem perder o juízo...

Está muito à vontade em minha companhia, como sempre. Não age como se me devesse nada, nem parece ter a menor idéia de como tem destroçado meu coração. Tanto que chega a fazer uma vênia de brincadeira quando dá um passo pro lado, dando-me passagem.

– Boa noite, Minerva – eu cumprimento e entro. – Ou melhor, bom dia.

– Não está meio tarde pra uma visita social?

Aponta-me o sofá e eu me sento obedientemente, mas ela permanece de pé. Então flexiona uma das pernas pra trás e retira uma de suas sandálias de salto alto, e depois repete o gesto com a outra. Não parece notar o modo desconcertado e maravilhado como observo a tudo isso.

– Bem, creio que sim, e me perdoe se eu estiver sendo inoportuno. Apenas vi as suas luzes acesas e fiquei um pouco preocupado contigo.

– Viu as luzes? – ela cita, surpresa. E pelo modo como arqueia uma das sobrancelhas, acho que acabei de cometer um erro.

– Do jardim – respondo, tentando soar natural como se vagar pelos gramados de Hogwarts de madrugada fosse a coisa mais normal do mundo. Apenas espero que ela se lembre de minha fama de excêntrico, e não repare que é ela o motivo de eu fazer isso.

– E o que raios você estava fazendo no jardim a uma da manhã?

Ela ri e caminha para o armário, mais ao canto. Deve estar indo pegar algo para bebermos. Sabe do hidromel que eu gosto, e nem sequer vai se dar ao trabalho de oferecer antes de nos servir. Fazemos isso muito, beber e conversar tarde da noite... Ou fazíamos, porque isso foi antes de Lawrence.

Os pés, belos e delicados pés femininos, seguem descalços contra o frio chão de pedra do castelo. Chega a dar pena.

– Era meia noite e trinta e sete, sabe, levei um tempinho pra chegar aqui. E eu só estava dando uma volta.

– Com que frequência você dá voltas debaixo da minha janela?

O-hou, ela está com aquele sorriso matreiro de novo. Começo a achar que está se divertindo com isso. Às vezes as mulheres podem ser cruéis, alimentando a própria vaidade às custas do sofrimento alheio.

– Pensei que passaria a noite fora – sem querer minha fala sai venenosa, como uma acusação. É o despeito falando por mim.

Mas o que eu estou pensando? Minerva não é assim! Ela é sincera e leal e... está furiosa comigo agora. E com razão, seu enorme imbecil!

– Ora, o que está querendo insinuar? – ela questiona, os olhos semicerrados. Felina prestes a atacar, é isso que parece.

– Nada. Você é adulta e livre, pode fazer o que bem entender. Não é da minha conta – tento me desculpar, mas parece que isso só piora as cosias. – Apenas estranhei que ele não a tenha trazido, como geralmente o faz.

Ela bate as taças com tanta fúria contra o tampo da mesa a minha frente que é de se admirar que não se quebrem. Despeja a bebida com tanta rapidez que não sei como não derrama nem sequer uma gota. Estou com um pouco de medo agora.

– Sim, Lawrence é um perfeito cavalheiro, mas não me trouxe esta noite – ela empurra minha taça pra mim, olhando-me desafiadora. – E você está certo numa coisa: não é mesmo da sua conta.

Eu desvio os olhos, para que eles não me traiam. Uma bofetada jamais teria doído tanto.

– Perdoe-me. Sou apenas um velho tolo que se preocupa muito contigo.

Minerva finalmente se senta ao meu lado e toma um gole, devagar. Eu também bebo, e todo o conteúdo de minha taça de uma vez só. Porém não me sirvo novamente, apenas fico girando-a entre os dedos e vendo como e fogo reflete no vidro. Meus olhos estão ardendo.

Penso que já é hora de me levantar e sair, penso que nem ao menos deveria ter vindo, penso que nem sei porque vim. Mas nem ao menos chego a me levantar, porque ela volta a falar, sem raiva ou mágoa, e me faz esquecer disso também.

– Tudo bem. Nós rompemos.

– Como?

Romperam? Eu ouvi bem? Sim, ouvi, não estão mais juntos. Isso significa sem namoro, sem encontros e sem beijos de boa-noite. Controle-se, Albus, não a deixe ver o quanto isso te deixa contente. E, ah, deixa muito, muito mesmo!

– Lawrence e eu. Terminamos. Ele queria mais do que podia oferecer e eu errei em achar que seria o bastante – ela faz uma curta pausa, observando o conteúdo da própria taça. – Não deveria tê-lo deixado gerar tantas expectativas ao meu respeito.

O modo tímido como ela fala, o quase pudor como menciona isso evidencia que, assim como eu pensara antes, ele também achava que nove encontros eram mais do que o suficiente para partir pra algo mais íntimo. E ela se recusou.

Nem dou por mim quando me levanto, furioso. Não estou exagerando quando penso que poderia matá-lo nesse momento.

– Ele – sei que minha voz está muito mais grave a ameaçadora do que deveria, mas não consigo me conter – tentou forçá-la? Por que se for esse o caso, sabia que eu iria até o fim do mundo para...

– De modo algum! Sossegue, homem – ela me interrompe, tranquilizando-me espantada com minha súbita explosão. – Como eu disse, Lawrence é um perfeito cavalheiro e jamais faria algo assim comigo.

Ótimo, deve estar pensando que eu sou doido. O que, de certa forma, não deixa de ser verdade. Mas em todo caso é melhor me sentar novamente.

– Ele não foi desrespeitoso ou grosseiro?

– Não, nem por um instante – Minerva afirma, com a mais curta de suas risadas.

– Então por que você o deixou? – meu tom é mais brando, confuso.

– Na verdade, eu não o deixei. Receio que tenha sido exatamente o contrário.

Estou perplexo. Retiro o que disse: Lawrence é que é doido, não eu.

– Por que alguém em sã consciência faria uma coisa dessas?

– Aparentemente porque eu sou fria e distante e me preocupo muito mais com meu trabalho do que com ele. E mesmo eu tenho admitir que ele está certo nisso.

Ela me olha de um jeito indecifrável por pouco mais de um segundo, depois abre um sorriso irônico. Nunca é fácil para uma mulher admitir uma coisa dessas e sinceramente me admira que ela não esteja, no mínimo, chorando. Sei disso porque todas as vezes em que fui eu quem rompeu um relacionamento tive de aguentar uma tempestade de lágrimas ou uma dama furiosa praguejando contra mim.

Mas Minerva não, é diferente até nisso. Ela apenas fica aí sentada bebendo seu hidromel, comentando ter sido rejeitada como se falasse de qualquer outro aborrecimento corriqueiro, sem importância.

– Ainda não entendo... Ele deveria se jogar aos seus pés e agradecer aos céus cada momento passado um sua companhia!

– Ah Albus, é realmente muito lisonjeiro de sua parte, mas parece que ele não pensa desse modo. Em todo caso estou feliz que não tenhamos ido longe demais com isso tudo, afinal foi melhor assim.

Também fico feliz com isso, minha querida.

– Mesmo? – ainda pergunto, enquanto me sirvo novamente. Ela pousa a própria taça, também já vazia, junto à minha sobre a mesa, num pedido mudo para que eu faça o mesmo por ela.

– Claro. E nem posso dizer que esteja realmente triste ou decepcionada. Apenas... não era pra ser.

Ela recupera seu hidromel com um de seus gestos elegantes e volta a bebericar calmamente.

Sei que isso não deveria me dar esperanças e sei que depois dele provavelmente haverão outros, mas cá estou eu lutando pra não sorrir na frente dela. E se Minerva precisar de um ombro amigo, fico satisfeito que esse seja eu.