A escuridão de piche dominava as janelas enquanto a carruagem balançava pela estrada acidentada.
Tara, entediada, passava os olhos verdes pelo campo imerso na calma silenciosa da noite. Mas, na verdade, já estava bastante cansada de ficar olhando os campos da Europa passarem pelas janelas, indo de uma cidade à outra aos caprichos de Aldric.
Já fazia muito tempo que aquela medida não era necessária.
- Chegaremos logo, Tara. Eu sei que você já deve ter se cansado da viagem agora...
Aldric Aitor Algesco du Langres, seu senhor, mestre, e pai. Algesco – nome ganho enquanto servia ao Império Romano, significando frio, gélido – era um velho vampiro de rosto carrancudo e olhos mesquinhos, que, com um nariz levemente adunco e sobrancelhas arqueadas, possuía traços finos e aristocráticos. Era muito branco, e esguio, na verdade quase franzino, e levemente encurvado, lembrando um maldoso condor decrépito.
O que Aldric dissera era demonstrado pela mudança do que se passava nas janelas: a paisagem campestre tornava-se periodicamente mais urbana, enquanto a carruagem aproximava-se de seu destino, a Londres elisabetana.
Um tempo depois, a diligência estacionou na silenciosa periferia da cidade, à frente de um imponente palacete de pedra acinzentada, levemente rósea. Toda a comitiva parou em frente à longa fachada da casa. Esta tinha uma grande porta no centro, e duas torres, uma em cada extremidade, ornadas com enfeites de ferro em seus topos, e dois andares repletos de grandes janelas de caixilhos. Por trás da fachada requintada, estendiam-se para o fundo três alas – a leste e oeste, nas duas extremidades, e uma menor, saindo do centro do prédio - que davam ao prédio uma forma a de um "E".
Das outras carruagens daquele macabro cortejo desceram, além de pertences dos mesmos, vários homens e mulheres bonitos e refinados, vestidos na última moda: rendas e pregas, tecidos finos e jóias caras.
Tara, sabendo que o palacete já estaria preparado para ser ocupado bem antes da ruidosa chegada da comitiva de vampiros, decidiu não juntar-se à corte maldita de Aldric, e sim dirigir-se imediatamente para seus aposentos, localizados na ala leste do palacete, acima das cozinhas.
No caminho, porém, encontrou Cecilia vagando contemplativa pela nova morada.
Enquanto Tara era filha de Aldric, Cecilia por sua vez era filha de Tara. A pequena vampira veio correndo até Tara, seus longos cabelos loiros levemente prateados balançando com os movimentos de seu corpinho infantil.
-Mã! – disse, jogando-se em seus braços.
- Olá, Ceci... – a frase foi interrompida por um pigarro forçado, destinado a chamar-lhes a atenção.
- Desculpe-me interromper este tocante encontro, mas tenho ordens de não deixar você fugir dessa vez, Tara. – Era Gabriel Fortier, o braço direto de Aldric. Atraente, ligeiramente alto com uma pele de cor caramelo e cabelos castanhos pouco mais escuros, Gabriel veio andando elegantemente até as duas – E pretendo cumpri-las – disse, sorrindo sedutoramente.
- É mesmo, Gabe? Aah, então acho que realmente vou ter que ir, sabe...
- Aah, mas como é teimosa e encrenqueira! Vamos, deixe de lado as ironias, Tara – disse impaciente – você sabe que ele ficará bem... irritado se você não for. E isso não seria bom pra ninguém.
Principalmente pra você pensou Tara, indo atrás do vampiro mesmo assim - estava cansada demais até para envolver-se nesse tipo de intriga.
