Oi, gente!

Antes de qualquer coisa, quero agradecer a todos que leram, comentaram alguma fic minha. Muito obrigada!

Eu estou meio doente, fato que me impossibilita sair de casa. Então, depois de muitos filmes e textos, o ócio acaba nos dando idéias. Escrevi essa fic baseada em alguns documentários que eu assisti sobre a Índia (a organização que eu coloquei é um rascunho do rascunho do rabisco feito por uma criança de 3 anos do que ocorre de fato na Índia, sem contar que eu inventei e inseri um monte de coisas que nunca existiram por lá! Só usei a idéia básica deles) misturando com um filme alemão que vi durante meu "enclausuramento". Uma fic multicultural! hahaha

Eu estou bastante insegura em relação ao que escrevi, especialmente porque não amadureceu na idéia. Escrevi ontem e já estou publicando hoje! É só um capítulo, mas a história em si, já está pronta. Na minha cabeça, né! hahaha

Talvez tenha um pouco de comédia (não aquela coisa hilariante, né), mas acho que ficará mais no tragicômico.

A idéia é falar um pouco de como as nossas vidas são coordenadas por uma rede muito complexa de convenções sociais, econômicas e como isso é facilmente destruído, reciclado, atropelando aqueles não se encaixam mais no sistema.

É meio loucura, mas mente desocupada acaba sendo oficina de muita gente!

Eu já tenho o outro capítulo no papel, com o lemon inclusive (mega apreensão em publicar. É o meu primeiro lemon e eu temo que tenha ficado um tanto...depravado).

Bom, não sei se darei continuidade a ela...Por favor, leiam!! Comentem se puderem! Digam que é rejeito nuclear se necessário!

Ah, Saint Seiya não me pertence. Esse texto é fruto de tardes frias e solitárias, para deleite (ou não) daqueles que o lêem.

Os primeiros parágrafos podem parecer meio malas, mas peço que, se chegaram até aqui, pelo menos tentem ler (nem que seja pra odiar hahaha).

Tá, chega de falar.

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Em Vasti (se fala "Vastí"), nascemos com o destino traçado. Quer dizer, nasceu avesta, será avesta... Pro resto da vida! Não dá pra se tornar suvesta... Deixe-me explicar. A divisão da sociedade dos vestas é feita em 4 estamentos. A distinção entre eles é justamente o nascimento. Não há qualquer tipo de divisão em Vasti que leve em consideração o poder aquisitivo ou a etnia. Os avestas estão no topo, o que não significa que são ricos materialmente. Eles são responsáveis pela manutenção da nossa cultura, nossa religião, do nosso conhecimento. Possuem o dom da palavra! São médicos, gurus, mestres em alguma coisa, sacerdotes... podem escolher seu caminho dentre essas possibilidades. Logo em seguida, vem o estamento dos davestas. Eu faço parte desse! Nossa função é cuidar da administração, da defesa do país. Mas também pertence a esse setor a maioria dos profissionais liberais de Vasti. Depois, temos os suvestas, que cultivam a terra, produzem as roupas. Os últimos, na pirâmide social, não têm um nome definido, mas são pessoas que acabam tendo que executar trabalhos mais subalternos, mas necessários. Esse é o princípio que rege nossa organização: todas as funções são necessárias em uma comunidade. Alguém precisa produzir alimentos, alguém precisa varrer as ruas. E essa foi a forma que encontramos de ter certeza que todas as necessidades seriam satisfeitas. Vivemos nesse sistema há, pelo menos, 3 mil anos.

Cada vesta tem certas etapas a cumprir na vida, como estudar os ensinamentos antigos até os 20 anos de idade. Nesse caso, as exigências diferem de estamento pra estamento. Por exemplo, por ser davesta, teria que servir ao exército e me apresentar sempre que me for solicitado. No entanto, eu, Shun Sagyana, não preciso cumprir tal exigência. Não mais. Eu me casei com alguém do setor superior, o que é considerado uma honra.

Em Vasti, existem muitos povos convivendo juntos. Todos os que são vestas nasceram dentro de uma religião que tem como base a sociedade de estamentos. Mas existem outras religiões e outros modos de vida em Vasti. Todavia, a maioria vesta é indiscutível. Até hoje, nunca tivemos conflitos internos por causa dessas diferenças, porque uma coisa é certa: os vestas pregam o equilíbrio e manutenção social, mas sabem absorver, ainda que lentamente, outras culturas. Para sair do sistema véstico, só renunciando ao Vestismo, nossa religião, o que é possível. No entanto, não é muito comum isso acontecer.

- Shun, cheguei! – Era Hyoga que chegava em casa. É, ele é avesta. Aliás, em Vasti, não há qualquer tipo de restrição ao número de casamentos que um "chefe de família" pode ter, tampouco com relação ao sexo dos cônjuges. Corri para a porta de nossa pequena casa. Entenda-se, BEM pequena! Mas suficiente. Foi construída horizontalmente no terreno de forma que todos os cômodos comuns – sala e cozinha - tinham visão da rua e do quintal. Em blocos, sabe? Primeiro a cozinha, depois a sala, um quarto, o banheiro e outro quarto. Tínhamos planos de aumentá-la...

- Oi, meu amor! Achei que demoraria mais... – Hyoga enxugava os pés com uma toalha. Ele não usava sapatos. Na verdade, poucos vestas usam sapatos. Não pergunte o motivo! Eu não saberia responder... Eu também não os uso, por isso, temos um lavapé na soleira de casa. Parei na sua frente esperando que terminasse sua tarefa. Ele estava sem camisa por causa do dia estava quente e um simples colar de pedras azuis balançava no seu pescoço de acordo com seus movimentos. Ah, em Vasti, não se usam calças. É considerado anti-salutar. Todos usam "saias", ou melhor, sahis que vão até os pés. Pras mulheres, há modelos que marcam mais a silhueta, por exemplo. Mas se quiser calça e encontrar alguma à venda por aí, pode usar. Ninguém vai proibir.

Assim que terminou, pendurou a toalha no cabide no batente da porta e eu o abracei. Me beijou na testa pra depois seguir para a minha boca. Foi um beijo rápido.

- Minha delícia... – Hyoga gostava de me chamar de "delícia" e eu me sentia um pequeno tesouro. Pelo menos, praquele homem, eu era um tesouro. – A marca já está saindo de novo. Depois do banho, me lembre de refazê-la, está bem? – Ele se referia à marca que temos no meio dos olhos. Dependendo da cor, indica seu estado civil. A nossa era vermelha. Não preciso dizer o que significa, né? Aliás, aqui tem marcas pra tudo. Mas explicar seria chato e... inútil.

– Como foi o seu dia? – Ele me perguntou seguindo para a cozinha, que ficava à direita da sala. Lá cabiam apenas duas pessoas, além, claro, dos eletrodomésticos, armários. Aqui, em Vasti, conseguir essas coisas é demorado. Só existe uma fábrica pra cada um em um processo quase artesanal. Assim, quando os casais têm filhos homens, já encomendam pra que, aos 20 anos do rapaz, tudo esteja pronto e ele possa casar. Casar é obrigatório. E também é obrigatório ter, pelo menos, um filho homem. Bom, você perguntaria como eu consegui casar com um homem se há todas essas condições? Eu sou o segundo casamento do Hyoga. O primeiro foi, obviamente, uma mulher. Assim que ele terminou os estudos, teve que casar. É o natural por aqui. Então, casou-se com uma prima para cumprir sua função social. Mas ele queria mesmo era casar comigo. E foi isso que aconteceu! Eu ainda não tinha voltado do meu aprendizado e ele pediu ao meu responsável, no caso, meu irmão, que me concedesse em casamento. Como Hyoga era do setor superior e já tinha uma mulher, significava que eu entraria em uma família que certamente teria um filho homem... Meu irmão nem se cabia de felicidade porque era, como eu já disse, uma grande honra. Quando voltei, recebi a notícia. Não me contive também. Eu e ele sempre fomos apaixonados um pelo outro...

- Estava passando um pouco de roupa. – Apontei a tábua de passar na sala, em frente à televisão. Ele observava da cozinha. Nós tínhamos feito uma espécie de janela da cozinha pra sala. Pelo menos, não ficava tão claustrofóbica.

- Hum... Então, chega disso. Vem tomar um chá comigo, meu amor. – Hyoga tinha uma voz melodiosa que ele sempre soube usar muito bem. Quase sempre falava como quem dá uma ordem, mas disfarçada de pedido. E era difícil não obedecer... Começou a servir longos fios de chá com uma cor avermelhada que fumegava. Sempre tinha chá pronto em casa. Ele se esticou pela passagem depositando os copinhos de porcelana na mesa colada ao balcão. Apreciei cada um de seus movimentos como quem olha o mar pela primeira vez. Tudo que Hyoga fazia trazia o deslumbramento de uma primeira vez... Ele vinha saindo da cozinha, dando a volta, a fim de sentar à mesa. Assim que passou por mim, me agarrou pela cintura me levando consigo. Hyoga era um homem forte, na medida certa. Eu era mais magricela...

- Não quer beber um pouco antes do banho? – Ele sussurrou ao meu ouvido aproveitando para lamber o lóbulo da minha orelha.

- Ah, Hyoga... – Gemi com o toque me segurando no seu pescoço. Logo, senti a cadeira embaixo de mim. Sentou-se à cabeceira sorrindo. Eu disse que a casa era pequena, né. Pois bem, a mesa tinha apenas 3 cadeiras, encostada ao balcão. Era fácil servir as refeições! Ele empurrou uma canequinha em minha direção se servindo da outra.

- Não me diga que seu dia se resumiu a passar roupas? – Tomou um gole de chá.

- Não, não. Na verdade, não teve muito movimento hoje... – Esqueci de dizer! Sou boticário. É um trabalho relativamente simples. As pessoas trazem as receitas médicas e eu as preparo. No entanto, é preciso conhecer ervas muito bem. E saber decifrar caligrafias bizarras também! Ah, quanto ao pagamento, existem várias formas. Alguns pagam com comida, outros com moedas, outros ainda com tecidos. Na semana passada, uma moça me pagou com uma pintura em henna. Pintou minhas mãos e meus pés. E fez também pequenos círculos negros ao longo da minha coluna. Fazia tempo que não os pintava...

Coloquei os cabelos loiros relativamente compridos (na altura do ombro) do meu companheiro atrás de sua orelha enquanto sentia seu olhar sobre mim. Ele tinha a pele morena, uma cor linda, que contrastava com a minha, meio branca demais... Hyoga era muito estudado e, como avesta, tinha grande conhecimento de sistemas de pensamento. Quando me olhava assim, parecia que estava acariciando a minha alma.

- E você? Fez muitos atendimentos hoje? – Hyoga era médico, esses médicos de família. Temos hospitais, tudo direito. Mas esses médicos de aldeia são comuns em Vasti, e as pessoas confiam muito neles. Ele saía umas duas vezes por semana pra fazer consultas. O resto passava em casa, estudando e ensinando ao seu discípulo. Às vezes, alguns apareciam, procurando por ele, pedindo conselhos ou consultas. Hyoga nunca se recusou a receber ninguém.

- As pessoas estão preocupadas com seus destinos. – Ele fez um olhar misterioso, bebendo mais chá e olhando pela janela da sala, acima da televisão, a posição do Sol. – Com medo que Vasti deixe de ser Vasti. – Eu sabia do que ele estava falando. Nosso modo de vida estava ameaçado. O país vizinho, Kundera, estava com pretensões em relação a nós e todos temiam que houvesse uma guerra. E se houvesse, provavelmente perderíamos. Kundera era poderoso demais, e sua organização, diferente da nossa. Lá, a sociedade se dividia por nível de poder aquisitivo, isso significava que era uma sociedade baseada no mérito pessoal. Isso era estranho para os vestas...

- Eu... – Ele me olhou profundamente de novo e eu apenas disse que acreditava que tudo ficaria bem. Ele pegou minha mão, beijando-a e sorrindo.

- Onde está o Saras? – Se diz "Sáras", certo? Ele bebeu o último gole de chá, se levantando.

- Estudando. Ele passou o dia fazendo isso... – Hyoga conferiu o relógio olhando novamente a posição do sol. Eram 20 pras seis.

- Está na hora do nosso banho. Vamos? – Ele pegou a minha canequinha vazia seguindo pra cozinha. Enquanto lavava a louça, perguntou se Ikki e June iriam. E respondi que "talvez" e que averiguaria. Ikki, meu irmão, morava na casa em frente, tão grande quanto a nossa, com sua esposa June. Ainda não tinham conseguido ter nenhum filho. Assim que abri a porta de casa, trombei com ele.

- Oi, Shun! Vim saber se irão ao rio? – Ikki também não usava camisa. Ele não andava com os balangandãs que Hyoga usava, como colares, às vezes uns brincos... Os avestas gostam de se enfeitar mais. Ikki pegou a toalha no batente, secando seus pés.

- Vamos sim, Ikki. Entre e espere um pouco. – Disse meu companheiro da cozinha antes que eu pudesse responder. Abri espaço para meu irmão passar. Ele me deu um beijo na bochecha, encostando a testa por alguns segundos na de Hyoga, que já estava ao meu lado. Os "chefes de família" costumam se cumprimentar assim em Vasti.

- Onde está a June? Não vai hoje? – Eu fechava a porta vendo Ikki sentando-se no sofá.

- Não, não vai. Está ajudando uma amiga que vai se casar. – Meu irmão se espreguiçava no móvel enquanto Hyoga permanecia em pé, meio aéreo. Tirei-o de seu transe:

- Hyoga, e o Saras? Vá buscá-lo, por favor. – Ele se sobressaltou.

- Ah, sim! Eu já volto. – Ele seguiu pelo corredor. Era possível ver nosso quarto no final. Do lado direito, ficava o quarto do Saras.

- Ikki, quer tomar chá antes de ir? – Ofereci pegando a sacola que eu já preparara com algumas roupas, ao lado da tábua de passar. Aliás, devia ter desmontado essa porcaria.

- Não, Shun, obrigado. Tomei em casa. – Ele se levantou assim que viu Hyoga vindo pelo corredor de mãos dadas com Saras, nosso filho e seu aprendiz. Saras tinha 7 anos e era um menino pequeno para a sua idade. Tinha os cabelos curtos, densos, loiros como os de Hyoga, mas seus olhos eram de um verde muito claro. Ele tinha a beleza latente do pai, mas uma fragilidade que certamente, meu marido não demonstrava ter. Eu o considerava meu filho. Saras era fruto do primeiro casamento de Hyoga, com aquela tal prima. Ela morreu em um parto improvisado nascendo ele, antes da hora. Hyoga fez de tudo para que eles sobrevivessem, mas ela não resistiu. Não era uma mulher muito forte... Na verdade, nenhum homem queria desposá-la. Nós então, o criamos. Hyoga não quis mais casamentos depois do que aconteceu julgando que a dor de perder alguém que se estima era muito intensa e não queria passar por aquilo outras vezes. Foi realmente um episódio muito triste em nossas vidas.

- Oi, tio Ikki! – Ao ver meu irmão, ele se soltou de Hyoga vindo correndo em sua direção. Saras adorava o Ikki.

- Garoto, você cresceu? Está comendo mais? – Ikki o media com a mão.

- Sou grande! Não sou, pai? – Hyoga apenas sorriu bagunçando o cabelo do pequeno dizendo que tudo tem sua razão. E que se ele era daquele tamanho, é porque era assim que tinha ser.

- Portanto, o seu tamanho é ótimo, meu filho. – Ele se agachou, ficando em frente ao menino. Saras abriu um sorriso dando um beijo em Hyoga que o pegou no colo.

- Ou seja, um perfeito tampinha! – Completou Ikki lançando um olhar em direção ao menino que me fez rir. Hyoga o colocou no chão e rapidamente ele correu pra perto do meu irmão, dando-lhe um chute na canela.

- Augh! Até que é forte pra um nanico... – Falou Ikki massageando o local arrancando uma risada discreta do meu marido.

- Saras, que coisa feia! – Dei-lhe uma bronca ouvindo um "foi ele quem começou" em resposta. - E Ikki, deixa de implicar com o garoto o tempo todo! Vai deixá-lo complexado... – Falei dando as costas para todos me dirigindo para porta.

O rio ficava a 20 minutos de nossa casa. Íamos andando, conversando, encontrávamos de vez em quando, alguém conhecido. Nesse momento, as ruas ficavam cheias. Todos queriam ir ao rio para o "banho do pôr-do-sol". Lá longe, no horizonte, víamos a outra margem. Uma floresta. Era preciso descer algumas escadarias. Longas escadarias para se chegar às águas. As escadas o invadiam e era como se você descesse literalmente, dentro do rio. Todos seguiam pra lá como que em uma romaria comandada por aquele ente vivo, o rio... Os rios são muito venerados entre os vestas. Eles comandam nossa vida, praticamente. Aliás, atrás de nossa casa, passa um rio que comparado a esse, é minúsculo. Enche no verão, banhando nosso quintal fertilizando a terra. Era ali que eu plantava as ervas que usava nos remédios. Hyoga ia na frente, com Saras em seu encalço. Eu os via de longe e não conseguia imaginar minha vida sem aqueles dois. Hyoga era um homem lindo. As mulheres não evitavam olhá-lo. Como ele se destacava na multidão com seus cabelos loiros, aquela pele morena, os enfeites nos lugares certos, sem exageros... Fiquei viajando em seus movimentos, no modo como ele conversava com nosso filho e cumprimentava os outros. Nisso, acabei tropeçando na rua.

- Opa, Shun. Está com as pernas tortas é, irmão? – Ikki me havia segurado rápido pelo braço impedindo que eu desse de cara com o chão.

- Não... – Respondi me recobrando. – É que essa visão é muito... inebriante. Não acha? – E como era!

- Sim, muito lindo mesmo... Somos abençoados. – Ikki olhou em volta enchendo os pulmões.

-É, somos... – Sorri ao ver Hyoga e Saras se darem as mãos.

O rio principal de Vasti, e o mais sagrado. Como muita gente vem até aqui, o governo resolveu colocar corrimãos para facilitar a entrada no mesmo. Algumas partes são fechadas para aqueles que não sabem nadar ou que possuem alguma limitação. Estava cheio. Encontramos um lugar próximo a uma das grades (são muito úteis pra estender a roupa molhada). Hyoga quem nos dava banho entrando primeiro na água. Ele agradecia aos deuses por estarmos vivos batendo as mãos no alto. Começava por Saras, seguido por mim, terminando com Ikki. Sim, era de roupa mesmo. Julgando que tudo que usávamos eram os sahis, não havia muito o que molhar. Enquanto banhava nossos corpos, ele dizia palavras de amor, de devoção de antigos textos de nosso povo.

Terminado nosso ritual, ficávamos sentados um pouco por lá aproveitando o frescor das águas, a paisagem. O sol começava finalmente a se pôr tingindo o horizonte de vermelho.

- Devíamos ter trazido o jantar! – Comentei sentando-me ao lado de Hyoga nas escadarias. Ele enlaçou minha cintura apertando de leve minhas carnes. Eu as tenho, viu! Deitei em seu ombro passando meu nariz em seu pescoço. Ele tinha um cheiro já quase natural de especiarias.

- Shun... – Mirei seus olhos prestando atenção. – Será que seu irmão e a June se importariam em ficar com o Saras essa noite? – Eu sabia o que ele planejava. Estava querendo aquilo desde o início da semana.

- Acho que não tem problema. Mas por quê? – Eu adorava ouvir a razão.

- Eu quero te ver se contorcendo de prazer... – Ele sussurrou ao meu ouvido pousando seu olhar sério em mim. Derreti ao senti-lo assim. Quando eu disse que os avestas tinham o dom da palavra, não era mentira! Eu podia imaginar a boca dele no meu corpo antes mesmo que ele pensasse em se mover. Hyoga tomou meus lábios lambendo-os por dentro. Ele sempre me teve nas mãos, apesar de eu saber que a sua dependência em relação a mim era igual ou maior. Alternávamos movimentos com a cabeça devagar e... aquele beijo se tornava impróprio para o lugar! Nos afastamos ao mesmo tempo sorrindo um pro outro. Ele se virou para o rio ainda me abraçando e eu enlacei meus dedos aos dele, deitando em seu ombro. Ikki e Saras brincavam na água, apostando corrida.

- Então, o que me diz? Será meu essa noite? – Ainda olhávamos o rio.

- Hyoga, eu sou seu desde que eu nasci... – Respondi olhando nossas mãos unidas. Ele riu respondendo que o contrário também era verdadeiro. Ficamos assim mais alguns minutos, até que ele me deu um beijo na testa de levantando.

- Vamos, gente! – Gritou pros dois na água.

- Ah, pai, só mais uma! Por favor! – Saras gritou de volta e Hyoga apenas concordou vindo pra perto me erguendo.

- Pode arrumar nosso filho enquanto falo com o Ikki? – Ele passava as mãos pelos meus cabelos ainda meio úmidos. Nossos corpos estavam praticamente secos dado ao calor do dia. Peguei um sahi na sacola que eu trouxera entregando a ele; sabia que iria querer trocar o que usava. Lancei-lhe um sorriso descendo as escadas para falar com Saras.

- Saras, filho, vamos! Você precisa jantar! – Ikki vinha trazendo o menino por um braço deixando-o nervoso. Subi um pouco pra onde os degraus estavam menos molhados vendo Hyoga se trocar próximo ao corrimão. Ficar nu ou seminu em público não era incomum em Vasti.

- Tio, ME SOLTA!

- Parece um saquinho de batatas de tão leve. – Ikki colocou o menino nos meus braços, completando a frase – Shun, estão dando de comer pra essa criança? – E ria enquanto comentava.

- Melhor que ser um gordo que nem você!

- Saras, isso é jeito de falar?

- Gordo? Sou forte, moleque! Forte! – E fez uma pose máscula me fazendo rir. Coloquei o garoto no chão me ajoelhando em sua frente. Ikki nos olhava com um sorriso carinhoso.

- Está nadando muito bem esse seu filho, Shun. – Ele comentou enquanto eu livrava o Saras do sahi molhado enxugando seu corpo em seguida.

- Ele aprendeu com o mestre da natação, Ikki.

- É? Quem, moleque? – Ikki enchia o peito achando que seria agraciado com o título que eu acabara de criar.

- O Shun, ué. – Ele respondeu inocentemente enquanto eu o vestia. Ele sabia se vestir sozinho, mas eu adorava essa tarefa.

- Shun? O MEU irmão? – E encarava o menino.

- Shun, o MEU pai, tá? - Encarando-o de volta.

- Magrelo desse jeito? Só consegue nadar em banheira. – Disse ele com certo desprezo querendo me atiçar.

- Ei, olha como fala comigo, hein! – Ikki já ia me dirigir outras de suas respostas provocativas quando Hyoga chegou perto.

- Isso mesmo. Veja lá como fala, Ikki. – Sorriram. – Posso falar com você um instante? – E desceram alguns degraus enquanto eu me levantava.

- Saras, pegue um sahi pro seu pai, por favor. – Ele buscava na sacola e eu ia retirando o molhado. Assim que coloquei um seco, sentei-me no degrau puxando meu filho para o colo. Hyoga e Ikki conversavam animadamente um pouco mais abaixo.

- Estou com fome... – Saras deitou sua cabeça loira em meu peito puxando o sono.

- Daqui a pouco já vamos embora. – Falei tão baixo que nem sei se ele ouviu. Na beira do rio, muitos faziam o mesmo com seus filhos, outros comiam e famílias inteiras ficavam dentro da água. Cenas assim me faziam imaginar que não haveria, no mundo, melhor lugar que Vasti... E naquele momento, eu me sentia tão feliz que poderia morrer. Apertei um pouco mais meu filho no colo sentindo ele me envolver se aconchegando. Hyoga e Ikki encostaram suas testas, vindo em nossa direção. A conversa já tinha acabado.

- Vamos, querido? - Disse Hyoga se agachando e acariciando a cabeça do Saras.

- Até que enfim... – Ele respondeu sonolento sendo logo erguido por Hyoga, que o segurou em um braço me oferecendo o outro para me levantar. Assim eu fiz, mas me desequilibrei caindo de bunda no chão. Em um ato reflexo, meu irmão tentou me segurar, mas sem sucesso.

- Shun, tá parecendo fruta madura! Caindo toda hora! – Ikki já tinha me levantado enquanto eu massageava um dos meus glúteos.

- Machucou, meu amor?

- Não, foi só uma quedinha à toa. – Saras riu um pouco fingindo não ter visto nada, deitado de olhos fechados no peito do Hyoga.

- Rindo, né? Vai levar um castigo. – Eu disse subindo as escadas com a sacola sendo seguido pelos três. Na mesma hora, ele levantou exibindo uma carinha chorosa.

- Mas, pai, foi engraçado! Poxa... – Estávamos no topo das escadarias e as luzes nos postes começavam a acender. A cidade não era assim tão bonita, as casas se aglomeravam de forma meio caótica, mas, pra mim, era o lugar mais bonito do planeta...

- Não quero nem saber. Vai dormir na casa do seu tio hoje! – Eu já sabia que Ikki não teria problema em ficar com Saras naquela noite. Nós sempre arrumávamos um jeito para que ele não descobrisse cedo demais todos os tipos de relações que existiam entre um casal. Quando chegasse a hora, Hyoga, como seu mestre, explicaria.

- Ah, não!! É horrível demais! Não quero! Pai, não deixa! – Saras sempre fazia isso. Quando um lhe dava uma bronca, pedia arrego ao outro. Mas ele sabia muito bem que raramente eu e Hyoga anulávamos a autoridade um do outro.

- Ué, você vai ter que aceitar a punição, filho. – Era bem verdade que sabíamos que o Saras adorava ficar na casa do meu irmão fazendo esses joguinhos de criança apenas pra ver se nós faríamos a sua vontade.

- Ei, e por que eu tenho que pagar pela má criação desse moleque? – Resmungou Ikki fingindo-se realmente emburrado.

- Porque eu não tenho mais pra onde mandá-lo pra ficar de castigo, Ikki! Ou você quer que eu o deixe sentado no quintal a noite toda? – Respondi. Saras estar de castigo em casa ou não, era a mesma coisa. Ele passava grande parte do seu tempo estudando, fazendo exercícios respiratórios no quintal ou no quarto. Poucas vezes brincava com outras crianças, até porque as outras também estavam estudando.

- Até que não é má idéia... – Falou Hyoga pensativo trazendo terror aos olhos do menino.

- Não, tem muito mosquito! Vou ficar todo vermelho!

- Bem feito, moleque! Não quis rir do seu pai? – Ikki falava vitorioso.

- Mas foi sem querer! – Ele se sacudiu nos braços de Hyoga querendo ir pro chão. Assim que chegou, parou na minha frente. – Desculpa, pai. Eu não quis rir do senhor. Doeu muito a sua bunda? – A pergunta foi feita de um jeito infantil e eu não pude evitar um risinho.

- Não, filho. Já passou.

- O senhor me desculpa? – Ele perguntou olhando os próprios pés.

- Claro que sim. Afinal, foi sem querer, não foi? – Ele levantou seu rostinho todo satisfeito.

- Foi! Eu prometo que não faço mais. – Passei a mão na sua cabeça olhando para Hyoga.

- Isso significa que não precisará mais passar mais a noite no seu tio. – Continuávamos o caminho pra casa, vendo as luzes nos predinhos e casebres aparecerem, uma ali, outra aqui. Saras parou de repente ficando um pouquinho pra trás.

- Saras, o que foi? – Perguntei vendo-o muito pensativo. Ele sorriu dizendo:

- Pensando bem, eu fui muito mau. Melhor ficar de castigo, não acha?

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E aí, merece continuação?