Disclamer: Os personagens de Saint Seiya pertencem a Masami Kurumada e a ele todos os direitos são reservados. Mas os sobrenomes dados aos cavaleiros nesta fanfic são de minha autoria. A Música incidental é "Ring of Fire", de Johnny Cash e composta por June Carter.

Nota: Esta fic é uma side-story de "The Gold Saints" e portanto UA, contando o começo do relacionamento de Miro, mencionado por Câmus no capítulo III. No entanto, as duas fanfics são bastante independentes e uma não necessita da outra para ser compreendida.

Como Cash e Carter

Capítulo I – Burning Thing

Estava a olhá-la por algum tempo. Parecia perdida, uma peça fora de lugar. Não que fosse feia. Muito pelo contrário. Os cabelos roxos na época, lhe caíam muito bem sobre os olhos verdes. Mas estar distraída com um livro num bar como aquele, numa hora como aquela, era no mínimo surreal.

Tentou enxergar a capa do exemplar e inclinou a cabeça, apoiando os braços sobre o balcão. Distraiu-se com as pernas finas e bem torneadas que ficavam a mostra naquele macacão escuro, tão curto como era. Tentou ler.

"Yôga, Sámkhya e Tantra".

- Bom, isso não ajuda muito.

- E o que vai ser, amigo?

- Ahm... Vodka, por favor.

Continuou a observá-la. Parecia alheia aos sons e a gritaria da banda ao fundo do salão. Pessoas iam e vinham e ela parecia estar em um mundo à parte. Tomou um gole de sua bebida e pensou em alguma maneira de se aproximar. Não sabia o porquê, mas não conseguia. Logo ele, que nunca tivera problemas para isso.

Não era a primeira vez que a via. Há dias tentava imaginar como abordar uma gata que ia até aquele lugar, sozinha, para ler. E até agora não encontrara uma resposta.

Tentou passar pela multidão na direção daqueles puffs adiante, decidido a acabar com aquele fetiche. Ela podia ter uma cor incomum de cabelo, mas ainda era uma mulher e não uma fera. Podiam ser os olhos. Talvez o corte de cabelo, que deixava o longo pescoço à mostra para tentá-lo. Ou talvez tudo junto, somado àquele corpo esguio. E aquilo só acabaria quando fizesse alguma coisa.

Sentiu um solavanco. Tarde demais. A bebida escapara do recipiente antes que pudesse impedir. E como sua sorte ia bem nos últimos dias, o líquido tinha que escorrer exatamente nas pernas de quem tanto tinha observado. Invejou a bebida por um instante, num lapso de desejo. Mas praguejou pelo desastre. Ela soltara o livro bruscamente e levantava-se, com as faces tomando uma cor diferente.

- Idiota.

Love is a burning thing
and it makes a firery ring
bound by wild desire
I fell into a ring of fire...

Aqueles lábios finos e ao mesmo tempo tão carnudos, vermelhos como uma cereja madura. Sentiu-se hipnotizado pelo modo como eles se moviam e por como a franja insistia em tocá-los levemente. E havia aquele tom de voz frio e sem emoção. Ao mesmo tempo tão cálido.

E de repente, com aquela única palavra, ele a queria. Um desejo incontrolável lhe tomava.

- Desculpe, eu... Me distraí por um instante.

- Eu notei. – forçou um sorriso.

E então ela finalmente encarou aqueles olhos azuis. Sentiu-se numa nevasca. Gelada como nunca estivera. Não sabia o que fazer.

Pegou o livro de volta, fazendo menção de sair.

Ele a impede, pondo-se em seu caminho.

- Por favor, não quero estragar sua noite.

- Escute, eu não sou esse tipo que está procurando.

Tentou sair outra vez. Mas ele ria. E aquele sorriso... Aquela malícia nos olhos... isso a congelou sobre o chão.

- E quem disse que estou?

A raiva lhe deu alguma força nas pernas e desta feita, parecia que conseguiria sair dali.

- Você é um idiota. – murmurou ao passar por ele, esbarrando em seus ombros.

Novamente aquelas sílabas. Aquele som lento e prolongado, quase musical. E havia aquele hálito doce que o arrepiou por inteiro.

Puxou-a pela cintura para perto de si e deixou que o calor das palavras alcançasse seu pescoço.

- Eu derrubaria minha bebida de propósito, se soubesse que repetiria o que disse...

Ela se vira bruscamente, indignada com a ousadia do rapaz, enquanto ele notou, ainda tonto, que havia uma tatuagem na nuca da garota.

- Você é algum tipo de maluc...?

Aquela era a deixa que ele tanto buscara e não a perderia. Talvez ela fosse uma fera. Mas ele finalmente sabia o que fazer. E assim tomou aqueles lábios com um desejo incontrolável de ter mais do que um beijo. E ali naquele bar, ela cedeu ao beijo dele pela primeira vez, sem sequer saber qual era o seu nome.

I fell into a burning ring of fire
I went down, down, down
and the flames went higher.
And it burns, burns, burns
The ring of fire
The ring of fire

Um beijo tão intenso que parecia não ter fim. E ela não queria que tivesse. Sabia que era loucura, mas a maneira suave como ele tocava sua nuca e a intensidade com que apertava sua cintura e como subia pela parte nua das suas costas com firmeza e desejo faziam com que esquecesse disso. E com um dos braços presos no minúsculo espaço que havia entre eles, ainda segurando o livro, não sabia exatamente o que fazer.

Quando finalmente se separaram ainda estava ofegante. Demorou para perceber que ele lhe estendia a mão para cumprimentá-la com aquele mesmo sorriso malicioso e perturbador.

- Miro Christakis.

Ela riu-se da ousadia e segurança exagerada que ele tinha. Resolveu que poderia quebrá-la pelo menos um pouco e sentir-se menos tola pelo que acabara de fazer.

- E suponho que isso é o nome científico de algum crustáceo.

E esperou alguns segundos. Esperou aquela expressão específica. Aquela perda de atitude e de voz quando alguém ficava sem jeito e não sabia o que dizer. Somente quando teve certeza de que o deixara novamente inseguro, é que lhe retribuiu o comprimento e ficou um pouco mais séria.

- Débora.

- Débora... Podemos esquecer aquela parte desastrosa e recomeçar?

- Já está na minha hora, desculpe sr. Chris... Como é mesmo?

- Me chame de Miro. Eu às vezes me esqueço que por aqui o sobrenome não é muito usual.

- Por aqui? - riu-se. - De que planeta você veio?

- Grécia.

Ela tentava desvencilhar-se do cumprimento ainda, mas ele continuava sem soltar sua mão, com aquela expressão sedutora e misteriosa.

- Claro. E eu da Índia.

- E que outro país me daria um sobrenome que parece uma piada de cunho científico?

- Você não tem sotaque.

- Já faz alguns anos que vivo em São Paulo.

- Sei. A gente se vê por aí, sr. Chris. Estou mesmo de saída.

Ele a encara com os olhos apertados por um instante.

- Prazer em conhecê-la, Débora.

E quando a moça tentou soltar a mão novamente, sentiu o solavanco. Ele a puxara pela mão estendida para roubar-lhe outro beijo, desta vez mais curto, mas não menos provocante.

- Tenta não esquecer de mim. - sussurrou.

- No seu país te contaram que a falta de delicadeza ficou no tempo das cavernas?

- E que o elemento surpresa revela nossos desejos mais íntimos.

- Hum.

Mordiscando os próprios lábios com malícia, Débora passou os dedos sobre a boca dele e aproximou o rosto, como se fosse beijá-lo. Miro desarmou-se, seduzido pelos olhos verdes que o hipnotizavam.

- A filosofia é fajuta, mas a teoria até que é interessante.

Ela afastou-se sorrateira, partindo do local deixando-o ainda mais louco que antes, sem fôlego para fazer mais do que admirá-la partir e imaginar mais detalhes daquela fera dos lábios picantes.

I fell into a burning ring of fire
I went down,down,down
and the flames went higher.
And it burns,burns,burns
The ring of fire
The ring of fire

Mas não voltou a vê-la naquele bar nos dias que se passaram. E beijá-la tinha sido pior do que se não o tivesse. Porque agora ele precisava de mais. E sabia que ela não sumiria de sua cabeça enquanto não a tivesse.

Concluiu que naquele lugar não mais a encontraria e lembrando-se do livro que ela lia, buscou algum instituto de Yôga na região. E havia somente um deles que seguia a linha que dava nome ao exemplar, que era uma tal de SwáSthya. Pelo que conseguira descobrir a respeito, era o método mais antigo e tradicional que haviam decodificado até então.

Sempre que podia, passava em frente à instituição, em dias e horários diferentes. E naquela tarde já estava se achando idiota o bastante para acabar com aquela bobagem. Entrou e perguntou se alguém com o nome dela trabalhava ou estudava lá. Nada.

Numa última tentativa, tentou descrevê-la, já que era uma visão bastante incomum. Se a conheciam por ali. E foi quando ele disse a cor do cabelo de Débora que a atendente sorriu e o fez acompanhá-la até a porta de saída. Apontou exatamente para o outro lado da rua, na direção de um SEBO.

Agradeceu e saiu. Duvidava que fosse encontrá-la, mas quando passou pelo meio fio conseguiu avistá-la nos fundos do local. Sentada numa banqueta e com os pés sobre outra, totalmente fora do mundo. Lendo.

Miro sorriu.

- Hm. Isso é que eu chamo de não enxergar o que está na frente do nosso nariz.

Entrou no local e parou na seção de relíquias musicais. Queria que ela chegasse até ele desta vez. Olhou mais uma vez de relance e ficou boquiaberto, sentindo o corpo incendiar. Ela lia nada menos que o Kama Sutra. Se ele tinha alguma chance de esquecer aquela garota, a chance acabara ali.

Ela finalmente o avistou e levantou-se, fingindo que não se lembrava dele ou que não o tinha visto todas as vezes que passara pelo outro lado da rua. Achava incrível que a tivesse encontrado tão rápido.

Preocupava-se que ele fosse algum tipo de maluco perigoso e não tinha muito orgulho de tê-lo deixado beijá-la antes de saber seu nome. Ela não costumava ser assim. Mas tinha alguma coisa nele que a seduzia.

- Procura algo em especial?

Miro entrou no jogo de Débora, ainda distraído com o livro que ela segurava.

- Muito especial. Destas que a gente não encontra por aí fácil.

Débora sorri maliciosa.

- A seção de raridades é esta da esquerda, mas que tipo de música?

- Do tipo proibida e inesquecível.

Ela continuou fazendo de conta que não entendia a ambiguidade e sustentou o sorriso.

- Os cds de Rock são sempre os primeiros que saem.

- Alguma coisa do Jerry Lee Lewis, talvez.

- Sério? - arqueou a sobrancelha.

- É um gosto muito incomum ou muito ruim?

- Incomum para um grego.

Ele ri.

- E o que a levou acreditar na minha nacionalidade de repente?

- O formato do nariz. - continuou ela com ar de gozação, enquanto passava o indicador pelo próprio nariz imitando o formato do dele.

Ela estava tirando sarro dele deliberadamente, o que o irritou um pouco. Riu sem jeito. Também podia significar que ela estava pensando em aceitar o flerte.

The taste of love is sweet
when hearts like our's meet
I fell for you like a child
oh, but the fire went wild…

- Vou ficar te devendo desta vez, mas tem alguma coisa de Ray Charles, Elvis Presley e Johnny Cash que podem te interessar. Esses caras faziam som de verdade antes das facilidades da tecnologia, não é?

- Se eu dissesse que concordo totalmente ia parecer que estou cantando você?

- Não, se resolvesse levar alguma coisa.

- Johnny Cash.

- Deixa eu ver... - Débora esgueirou-se sobre a prateleira para o encanto do rapaz, que estava adorando olhar para aquela tatuagem e imaginar se haveriam outras. - "I Walk of the Line", "At Folsom Prision"... Estes são os últimos em bom estado.

- Cara, estes são das antigas!

Débora acha certa graça no modo como ele esquecera-se do mundo e da pose galanteadora com aqueles álbuns na mão, como uma criança que encontrou a figurinha que faltava para sua coleção.

- Suponho que vai querer levar os dois.

Ele tenta se recompor.

- Claro.

- Vem comigo até o caixa.

Seguiram para os fundos da loja em silêncio, onde ele pagou pelos exemplares, tentando disfarçar que tremia. Ele não sabia dizer o que aquela garota tinha de especial. Mas o fato é que havia algo no modo como ela falava que o fazia perder o controle. E agora tinha aquele livro para piorar as coisas...

- Sabe, foi um bocado difícil encontrar você.

- Não foi o que pareceu.

- Mas foi.

- Sei.

- Talvez a gente possa sair um dia desses.

- Talvez.

- Tem compromisso na sexta?

- Bom, sabe... Tem um livro que eu to terminando de ler, então não acho boa idéia.

- Definitivamente. - disse sem pensar, lembrando-se novamente do exemplar.

I fell into a burning ring of fire
I went down,down,down
and the flames went higher.
And it burns,burns,burns
The ring of fire
The ring of fire

- Definitivamente o que?

- Ah, que... Hm. Bom, na semana que vem eu tenho uma folga de sábado. Posso te pegar as sete, se me disser o endereço.

- De sábado a gente fecha às oito. Se puder ser às nove, eu te espero aqui em frente.

- Ótimo, então... Então até sábado.

- Ei, não tá esquecendo de nada?

O coração dele parou por um instante. Voltou-se.

- Seus clássicos raros e proibidos.

Tomou ar em um misto de alívio e decepção.

- Obrigado pela ajuda.

- Até o outro sábado, Chris.- piscou.

Aquela boca. Aquele olhar. Conteve-se. Não podia arriscar prejudicar o emprego da moça. Saiu às pressas. Estava muito calor naquele lugar.

- Bem diz o Câmus... raio de país quente dos infernos.

I fell into a burning ring of fire
I went down,down,down
and the flames went higher.
And it burns,burns,burns
The ring of fire
The ring of fire

Continua...

N.A.: Bom, desde que comecei a fic The Gold Saints que este casal me veio a cabeça e foi um "boom" de idéias que não caberiam só naquela fic. Então aqui está, meu ibope favorito, fazendo o que ele faz de melhor! Considerem que, por enquanto, estamos falando de alguns anos antes do que se passa na The Gold Saints. Quando ela finalmente ficarem contemporâneas e se interligarem eu aviso, mas vocês perceberão sozinhos! ^^'

Há muito tempo que eu queria fazer uma personagem mais picante para o Miro e então pensei bom... A Sofia foi um bom castigo para o cavaleiro de ouro que aprontou todas, mas agora neste UA que ele é um "zé-ninguém" eu posso dar um grande prêmio! E surgiu a Débora assim, sem mais nem menos, quando eu comecei a pensar no capítulo do Câmus. Capítulo, aliás que foi um parto, já que eu escrevia uma linha dele e 10 desta fic! XP

Um presente para todas as fãs do Miro! Espero que gostem tanto quanto eu do veneno intenso desta fic. XD

Comentários são sempre bem vindos também!