In our bedroom after the war
Wake up
Say good morning to that sleepy person lying next to you
If there's no one there, then there's no one there
But at least the war is over
Eu queria poder dizer que me arrependo, mas eu cairia na risada segundos depois de dizer uma barbaridade dessas. Não dá pra se arrepender de algo que parece tão certo, algo que esteve oculto de baixo da minha pele e nos meus ossos por uma vida e que me levava em direção a ele como a própria gravidade. Não é algo que eu possa lutar contra, ou arranjar uma justificativa racional. Não há nada de racional nos impulsos, nos instintos e na forma com meu coração reage imediatamente quando ouço o som da voz dele.
Algumas coisas não foram feitas para serem entendidas, eu acho. Elas apenas existem, a despeito de nosso bom senso e julgamento. Sempre esteve ali, invisível, sutil e constante, com o oxigênio que preenche nossos pulmões, como as sinapses de nossos cérebros.
E o que importa se quando nos reencontramos éramos pouco mais do que estranhos familiares? Eu ainda vejo nos olhos dele a necessidade de encontrar em mim traços de um passado mais simples e feliz, quando já não sobrou nada disso para nós. Ás vezes ele se espanta com meu tom de voz, ou mesmo com minha forma de agir. Ele diz que sou fria como a Muralha, que sou impiedosa e por vezes cruel, mesmo com ele. Hoje já não me importo, mas basta que ele me abrace e eu sinto essa vontade tola de fazer promessas, de dar carinho, mesmo sem saber como fazer isso.
Não tem nada há ver com o sangue em nossas mãos, ou com os rostos sujos e as cicatrizes que carregamos. Ele me viu com outros rostos, me viu sem rosto algum e mesmo assim me reconheceu através de um campo coberto por uma grossa camada de neve, sobre a qual corpos mutilados se acumulavam e o cheiro de fumaça e decomposição saturava o ar.
Ele abriu caminho entre as linhas inimigas para chegar até mim, deixando um rastro de destruição pelo caminho. Eu me lembrava de todos os movimentos, das rugas que se formavam em seu rosto toda vez que ele lutava, mas nunca houve tanta vontade, ou tanta determinação em seus gestos. Jon não era um sanguinário. Eu era.
Mesmo assim ele me alcançou, mas não a tempo de impedir o corte no lado esquerdo do meu abdômen que me fez deixar a espada cair. Pela primeira vez eu vi nele o descontrole de seus antepassados e a loucura viva enquanto ele mutilava meu oponente sem qualquer noção de sua brutalidade.
Eu cai na neve, desacordada por causa da dor implacável. Acordei sem noção do tempo, num lugar que cheirava a passado e neves de verão. Era a mesma cama onde eu havia nascido, a mesma cama em que meus pais dormiram por tantos anos. Eu não queria ter chorado, mas só percebi quando o gosto das lágrimas chegou à minha boca. Eu estava em Winterfell. Eu estava morta.
Não sabia dizer quanto tempo passei deitada naquela cama, sem saber se era dia ou noite. A comida aparecia em intervalos regulares e estava longe de ser farta e boa como nos tempos de paz. Jon não apareceu e eu comecei a temer o pior.
Numa noite em que o vento uivava pelas frestas das janelas e o fogo quase não resistia ao frio, a porta do quarto se abriu. Eu esperei por um maester, ou por uma serva trazendo comida, cobertores, ou lenha seca, mas nada disso apareceu.
O som do metal, o som dos passos pesados contra o chão de pedra e da respiração profunda. Nas sombras um rosto com marcas profundas de experiência, traição, fúria e dever. Ele havia envelhecido em uma velocidade quase cruel, a despeito de seus vinte anos. Por um instante eu pude jurar que havia cabelos brancos em suas temporas. Ele estava dolorosamente parecido com meu pai e com meu tio. Sua armadura era feita de aço negro e era composta por placa de peito, ombreiras, cota de malha e luvas. No peito se erguia um dragão imponente, feito de rubis cor de sangue.
Nas sombras silenciosas daquele quarto ele parecia um fantasma de todos aqueles que viveram em outro tempo, em outra guerra. A fúria dos Baratheon, os traços dos Stark, e o emblema dos Targaryen. Eu sabia que o Jon que eu conheci e amei como a um irmão estava morto e sepultado na Muralha como um Patrulheiro. Eu ouvi os rumores e vivi para comprová-los, mas me recusava a aceitar que era aquilo o que havia sobrado dele.
Jon se aproximou como se não soubesse se devia ou não fazer aquilo. A cicatriz sobre seu olho se misturavam com rugas finas que surgiram de lugar nenhum no meio da guerra. Mesmo com toda distância eu podia sentir o cheiro de enxofre e cavalos, neve e couro. Tentei levantar da cama e ir até ele, mas antes que eu pudesse Jon já estava ao meu lado, me forçando de novo contra o leito com uma expressão de pânico.
- Não... – sua voz rouca e assombrada disse em tom de urgente – Não se esforce.
Eu grunhi em frustração e impaciência, mas o cheiro dele por baixo do fedor dos dragões me acalmou. Jon sorriu, ou eu imagino que aquilo era o mais próximo de um sorriso que ele conseguia esboçar.
It's us
Yes, we're back again
Here to see you through til the day's end
And if the night comes, and the night will come
Well at least the war is over
Lift your head and look out the window
Stay that way for the rest of the day and watch the time go
Listen the birds sing
Listen the bells ring
All the living are dead, and the dead are all living
The war is over and we are beginning
Ficamos naquele silêncio sagrado até que pudéssemos ouvir nossos próprios corações misturados ao som da madeira estralando na lareira. Eu me sentia débil e indefesa perto dele, perto de toda aquela força, de toda fúria e de toda selvageria que ele tinha em seus traços. Algo nele era assustadoramente bonito, como o Norte, suas florestas e seu clima impiedoso. Era isso, ou apenas a minha saudade de casa falando.
Ele levou a mão aos meus cabelos e parecia decepcionado com aquelas pontas curtas e emaranhadas, sem qualquer graça ou brilho.
- Vai deixá-los crescer de novo? – era uma pergunta boba de se fazer depois de tantos anos, mas era algo tão íntimo, tão nosso...Ele adorava bagunçar meus cabelos e com eles curtos simplesmente não tinha a mesma graça. E eu sentia falta das pontas dos dedos dele em meu escalpo, de como aquilo me irritava quando eu era menor.
Um nó se formou na minha garganta e meus olhos ficaram rasos de água e sal. Eu não consegui responder, apenas acenei positivamente com a cabeça. Antes que eu pudesse perceber, os braços dele se fecharam ao meu redor e era ele quem soluçava em um choro convulsivo, enquanto enterrava o nariz nos meus cabelos. Eu o abracei de volta e pela primeira vez me senti em casa.
- Eu senti tanto a sua falta... – ele confessou sem ar, como se aquilo tivesse sido obtido após anos de tortura. Um segredo que ninguém jamais ouviu – Eu tive tanto medo!
A ideia de Jon com medo de alguma coisa parecia tão absurda. De algum modo ele ainda era aquela imagem sagrada e heroica do meu irmão mais velhos. Não tinha importância, porque aquilo era uma verdade para mim também. Eu senti falta dele em cada segundo de todos os dias dos últimos cinco anos e eu fechava os olhos para aquele medo avassalador. O medo de ouvir pelas ruas de Braavos, ou qualquer outro lugar, que algo terrível havia acontecido com o Bastardo Negro da Muralha.
- Está viva. – ele dizia como se aquilo fosse um milagre. Sua mão pousou entre meus seios e eu me assustei por uma fração de segundos, até perceber que ele estava apenas sentindo a batida do meu coração e se assegurando de que ele ainda batia.
- Estou. – eu respondi finalmente – E entediada. – sentia minha pele arrepiada e não soube se era pelo frio ou pelo toque dele. Seus dedos calejados e quentes, pousados entre meus seios, enquanto eu respirava como se uma mão invisível me estrangulasse, ou como se tivesse corrido de Winterfell até a Muralha. Meu coração acelerava contra a palma da mão dele e por um instante, raciocinar ficou muito difícil.
- É preciso que se recupere. – ele disse levando a mão ao meu rosto, com os olhos ainda vermelhos, a barba por fazer e o semblante de quem carrega o mundo nas costas. Minha pele se sentiu vulnerável sem o toque dele, como se eu tivesse sido abandonada de algum modo.
- O que não é justificativa para não me dizer o que está acontecendo fora desse quarto. – eu insisti – Por que estou em Winterfell e não na Muralha?
- Porque é mais seguro. – ele respondeu – Aqui poderia se recuperar melhor, com um maester por perto e longe da agitação da batalha.
- Hahah! Eu sabia. Não quer me deixar lutar. – eu disse irônica – Sabe que precisa de toda ajuda que puder conseguir. Eu posso ser útil, Jon.
- Eu precisava de toda ajuda que pudesse conseguir. Não preciso mais. – ele disse sério e havia um toque de alívio em suas palavras – Acabou.
- Ganhamos? – eu perguntei assobrada. Eu já nem sabia mais de que lado estava lutando, mas eu e Jon estávamos vivos e isso já era uma vitória.
- É uma forma de entender a situação. – Jon disse sem humor ou alegria. Era como se aquilo não significasse nada, como se ele preferisse que o resultado fosse outro.
- O que acontece agora? – eu perguntei inquieta e ele desviou os olhos.
- Eu não quero falar sobre isso agora. Você só iria se aborrecer sem necessidade. – ele disse sério e evasivo – Não há nada definido ainda, então não há por que se preocupar. É melhor que descanse e se recupere.
- Para os sete infernos você e essa história de que tenho que descansar! – eu respondi com raiva e Jon pareceu pego de surpresa pela minha reação – Eu preciso saber de muita coisa! Bran e Rickon, como eles estão? E Sansa?! Jon, você não pode me trancar dentro deste quarto e fazer de conta que o mundo do lado de fora não existe!
Jon ficou em silêncio por um tempo, como se ponderasse o que devia dizer. Ele respirou fundo e mais uma vez eu vi o peso da guerra em cada um de seus músculos. Dentro daquela armadura ele parecia mais duro e frio do que a Muralha. Eu não gostava de vê-lo envolto em aço. Tinha a sensação de que ele estava vindo se despedir mais uma vez, como tantos homens se despediam de mulheres antes de irem para uma batalha. A armadura parecia um sinal de que eu o perderia de vez e aquela seria uma dor que eu não suportaria. Talvez essa vulnerabilidade que eu sentia diante da iminência de perdê-lo era o que me fazia odiar minha condição. Se eu fosse um soldado marcharia para a batalha com ele, mas eu era uma mulher e Jon jamais permitiria que eu fosse.
- Eles estão a salvo. Vão ficar bem. – Jon disse sem oferecer mais explicações – E talvez eu esteja te trancando aqui pra que não veja o que sobrou do mundo lá fora. Não estou fazendo isso pra punir você, Arya. Eu só quero resguardá-la, ao menos por enquanto.
- Bobagem! – eu resmunguei e Jon me encarou de uma forma que eu não soube identificar.
- Pode ser, mas eu sou o responsável por Winterfell e por você até segunda ordem. – Jon disse respirando fundo – Quando tudo estiver mais tranquilo, quando você estiver recuperada e descansada, só falaremos sobre isso. Até lá, você fica aqui, segura, aquecida e bem alimentada.
- Você vai embora de novo? – eu perguntei, mas minha voz parecia estar desaparecendo e minhas mãos tremiam. Jon me lançou um sorriso cansado.
- Não. – ele disse – Vou ficar aqui. Há muito que ser feito e os selvagens me respeitam o bastante para não causarem confusão enquanto eu estiver no Norte. Além disso, eu não sou idiota de deixá-la aos cuidados de qualquer outra pessoa. Você escapuliria daqui na primeira oportunidade.
- Precisa usar armadura dentro de casa? – eu perguntei contrariada.
- Algum problema com ela? – Jon me encarou confuso.
- Não gosto deste brasão sobre seu peito, gosto menos ainda de ver você coberto em aço. É como se estivesse preparado para o pior. – eu disse. Jon passou a mão pelo meu cabelo e sorriu um sorriso cansado.
- Eu não estou. – ele disse – Se preferir, eu posso deixar a armadura de lado enquanto estiver dentro do castelo, mas quanto ao meu brasão...Temo que terá de se acostumar.
- Sabe, você nunca vai ser um Targaryen pra mim. Não importa o que digam, eu me recuso a chamá-lo de "Vossa Alteza". – eu disse traçando o contorno de rubis que formava o dragão sobre o peito dele. Jon riu um riso baixo pouco antes de beijar minha testa.
- Deuses sejam bons, eu teria feito de tudo para que você não soubesse meu novo nome, mas não consigo controlar as fofocas, boatos e canções exageradas ao meu respeito. Eu teria feito tudo pra que ao menos você não me tratasse diferente por causa de um maldito nome. – Jon disse me abraçando forte.
Gridlock
On the parkway now
The television man is here to show you how
The channel fades to snow
It's off to work you go
But at least the war is over
She's gone
She left before you woke
As you ate last night
Neither of you smoked
Dishes, TV, bed
The dark was filled with dread
But at least the war is over
Lift your head
And look out the window
Stay that way for the rest of the day and watch the time go
Listen, the birds sing
Listen, the bells ring
All the living are dead, and the dead are all living
The war is over and we are beginning
Eu me permitir fechar os olhos e aproveitar o conforto do abraço dele. O aço era frio contra minha pele, mas as mãos de Jon eram quentes e seus dedos traçavam círculos invisíveis sobre minhas costas cobertas pela camisola grosseira. Eu poderia ficar daquele jeito para sempre, ou tanto quanto fosse possível. Uma parte de mim queria gritar para o mundo que ninguém mais ia tirá-lo de mim, nem que para isso eu tivesse de desafiar o mundo inteiro. Não conseguia evitar o pensamento de que Jon me pertencia de algum modo. De uma forma complexa e intensa, como uma nota específica no batimento constante do meu coração.
Jon não ficou muito tempo. Ele sumiu entre as sombras do castelo e por horas eu não ouvi nenhum sinal de movimentação. A lareira continuava acesa e o vento ainda soprava através das frestas. Os criados não falavam nada além de me perguntarem se eu precisava de alguma coisa. Acabei pegando no sono, desta vez aliviada por saber que eu não estava mais sozinha no mundo.
Eu estava cansada de ficar deitada e de não saber o que estava acontecendo do lado de fora. Sempre que eu perguntava alguma coisa à criada que me trazia a comida ela desconversava, ou apenas dizia que "O Senhor" ficaria contrariado se soubesse que ela havia dito alguma coisa. Depois de várias tentativas frustradas eu acabei desistindo de obter uma resposta.
Pedi que me trouxessem uma banheira e água quente. Depois de dias naquela cama, tomando banho com esponjas e trapos encharcados, eu daria tudo por um banho quente para arrancar de mim aquele cheiro enjoado. Eu havia sido Ninguém por tempo de mais. Agora eu era a Stark em Winterfell e cedo ou tarde o mundo saberia disso. Eu não era uma órfã de rua, eu tinha uma casa, um nome e pessoas que dependiam de mim para me erguer quando a hora chegasse.
A água quente contra minha pele era um alívio. A ferida estava bem cicatrizada e dificilmente reabriria. O cheiro de lavanda não me agradava normalmente, mas daquela vez era um aroma bem vindo para apagar o cheiro desagradável do meu suor seco sobre a pele. Fechei meus olhos, sentindo os músculos relaxarem e o perfume me deixar zonza.
Não sei quanto tempo fiquei daquela maneira languida dentro da banheira. Também não sei dizer quando a porta se abriu. A espuma densa cobria muito bem minha intimidade, assim como a grande quantidade de leite que deixava a água esbranquiçada, de modo que eu não me dei ao trabalho de me cobrir para que o intruso não me visse.
Jon pareceu inicialmente constrangido, mas não fez qualquer movimento no intuito de sair do quarto, ou me repreendeu pela minha falta de cuidado e modéstia. Fosse qualquer outro homem eu me colocaria em posição defensiva e me sentiria ameaçada, mas era Jon e nada nele poderia me fazer mal.
Ficamos nos encarando em silencio por um longo tempo. Eu nua, coberta por água e óleos perfumados e ele de pé, vestindo uma maldita túnica pesada com o emblema Targaryen parcialmente encoberto pela capa com gola de pele. Ainda havia círculos escuros ao redor de seus olhos, mas o cabelo estava mais contido. Ele agora usava barba por fazer e eu me peguei pensando qual seria a sensação de sentir os fios escuros contra meus dedos e em como a barba deixava o rosto dele mais feroz e másculo.
Ele ainda parecia muito mais velho do que realmente era, mas a maturidade parecia agraciar o rosto dele, ao invés de desmerecê-lo. Jon sempre foi bonito para mim, mas agora havia algo totalmente diferente em seus traços que fazia com que ele tivesse aquela beleza austera e feroz.
- Me desculpe por entrar. Eu não... – ele respirou fundo como se tentasse lembrar o que deveria dizer. Fiquei curiosa e estranhamente fascinada pela reação dele, sem conseguir desviar os olhos dele – Eu não devia ter entrado sem bater.
Ele se virou de costas pra mim e eu podia sentir cada movimento dele ser preenchido com incerteza e lentidão.
- Espera! – eu disse firme – Fica aqui.
- Não seria...- ele ponderou mais uma vez me lançando um olhar de canto de olho – Não seria apropriado.
- Nós dois tomávamos banho juntos o tempo todo quando éramos crianças. – eu disse tentando soar ingênua, quando minha vontade de mantê-lo ali era quase perversa.
- Não somos mais crianças, Arya. – ele disse sério.
- E que mal você, de todas as pessoas, poderia me fazer? – o desafio estava subentendido. Juro que ouvi um rosnado baixo escapar da garganta dele
- Não devia dizer essas coisas a um homem, por mais que confie. – Jon revidou – Há coisas que podem fugir ao seu controle, então não brinque com isso.
- Não estou brincando. – eu continuei, cada vez mais maravilhada pela forma como Jon parecia confuso e tentado em aceitar um pedido que não era nada inocente. Ele continuou imóvel e eu sabia que se esperasse muito ele viraria suas costas e sairia do quarto.
We won
Or we think we did
When you went away
You were just a kid
And if you lost it all
And you lost it
Well we'll still be there when your war is over
Lift your head and look out the window
Stay that way for the rest of the day and watch the time go
Listen the birds sing
Listen the bells ring
All the living are dead and the dead are all living
The war is over and we are beginning
Foi quando eu me levantei sem qualquer pudor ou modéstia. A água escorrendo pelo meu corpo nu, bem diante dos olhos dele para que Jon pudesse ver o quanto desejasse antes de tomar uma decisão.
A resposta dele não foi dada em palavras.
Seus olhos escureceram imediatamente e eu senti um arrepio irritante percorrer meu corpo. A língua dele umedeceu os lábios entreabertos. Podia ouvir a respiração pesada dele, mesmo com toda distância.
Jon não disse nada, apenas ficou me encarando por longos segundos antes de caminhar em minha direção. Ele retirou a capa e deixou que ela caísse aos seus pés. Seus olhos seguros e objetivos como no dia em que ele me salvou da morte certa no campo de neve.
Suas mãos desafivelaram o cinto e desabotoaram a túnica, jogando-a junto da capa. Em seguida a camisa de linho branco se foi, deixando o tronco dele nu para que eu pudesse admirar.
Ele estava bem mais forte do que o que eu me lembrava. Cada músculo delineado de forma graciosa e imponente, encoberto pela pele alva. Havia um número considerável de cicatrizes longas e pálidas sobre a pele, como uma lembrança e um troféu de batalhas incontáveis. Jon desfez os nós que prendiam sua calça e retirou a última peça de roupa sobre seu corpo, junto com as botas.
A exemplo da minha provocação, ele ficou de pé na minha frente, completamente nu para que eu o contemplasse o quanto quisesse. Seu abdômen era bem definido e os músculos era um convite ao toque. Havia uma trilha de fios de cabelo escuros no final de seu abdômen. Suas pernas eram grossas e bem feitas. Nada nele era delicado, nada sugeria o menor sinal de sutileza. Jon era imponente em todos os sentidos e algo dentro de mim estremecia diante da visão de sua nudez gloriosa.
Ele caminhou até a banheira e entrou na água sem me tocar ou dizer coisa alguma. Ele se sentou, permitindo que a água o encobrisse e fez sinal para que eu fizesse o mesmo.
Eu me sentei entre o arco formado por suas pernas, sentindo sua ereção pressionada contra as minhas costas despertar um frenesi inexplicável em mim. Recostei minha cabeça contra o ombro dele e Jon passou a alisar meus braços languidamente.
Aos poucos suas mãos se tornaram ousadas até que ele criasse coragem para tocar meus ombros e pescoço. Sua mão guiou meu rosto para que eu pudesse olhar para ele. Jon inclinou o próprio rosto de encontro ao meu. Sua respiração pesada escapando pela boca entreaberta que estava a apenas alguns milímetros da minha.
- Você se tornou uma mulher diabólica. – ele disse como se estivesse sem fôlego.
Eu não tive a chance de responder a provocação. A boca dele foi mais ágil e imperativa, caindo sobre a minha, enquanto sua língua demandava passagem entre os meus lábios. Meu coração acelerado e minha cabeça em um turbilhão de pensamentos, que diziam de forma insistente que aquilo era errado e jamais deveria acontecer.
Em um passado distante ele foi meu irmão e meu melhor amigo. De algum jeito ainda havia um pedaço de mim que jamais conseguiria vê-lo de outra maneira, mas naquele momento, no meio daquele isolamento irritante, Jon era o homem mais bonito que eu já havia visto e algo nele me fazia arder em expectativa e vontade.
As mãos dele se fecharam ao redor dos meus seios e seus dedos calejados provocavam meus mamilos até que eles estivessem dolorosamente rígidos. Jon os beliscava sem piedade e me fazia gemer entre seus lábios. Quanto mais altos eram esses gemidos, mais determinado ele ficava a tratar meus seios com pouca ou nenhuma piedade.
A boca dele libertou a minha, passando a traçar o contorno do meu pescoço com beijos e mordidas leves, até alcançar meus ombros. Minhas mãos se sentiram seguras para sentir a firmeza das pernas dele ao meu redor. Jon enlaçou minha cintura com um dos braços, colando ainda mais nossos corpos e aumentando a fricção. A respiração irregular de Jon junto ao meu ouvido era enlouquecedora.
Podia sentir a urgência dele em cada toque e podia sentir como o controle metódico dele se esvaia rapidamente a cada suspiro e a cada gemido. Eu o queria e somente os deuses podiam dizer desde quando aquele sentimento existia dentro de mim sem que eu me desse conta. Jon não era indiferente a isso de forma alguma.
O dia em que ele me salvou eu vi nitidamente a raiva insana tomar conta dele. O medo de perder algo que lhe pertencia por direito e por conquista. Eu sempre fui dele de algum modo. Era eu quem o defendia, quem ouvia seus lamentos, quem o fazia rir. Jon sempre esteve no centro do meu mundo e agora que todos estavam mortos, aleijados, desaparecidos ou apenas indiferentes, Jon permanecia ao meu lado, quente, ansioso e urgente em seus carinhos e desejos.
Eu afastei suas mãos de mim, deixando-o confuso por alguns instantes. Ele arfou ao me ver de joelhos, encarando-o diretamente nos olhos e puxando-o para um beijo selvagem. Meus dedos se perderam nos cabelos dele, enquanto eu sentia a barba roçando contra o meu rosto e os dedos calejados de Jon massageando meu escalpo.
Em algum outro tempo, num passado que parecia quase irreal, um momento como aquele seria o centro de todos os nossos arrependimentos. Mas ele não era mais Jon Snow e eu já havia deixado de ser Arya Stark durante tantos anos, que agora já não fazia diferença pensar que nós dois crescemos como irmãos.
- Deuses sejam bons. – ele disse sem fôlego entre meus lábios – Aryas...Eu...
- Não diga nada. – eu disse. Os braços dele me enlaçaram pela cintura e num movimento rápido e preciso, Jon me ergueu de dentro da água.
Ele separou o beijo e me encarou nos olhos. Havia loucura e desejo interligados no fundo dos olhos cinzentos dele, misturados a um toque de urgência e necessidade.
- Vá pra cama. – ele disse num tom preciso e autoritário, enquanto eu o encarava confusa.
- Mas...
- Uma banheira é muito apertada para nós dois. – ele disse rouco junto ao meu ouvido – Você não devia ter começado isso.
- Então diga que não quer. – eu o desafiei beijando seus lábios de leve. Antes que eu pudesse me afastar, Jon me segurou pela nuca.
- Não sou tão forte, virtuoso ou determinado pra tanto. – ele disse – Posso ter herdado o sobrenome Targaryen, mas não sou Baelor para poder resistir a você agora.
Eu me afastei de Jon mais uma vez, saindo da banheira, com o corpo ainda encharcado e caminhei até a cama. Jon veio logo atrás, sedento e urgente. Eu me deitei sobre a cama languidamente, deixando minhas pernas separadas, apenas esperando para que ele tomasse o que lhe pertencia.
Jon ficou me encarando por um tempo antes de ir até mim. Eu esperei pelo peso de seu corpo sobre o meu, sólido e opressivo como uma rocha. Ao invés disso, senti a boca dele sobre a minha barriga, sua língua contornando meu umbigo e provocando arrepios desconcertantes sobre minha pele, enquanto traçava o caminho até meus pontos mais íntimos.
A boca dele era diabólica ao entra em contato com minha pele quente. Seus dedos abriam espaço para que a língua dele me tocasse de forma intima e me fizesse derreter sem qualquer esforço. Não conseguia pensar em uma única palavra coerente, tão pouco conseguia conter o volume de minha voz, enquanto Jon me beijava entre as pernas com muito mais ousadia e vontade do que havia usado para beijar minha boca.
Meus dedos o agarraram pelos cabelos da nuca, incentivando a ir além, a continuar me enlouquecendo daquela maneira até que eu já não tivesse voz e meus ossos tivessem se tornado maleáveis. Eu sentia aquela estranha sensação de que algo extraordinário e poderoso estava prestes a acontecer. Eu estava tão perto...Tão...Perto...
E foi ali que eu continuei. Insatisfeita e atordoada pelo fato de que Jon havia parado de me tocar com sua língua e seus lábios. Eu o encarei indignada e dei de cara com o rosto afogueado dele. Com seus cabelos desalinhados e um sorriso malicioso que insistia em se formar no canto da boca dele. Era um jogo e ele estava se divertindo tanto que por um momento eu vi naquele rosto o menino que um dia eu chamei de irmão.
Aquilo fez uma sensação desconfortável de repulsa e timidez aflorar dentro de mim e por um momento pensei em afastá-lo e me cobrir. Era ridículo pensar daquela maneira quando eu estava nua e de pernas abertas para ele. Pior era a necessidade que eu tinha de sentir as mãos de Jon sobre meu corpo e ouvir os sons estranhos que ele fazia quando ficava satisfeito com um carinho. Eu o queria e não estava disposta a esperar ou voltar atrás. Jon era um Targaryen. Aquele tipo de coisa não deveria ter importância.
Jon voltou a beijar minha barriga e desta vez a trilha de beijos seguiu até o vale entre meus seios. A boca dele era quente e aveludada, sua língua provocava meus mamilos pouco antes de seus dentes rasparem contra a pele sensível. Meus dedos se perdiam nos fios de cabelo dele. Jon sugou meu mamilo com força e urgência, como um recém-nascido esfomeado, me fazendo gemer sem pudor em resposta.
Eu já estava atordoada e exausta com tantas provocações. A boca dele buscou a minha e desta vez o beijo foi intenso e intimo. Tentei não pensar no que aquele momento significava, mesmo porque nem eu sabia dizer ao certo.
Aquilo era admitir que durante todos aqueles anos eu desejei aquilo em meu intimo. Eu sonhei em voltar pra ele. Em ser mais do que apenas a garotinha que o fazia rir. Estava desconstruindo meu herói. Me desfazendo da inocência e das memórias ingênuas de minha infância, me tornando a amante de um príncipe de sangue real. O Dragão do Norte, o Bastardo Negro da Muralha, o Príncipe Prometido, e tantos outros nomes que deram a ele não seriam o bastante para ocultar sua verdadeira identidade. Ele era Jon, e ele seria só meu, ao menos por uma noite.
Houve um momento de hesitação antes que ele me tomasse definitivamente. Jon me encarou nos olhos, como se pedisse permissão, ou como se quisesse guardar aquela cena na memória para se torturar mais tarde. Havia devoção, insegurança e vontade em seu rosto. Seus cabelos desgrenhados e a barba por fazer tornavam-no o retrato do caos e eu o queria exatamente daquela maneira.
Então eu o senti entre minhas pernas, me invadindo lentamente e abrindo espaço para reclamar o que já lhe pertencia. Não era ruim, era apenas estranho, talvez um pouco desconfortável por eu me sentir invadida de uma forma tão intima e definitiva. Então veio a dor que as outras mulheres comentavam. Nada comparado a um ferimento por espada no abdômen, ou tantas outras dores que acumulei ao longo dos anos.
Jon respirava com dificuldade. Ele se deteve por um momento, me dando a chance de me ajustar e acomodá-lo melhor, antes de se mexer. Eram movimentos sinuosos. O quadril dele se chocava contra o meu e a cada nova estocada eu sentia aquela expectativa por algo extraordinário. O prazer se acumulava em ondas, cada vez mais fortes, como se fosse o nível crescente da maré que vai de encontro aos grandes rochedos.
Eu perdi a noção do volume da minha voz e aos poucos meus dedos dos pés se curvavam e ficavam dormentes, enquanto continuávamos nos movendo, por puro instinto, buscando a satisfação daquele prazer primitivo um no outro. A velocidade aumentava e os movimentos se tornavam menos cuidadosos, até que eu pudesse sentir meu baixo ventre dolorido e mesmo assim não me importar com a sensação. Eu queria mais, eu queria tudo.
Foi quando o mundo saiu do meu campo de visão, substituído por um véu branco e enevoado. Minhas unhas cravadas nos braços e nas costas de Jon, deixando um rastro avermelhado sobre a pele alva. Ele continuava se movendo e prolongando aquela sensação inexplicável.
Jon me puxou forte pela cintura no momento que alcançou o próprio alívio, lançando sua semente bem fundo. Ele se apoiou nos antebraços enquanto tentava recuperar o fôlego. Eu estava languida de lenta de mais para conseguir fazer qualquer coisa que não fosse alisar as costas dele, como quem afaga um felino.
Quando ele rolou para o meu lado, pude sentir o liquido viscoso e quente que escorria entre minhas pernas e sentia o cheiro distinto de sangue no ar. Jon olhou para o lugar onde eu havia recebido o golpe dias, ou meses, atrás e não havia qualquer sinal de que a feria estivesse aberta. O sangue que manchava os lençóis era outro e ele pareceu atordoado ao notar.
O silêncio se tornou desconfortável eventualmente. Pensei em me levantar e sair da cama antes que Jon pudesse dizer que estava arrependido. Antes que eu pudesse fazer isso, ele me enlaçou pela cintura mais uma vez e repousou o queixo sobre o meu ombro. Ao menos ele não parecia tão desconfortável com sua consciência.
- Machuquei você? – ele perguntou cauteloso.
- Não. Eu estou bem. – respondi sonolenta – Isso foi...
- Não...Por favor, não avalie isso agora. – ele pediu com urgência – Já vai ser difícil o bastante pensar a respeito sem tentar classificar o que acabamos de fazer.
- Eu ia dizer que foi bom. Que eu gostei. – eu disse e Jon me apertou mais forte em seus braços.
- Tem noção do que isso significa? – ele perguntou temeroso – Eu posso ter acabado de fazer um filho em você. Eu a desonrei e você é uma lady, mesmo que não goste disso. Há tanta coisa que pode acontecer e eu não...Arya, eu não queria que você sofresse por causa da minha falta de controle.
- Que se dane sua falta de controle. – resmunguei – Já que você não me deixa sair do quarto, vou assumir que o mundo lá fora acabou e só sobramos nós dois.
- Quem me dera o mundo tivesse acabado. – Jon deixou escapar.
- O que está acontecendo, Jon? Me diga a verdade. – eu pedi e ele respirou fundo pouco antes de me soltar e ficar encarando o teto.
- Daenerys pretende voltar para o Leste e renunciar aos seus direitos como herdeira do Trono de Ferro. – ele disse com a voz grave – Aegon está ferido e não tem filhos ou esposa. Ele está inconsciente há dias e há pouca ou nenhuma esperança de que ele sobreviva.
- O que aconteceu com os dragões? – eu perguntei temerosa.
- Drogon continua forte e temperamental, mas Vyserion foi abatido. Um golpe de sorte. Aegon caiu no meio do ataque. – Jon disse – Meu irmão ainda respira e as conspirações já começaram.
- Que conspirações? – eu perguntei angustiada – Jon, o que está acontecendo?
- Tyrion Lannister, boa parte dos homens leais a casa Stark e até mesmo Storm End e o Eirye já se declararam. Querem colocar uma coroa sobre minha cabeça e uma noiva digna em minha cama. – eu estremeci ao ouvir a última parte – Deuses! Aryas, eu não sei o que fazer. Eu não sou o que eles dizem.
Eu o beijei, silenciando todos os temores dele.
- Você é o meu Jon. Isso é tudo o que importa. – eu disse. Me virei para encará-lo e o rosto dele mais uma vez era tomado por aquela sombra de dever e sabedoria incondizente com seus vinte anos. Eu beijei seu rosto e ele deixou escapar um sorriso discreto. Jon me encarou nos olhos diretamente, como se buscasse neles um pouco de paz.
- Queria poder ficar aqui pra sempre. – ele disse num sussurro – Queria poder dizer que serei só seu pelo resto da vida, mas enquanto houver um reino...Estou atado ao Trono e às responsabilidades que ele traz.
- Então é isso? – eu perguntei desanimada – Eu serei a prima do rei e, com sorte, sua amante? – Jon deu um sobressalto ao ouvir aquilo e me encarou como se eu tivesse acabado de ficar louca.
- Eu me recuso a ouvir isso de você. – ele disse com urgência. – Posso ter mudado muitos dos meus conceitos ao longo do tempo, mas não o bastante para aceitar a ideia de ter uma amante.
Tentei fazer de conta que aquilo não me magoou. Então ele cumpriria seu dever, casando-se com outra mulher, uma que pudesse ser uma boa rainha e dar filhos a ele. Uma mulher que fosse mais equilibrada e menos selvagem, gentil e educada como eu nunca fui. E quando isso acontecesse, ele me esqueceria. Esqueceria o que havia acontecido naquele quarto, pouco depois da guerra acabar.
- Então serei apenas a prima inconveniente do rei. – eu disse tentando manter um pouco da minha dignidade enquanto buscava algo para me cobrir.
Jon se sentou sobre a cama, enquanto eu me enrolava em uma coberta de pele para esconder minha nudez subitamente constrangedora. Eu não queria olhar para ele naquele momento, não queria ter que ouvir suas desculpas, ou qualquer outra coisa. Jon me abraçou forte, me impedindo de sair da cama. Eu queria chorar e sair correndo, mas ele não permitiria isso.
- Não me deixe agora. – ele pediu – Não quando eu mais preciso.
- Foi você quem disse que não me queria. – eu respondi.
- Eu não disse isso. – Jon se defendeu.
- Disse que jamais teria uma amante. – eu revidei contrariada, tentando conter a vontade de socá-lo. Ele beijou o ponto logo abaixo da minha orelha, me provocando um arrepio.
- O que não quer dizer que eu não quero você. – a voz não passava de um sussurro – Se ainda existe um mundo lá fora e eu devo governá-lo porque não me resta escolha, ao menos isso vão ter que permitir.
- O que está sugerindo? – eu me virei para encará-lo. Jon sorriu de forma insegura.
- Que eu ainda não aceitei nenhuma proposta de casamento. – ele disse – Se eu tenho de me casar com alguém, se tenho de aceitar mais esta condição, ao menos eu terei a palavra final quanto a escolha da noiva. – Jon disse convicto e eu desejei que ele não concluísse aquele raciocínio.
A ideia era assustadora e perigosa. Eu não queria que entre nós houvesse o peso de algo tão drástico, ou as obrigações para com o reino, mas Jon continuou a falara, apesar dos meus receios e objeções.
- Bran não se importaria, eu acho. – Jon disse afastando uma mecha do meu cabelo que caia sobre os meus olhos – E mesmo que ele tenha objeções, ao menos para dar uma ordem esta coroa tem de me servir.
- E se eu não quiser? E se eu não concordar? – eu questionei deixando-o atordoado.
- Achei que...- ele fez uma pausa significativa e agora era ele quem estava magoado – Eu achei que você ficaria feliz com a ideia depois de tudo o que aconteceu aqui. Eu fiz algo errado?
Eu respirei fundo.
- Eu não quero uma coroa, um marido, nada disso. – eu disse firme – Eu só quero você.
- Infelizmente não pode me ter sem aceitar o resto. – ele disse ainda cauteloso – E se não me aceitar nestas condições, então eu não tomarei uma esposa e terei de me conformar com a ideia de ter uma amante real. Sinceramente, eu preferia não ofender a memória de seu pai, que me criou desde pequeno, nem ofender a honra dos Stark além do que já ofendi.
- Pode me dar alguns dias para pensar a respeito? – eu perguntei e apesar de não ser a resposta que Jon gostaria de ouvir, ele concordou com um aceno de cabeça.
No dia seguinte, depois de dormirmos enroscados um no outro, ele permitiu que eu deixasse o quarto para ver a movimentação no castelo. Winterfell resistia no coração do Norte, a despeito do inverno e do clima impiedoso. Alguns pavilhões eram reparados as pressas. Fantasmas caminhava tranquilamente ao lado de Jon.
As pessoas nos encaravam com olhares desconfiados e sussurravam uns para os outros quando nos viam passar. Imagino que àquela altura já não era segredo o que havia acontecido naquele quarto.
Jon não voltou a tocar no assunto da proposta de casamento nos dias que se seguiram. Eu o teria aceitado, se a ideia de ser rainha não fosse tão assustadora, se a memória da guerra e das traições não me tirassem o sono de madrugada. Eu queria voltar a ser aquela menina de nove anos, que tinha uma família e ignorava que um jogo perigoso era jogado entre lordes de todo reino. Mesmo meu amor por Jon não era o bastante para me fazer ignorar aquele medo.
Apesar da falta de uma resposta minha, Jon continuou voltando ao quarto e a despeito de suas objeções a ter uma amante, era isso o que ele havia me tornado. Queria que tudo pudesse ser tão simples quanto aquilo.
As notícias daquele caso logo se espalharam pelo reino e os lordes começaram a ficar desesperados para me substituírem por uma de suas filhas, enquanto os homens do Norte olhavam para nós com rostos severos e cochichavam sobre nossa imoralidade.
Sansa me escreveu uma carta cheia de conselhos e críticas. Em seguida veio uma carta de Bran, que eu se quer me dei ao trabalho de abrir. Queimei as duas na lareira do quarto. Se eu tinha de tomar uma decisão, seria por Jon e não pelo jogo de poder que meus irmãos agora jogavam com tanta habilidade.
Eu permaneci calada, mesmo quando meu sangue parou de descer e nada conseguia parar no meu estômago.
Passei a ser mais cuidadosa perto de Jon, sabendo que a notícia o deixaria inquieto e ansioso pela minha resposta. Notícias da piora de Aegon chegaram mais ou menos um mês depois da falha em minhas regras. Jon quase não dormia direito naqueles dias e os corvos vindos do reino inteiro enchiam a torre do maester de Winterfell com penas, tinha e sujeira das aves.
Estávamos sentados junto a lareira do quarto. Eu estava enrolada em minha capa, tentando me manter aquecida, enquanto Jon relia um pergaminho pela décima vez. Minha mão estava acomodada sobre minha barriga de forma inconsciente. Era difícil acreditar que havia algo ali.
Jon respirou fundo, deixando o pergaminho de lado. Ele encarou o fogo diante de nós e pareceu refletir sobre seus inúmeros problemas.
- Sei que gosta de fingir que o mundo não existe fora deste quarto, mas sabe que isso não é verdade. – ele disse num tom sério e calmo – O reino tem expectativas e nós temos de atendê-las.
- Isso é um jeito diplomático de dizer que você quer uma resposta minha? – eu perguntei de forma evasiva. Jon respirou fundo e encostou a cabeça na poltrona.
- Cartas com proposta de lordes do reino inteiro me oferecendo suas filhas chegam diariamente e eu não posso ignorar isso para sempre. Os rumores sobre o que acontece neste quarto quando estamos a sós já alcançaram os ouvidos de Sansa e Bran. Ele me escreveu perguntando o que eu pretendo fazer e o tom que ele usou não era nada simpático. Tyrion Lannister aprova a união. Eu devo uma resposta ao seu irmão e à Mão do Rei. – Jon disse de forma solene – Sei que é assustador, mas não é só você quem vai ter de se adaptar a uma vida nova se aceitar meu pedido. Aegon está morrendo e todas estas questões se tornaram urgentes, mas independente disso, independente de qualquer razão política, eu quero que se case comigo porque eu a amo. – Jon fez mais uma pausa, como se ponderasse se devia ou não dizer mais alguma coisa – Se não acha que eu tenho o direito de ouvir uma resposta sua, se não acha que a iminência da minha coroação é algo que possa fazê-la tomar uma decisão, eu gostaria ao menos que considerasse que em alguns meses sua barriga vai estar grande de mais para disfarçar com roupas folgadas.
- Há quanto tempo sabe? – eu perguntei num tom fraco de voz.
- Todo castelo comenta como tem passado mal pela manhã. Acha mesmo que nenhuma das criadas me contaria que não tem sangrado nos últimos meses? Eu sei já faz algumas semanas. – ele respondeu – Me perguntava quando você teria coragem pra me dizer.
- Eu sabia que isso ia deixá-lo ansioso por uma resposta. – eu disse.
- E com todo direito. – Jon insistiu. Ele se levantou da poltrona e caminhou até mim.
Jon se ajoelhou diante de mim e levou a mão à minha barriga. Seu rosto tinha uma expressão serena e seus lábios pareciam se curvar num sorriso discreto. Ele estava exausto e isso era nítido. Seus olhos eram doces enquanto ele me encarava, cheio de expectativas. Aquele homem que se ajoelhava diante de mim seria rei e eu estava carregando um filho dele, enquanto me recusava a admitir que eu queria ser a mulher dele, se não houvesse no meio do caminho um reino inteiro.
- Não quero que essa criança saiba o que é ser um bastardo. – ele disse calmo – E eu não quero que você seja chamada de nomes indignos pelas costas.
- Nós crescemos como irmãos e o Norte inteiro sabe disso. Nomes indignos já eram de se esperar. – eu disse teimosa.
- Eu te amo. – ele disse com aquela sinceridade simplista e rústica, típica de um nortenho. Jon não tinha o talento dos poetas ou cantores, tão pouco eu queria que ele tivesse. Aquela total falta de eloquência que nós compartilhávamos era algo que me agradava até certo ponto. Nós nos entendíamos bem através de olhares. – Com ou sem coroa, isso não vai mudar.
Acariciei o rosto dele, sentindo a barba roçar contra as pontas dos meus dedos. Beijei a boca dele e este foi todo o incentivo que Jon precisou para tornar aquele beijo algo mais intenso.
- Então escreve dizendo ao meu irmão que passe a me chamar de Vossa Graça. – eu disse com meus lábios ainda colados aos dele – Deuses sejam bons.
Jon riu um riso grave e espalhou beijos por todo meu rosto e pescoço. Sua mão, sempre que tinha a chance, pousava sobre meu ventre, acariciando a criança que nós dois ainda relutávamos a crer que estava ali.
Dias depois estávamos de baixo da árvore coração. Nortenhos nos encaravam divididos entre a reprovação pelo nosso passado e a satisfação pelo enlace. Os deuses antigos nos vigiavam no bosque sagrado, enquanto um septão recitava preces e anunciava que eu e Jon éramos marido e mulher.
O inverno ainda estava longe de acabar e seria impiedoso. Muitos ainda morreriam antes que a primavera chegasse, assim como Aegon morreu duas semanas depois do meu casamento. Eu e Jon ainda passaríamos por muita coisa. Brigaríamos e faríamos as pazes incontáveis vezes, enquanto tentávamos governar o reino. A vida não seria fácil, mas dentro do quarto preferíamos fazer de conta que o mundo lá fora não existia. A vida seria sempre difícil, mas ao menos, a guerra havia acabado.
E se me perguntarem, eu direi que não me arrependo de nada. O que aconteceu naquele quarto, quando a guerra terminou, foi apenas a confirmação de um sentimento que nós dois sabíamos que estava gravado dentro de nós a ferro e fogo. Não é algo que eu possa explicar, ou medir. O que nós tínhamos era algo que cresceu em um terreno árido e impiedoso, quando perdemos quase tudo e ainda tentávamos encontrar os caminhos que nos levariam a um mesmo castelo. Nós sobrevivemos graças a esperança de nos reencontrarmos.
Here it comes
Here comes the first step
Here it comes
Here comes the first step
It Stars Up in our bedroom after the war
It starts Up in our bedroom after the war
After the war, After the war, After the war
After the war, After the war, After the war
Nota da autora: A ideia pra essa fic veio do além! Sério, não tenho nem noção do porque eu comecei a escrever essa shot, mas vou culpar meu stress de semana de prova. Eu gostei muito do início da história até o pós smut, depois...Sei lá, acho que a história se perdeu um pouco. Espero que gostem e comentem.
Bjux
Bee
