Capítulo 1 – Morsmordre

Irremediavelmente dele. É isso que eu sempre serei, é isso que sou desde a primeira vez que o vi, naquele jantar na casa dos meus pais quando eu tinha apenas quinze anos. Eu estava nas férias de verão entre o quinto e o sexto ano, e desde aquela idade eu já sabia quem era o famoso Lord Voldemort, o quão poderoso ele era e quanto poder ele ganhava cada dia. Desde aquela época eu já era fascinada por seus ideais, e me lembro de ter ficado exultante ao saber que o já tão famoso Lorde jantaria com nossa família.

Como não podia deixar de ser, eu me valera da minha habilidade nata de ser o centro das atenções para conversar com o Lorde durante praticamente todo o jantar, enquanto minhas irmãs, tolas, ficaram o tempo todo caladas. Ele parecera impressionado por eu ser desinibida o suficiente para manter com ele uma conversa de igual para igual, como nem meu pai fazia, e parecera ainda mais impressionado quando eu expusera minhas ideias sobre a escória trouxa, a limpeza do sangue e as Artes das Trevas. Eu ficara mais que lisonjeada por ter despertado tanto interesse na pessoa que, para mim, era a mais interessante do mundo bruxo.

- Então, Srta. Black, estaria disposta a se juntar a mim na busca da purificação do sangue? - ele perguntou em certo momento, sua voz grave e penetrante.

- Prontamente, meu senhor! Eu dedicaria minha vida de bom grado pelos seus ideais. - eu disse sem hesitar. Ele sorriu, um curvar de lábios quase imperceptível, mas magnífico para mim.

- Uma posição muito firme, para alguém tão jovem.

- Bellatrix sempre foi muito avançada para a idade, Milorde. - vangloriou-se minha mãe, de quem eu puxara minha necessidade de ser o centro das atenções. Obviamente, eu já a havia superado há muito tempo nesse quesito.

- Posso perceber, e considero isso muito promissor. - disse o Lorde, e orgulho inflou em meu peito como nunca antes. - Percebo também que não tens muito conhecimento nas Artes das Trevas, apesar de seu interesse.

O orgulho murchou de uma vez, como um balão furado. Eu era uma Black, contudo, e aprendera desde cedo a manter as emoções fora do meu rosto.

- Infelizmente isso é verdade, embora nas férias eu tente estudar um pouco pelos livros do meu pai, ele não permite que eu pratique pois diz que é magia muito avançada para a minha idade.

- Com todo o respeito, Cygnus, sou obrigado a discordar. Nunca é cedo para começar a aprender, e creio que, se for devidamente treinada, sua filha será de grande valia quando se juntar aos Comensais da Morte, se ela assim desejar.

Com o orgulho crescendo novamente em mim, eu agradeci e assenti brevemente. Já havia deixado bem claro durante o jantar que eu desejava me juntar aos Comensais, e não queria parecer bajuladora de mais. Meu pai, por outro lado, se desdobrou em agradecimentos.

- Oh Milorde, é uma grande honra que nossa família lhe seja tão útil! Eu mesmo treinarei Bellatrix, se isso for de seu desejo. - ele disse, servil.

- De forma alguma, Black. Sua maior utilidade para mim é no Ministério, e não quero que se dedique a nada além disso. Não, sua filha terá outro tutor. Eu a ensinarei.

Não consigo encontrar uma descrição menos rude para a reação de minha mãe: ela praticamente teve um orgasmo ali, de tanta felicidade. Meu pai sucumbiu em agradecimentos e bajulações. Eu? Eu nunca abrira um sorriso tão grande em toda a minha vida, e, na minha tolice adolescente, entrei em choque e não consegui dizer sequer uma palavra. Contudo, eu não precisava me desfazer em agradecimentos para que o Lorde soubesse o quanto eu estava honrada e extasiada. Ele olhava diretamente para os meus olhos, e eu sabia que estava usando Legilimência.

Nos dois anos seguintes, em todas as férias e feriados que eu recebia de Hogwarts, o Lorde me visitava para me ensinar as tão fascinantes Artes das Trevas. Eu o via como um deus. Um deus poderoso e impiedoso que eu seguiria cegamente para onde quer que fosse. Em algum momento, porém, isso mudou. Não sei se a mudança foi súbita ou gradual, mas quando me dei por mim eu não o via mais apenas como um deus (embora eu nunca tenha deixado de vê-lo desse modo), eu o via também como um homem. Um homem charmoso e sensual, que me despertava um desejo como eu nunca antes sentira.

Eu bebia cada palavra sua como se fosse um licor, sua voz grave acariciando meus ouvidos e despertando em mim os mais lascivos pensamentos. Seus toques, breves e acidentais, deixavam minha pele em chamas. E os duelos, que faziam parte das lições, eram simplesmente incríveis. Destemida, eu o enfrentava como se fossemos iguais, embora isso nunca fosse possível, e me tornava cada vez melhor. O Lorde dizia que em pouco tempo nem os melhores aurores seriam páreo para mim, e que até ele mesmo teria dificuldade para me derrotar. Apesar disso, e apesar de eu sempre duelar com todas as minhas forças, o que eu mais gostava em nossos duelos era quando ele me derrotava. Naqueles momentos, quando a magia de seus feitiços percorria cada fibra do meu corpo, era quando eu sentia de fato todo o seu poder sobre mim, era quando eu me sentia mais próxima dele.

Então vieram os sonhos. Sozinha em meu dormitório de Hogwarts, eu sonhava com um Lorde das Trevas que vinha até mim e satisfazia todos os meus desejos. Os sonhos eram tão reais e intensos que eu não queria acordar, e quando acordava eu tentava suprir meus anseios com idiotas como Malfoy e Dolohov, que apenas me faziam imaginar o quanto o Lorde devia ser superior a eles naquele aspecto, como o era em todos os outros.

Aos poucos, fui admitindo para mim mesma algo que eu sempre pensei ser impossível: eu, Bellatrix Black, estava apaixonada. Logo eu, que sempre achara o amor uma fraqueza patética. No começo, odiei a mim mesma por sucumbir a um sentimento tão ridículo. Depois, ao entender que o que eu sentia pelo Lorde era irreversível, pude perceber alguns aspectos desse amor que antes eu não via. O único homem que conseguira me fazer amar era também o único que nunca poderia me amar de volta, e o único que por amá-lo não me tornava fraca, pois amar o homem mais forte do mundo não poderia nunca ser uma fraqueza. Meu amor por ele me levava também a segui-lo por caminhos que outros, covardes, nunca seguiriam. Meu amor faria de mim sua melhor Comensal, e seria minha fortaleza em vez de minha fraqueza.

Ao final desses dois anos, me formei em Hogwarts com excelentes N.I.E.M.'s e outras várias honrarias, como não podia deixar de ser. No dia seguinte à minha formatura, o Lorde das Trevas foi pessoalmente à minha casa para me parabenizar. Nenhuma honraria que Hogwarts pudesse me dar jamais chegaria aos pés daquele gesto. Naquela ocasião ele me informou que, apesar da minha brilhante conclusão na Escola de Magia e Bruxaria, minha formação nas Artes das Trevas ainda não estava completa, e ele calculava que eu precisaria de ainda mais um ano de treinamento.

A partir de então, passamos a ter aulas toda semana, e era simplesmente esplêndido vê-lo com tanta frequência. Devido a isso, a maior parte de nossas aulas passou a ser na casa onde funcionava a sede dos Comensais da Morte, já que o Lorde passava a maior parte de seu tempo lá. Com essa mudança, fui sendo aos pouco apresentada aos outros seguidores de meu Mestre. Na verdade, a maioria deles eu já conhecia, embora superficialmente, já que todas as famílias de sangue puro são de algum modo interligadas, e eu já vira muitos deles nas festas e eventos da alta sociedade.

Entre esses Comensais, estava Barty Crouch Jr. Ele era três ou quatro anos mais velho que eu, e me lembrava dele dos tempos de Hogwarts. Na escola, ele não passava de um garoto desengonçado e cheio de espinhas, com o nariz e as pernas compridos de mais, mas o fim da puberdade fizera maravilhas para ele, e agora Crouch era um jovem extremamente atraente. E não fora só o fim da puberdade, eu percebi ao analisá-lo melhor, fora também o ingresso nas Artes das Trevas que lhe adicionara um ar de crueldade que eu muito apreciava.

Acabei o levando para a cama. Havíamos decidido que nossa relação não passaria de sexo casual, nenhum dos dois queria compromisso, embora dividíssemos o quarto com bastante frequência. Ah, ele era sem dúvidas melhor que qualquer um com quem eu dormira em Hogwarts, mas eu não deixava de compará-lo ao que eu imaginava que o Lorde das Trevas seria, não deixava de imaginar o rosto do meu Mestre no lugar do seu quando estávamos juntos.

Assim foram se passando os meses, e quanto mais o tempo passava, mais poderoso meu Lorde se tornava, em todos os sentidos. Mais Comensais e aliados de outros tipos se juntavam a nossa causa, e ele ia se tornando cada vez mais divino e menos humano, ganhando inclusive alguns traços ofídicos. É claro que, daquele modo, ele se tornava menos bonito, mas aos meus olhos ele se tornava ainda mais belo, pois aquelas mudanças indicavam a grandiosidade de seu poder, que o fazia estar acima da simples humanidade.

Eu também, nesses poucos meses, crescia muito depressa em meu poder, e embora eu obviamente nunca fosse chegar ao nível do Lorde, já me aproximava do nível de alguns Comensais, ultrapassando inclusive alguns deles. Eu aprendia rápido, afinal, e não podia ter um mestre melhor. Ah, as aulas! Eu passava a semana inteira esperando que chegasse a próxima aula, nunca me cansava de ficar perto dele.

Em certo ponto, comecei a tentar provocá-lo. Não de forma súbita e vulgar, é claro, mas como uma boa Black e uma boa Sonserina como eu faria: sutilmente, implicitamente. Pequenos olhares. Um vestido mais decotado ou um corpete mais apertado ou uma fenda maior na saia. Pernas cruzadas à mostra. Uma mordida no lábio inferior. Uma frase de duplo sentido de vez em quando. Metade dessas coisas era suficiente para trazer qualquer homem que eu conhecia, sem nenhum exagero, rastejando aos meus pés.

O Lorde das Trevas, contudo, não mudou de postura. Ele me tratava, desde algum tempo, de forma diferente que tratava os outros Comensais. Me chamava pelo primeiro nome, às vezes até pelo apelido, quando eu fazia algo certo; e tinha para comigo, por vezes, um tom de informalidade, de familiaridade, que não tinha com os outros. É claro que eu me sentia honrada com aquilo, como me sentia por ser a única com o privilégio de ser ensinada por ele, mas eu queria muito mais que aquilo, muito mais.

Por vezes, eu tinha a impressão de que ele me olhava, de cima a baixo, com olhos famintos que me despiam por completo. Mas então ele voltava à sua atitude normal, e eu ficava me perguntando se aqueles olhares não eram apenas ilusões causadas pelo meu desejo louco de tê-lo. Na verdade, às vezes eu me perguntava se, de tão divino, ele já teria se livrado da necessidade humana por sexo, como já havia se livrado da morte e da capacidade de amar. Mas eu não gostava muito dessa teoria, preferia continuar sonhando com ele em meus braços e imaginando seu rosto ofídico no lugar do belo rosto de Crouch.

No outono daquele mesmo ano, os irmãos Lestrange se juntaram ao Lorde das Trevas, para o grande orgulho de seu pai, um dos Comensais mais antigos. Assim como a maioria dos Comensais, eu conhecia os Lestrange brevemente e, no caso deles, os conhecia também de Hogwarts. Rodolphus era cerca de seis anos mais velho que eu, e me lembro muito pouco dele na escola. Rabastan, apenas dois anos mais velho que eu, dele eu me lembrava bem. Ele costumava a andar comigo na escola e, embora eu nunca tivesse dormido com ele, fora eu quem o levara para o mal caminho em todos os outros sentidos.

O Lorde me chamou para a reunião na qual os dois foram marcados. Era a primeira reunião formal a qual eu comparecia, e era a primeira vez que eu via a Marca Negra ser gravada em alguém. Fiquei maravilhada ao ver as linhas vermelhas queimando suas peles, desenhando aos poucos o contorno da caveira e da serpente, e depois se tornando negras à medida que esfriavam e cicatrizavam. Rodolphus e Rabastan fizeram várias caretas de dor no processo, e eu achei uma tremenda fraqueza. Apesar disso, quando os dois já tinham suas marcas, o Lorde os parabenizou por terem resistido bravamente, sendo que outros Comensais haviam gritado ou até chorado de dor. Eu havia entendido que o objetivo do Lorde ao me levar para aquela reunião provavelmente era que eu me preparasse para receber minha própria marca, e eu decidi então que, quando chegasse minha vez, eu resistiria impecavelmente à dor, sem sequer uma careta.

Com o ingresso dos Lestrange aos Comensais da Morte, fui me aproximando mais deles, e logo nos tornamos amigos. Mesmo entre os Comensais, era difícil encontrar pessoas sádicas como eu, e os Lestrange se tornaram rapidamente meus companheiros de tortura a trouxas. Rapidamente também, comecei a levar Crouch para nossas festinhas, e algumas vezes outros colegas também se juntavam a nós. Também me afeiçoei aos dois irmãos por eles serem em geral mais inteligentes que os outros Comensais, e mais apegados aos nossos ideais, rendendo por isso conversas mais interessantes. Quanto mais nos aproximávamos, mais eu notava o interesse de Rodolphus por mim. Era difícil não notar, ele me olhava como se eu fosse uma divindade. Ah, como eu queria que o Lorde me olhasse assim!

Depois, também, de ter me chamado para aquela primeira reunião, Milorde começou a me mandar para algumas missões. Eram missões pequenas, e eu sempre ia acompanhada de outros Comensais mais velhos, mas eu as tratava com a maior importância (ora, nada que o Lorde das Trevas faça poderia ser desimportante) e sempre tinha um desempenho magnífico, fazendo tudo que me era requisitado e um pouco mais. O Lorde ser orgulhava de mim, eu podia ver, e esse orgulho me preenchia completamente, eu não precisava de nada mais no mundo. Enquanto eu pudesse ser útil a ele, pudesse cumprir seus desígnios e causar-lhe orgulho, eu poderia ser feliz. Mas como eu queria poder servi-lo também em outros quesitos, como eu queria me entregar a ele de todas as formas possíveis! Ele, contudo, parecia estar realmente acima de tudo isso.

Eventualmente, comecei a dormir com Rodolphus. Apesar de eu não o considerar como nada mais que uma "amizade com benefícios", aos olhos da alta sociedade, conservadora e hipócrita, nós eramos os namorados perfeitos. Minha mãe não desperdiçava uma chance de me dizer o quanto Rodolphus seria um bom marido e o quanto eu seria tola se não me casasse com ele. Aos olhos de Narcissa, na época apenas uma adolescente iludida, nós possuíamos uma história de amor digna dos contos de Beadle. De volta à realidade, eu estava confortável em ter uma boa companhia na cama que pudesse também ser uma boa companhia fora dela. Apesar disso, minha relação com Crouch continuou a mesma, casual e secreta, embora eu o procurasse com um pouco menos de frequência.

No início do ano seguinte, alguns meses antes que completasse um ano de treinamento nas Artes das Trevas depois de minha formatura, eu recebi uma das mais felizes surpresas da minha vida. Depois de uma de nossas aulas, o Lorde pediu para que eu me sentasse em sua frente. Seu tom era de quem queria ter uma conversa séria, e eu me preocupei. Desapontar Milorde era meu maior medo, e ele me assombrava sempre que eu ouvia esse tom de voz.

- Não se preocupe, Bella, o que temos para conversar são boas notícias para você. - ele disse, enquanto eu me sentava, e o alívio tomou conta de mim.

Bella... ele já quase não me chamava mais de Bellatrix, apenas de Bella, e meu apelido soava tão bem em seus lábios que eu não permitia mais que outros me chamassem assim. Eu era sua Bella, e de mais ninguém. Assenti brevemente, sorrindo frente a suas palavras, e esperei que meu mestre desse as boas notícias.

- Seu desempenho nas Artes das Trevas tem sido excepcional, e você tem se desenvolvido muito mais depressa que eu imaginava. Devo dizer que estou orgulhoso, Bella. - não consigo traduzir em palavras a alegria que receber tais elogios dele me trazia. - Por esse motivo, creio que terminaremos seu treinamento antes do tempo previsto. O que quero dizer, minha cara, é que julgo que você já está pronta.

Eu não me lembro das exatas palavras de agradecimento que proferi, tamanha a felicidade e o orgulho que eu sentia.

- Mas primeiro, você passará por um último teste. Eu lhe enviarei a mais uma missão, dessa vez sozinha, uma missão importante, e quando voltar, se tiver sucesso, terá sua Marca.

- Perfeitamente, Mestre. - eu disse, quase ofegante. A iminência de receber minha Marca Negra, de pertencer oficialmente a ele, me deixava exultante.

A missão que ele me deu era completamente digna de ser meu último teste. Eu teria que matar meu antigo professor de Defesa Contra as Artes das Trevas. O homem, Erich Smith, era um grande partidário de Dumbledore, e estava formando aurores de mais para o gosto de Milorde. Eu não podia estar mais honrada em receber, tão jovem e sozinha, uma missão tão importante. Era feriado de Páscoa, e o professor estaria em casa. Milorde me deu o endereço e eu fui para lá logo na noite seguinte, depois de passar o dia me planejando.

Eram três da madrugada quando eu aparatei no bairro trouxa em que ele morava. Minha capa preta, com o capuz tampando o rosto, fazia com que eu me camuflasse facilmente nas sombras. Me esgueirei em volta da casa, silenciosa. Todas as luzes estavam apagadas, exceto uma no andar superior.

- Homenum Revelio – eu sussurei, apontando a varinha para a casa. Lá estava ele, sozinho em seu quarto. Perfeito.

Verifiquei, então, os escudos e alarmes que ele havia colocado em volta da casa. Havia menos proteção do que eu imaginava, tão descuidado para um professor de DCAT, tsc tsc, que belo exemplo ele estava dando para os aluninhos... A porta estava trancada com magia, então lancei um abaffiato e a explodi. Nenhum barulho chegou ao andar de cima, e o sangue ruim continuou exatamente onde estava, exatamente onde eu o queria. Perder o elemento surpresa não estava em meus planos aquela noite, eu não queria arriscar que ele chamasse ajuda. Subi as escadas, silenciosa como um fantasma, e fui em direção ao quarto iluminado. A porta estava aberta, e entrei sem ser notada. O professor estava a uma mesa, de costas para mim, escrevendo em alguns pergaminhos.

Apontei minha varinha para suas costas, mas nesse momento ele levantou a cabeça e viu meu reflexo na janela escura à sua frente. Levantou-se e virou-se numa rapidez impressionante, já empunhando a varinha, e começamos instantaneamente a duelar. Eu defendia os feitiços dele e conseguia revidar com a mesma velocidade, e o duelo estava extremamente equilibrado. Em certo momento, meu capuz escorregou, revelando meu rosto.

- Srta. Black! Por que está fazendo isso? - ele exclamou em meio à chuva de feitiços que eu lhe mandava, parecendo surpreso por ver uma de suas alunas mais brilhantes atacando-o.

- Os propósitos do Lorde das Trevas não são da sua conta, sangue ruim imundo! A única coisa que você precisa saber é que sua aluna, que há muito já te superou, veio te matar. - eu respondi, sorrindo, sem nunca tirar a concentração do duelo. Ele era professor de DCAT por um motivo, afinal, e era um adversário à altura.

- Ah, então se juntou a ele. Eu devia ter imaginado, sempre soube que não havia muita coisa boa em seu coração.

- Errado, professor. Não há nada bom em meu coração. É por isso que eu te superei.

Assim que eu disse isso, lancei três feitiços seguidos, quase ao mesmo tempo. O primeiro ele bloqueou, e desviou por pouco do segundo, que atingiu sua mesa e a espatifou em pedaços. O terceiro, o mais fraco de todos, o atingiu no peito e o derrubou, jogando sua varinha longe. Expeliarmus é uma droga de feitiço, mas bem útil quando se quer render uma vítima para brincar com ela entes de matá-la. Apontei minha varinha para ele, me aproximando devagar como uma cobra pronta para dar o bote.

- Pare, Bellatrix, você não tem que fazer isso! - ele disse, com os olhos arregalados. Era impressionante como os fracos tentam parecer seus amigos quando são derrotados. Me chamando pelo nome de batismo, francamente!

- Você não tem o poder de me dizer o que eu tenho ou não que fazer. Mas isso é o que todos dizem quando imploram pela vida, não é? Nada criativo, professor Smith... Vamos ver como você se sai implorando pela morte. Crucio!

O raio vermelho o atingiu em cheio, e ele se contorceu de dor. Seus gritos desesperados, que ecoavam pela casa, eram música em meus ouvidos. A Cruciatus sempre fora minha maldição favorita, desde a mais tenra idade, quando eu torturava o gato da Andrômeda para fazê-la chorar, e eu estava me especializando nela. Torci minha varinha no lugar, como se rodasse uma chave, e os gritos aumentaram. Eu mesma havia criado aquela técnica, que aumentava a intensidade da maldição. Eu não conseguia conter meu sorriso quando torturava alguém, a sensação era sublime de mais!

Ele era fraco, porém, e não demorou muito para que seus gritos se tornassem súplicas. Ele também não era muito original ao implorar pela morte, uma pena, mas esse não era um pedido que eu pudesse negar. Cessei a maldição, e com elas cessaram seus gritos. Dei-lhe um chute no rosto, só por diversão, e ele voltou a gritar. Muito bom, eu gostava dos gritos. O bico da minha bota fez um grande estrago no rosto dele, e o professor começou a cuspir sangue, junto com alguns dentes. Aquele sangue imundo, mas tão vermelho e belo.

- Você sucumbe hoje aos poderes do Lorde das Trevas, sangue ruim. - eu disse, com um grande sorriso no rosto. - Em breve, todo o mundo bruxo sucumbirá. Adeus, professor. Avada Kedavra!

Dei uma gargalhada quando a vida deixou os olhos dele. Agora eu seria de fato uma Comensal da Morte, e seria a melhor. Fui até a janela do quarto, abri-a e apontei minha varinha para o céu.

- Morsmordre! - gritei, soltando outra gargalhada em seguida, e desci correndo as escadas.

Saindo da casa, lancei um último feitiço e fiquei um tempo ali, observando as chamas que eu acabara de conjurar consumindo a casa, enquanto a Marca Negra brilhava esverdeada no céu escuro da madrugada. Missão cumprida, e em grande estilo, eu tinha que admitir. Aparatei direto na sede dos Comensais, que, eu havia descoberto há pouco tempo, era também a casa do Lorde das Trevas. Ele me esperava na sala de estar, e nem se levantou de sua poltrona quando eu passei pela porta.

- Milorde – eu disse, fazendo uma grande reverência aos seus pés. - A missão foi um sucesso! A Marca Negra paira no céu, e o corpo do sangue ruim está sendo consumido pelas chamas que, em breve, se alastrarão pela vizinhança e darão fim à vida de vários trouxas.

- Fogo Maldito, eu presumo. - ele disse, e eu assenti orgulhosa. - Meus parabéns, Bella. Amanhã você terá sua Marca, e terá todo o seu mérito reconhecido. Agora me conte tudo que aconteceu, quero um relatório completo.

Eu me sentei ao seu lado, cruzando as pernas e me inclinando um pouco em sua direção, e comecei a contar, me deliciando em dizer cada detalhe sórdido. Os olhos dele queimava em mim e, naquele momento, eu percebi que minhas provocações faziam, sim, algum efeito nele. Naquele exato instante, enquanto eu descrevia como eu torturara e matara meu antigo professor, o Lorde das Trevas me despia com os olhos. Ah, eu seria capaz de matar muito mais de mil homens, se a cada um que eu matasse meu mestre me olhasse daquele jeito.

No dia seguinte, eu recebi a Marca Negra. Quando cheguei à sede, todos os Comensais já estavam reunidos, e suas vozes exaltadas podiam ser ouvidas do hall. Parei um pouco para ouvi-los, antes de entrar. Eles comentavam sobre a matéria de capa do Profeta Diário daquela manhã, matéria que falava sobre certo ataque de Comensais à casa de certo professor de Hogwarts. Todos ali queriam saber qual deles haviam feito aquilo, e estavam confusos como gigantes diante de uma equação matemática.

- Se nenhum de nós fez isso, então quem foi? - ouvi um deles perguntar, era o momento certo para minha entrada dramática.

- Fui eu, é claro! - eu disse, mais alto que todos eles, entrando de uma vez na sala e deixando que a porta batesse com estrondo atrás de mim. O efeito foi exatamente o que eu esperava, todos se calaram e olharam para mim. Após um breve momento de silêncio, ouvi a risada de Goyle.

- Você, Black? Você não daria conta nem da metade daquilo, não passa de uma pirralha que mal saiu da escola!

- Você se esquece, Goyle, que essa pirralha aqui é a aprendiz do Lorde das Trevas, e pode acabar com você se quiser. - eu disse, erguendo as sobrancelhas na minha típica expressão de superioridade.

- Acho que você está meio desinformado, Goyle, Bellatrix é bem mais poderosa que parece. - Rodolphus se intrometeu.

- Sua opinião é suspeita, Lestrange. - desafiou Goyle, ainda incrédulo, e outras pessoas concordaram com ele, rindo. Eu revirei os olhos.

- Não é por nada não, amigo, mas o Lestrange está certo. Eu fui na última missão em que o Lorde mandou Bellatrix, e essa garota faz algumas coisas bem impressionantes. - falou Crabbe, e vários outros concordaram.

- Ah, fala sério, vocês todos só estão a paparicando porque ela é a bonequinha do Lorde! - Goyle parecia inconformado. Devia ser orgulho ferido, por ser superado por uma mulher com a metade da sua idade. Pior para ele, teria que engolir esse orgulho por bem ou por mal, e eu me alegraria em fazê-lo se arrepender por mal. De um jeito ou de outro, eu não permitiria que ele falasse comigo daquele modo, e minha varinha já estava apontada para o seu queixo gordo, mal ele havia terminado de falar.

- Nunca mais ouse me chamar assim, Goyle! - eu ameacei, minha voz baixa e letal, e o ar ficou suspenso na sala.

- Ou o quê, hein? O que você vai fazer, pirralhinha Black?

- Se eu fosse você, não seria tão rápido em subestimar seus colegas, Goyle. - a voz grave e gélida do Lorde das Trevas soou do topo das escadas, e todos nos viramos prontamente, nos dobrando em reverência enquanto ele descia majestosamente as escadas. - Sentem-se. - ele mandou, e nós nos espalhamos pelos sofás e cadeiras da sala.

- Na madrugada de ontem, Bellatrix Black foi sozinha até a casa de Erich Simith, seu antigo professor de Defesa Contra as Artes das Trevas. Ela arrombou sua porta, venceu-o num duelo, torturou-o e matou-o, colocando em chamas o bairro trouxa em que ele morava. Mais de dez trouxas morreram no incêndio. Esse foi o último teste de minha aprendiz, e por ela ter passado com louvor, creio que todos vocês irão concordar que a Marca Negra lhe é mais que merecida. - ter tudo que eu fiz reconhecido pelo Lorde, contado por ele para todos comensais com tanto orgulho, me deixava extasiada, assim como a expectativa de receber minha Marca. - Levante-se, Bellatrix.

Eu obedeci prontamente, me aproximando dele. O Lorde estendeu a mão e segurou meu pulso, trazendo meu braço para cima. Seus dedos frios em contato com minha pele fizeram calafrios percorrerem meu corpo. A manga do vestido que eu havia escolhido especialmente para a ocasião era comprida e tinha uma fenda até acima do cotovelo, de modo que a posição do meu braço fazia a fenda se abrir e o pano fino escorregar em cascata, expondo todo o meu antebraço e criando um efeito muito bonito.

- Ajoelhe-se, Bella. - ele disse com a voz baixa, e eu caí de joelhos no mesmo instante. Aquela frase fizera os pensamentos mais impuros percorrerem minha mente, mas eu tratei de me concentrar naquela cerimônia, que mudaria minha vida para sempre. - Bellatrix Black, é de seu livre e total desejo se unir a mim para livrar o mundo da escória trouxa e devolver aos bruxos o domínio que nos é de direito?

- Sim, Mestre, é o que eu mais desejo. - respondi, quase ofegante de euforia.

- E você jura, Bellatrix, eterna lealdade a mim e jura que me servirá incondicionalmente, mesmo que isso coloque em risco a sua vida ou a de quem você ama?

- Eu juro. Hei de servi-lo de corpo e alma, Milorde. - eu disse com firmeza, talvez as palavras mais sinceras de toda a minha vida.

- Muito bem então. Morsmordre!

Da ponta de sua varinha irradiou a maior dor que eu já sentira na vida, e rapidamente se espalhou por todo o meu braço. As linhas vermelhas que desenhavam lentamente o contorno da tatuagem queimavam como fogo. Percebi que meu cenho estava franzido e eu prendia a respiração. Me esforcei para controlar a expressão e colocar uma máscara de frieza e impessoalidade. Eu havia sido criada daquele jeito, aprendendo a me controlar e a usar máscaras, e não poderia falhar naquele momento tão importante. Pude perceber que os Comensais em volta estavam espantados com minha impassividade. Goyle que se arrependesse de me chamar de bonequinha.

A dor que eu sentia no braço era quase insuportável e, apesar de meu rosto continuar calmo minha respiração começava a ficar pesada. Merlin, o desenho não estava nem na metade, será que eu suportaria? Deixei de pensar na dor para tentar me distrair dela. Pensei na honra que aquilo representava, a partir daquele momento eu pertenceria inteiramente ao Lorde das Trevas. Eu estava, do único jeito que eu podia, me entregando a ele. Agora nós tínhamos uma elo, uma ligação que nunca podia ser quebrada. E naquele instante eu estava mais próxima dele que nunca antes, sua magia tão forte e poderosa atravessava meu corpo e se entranhava em minha carne. Havia um pedaço dele comigo agora, seu símbolo queimando em minha pele.

Apesar da dor, eu sorri. Um sorriso fraco e trêmulo, mas um dos meus mais sinceros. Os Comensais nessa hora deviam ter achado que eu era uma tremenda masoquista. Eles que pensassem, eu não me importava – até porque, talvez eu fosse mesmo. Eles nunca entenderiam que aquele era o meu grande momento, aquele com o qual eu sonhava desde antes de conhecer o Lorde das Trevas.

Quando finalmente acabou, fechei meus olhos por um segundo e soltei a respiração de uma vez, que acabou soando como um gemido baixo, mas apenas Milorde ouviu. A marca em meu braço estava se tornando negra, e não doía mais. Levantei meus olhos para o Lorde, e ele me olhava como havia olhado na noite anterior, cheio de orgulho e desejo. Me senti corar e mordi o lábio inferior antes de abrir um grande sorriso. Só então percebi que ainda estava ajoelhada aos pés do Lorde, e me levantei lenta e respeitosamente. A mão dele, que ainda segurava meu pulso, escorregou até a ponta dos meus dedos e os trouxe até seus lábios. Foi um toque leve e rápido, mas queimou em minha pele como a Marca Negra havia queimado há pouco.

- Você ultrapassou magnificamente o recorde dos Lestrange, minha cara, devo parabenizá-la. - me enchi de orgulho com suas palavras. Agradeci, fazendo uma pequena reverência. - Agora você é oficialmente uma Comensal da Morte, Bella. Seja bem vinda.