Picturing the Past - Prólogo

Obs: Bem, a idéia dessa fic surgiu de um sonho que eu tive há um tempo atrás. O estilo de escrita dela também é diferente do que eu to acostumada a escrever e tudo o mais... espero que gostem A-A E, se alguém por acaso souber de alguma fic que lembre, mesmo que vagamente, essa... por favor ME AVISE.

Agradecimentos à Blanxe pela ajuda.

Beta: Cristal Samejima

E não, essa não é uma deathfic.


'He cannot live neither die in this world
Burning sensation inside, you know how that hurts?'


- Você se lembra da vez que roubamos as maçãs do Seu Harrison? – Ele perguntou, com um sorriso em sua voz.

- Cla... ro...

- Então! O velho ficou irritado! Eu sabia que a gente ia acabar se encrencando, mas você foi rápido!

O outro menino sorriu suavemente para o amigo; não tinha mais forças para nada além daquele esboço. O olhar de seu amigo era tão triste, apesar de ele tentar disfarçar... Queria poder tirar aquela tristeza de seus olhos... mas os seus, no momento, pesavam tanto...

- Hey... não dorme, ok? Você não pode dormir. Lembra de como eram as maçãs? A gente podia pegar mais algumas um dia desses!

Concordou com a cabeça, sentindo-se cada vez mais cansado. Mas não podia dormir. A voz de seu amigo parecia cada vez mais distante agora... quase um sussurro, mas que era o suficiente para deixá-lo acordado.

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Um dia, a Morte se apaixonou. Era um amor impossível, ela sabia, mas isso não a impedia de desejá-lo cada vez mais; era como se nada mais, além de seu amado, importasse em sua existência.

Ela o observava de longe sem poder agir, sem poder confessar e consumar o que sentia por aquele ser inferior. O sorriso dele era doce e gentil, os olhos azuis eram tranqüilos... transmitiam uma paz tão grande que a Morte se perdia naquele olhar. Queria poder tocar aqueles belos cabelos loiros, fazê-lo sorrir e olhá-lo com ternura... Queria tê-lo para si, mas ele ainda era uma criança, ainda teria a vida dele inteira para acompanhar, até que seu fim um dia chegasse e ela, finalmente, pudesse tocá-lo antes de tirar-lhe a alma. Era um pensamento mórbido, mas era a sua única chance. E foi a primeira vez em que a Morte se ressentiu de ser o que era, de ter de tirar vidas.

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- Eu prometo que quando você ficar bom eu vou conseguir dinheiro o suficiente para te comprar um sorvete! Mas você tem que ficar bom primeiro.

- Pro...mete? – Perguntou o menino, um pouco mais animado.

- Juro.

- Eu vou ficar bom então.

O mais velho sorriu, um sorriso triste. Queria poder acreditar nas palavras do amigo, mas o estado deplorável em que este se encontrava fazia com que isso se tornasse cada vez mais difícil.

- Isso aí! Agüenta, a gente ta quase chegando. Você vai ficar bem... – Disse, sem deixar que sua voz ficasse embargada.

Precisava chegar a tempo, precisava salvá-lo... Só esperava que o menino em seus braços resistisse até que chegassem em seu destino. "Por favor..."

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Quanto mais os anos se passavam, mais seu encanto por ele aumentava. Era como se cada fase de sua vida, a cada mudança, ele a cativasse cada vez mais. Mas os sorrisos dele nunca eram para ela, os olhares carinhosos nunca seriam dirigidos em sua direção... E aquela constatação doía muito mais do que gostava de admitir, fazia com que algo dentro de si se quebrasse, numa agonia que nunca havia experimentado antes.

E foi a primeira vez que a Morte chorou. Chorou por si, pelo que era, pela impossibilidade de ter aquele humano para si. As lágrimas rubras coloriam-lhe as faces pálidas, liberando todo o desespero e dor guardados dentro de seu ser.

E Deus apiedou-se da Morte ao notar-lhe o sofrimento, oferecendo-lhe um presente irrecusável, porém ainda assim cruel: Ela poderia ter a seu amado, sim, mas apenas uma vez, quando a alma dele estivesse na transição entre a vida e a morte. Ela seria autorizada a curá-lo apenas para que aquela noite existisse, tomando-lhe a alma em seguida. Não havia como contestar ou recusar um presente vindo de Deus... se era algo dado por Ele, deveria ser algo para o seu bem... ou pelo menos assim ela costumava a pensar.

Então, antes que a Morte pudesse sentir-se minimamente feliz, pôde constatar que, no plano humano, o jovem a quem amava estava com o tempo contado; Deus havia colocado um cronometro em forma de doença, para que o seu presente tivesse uma data de recebimento, e a Morte nunca se odiou tanto como naquele momento. Amaldiçoou-se por um dia haver se apaixonado por aquele humano, por seu egoísmo ter tirado parte da vida dele... Sentia-se um monstro, sem qualquer direito de tocá-lo ou mesmo de amá-lo. Ela só não sabia que os planos divinos para si eram muito maiores do que poderia imaginar e que, de certa forma, ela nunca o perderia totalmente.

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Seus passos tornaram-se ainda mais apressados à medida que sentia o corpo em seus braços se entregar cada vez mais à exaustão que o consumia. Lágrimas começaram a embaçar seus olhos; estava o perdendo... Não podia perdê-lo! Não...

- Você está acordado, ne? - Perguntou, sacudindo-o.

- Aham... falta mui... to? Cansado...

- Aguenta aí! Você é forte! Tamos quase lá! – Disse, tentando animá-lo.

Mas a verdade era que não estavam tão perto assim... Só esperava que ele não desistisse ainda... não poderia deixá-lo morrer. Havia prometido cuidar dele e jamais falharia em sua promessa.

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Seus olhos se embaçaram. Assistia-o agonizar, sofrer pela doença que o consumia. Não queria ter que assistir àquilo, mas não havia sido forte o suficiente para recusar o presente de Deus. Mas não pretendia apenas assistir... era mais do que poderia agüentar. Materializou-se em sua forma humana e aproximou-se do leito de seu amado. As lágrimas, cristalinas em sua nova forma, vertiam sem qualquer controle enquanto caminhava. O vento fraco vindo da janela aberta não era o suficiente para mover seus pesados e compridos cabelos negros, mas o bastante para que o farfalhar de seu vestido contra o chão fosse aumentado, atraindo a atenção do jovem enfermo.

Seus olhos se encontraram e nenhuma palavra foi pronunciada por vários minutos, até que o rapaz sorriu fracamente, levando uma das mãos até o rosto da Morte.

- Você... é um anjo? – Ele perguntou, ofegante, fazendo com que ela apenas negasse e pousasse sua pálida mão acima da dele. – O que vo...cê é... então?

- Eu sou um monstro. – A Morte disse, com a voz embargada, arrancando mais um sorriso do jovem.

- Linda... demais pra ser... monstro. – Ele declarou, cerrando os dentes em seguidas para que pudesse agüentar a dor que o tomava.

Aquilo fez com que um soluço seco deixasse os lábios da Morte, enquanto ela se debruçava sobre o corpo diante de si e o abraçava firmemente.

- Eu espero que você me perdoe. – Ela sussurrou.

- Por... quê?

- Por eu ter me apaixonado por você. – Ela então o calou, pousando um dedo em seus lábios. – Eu vou ficar com você até... o seu fim. – A Morte declarou, com extremo pesar. Seu coração se acelerou ao ver o olhar de gratidão naqueles belos olhos azuis. Ele não tinha mais ninguém para segurar-lhe a mão no final...

Sabia que ele não agüentaria muito mais, mas ainda não pôde deixar de apertar-lhe a mão e deixar que mais lágrimas e dor a inundassem, quando ele deu seu último suspiro. Então uma aura púrpura os envolveu em seguida; a Morte passava parte de sua energia vital para o corpo inerte diante do seu, fazendo com que o coração do jovem voltasse a bater de súbito e sua respiração retornasse. Os olhos azuis se abriram, fitando-a sem aquela sombra fúnebre, que se fizera presente momentos antes.

- Eu morri? – Ele perguntou, franzindo o cenho.

- Não... não ainda. – A Morte respondeu, tocando-lhe o rosto suavemente.

O rapaz fechou os olhos novamente, aproveitando a carícia e tendo plena consciência de que aquele era seu último momento em vida. Voltou a encará-la, hipnotizado por aqueles belos olhos violetas, enquanto suas mãos adentraram-lhe os cabelos.

- Por quê? – Ele voltou a questionar, num sussurro.

- Eu amo você. Amei desde a primeira vez que o vi, quando você era apenas um menino. E... meu amor por você foi o que o matou, pois Deus me concedeu o seu último momento.

Para a surpresa da Morte, os olhos dele se encheram de lágrimas e ele a abraçou forte, ainda não deixando de fitá-la.

- Eu... sempre busquei por você a minha vida toda, Morte... talvez Deus escreva mesmo certo por linhas tortas.

Aquela confissão fez com que a Morte ficasse atônita. Ela sequer imaginava que seu amado houvesse descoberto sua verdadeira identidade e, além disso, descobrir que ele buscava o próprio fim, feria-a imensamente.

- Por quê? – Foi a vez dela perguntar, confusa.

- Porque não tem nada aqui para mim. Você levou todos a quem eu amei... eu esperava que você pudesse me levar também.

E a Morte amaldiçoou a Deus por aquele presente sádico...

Ela abraçou seu amado com ainda mais força, tomando-lhe os lábios com delicadeza. Não soube exatamente como aconteceu, mas pela primeira vez em sua vida, a Morte se sentiu completa. Os braços dele a envolviam, os lábios dele a tomavam e seus corpos se moviam ritmadamente, buscando por alívio, ao mesmo tempo em que tentavam aproveitar o máximo daquele momento. O último momento...

- Você vai me levar agora, não vai? – Ele sussurrou entre os cabelos dela, saciado, ainda a acariciando.

- Sim... – Ela respondeu, com pesar.

- Não fique triste. Eu te desejei a minha vida toda... nunca ia imaginar que a Morte se vestia de branco.

Ele sorriu, fazendo com que novas lágrimas vertessem dos olhos dela. Beijou-o novamente, enquanto separava-lhe a alma do corpo sem que ele sequer percebesse. Tomou-lhe a mão transparente, enquanto o corpo carnal do rapaz acabava por morrer, e seu espírito fitava a Morte com um belo sorriso no rosto.

- Obrigado.

- Eu te amo. – Ela disse, antes de soltá-lo e vê-lo partir para longe de si.

Naquela noite, a Morte permaneceu abraçada com o corpo morto do jovem que amava até que não pudesse mais chorar ou sentir nada. Nada além de ódio... E amaldiçoou-se novamente por não poder controlar a própria vida e ser obrigada a se submeter às ordens de Deus.

Mas foi quando os primeiros raios de sol adentraram o aposento que ela percebeu que aquela noite não havia sido em vão. Não sabia como ou porque, mas notou que em seu ventre, o fruto de seu amor florescia. Aquela realização a paralisou totalmente... ela era a Morte! E a Morte não tinha condições de dar vida...

'Nada é em vão...' Ela ouviu a voz de Deus reverberar por sua mente e mais raiva a tomou.

- Por que fez isso comigo?! – Questionou-o, dolorosamente. – Por quê?!

E o silêncio voltou a preenchê-la, fazendo com que suas perguntas permanecessem sem resposta, deixando-a ainda mais desolada. Não entendia o porquê de aquilo ter acontecido, e, para si, fora uma obra extremamente cruel e irônica de Deus para consigo; A Morte gerando uma vida. Quis rir da situação, mas sua amargura não a permitiu. Não sabia o que fazer, mas não pretendia deixar que aquela criança que se formava em seu ventre fosse controlada e usada como havia sido. Não... seu filho não seria como ela... seu filho seria livre. Deus não controlaria a vida dele, ele poderia fazer o que quisesse, poderia amar o quanto quisesse... Ele seria humano.

Seu filho era o misto de duas raças, de dois seres completamente diferentes. Ele era especial, único... não era apenas um, não teria como ser; ele era a junção da liberdade com a servidão, da vida com a morte, do bem com o mal... porque ela sabia que não era boa. A Morte não podia ser boa. A Morte era fria, traiçoeira e, muitas das vezes, maligna. Seu filho era agora uma parte de si... mas também uma parte dele. E nunca seria um só...

"Duo."

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- Duo! Acorda, Duo! – Ele sacudiu o amigo, vendo-o abrir os olhos fracamente, porém aparentando estar assustado.

- Solo...

O menino correu, subindo as escadas com tanta pressa que não soube como não tropeçou. Chutou desesperadamente a porta da igreja por estar com os braços ocupados, enquanto as lágrimas o dominavam e manchavam seu rosto.

- Padre Maxwell! Por favor! – Gritou, enquanto chutava a madeira com força. – Padre Maxwell!

Uma mulher com o rosto gentil, vestida com o hábito, o atendeu. Ela sequer perguntou o que havia acontecido, apenas guiando Solo para dentro do lugar com pressa, enquanto gritava para que alguém encontrasse o Padre Maxwell. Solo notou que a respiração de Duo estava cada vez mais ofegante, enquanto o menino tremia de encontro ao seu corpo, os farrapos de sua roupa não sendo o suficiente para aquecê-lo em sua enfermidade. Então, alguns minutos depois, um homem de meia idade apareceu, vindo de um corredor, e os olhou com o cenho franzido. Retirou Duo de seus braços e olhou para o garoto analiticamente, voltando os olhos para Solo em seguida.

- O que há com ele? – Perguntou suavemente, porém de forma séria.

- Eu não sei, Padre... ele ta morrendo! Ajuda ele! – O menino implorou, olhando-o nos olhos. – Por favor, Padre... eu não tenho dinheiro... mas eu consigo se precisar... mas ajuda o Duo...

A expressão do eclesiástico se suavizou e ele olhou para a freira que os acompanhava.

- Helen, cuide desse jovem enquanto eu vejo o que posso fazer por seu amigo. – Ele pediu, vendo a mulher assentir firmemente. – E você, meu jovem... não se preocupe, eu não quero dinheiro. Se Deus me deu o dom de ajudar as pessoas, eu o faço sem cobrar. Eu espero conseguir salvar seu amigo.

Solo os viu sumir pelo corredor em que o padre aparecera anteriormente. E, depois, foi saber pela Irmã Helen que aquele era o corredor que conectava a Igreja com o Hospital Universitário de São Lucas, que era onde o padre Maxwell trabalhava.

Não acreditava em Deus, mas jurou para si mesmo que passaria a acreditar se Duo saísse vivo daquela... e que seria um de seus seguidores, afinal milagres não acontecem todos os dias...


Notas beta: Ai... cheguei a sentir dor no coração ao ler esse capítulo... Tenho lido tanto sofrimento do pobrezinho do menino de olhos violetas... tadinho...

Mas se Duo é filho da morte e pode morrer... será que a mãe o quer por perto??... brrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr...

Beijos! Cristal