Naruto é do Kishimoto.
Pré Sarada, pós casamento. UA em que Sakura tem um pouco de amor próprio.
Não betada.
Desgosto
"You are one of God's mistakes
You crying, tragic waste of skin
I'm well aware of how it aches
And you still won't let me in"
Placebo – Song To Say Googye
É no sétimo mês de casamento que Sakura finalmente descobre que ela não gosta mais de Sasuke. Que talvez o odeie, até.
Ela não gosta de como ele sempre levanta cedo demais a fazendo acordar antes da hora e sempre chega quando ela está quase pegando no sono, de forma que ela não se lembra qual foi a última noite de sono decente que teve.
Ela não gosta nenhum pouco como ele fez questão que eles se mudassem para aquela casa velha. Condenando-a a uma existência de faxinas sem fim e corredores escuros levando a cômodos assombrados. E apesar disso, o único fantasma que a assombra é ele, ele que não suporta as lembranças, mas se recusa a partir, que responde grosseiramente quando ela o propõe, preferindo se perder num paraíso líquido de sakê em vez da liberdade.
Ela não suporta o como ele continua sofrendo, depois de todos esses anos, sozinho, em silêncio, cozinhando seu ódio em fogo baixo, mas quente o suficiente para queimar toda vez que ela tenta chegar perto.
Como médica, ela acredita que cada vida é um milagre envolto na máquina quase perfeita que é o corpo humano, como ninja ela fazia questão de tirar dessa máquina o melhor aproveitamento o possível, alimentando seu intelecto tão bem quanto seu corpo, buscando a perfeição nos mínimos detalhes. Quando era mais nova, acreditava que Sasuke também era assim, daí sua admiração por ele e desdém por displicentes como Naruto. Mas agora, ao ver seu marido perambular pela casa, sentir o cheiro de álcool nos lençóis, seu passado cheio de falhas seu futuro que não parecia ir a lugar nenhum. Talvez Sasuke não fosse o mais perto que ela chegaria da perfeição, hoje em dia ele lhe parecia bem mais com um erro dos deuses, um enorme desperdício de células e espaço.
E ainda assim ela não conseguia largar sua insistência estúpida de se agarrar nos momentos que lhe davam esperança, em beijos quentes, olhares longos o ridículo toque em sua testa.
Momentos que dão esperança, mas não lhe dão abertura. Ele nunca a deixa entrar. E sabe que ela se importa, que a amargura dele azeda todos os sonhos que ela teve para os dois e mesmo assim ele não a deixa entrar. É como se a distância nunca se findasse, é como mesmo sabendo onde ele está ela nunca conseguisse o tocar. É como se ele estivesse sempre atrás de uma das portas trancadas daquela casa.
E é nessa hora que ela se pergunta se não está louca, se não esteve desde o principio, amando um homem desses a ponto de chegar a adiá-lo com todas as suas forças.
Em outras vezes a questão parece ser quando foi que isso aconteceu, ela tinha certeza que não o odiava quando ele e Naruto lutaram pela última vez, ela tinha certeza que o havia perdoado quando ele pediu desculpas – ainda sua maior surpresa e choque, mais até do que o pedido de casamento – e havia momentos em que parecia que o ódio sempre esteve lá. A cada humilhação, a cada palavra dura e olhar de desdém, mesmo na infância, principalmente na infância quando o sentimento de traição queimava em seu estômago depois de ver o resultado do uso que ele fez dos segredos que a fez guardar. Sasuke sempre foi abençoado por conseguir atos de sacrifício das pessoas que o ama, afinal.
Mas agora sua inocência estava perdida e sua quota de sacrifícios batida e o que sobrava era aquela piada que os dois chamavam de casamento.
O que a Sakura-chan de doze anos pensaria dela agora? Dele?
Sakura fecha os olhos com força ao sentir ele se deitar na cama ao lado dela, o cheiro de bebida alcoólica enchendo o ar. Ela não chora mais, no fim das lágrimas só sobraram o ácido quente da raiva em seu ventre. Ela lê as horas no relógio em cima da mesa de cabeceira, três da manhã outra vez. Com esforço, se vira pra o lado, encarando a cara inchada que ela quer terminar de arrentar com seus punhos potentes.
- Pare de me olhar assim.
- Estou te incomodando? – retorquiu cínica.
Os lábios dele se comprimem numa linha e ele parece lutar internamente.
- Eu não tinha a intenção de te acordar – se desculpa com um tom de voz seco e o pior que ela acredita, ela sempre acredita.
- Sasuke-kun...
- Volte a dormir, Sakura.
Mas como ela poderia? Quando o ácido em seu estômago está aponto de lhe causar uma úlcera e a presença dele em sua cama lhe dá vontade de vomitar?
- Estou grávida.
O corpo ele enrijece, ela se vira pro outro lado, dando a ele a única coisa que ela pode dar que ele parece valorizar: privacidade. Que ele lide com seus sentimentos em solidão, como lhe convém, Sakura ainda não pode dizer que não se importa, ainda vai levar um tempo, pode levar uma eternidade e talvez ela nunca deixe se se importar mesmo e tenha que ser ela a viver para sempre solitariamente se importando com os sentimentos não compartilhados de Sasuke Uchiha, mas ela nunca foi muito boa nessa coisa se amor próprio mesmo.
Ela decididamente não o suporta, mas seu coração ainda parece transbordar quando ele finalmente a abraça por trás, o hálito adocicado de sakê balança dos fios rosados e seu pescoço quando ele suspira.
- Obrigado.
N/A: Eu deveria estar estudando, eu deveria estar dormindo. Eu deveria estar fazendo mil coisas em vez de estar escrevendo fic pra um fandom que não perteço mais. Mas o final do mangá me trouxe lembranças de um ship que eu só gostava quando bem amargo.
