Ele não poderia aceitar aquele sentimento de forma alguma.

Como alguém tinha a coragem de lhe dizer aquelas palavras? Algum ser mortalmente idiota que não tinha consciência do que falava. Só podia. Porque ele sabia muito bem o que fazia. Sabia porquê fazia e as consequências disso. Sabia também que nunca teria em troca nada além do que ele já esperava.

Malfoy sempre teve o que quis. Além de matéria, ele teve respeito - um respeito conquistado pelo medo, mais parecido com 'temor' do que com admiração- , teve privilégios, teve vantagem, conseguiu chegar onde queria. E em contra partida, só recebeu o mesmo em troca. Recebeu ódio, revolta, sede de vingança. Recebeu o olhar magoado e triste dos de "bom coração"; e a vontade de sangue e de causar em Malfoy tudo o que ele causara às outras pessoas vinha daqueles mais parecidos com o próprio loiro. Aquelas com almas menos vertiginosas, menos honradas, mais... Sonserinas.

Ele só não teve uma coisa. Um tal bruxo famoso que tinha a sua idade simplesmente negara a sua amizade. Simples assim. E Malfoy teve o seu primeiro "não" em muitos anos. Desde quando Draco Malfoy não atendia às exigências de alguém? Como ele, agora, não podia ter o que queria? Foi a primeira vez que Potter ousou em relação à Malfoy.

A verdade era que Malfoy não sabia como lidar com esse sentimento.

Mesmo assim, depois de todo o seu esforço, como ele escutava aquilo? Como ousavam?

O que ele recebia de volta era fruto de suas ações, de seus pensamentos, daquilo que defendia - nem sempre de origem própria, mas não importava -. E ele estava habituado aquilo, aceitava. Principalmente porque ele tinha o controle. E tudo se resumia aquilo: ter controle. Fosse das coisas boas - raras e de definição meio duvidosa -, fosse das ruins. Ele pelo menos sabia lidar com aquilo. Controlava, manipulava, aproveitava. Suas melhores qualidades. Então, o que mais o revoltava era exatamente não ter controle ou saber se comportar diante àquela nova situação.

Como alguém tinha o direito de fazê-lo sentir-se assim? Impotente diante de uma afirmação tão banal, rídicula. Malfoy não acreditou em nenhuma daquelas palavras - nas palavras, naquele que as dizia e muito menos em seu significado.

Porque Malfoy não admitia perder.

Perder a voz.

Perder o ritmo constante de seu coração.

Perder o ar, que parecia dificultar-se, como se evitasse entrar pelos seus pulmões.

Perder o foco do todo, concentrando-se apenas nos olhos à sua frente.

Perder a capacidade de dizer algo extremamente ofensivo, que fizesse a pessoa se tocar do absurdo que dizia e pedir perdão.

Perder o controle de seus próprios atos ao deixar que seus lábios se curvassem centímetros em um direção, que quase - e Malfoy fez questão de se lembrar que foi somente quase - formou um meio sorriso. Torto e estranho, mais ainda assim um sorriso.

Perder a noção do tempo.

E à cima de tudo, perder a consciência do que estava perdendo ao aceitar o encontro dos lábios que se deu após os segundos que Malfoy não contou.

Como alguém ousava beijá-lo?

Como alguém ousava dizer que o amava?

Como esse alguém ousava ser o maldito Harry Potter?