O inverno do meu contentamento

Prefiro o frio. Não digo que adore, mas eu fico mais confortável.

No inverno, estou quase contente.

Uso casacos pesados. Entro debaixo de grossas cobertas.

É tão bom ficar envolvido em tanto tecido. Abraçado. Como um manto.

Ninguém jamais me abraça, e eu aceito conforto de tecido.

Meu corpo se aquece no inverno.

Suponho que seja justo, já que o calor não toca minha alma.

Nunca.

Eu jamais fico quente por dentro.

Perpetuamente gelado no interior.

Perenalmente frio.

Permanentemente convertido em gelo.

Carente de vida, embora não totalmente insensível.

Pois eu sinto

Eu sinto dor

e desgosto

e amargor

e sofrimento.

Destituído e espoliado.

Abandonado e vazio.

O verão não me cai bem.

Lembra-me queimar, sufocar, asfixiar.

Traz suor, traz fogo.

Fogo da pressão, do desconforto.

Eu sei que alguns adoram o verão.

Os de pouca roupa, os de pouca preocupação, os que não são eu.

Não são mesmo.

Pois meu nome é Severo, rígido e sério.

Não, o verão não me cai bem.

Não sou um homem para todas as estações.

Eu conheci um desses.

Mas tive que matá-lo.

Era uma noite tão quente e abafada.

E eu tremia.

Como sempre. Nada de calor por dentro.

Não importa a temperatura, eu estou sempre azul de frio.

Congelado, glacial, ártico.

Uma rocha solitária desgastada pelo vento inclemente

Longe das pessoas, longe do amor.

Assim segue minha vida.

Dia após dia após dia após dia.

Eu já deveria ter me acostumado,

Deveria ter aceitado.

Eu tive uma chance e a arruinei.

Agora sou assombrado.

A danação caminha na minha direção

Selando meu destino

Zombando de mim com a cor do amor

Pois, afinal de contas, o amor é verde

Em olhos verdes puros e reluzentes

Que jamais brilharão para mim.