Marília acordou em um sobressalto, acabara de ter um pesadelo. Vira fogo, gritos, emoções confusas, o medo que ela sentira, sendo levada para dentro de uma concha, presa dentro de uma pérola, totalmente negra.

-Marília, pelo amor de Deus, ser trancafiada dentro de uma pérola?Foi só um sonho!

Ela olhou pela janela fechada, não se via nenhuma luz.

"Ainda deve ser noite, melhor é voltar a dormir" Pensou consigo mesma. Ela deitou no travesseiro e se recobriu, com os olhos fechados tentava dormir, mais o pesadelo lhe vinha à mente a todo instante. "Marília, vê se esquece isso! Foi só um sonho bobo, dá para voltar a dormir!" Ordenou a si mesma. Assim a noite foi passando e Marília foi acordada por batidas na porta.

-Marília? É a Madame Darion. Você está acordada?Poderia abrir a porta?

-Só um minuto, Madame.

Ela levantou da cama ainda um pouco sonolenta, foi até a cadeira da escrivaninha e pegou seu chalé rosa claro, um pouco cambaleante se dirigiu à porta e a abriu.

-O que foi Madame? Aconteceu algo?

-Não minha querida, é que já são 10 horas e você havia comentado de um compromisso as 11?

-Ah, claro! Muito obrigada Madame!

-Com licença então...

M. Darion deu um último sorriso e desapareceu descendo as escadas. Marília fechou a porta e se virou com um ar preocupado. Como poderia ter se esquecido?Era hoje que Johnny chegava!Nossa, há quanto tempo que eles não se viam! Desde crianças brincavam juntos, foram crescendo, mais aos 14 anos ele se resolveu pela vida de aventuras no mar. Embarcara em um navio mercante fazia 3 anos e os únicos vestígios de tão grande amizade ficou no coração, memória e cartas de ambos.

-Cadê aquele meu conjunto azul? Eu tinha posto aqui dentro! Ah achei! Vamos Marília, você não tem muito tempo!

Ela se vestira com um vestido branco, preso pelos ombros e descia até o tornozelo, dando sustentação, um corpete azul clarinho, amarado na cintura e terminando solto por cima da saia do vestido. Era uma de suas melhores vestes, que ela ganhará de M. Darion e, como não possuía muito dinheiro, não poderia comprar um novo.

-Esse vestido não é novo, mais é muito elegante!

Fez um meio coque, deixando seus cabelos castanhos claros lhe caírem pelo ombro, colocou um batom rosa claro e pegou seu leque branco, que era muito prático, combinava com tudo, afinal, não poderia se dar ao luxo de comprar mais leques.

-Está ótimo!

Ela parou se olhando no espelho e aprovando o resultado.

Sorriu, se dirigiu à porta, antes de sair deu um molhada em seu quarto. Ele era simples, mais aconchegante.

Havia uma cama no centro, uma mesinha de canto com lâmpada e flores, uma escrivaninha de frente para a janela com alguns pertences, um guarda-roupa com espelho embutido e no outro canto uma divisória, para que ela pudesse trocar de roupa.

Marília suspirou "O Johnny há de gostar daqui" e abriu mais o sorriso ao lembrar de como fora parar naquela pensão.

Tudo começara nos seus 6 anos de idade. Órfã de mãe, ela e seu pai passaram por muitos apertos, até que por um convite de uma tia, foram para a pequena cidade de Turniffe. Eles passaram um tempo lá, a casa de sua tia era em frente a uma pensão, da M. Darion, fora lá que conhecera Johnny, sempre tão amigos! Brincavam toda à tarde juntos, até que um dia de chuva forte, eles estavam no porta e se refugiaram no forte. A tempestade trouxera com ela a desgraça. Um navio de piratas atracou no porto de Turniffe e saquearam toda a cidade. Fora naquela noite que Marília perdeu tudo. Seu pai foi morto em batalha, tentando defender sua casa, e sua tia fora levada como prisioneira. Saquearam toda a casa, deixando Marília totalmente sozinha no mundo e sem nada.

M. Darion a acolhera em sua pensão, tornando-se uma nova mãe para Mary e a pensão, sua nova casa.

-Marília, querida, você está pronta?Já está na hora!

Essa voz a fez sair do transe em que estava. Mary trancou a porta de seu quarto e correu a escada. Passando como um raio pela Madame:

-Não vai comer nada?

-Na volta, até mais!

Respondeu e saiu para a luz do dia, que estava muito bonito, nuvens brancas brincavam no céu azul, sendo levadas pela leve brisa que soprava.

Foi andando rápido, que Marília se dirigia ao porto.

Ela iria finalmente rever o amigo de tanto tempo!Ela lembrava do dia em que soube que Johnny iria partir. Estava frio e nublado. Ele a chamou para conversar e explicou que iria sair de Turniffe.

-Não posso mais ficar aqui, vou atrás de dinheiro, sairei com o navio mercante e não sei quando voltarei.Mais sempre seremos amigos, e eu escreverei!

-Ah, John, quanto tempo! Falou para si mesma em um suspiro.

Agora já podia ver os barcos ancorados, apertou o passo e chegou ao deque. Quantos navios e barcos! Como ela acharia o John ali, no meio daquela confusão! Resolveu perguntar ao senhor que estava circulando com um bloco de papel nas mãos:

-Com licença...

-Sim, senhorita?

-Eu estou esperando um navio chegar, o Madlook.

-Ah, sim, é aquele ali. Ele acabou de desembarcar.

-Obrigada!

Fora na direção indicada e viu os navegantes desembarcando cargas, ao passar por eles ouviu alguns assobios, não ligou, tinha coisas mais importantes a fazer. Ela olhou em volta, mais nem sinal do Johnny.

-Onde ele está? Perguntou a si mesma.

E nesse momento sentiu alguém atrás de si cobrir-lhe os olhos com as mãos e uma voz conhecida, porém um pouco diferente disse:

-Adivinhe quem é?

Não houve tempo para resposta, Marília tirou as mãos estranhamente conhecidas de seu rosto e virou-se com um sorriso de felicidade nos lábios.

-John!

E mesmo sabendo que era muito estranho naqueles tempos uma garota de sua idade abraçar um rapaz tão abertamente, jogou-se em cima dele e lhe deu um grande abraço, um misto de saudade e alegria.

-Quanto tempo! –Ela disse e se separaram

-Nossa, minha amiguinha virou uma lady da sociedade!

-Mais mesmo assim, posso vence-lo a qualquer momento!

John cerrou os olhos, como fazia quando criança, no que Marília levantou as sobrancelhas e saiu correndo. Johnny começou a correr em seu alcanço, cada vez mais perto até que se encontraram e ele á levantou nos braços.

-O que você estava dizendo?

-Ah...Bem, são os sapatos, tente correr com ele!

Ele a devolveu ao chão enquanto ambos riam.

-Vou te levar pra casa, venha!

Os dois jovens foram conversando a caminho da pensão, chegaram lá no horário do almoço e Johnny foi recebido com um forte abraço da M. Darion.

-Ah, Johnny!Que saudades!Como você cresceu, está tão bem!Vamos almoçar, sim?

-Adoraria Melany!

Todos se sentaram, e Johnny foi contando suas aventuras durante todo o almoço.

-Quanto tempo você vai ficar aqui, querido?

-Somente três dias, Madame...

-3?Mais só três?Não ia ser uma semana?

-Pois é, o capitão recebeu uma mensagem de um amigo e só viemos reabastecer e descansar um pouco, depois rumaremos para Tortuga, acho...

-Tortuga?Você sabe que aquela é uma maldita cidade infestada de piratas, não sabe?

Era óbvio em cada palavra de Marília, que ela desprezava os piratas mais do que tudo.

-Sei, mais é um bom lugar para o comércio.

E os dias foram passando, Marília e Johnny não se desgrudavam, como nos velhos tempos, só que sem as brincadeiras.Até que o dia de partida chegou, Marília o acompanhou até o Madlook:

-Mary, pra você.

Johnny entregava-lhe um embrulho, que rapidamente fora retirado e deu lugar a uma linda caixa de madeira talhada, com pedras brilhantes e forrada por dentro com veludo.

-John, é lindo!Não precisava e eu nem trouxe nada para você!

-Não precisa, só te reencontrar foi um presente. Essa caixa é para você guardar suas melhores lembranças, o que lhe é importante, sabe?

-Eu amei, com certeza vou guardar!

O imediato chamou todos os navegantes do Madlook, e John e Marília se despediram com um longo abraço.

Ela podia sentir as lágrimas lhe escorrendo pelos olhos, e ficou ali, vendo o navio partir até desaparecer no horizonte.