Título: Gravity
Autora: Senhorita Mizuki
Categoria: Slash
Gênero: Drama
Classificação: PG
Personagens: Harry Potter e Draco Malfoy
Avisos: Spoilers do primeiro ao sexto livro, O Enigma do Príncipe. AU em relação ao sétimo livro, Deathly Hallows..
Disclaimer: Harry Potter e personagens aqui representados não me pertencem, mas sim a autora J.K.Rowlings e a Warner Bros. Foi escrito de fã para fã, sem fins lucrativos.
Gravity
Por Senhorita Kaho Mizuki
Capítulo 1
Sobressaltou-se no meio de seu sono, ouvindo leves pancadas. Confuso, percorreu os olhos sonolentos pelo lugar, se perguntando onde estava. Ajeitou os óculos que haviam escorregado pelo nariz, suspirando resignado. Havia adormecido de novo ali, na biblioteca.
Endireitou-se na cadeira, sentindo seus músculos protestarem de dor. Ouviu novamente as pancadas, dessa vez mais forte, moveu a cabeça em busca da origem do som, deparando-se com uma vidraça embaçada. Uma coruja bicava impacientemente o vidro. Abriu a janela, em instantes levando o dedo a boca gemendo, o animal nervoso o havia bicado. Fitou ameaçadoramente a pequena coruja, não se demorando em retirar o pergaminho preso à patinha.
Leu o remetente enquanto a ansiosa ave fazia um vôo rasante para fora antes que cerrasse a janela e passasse a tranca. A carta era dos gêmeos Weasley, Fred e George. Voltou para a mesa, jogando a carta sem abrir sobre um montinho com várias delas. Cartas de Hermione, de Ron, de Gina... Cartas que nos seus seis anos como bruxo o haviam confortado, lhe dado forças e o feito sorrir, enquanto permanecia o verão trancado no quarto de brinquedos de Duda na casa dos Dursley.
Não haveria cartas de Hogwarts aquele ano, a lista de material e livros, o trio não iria ao Beco Diagonal comprar suas novas vestes e se preparar pra o último ano letivo. Não haveria o Expresso de Hogwarts, a plataforma nove e meia, o reencontro dos colegas grifinórios nem a recepção dos novos alunos. Não haveria Dumbledore saudando os jovens bruxos.
Não haveria sonserinos arrogantes a zombar das outras casas...
Afundou-se na cadeira onde havia adormecido pela terceira vez naquela semana, encarando a bagunça que se instalara na mesa e nas prateleiras de livros. Semicerrou os olhos verdes, sentindo uma dorzinha de cabeça piorar quando um som estridente de panelas batendo umas nas outras veio da cozinha. Foi seguido de um resmungo mal-humorado, que adivinhou ser de Monstro, o elfo deveria estar preparando seu café da manhã. Era mais fácil acreditar que estava destruindo a cozinha dos Black.
Seus últimos dias com os Dursley haviam sido os piores de seus dezesseis anos, por mais incrível que pudesse parecer. Não tinha mais a mínima paciência de agüentar as acusações calado e de se segurar para não receber mais delas, pois antes ele tinha um motivo.
Sinceramente, não se importava mais nem um pouco com a proibição do uso de magia fora da escola e em trouxas. Mas não havia mais graça em ameaçar os tios ou fazer Duda dançar ao poder do tarantallegra.
Proteção. Soltou uma risada amarga, o que aquela proteção havia lhe custado?
No dia em que completara dezessete anos já tinha sua mala feita, e assim que a manhã chegara voara em direção da porta com seus pertences e Edwiges em sua gaiola. Antes que o tio Valter tivesse o prazer de impedi-lo, estendeu um documento do Ministério da Magia, onde dizia que ele havia atingido a maioridade. Não seriam mais responsáveis pelo sobrinho odiado.
Foi-se sob os olhares estupefatos de tio Valter, tia Petúnia e do primo Duda. "Para nunca mais, eu espero".
Sim, ele morria de saudades d'A Toca, da comida da Sra. Weasley, dos irmãos ruivos, dos dois melhores amigos e da ex-namorada.
Mas foi para o Largo Grimmauld número 12 que se dirigiu, ao tomar o Nôitibus, depois de perambular a esmo por Londres, ignorando solenemente os olhares curiosos dos trouxas em direção a sua coruja. Mirou sem muito entusiasmo a fachada da mansão dos Black. Não lhe agradava ter de ficar ali, na moradia dos parentes de Bellatrix Lestrange, na antiga sede da Ordem da Fênix. Mas fora a única coisa que seu padrinho havia lhe deixado, afinal.
Isso fora há uma semana, e agora era apenas ele e o elfo doméstico. Numa convivência mais de tolerância mútua do que a de mestre e servo. Mas não estava de todo sozinho, obviamente a Ordem providenciara para que o vigiassem de perto, alternando aurores para que lhe fizessem companhia. Certas vezes era Tonks, sua juba mais rosa do que nunca, outras o esquisito Alastor Moody, mas geralmente era seu ex-professor Remus Lupin.
Estava muito agradecido pela sua companhia, fora o melhor amigo de seus pais e de Sirius. Parecia compreendê-lo, uma vez que perdera as mesmas pessoas queridas. Mas o lobisomem aparentava estar bem melhor que ele, certamente a causa era a metamorfomaga louquinha.
O-Menino-Que-Sobreviveu havia decidido afastar todos de si, era melhor sofrer por estar sozinho e sem amigos que sofrer a perda de um deles. Não agüentava mais, não agüentaria mais. Aquilo haveria de acabar.
Recusava todos os convites dos amigos, das férias n'A Toca, da ida a um campeonato de quadribol, de visitas ao Beco Diagonal, da loja de Fred e Jorge. E ao invés de se sentir aliviado com a sensação de estar fazendo a coisa certa, sentia-se o pior possível. Jogado em um canto de Londres, entre relíquias empoeiradas, quadros de estranhos que o olhavam de forma acusatória e na companhia de um elfo que a toda hora resmungava de descontentamento na sua orelha. Estava a ponto de se juntar a ele nas lamúrias sem fim.
Antes que isso acontecesse, passou a revirar a biblioteca dos Black, apreciando o acervo de feitiços que continha. Pelo menos o que Sírius não havia jogado fora, que o elfo não tivesse escondido ou o que maldito do Mundungo Fletcher não havia roubado. Talvez pudesse passar o tempo testando-os em Monstro.
Então descobriu os álbuns de fotos da família, sentindo-se satisfeito ao achar algumas imagens do jovem Sirius escondidas. Como se a rabugenta Sra. Black no fundo ainda tivesse esperanças de que o filho rebelde se emendasse e voltasse para eles. Admirava a figura do charmoso e bem humorado herdeiro, muitas vezes o achava com ar entediado e contrariado em fotos com a família, lançando um olhar aborrecido e bufando. Em certas fotos em uma guerrinha de cutucões com o irmão, Regulus.
Em uma fez uma careta, encontrando as irmãs Black. A morena tinha um sorriso malicioso adornando os lábios, algo que parecia acompanhar-lhe desde o nascimento. A irmã ao seu lado tinha um cabelo loiro e liso impecavelmente escovado, que jogava para trás do ombro, em um gracejo. Tinha um ar arrogante, erguendo as finas sobrancelhas. Idêntico a ele...
Bellatrix e Narcisa. Trincou os dentes, a fúria subindo em seu peito. Vingaria, todos eles. Enfrentaria de frente os assassinos deles, pegaria Bellatrix, Snape e Voldemort.
Tirou a foto das irmãs do meio das cartas e começou a observar com muita atenção os traços da loira. Um novo barulho o fez pular da cadeira, mas dessa vez era só a porta da frente. Na mesma hora o quadro da Sra. Black despertou, gritando uma série de xingamentos que ele nem sabia que existiam.
Lançou-lhe um olhar furioso e gritou Silencio, apontando a varinha para a boca pintada da mulher inconveniente. Logo os únicos sons eram os resmungos de Monstro e seus passos em direção à entrada. Hesitou antes de girar a maçaneta, rolando os olhos ao lembrar das recomendações do Ministério.
- Senha?
- Juro solenemente que não farei nada de bom! – soou uma voz forçadamente séria do outro lado.
Harry riu, destrancando a porta e abrindo-a. Abriu um sorriso de orelha a orelha, vendo Lupin tirar seu chapéu e cumprimentá-lo com um aceno de cabeça. Afastou-se, abrindo passagem para o lobisomem. O homem passou cauteloso pelo quadro, franzindo o cenho ao ver a velha mulher mover furiosamente sua boca, mas sem emitir som. O garoto sorriu sonsamente, fechando a cortina na frente da pintura.
- Creio que usei o feitiço com mais raiva que devia. – deu de ombros.
Seguiu o garoto até a sala, vendo-o pegar a capa e ajeitá-la sobre os ombros, levantando a sobrancelha ao observá-lo arrumar o cabelo que despontava para todos os lados. Harry percebeu sua confusão e apressou-se a explicar.
- Não agüento ficar aqui dentro nem mais um dia, comendo o que esse elfo faz. – disse entre dentes e acenou a cabeça na direção da cozinha.
Lupin soltou uma risada que não ouvia há tempos e cruzou os braços, olhando-o com um ar divertido. Harry sorriu abertamente, metendo as mãos nos bolsos da calça.
- Ah, então decidiu finalmente sair? Pena que seus amigos não estão aqui para nos acompanhar. - murmurou Lupin, soando um tanto melancólico.
Então se aproximou da lareira e pegou um punhado de pó de flu. Disse em alto e bom som as palavras Caldeirão Furado, jogando o pó e desaparecendo. Harry imitou-o, surgindo logo depois ao seu lado no familiar bar sujo e escuro.
Remus deu alguns tapinhas nas costas do jovem que já tinha quase sua altura, e que logo deveria ultrapassá-lo. Apontou para uma mesa vazia e seguiram até lá. Em poucos segundos, Tom estava do lado deles, cumprimentando-os e anotando seus pedidos.
O garoto percorreu os olhos pelo lugar, achando-o mais vazio do que costumava ser. Não era de surpreender, uma vez que os Comensais da Morte e seu Lord estavam à solta, espalhando terror. E com a morte de Dumbledore o pânico crescera, queria saber como estava em Hogsmeade. Os bruxos não saíam de suas casas, seus filhos não voltariam a Hogwarts. A escola não era mais um lugar seguro, uma vez que os Comensais conseguiram invadi-la meses atrás.
Seus pensamentos foram interrompidos quando duas cervejas amanteigadas foram depositadas na mesa. Tomou um bom gole da garrafa, sentindo o líquido descer pela garganta, depois estalou a língua.
- Estava com saudades disso.
- Aposto que sim. - o lobisomem riu.
Harry apoiou os cotovelos na madeira, olhando-o com uma expressão curiosa no rosto, vendo-o bebericar também da garrafa. Apoiou o queixo nas costas das mãos, inclinando-se na sua direção e dirigindo-lhe um sorriso maroto.
- Como está Tonks?
O homem engasgou, tossindo sonoramente e corando. Piscou várias vezes, arregalando os olhos para o garoto, começando a gaguejar, por um momento achou que James havia voltado. O outro sentiu que podia explodir na gargalhada com a visão que tinha, mas conteve-se, não era justo. Viu-o olhar ao redor aborrecido, haviam chamado a atenção das pessoas. E então lançou um olhar nervoso para Harry.
- Engraçadinho, diga-me você! Tonks esteve na mansão dias atrás!
- Não precisa ficar envergonhado, professor! Eu sei que estão saindo – disse com calma, dando mais um gole da cerveja – Tonks ficou o tempo todo tagarelando sobre e mudando o estilo e cor do cabelo, perguntando qual era seu tipo. Me deixou até tonto. – revirou os olhos de forma dramática.
Gostaria de saber se a metamorfomaga havia aceitado a sugestão de usar o cabelo comprido e negro. E se sim, adoraria ver a cara do Lupin quando visse o novo visual. Reprimiu o riso dando mais um gole da cerveja.
- Bom, digamos que estamos saindo, sim – cruzou os braços, balançando ligeiramente a cabeça – É, é uma boa moça – pigarreou – Mas duvido que Sirius aprovaria – fez um muxoxo – Digo, ela era sua prima.
Seguiu-se um longo silêncio entre eles. Harry deu alguns tapinhas no braço do lobisomem.
- Não se preocupe, creio que aprovaria.
- Você não estava namorando a caçula dos Weasley?
Imaginava que iriam mudar de assunto, mas não esperava que seguisse logo por aquele viés.
- Namorar não é a palavra. – murmurou amargo – Não chegamos a isso.
- Harry... Por que está se afastando de seus amigos? Tonks diz que tem cartas empilhadas deles, mas não as responde.
- Não quero que se machuquem por minha causa. – desviou o olhar, incomodado com o rumo da conversa.
- James, Sirius e... Peter – hesitou antes de falar o nome do último – se arriscaram por mim. Acredito que eles fariam o mesmo por você, Harry.
- Mas eu não quero que se arrisquem por mim! – se exaltou, encarando-o e fazendo alguns olhares voltarem para a mesa deles.
Tom chegou trazendo a refeição deles, e logo os bruxos voltaram suas atenções para suas próprias atividades. Uma mulher desceu as escadas, vinda provavelmente dos quartos que o Caldeirão Furado alugava. Usava uma capa de veludo verde escuro, o capuz cobrindo o rosto de tal forma que apenas se via o queixo pálido e um punhado de cabelo loiro que ficara para fora dele, descendo liso sobre o colo.
Harry correu os olhos rapidamente pela figura, distraidamente, e então se ocupou a comer, o que Remus já fazia. Agradeceu mentalmente que não voltarem ao assunto que ele mesmo conduzira, mas não queria passar o resto da manhã sem conversar com o lobisomem. Pigarreou, fazendo-o levantar os olhos do prato para si.
- Andei lendo o Profeta Vespertino, segundo eles os Comensais estão intensificando os ataques a capitais trouxas?
- Sim, é verdade. – acenou a cabeça – O Ministério da Magia está tendo problemas em apagar a memória dos trouxas. São muitos os ataques à luz do dia, e acabam sendo transmitidos ao vivo pela televisão. Como explicar, por exemplo, por que seus carros estão voando?
"Os aurores andam tão ocupados, que temo que o mundo bruxo esteja desprotegido mais do que deveria".
Suspirou por fim, a expressão pesarosa tomando conta do rosto agradável do lobisomem. Harry grunhiu, esfregando a cicatriz na testa, sentindo o ódio em seu peito aflorar mais uma vez.
- Se pelo menos eu pudesse me tornar um auror, ir com vocês caçar esses malditos! Mas nem ao menos poderemos prestar os NIEMs esse ano.
- Não, Harry! Você é o alvo principal, não deve se expor!
- Estou cansado de ser protegido e ficar parado, sem fazer nada! Pessoas morrem enquanto não o enfrento!
Instintivamente meteu a mão no bolso, apertando o metal frio do colar. Mantinha guardado consigo desde que haviam ido até aquela caverna horrível, desde que Dumbledore havia morrido. Para nada.
Precisava continuar o que começaram juntos, tinha de ir procurar os horcruxes restantes. Antes de enfrentá-lo cara a cara para uma última batalha. Era o único jeito, segundo o falecido bruxo, destruir as partes de sua alma, para que não houvesse chances de sobrevivência para o Lorde das Trevas.
Mas por onde começar? Os últimos acontecimentos davam voltas e mais voltas na sua cabeça. E antes prometera a si mesmo visitar o túmulo dos pais, em Godric's Hollow, mas não se sentia pronto ainda.
- Há mais coisas sobre os comensais que o "Profeta" não divulgou? – murmurou, voltando a dar uma garfada na omelete.
- Bem... – hesitou, fazendo com que o outro o olhasse com curiosidade – Não sei se é bom contar-lhe. – viu o jovem fazer uma cara exasperada – A fonte não é de todo confiável. – olhando para os lados, inclinou-se na mesa e falou baixo – É sobre aquele filho dos Malfoy.
- Draco? – disse em um gemido estrangulado, pronunciando o nome em um tom suficientemente alto pra que a mulher sentada próxima a eles erguesse o rosto, descobrindo mais o rosto por sob o capuz escuro.
- Sim. – fez um gesto para que falasse baixo – Parece que os Comensais não estão satisfeitos com ele, compreensível já que, como você mesmo afirmou, não foi capaz de matar Dumbledore.
- Por Merlin, ele tinha só dezesseis anos. – murmurou, um tanto indignado.
- Dizem que além do Ministério, o herdeiro dos Malfoy também está sendo caçado pelos companheiros de seu pai.
- O Ministério...? – a confusão tomou conta do jovem.
- Oras, ele acabou fugindo com Snape e os Comensais que atacaram Hogwarts, não? – ergueu os ombros – Está sendo procurado tanto quanto eles. A mansão e Narcisa são vigiadas dia e noite.
Caçado? Seus pensamentos voltaram à fatídica noite, sentindo pena do medo que tomara conta do sonserino loiro. Nos dias seguintes pensara nas vezes que seguira Draco no último ano para pegá-lo fazendo algo comprometedor. Provar que estava certo em acreditar que estava trabalhando a serviço de Voldemort.
O ar cansado e abatido que cobria o rosto pálido, não se ocupando mais em importunar o arquiinimigo da escola e seus amigos. O dia em que o vira chorar de desespero... e quase o matara. Ele não era um assassino. Podia ser arrogante, insuportável, odioso, mas não era como seu pai.
Onde estaria agora? Se fosse verdade o que Remus havia lhe contado onde estaria escondido? Apertou os punhos sobre a mesa. Snape estaria ajudando-o?
O sino da porta do bar soou, indicando que alguém entrara naquele instante. Isso fez com que Harry levantasse os olhos. Ofegou e sentiu um arrepio percorrer sua espinha.
Olhos azul acinzentados, duros e frios emoldurados por fios de um loiro quase branco, encararam de volta seus olhos verdes.
Continua...
Fevereiro/2006
