Olás! Minha tentativa de escrever algo sobre Clito e Alexandre aqui... só pensando que, se eles pudessem ter se reconciliado, teria sido ótimo...


Meninos

Já durava o terceiro dia da febre de Alexandre. O rei se debatia na sua cama, às vezes caindo em uma profunda letargia apenas para ser desperto pelas estranhas dores que sentia. E foi em um desses breves alívios que o sono lhe concedia que ocorreu algo estranho.

Estava só em seu quarto, e foi despertado por um suave afago na cabeça. Ao abrir os olhos, deparou-se com Clito, que sentava-se ao seu lado com uma taça de vinho na outra mão. Tinha um olhar incrivelmente suave.

"Clito?", articulou as letras pesadamente, como se saísse do maior torpor de sua vida, "Como..."

"Aquiete-se, Alexandre. Espere um pouco e verá que melhora".

E de fato, Alexandre logo sentiu-se melhor. Era como se a febre e as dores o houvessem abandonado. Mas ainda sentia-se prostrado. Não ousou sorrir para Clito. O que sua sombra fazia ali, sendo tão gentil? Não se lembrava de haver visto, nem uma única vez na vida, um olhar tão doce em seus olhos. Ele continuava fazendo afagos em seu cabelo.

"O que está fazendo aqui, Clito?", perguntou sentindo a língua bem mais leve. No entanto, sentia também uma mistura de remorso e tranquilidade por ver de novo aquele rosto. Que um dia, ele havia visto se contorcer de dor ao ter o corpo traspassado pela sua lança. Queria lhe sorrir, mas não estava em seu direito.

"O que mais? Lhe fazendo companhia, rapaz".

Alexandre não pôde controlar os cantos de sua boca, curvando-os em um triste sorriso. "Por que veio até aqui? Eu te matei como um covarde, porque não suportei te ouvir".

Clito fez uma pausa, ficando sério. "Eu também não fui o homem mais justo com o que dizia".

"Disse o que devia, Clito. Eu preciso do seu perdão...", Alexandre disse com um olhar de súplica.

"Deixe disso, Alexandre. Nossa briga foi a de dois homens bêbados. Que homem pode se chamar de macedônio, se não fizer isso?", Clito replicou com um sorriso amargo.

Alexandre quis chorar, mas sentiu que as lágrimas não vinham. "Por favor, Clito..."

"Deixe disso, Alexandre", ele repetiu gentilmente voltando a afagar a sua cabeça. "Deixe disso ou vai se cansar".

Mas Alexandre não cedeu. "Está mesmo tentando me dizer que não estava magoado com minhas ações? Que o que falou veio do vinho e não do seu coração?"

Clito suspirou. "Eu estava irado, Alexandre. Profundamente irado. Você parecia se esquecer de nós, que te acompanhávamos desde a Macedônia, para olhar para os bárbaros. Não fazia ideia do quanto isso nos feria".

Alexandre olhou nos olhos de Clito, e viu que ali também havia tristeza. "Tem ideia do que é ir atrás de um rei que te leva a inimagináveis léguas de casa, para as portas do fim do mundo e ver que ele prefere um bárbaro no seu lugar? Que, para ele, um grego que o serve há sete anos em campanha e um bárbaro que acabou de conhece-lo são a mesma coisa?"

"Mas eu jamais preferi eles a vocês, Clito. Em meu coração, jamais esqueci que vocês estiveram comigo desde o início".

"Pois não era o que parecia", Clito falou olhando para o vinho, como se estivesse perdido em memórias, "Você nem nos consultava mais. Isso feriu o nosso orgulho, mas mais do que tudo, feriu o nosso amor por você".

Alexandre sentiu cada parte do seu corpo ser abalada por aquelas palavras.

"E, naquela noite, eu quis te fazer enxergar isso".

Alexandre fez uma pausa, procurando absorver aquilo tudo. Quando conseguiu encontrar as palavras, falou:

"Eu não posso me desculpar por ter querido que os asiáticos fizessem parte do meu exército", ele falou com suave firmeza, porém logo sua voz começou a falhar, "Mas peço perdão por não ter percebido o que estava fazendo com vocês". Ele estendeu a mão para pegar a de Clito.

"Perdoe-me por não ter te ouvido, Clito. Perdoe-me por..."

Sem conseguir completar a frase, implorou com os olhos o perdão do mais velho. Clito sorriu tristemente e segurou de volta a sua mão.

"Está perdoado, Alexandre. Está perdoado". Os dois se olharam por mais alguns instantes, e o jovem rei voltou a sentir-se feliz na companhia do soldado favorito de seu pai. "Agora, volte a se deitar antes que se canse".

Alexandre recostou de novo a cabeça no travesseiro, sentindo-se mais leve do que nunca. "Eu te amo, Clito", disse com os olhos molhados de emoção.

"Eu também te amo, menininho", Clito disse beijando a sua cabeça.

Alexandre se acalmou e caiu em um sono profundo. Entre seus servos comentou-se que, curiosamente, aquela fora sua única noite de paz em sua longa agonia...


P.S: O "menininho" de Clito é porque, se não me engano, na dublagem brasileira ele diz isso lá na cena do banquete em honra ao casamento de Felipe e Eurídice. Ele beija Alexandre e diz algo como "Eu te amo, menino/menininho". Achei uma referência bonitinha.