"O que é isso que está ali?"
Um dia ele já compreendeu o que eram as coisas não palpáveis. Já compreendeu as coisas que não se pode ver. Já compreendeu um sentimento. Já compreendeu um coração. Mas agora, ele esqueceu de sua humanidade. Ela foi deixada para trás há muito tempo. O motivo, não se sabe...
Após sua morte, ele perdeu tudo o que um dia o tornava humano.
"Não há nada"
Quando acordara, se viu no meio de algo completamente desconhecido. Aquele era um lugar onde a luz não poderia alcançar. Mas nessa escuridão, ele era o único que possuía uma cor. Ou a falta dela. Branco...
"Eu nasci nas profundezas, onde a luz não alcança."
Ele não estava sozinho naquele lugar de trevas. Haviam mais pessoas, ou criaturas. Porém eles eram de mesma cor que as trevas. Olhavam para ele. Famintos. Queriam alimentar-se para evoluir, mas Ulquiorra, não. Ele apenas queria ficar sozinho para viver seu vazio.
"Envolto pelas trevas. Incerto sobre o futuro. Nascido sobre aqueles resíduos negros... Completamente negros."
A sua diferença era o que chamava a atenção daqueles outros. E era a sua diferença que só fazia que ele quisesse ficar longe de tudo e de todos.
"Eu possuía um corpo alvo. Meus companheiros tinham corpos negros. Esses corpos negros... Com suas bocas descobertas e olhos reluzentes... Sem dúvidas, devoravam algo. E então..."
Se todos eram diferentes dele, não havia sentido em continuar ali. Ainda mais por eles quererem devorar o que não havia em Ulquiorra. Decidiu que a única coisa que lhe restava, seria vagar sem rumo.
"Em mim nada havia."
Caminhou pelo deserto. Sozinho. Talvez nem sua sombra estivesse lhe fazendo companhia. O vento soprava, em silêncio. Não sabia para onde iria, na verdade, isso não importava. Nada em sua vida importava. A meia lua do Hueco Mundo era a única coisa que o observava, mas de toda forma, estava longe demais para ser considerada uma companheira.
"Eu não sentia nada.
Não.
Eu fui incapaz de notar que o que eu sentia era vazio."
Ele se tornou incapaz de tudo. Incapaz de ouvir. Incapaz de comer. Incapaz de sentir o cheiro. Incapaz de sentir o toque. Incapaz de dormir. Não possuía companheiros. Ele apenas... Vagava sozinho.
"O que reflete em meus olhos, não possui significado.
O que não reflete nos meus olhos, não existe."
Vagando... Vagando...
Vagando... Vagando...
Vagando...
Vagando...
"Quando dei por mim... Encontrei algo extraordinário."
Vários gravetos. Aglomerados como uma colônia. Porém, mortos. Sem qualquer sinal de terem vida. Secos. Sem cor. Ele olhou para os gravetos. Ele via a si mesmo.
"Foi, de certa forma, o local de nascimento...
Foi a primeira vez...
... Que algo chamou a atenção dos meus olhos."
Ele via a si mesmo. Era ali que deveria estar. Então, jogou-se naquele monte de vazio.
" Sem cor. Sem som. Sem fragrância. Não interagia com nada. Apenas existia. Foi a existência mais próxima do vazio que meus olhos encontraram. Eu atirei o meu corpo... Naquele grande vazio."
Quando atirou-se, enquanto os galhos mais resistentes quebravam-lhe a máscara óssea que cobria seu rosto. Feriam sua pele pálida, mas não se importou. Ele era incapaz de sentir a dor. Ficou ali, deitado. Olhando para o nada.
"Nada havia ali. Minha visão se esvaiu, e eu me dissolvi no vazio. Senti como se tudo tivesse desaparecido."
Felicidade...
Ele estava sonhando. Quando abriu os olhos viu o rosto daquela jovem de quem ficara responsável. Ela tinha se assustado.
– WAH! – ela exclamou. – Você me assustou!
Logo ela sorriu. Ulquiorra havia pego no sono enquanto esperava que ela terminasse sua refeição.
– Eu ia te acordar, mas você acordou sozinho. Tomei um susto! – ela ainda sorria para ele. – Mas estou surpresa em saber que você consegue dormir, Ulquiorra-kun.
– Ulquiorra. – ele falou.
Ela não entendeu.
– Eu já disse para não se referir a mim como um humano. – ele disse. – Me chame de Ulquiorra. Apenas isto. – ele completou.
O leve sorriso da jovem se desfez...
"Se a felicidade existe neste mundo...
...Então ela deve ser algo que se assemelha ao completo vazio.
O vazio significa não ter nada, e não ter nada a perder.
Se isto não é ser feliz, então, o que é?"
O vazio era tudo o que ele conhecia. Tudo o que ele não conhecia. A razão da sua existência, ou a falta dela.
"O que reflete em meus olhos, não possui significado.
O que não reflete nos meus olhos, não existe.
Não há nada.
Em você...
...e em mim."
