O sol estava escaldante, quase nenhum vento soprava e havia deserto até onde a vista dava. Poe Dameron tentava se manter acordado. Perdera consciência por alguns segundos. Não sabia onde estava, como viera parar ali, o que estava fazendo, quem era... mas logo tudo voltou a sua mente num turbilhão.
"BB-8!", sua mente gritou lembrando-se da importância no robô. Ele moveu-se rapidamente mas parou devido as dores intensas nas costas. Gemeu de dor. Já tivera acidentes antes então aquilo não o chocou, mas mesmo que fosse a centésima vez doía como se fosse a primeira. "Concentre-se, Dameron! Deixe de ser chorão.", disse para si mesmo.
Olhou de lado. Percebeu que fora jogado muito longe da nave. O garoto Finn não estava por perto. "Droga!", xingou. Sabia que ia dar tudo errado porque por um momento tudo estava dando certo. Achara o mapa muito tranquilamente. Era bom demais pra ser verdade. Claro que iam ser presos, ter um acidente, ele ia perder BB-8, a Primeira Ordem descobriria onde estava Luke Skywalker e ele morreria num maldito deserto!
Assim que a palavra "deserto" passou por sua mente ele começou a sentir muita fome e sede. "O que eu não daria por um bom vinho de Alderaan agora.", pensou desejoso. O que não foi uma boa ideia. Logo lembrou-se da General Organa e de como falhara miseravelmente na sua missão. "Perdoe-me, Leia", lamentou.
Pelo canto do olho viu umgrupo de crianças se aproximando.
-Oi, garotos!- exlcamou tentando sorrir, mas não obtendo muito sucesso.- Tive um pequeno acidente com a minha nave, será que vocês poderiam me ajudar? Sinto como se tivesse quebrado todos os meus ossos.
Os meninos o olharam desconfiados. O que parecia ser o mais velho segurava um pedaço de pau e o apontou para Poe.
-Você é um deles!
Poe franziu a testa, mas então entendeu.
-Ah, é... sim, sou um piloto da Primeira Ordem. Uhum. Por favor, me ajudem e serão recompensados. Eu prometo.
Até uma criança entende o que "ser recompensado" significa. Os garotos se entreolharam indecisos. Era difícil ser charmoso sentindo dores por toda extensão do seu corpo. Mas Poe sorriu e tentou usar uma voz apaziguadora.
-Olhem, estava numa missão muito importante. Se vocês me ajudarem, a Primeira Ordem será muito grata e achará uma maneira de ajudá-los de volta assim que possível.- aquilo era parcialmente verdadeiro. Fez uma anotação mental para não se esquecer daqueles meninos quando retornasse ao QG da Resistência.
Os garotos murmuraram em concordância.
-Vocês seguram as pernas e nós os ombros e a cabeça.- disse o mais velho apontando para eles.
Dois meninos seguraram as pernas do piloto e os outros três apararam seus membros superiores. Poe gritou de dor e até soltou alguns palavrões quando o levantaram.
-Você é pesado!- reclamou um dos meninos sem nenhuma consideração pelo sofrimento do outro.
-Desculpe.- disse sarcástico. Rezou para que não tivessem piorado nenhum ferimento.
Os garotos carregaram-no por um bom tempo. Poe fechou os olhos evitando o sol forte, mas ao mesmo tempo tentava não adormecer. Puxou conversa com as crianças.
-Então... só por curiosidade, em que planeta estou mesmo?
-Você não sabe?- perguntou um dos meninos espantado.
-Sua missão não era por aqui?- indagou outro desconfiado.
-Não. Já disse, sofri um acidente.
-Qual era sua missão?- perguntou o líder deles sem responder o questionamento de Poe.
-Não posso dizer, é confidencial.
-Acho que está mentindo.- acusou um outro menino.
-Não estou, vejam, os destroços da minha nave não devem estar longe daqui. Estou indefeso, sem armas e sozinho. Se suspeitarem de mim podem chamar seus pais. Não tem problema, eu não me importo.
Eles se calaram, mas Poe percebeu que ainda não confiavam nele completamente.
-Então... o planeta?
-Jakku.- disse o mais velho a contragosto.
-Jakku!- exlcamou Dameron em tom de desespero. Ele ainda estava naquela pedra?! Pensou que conseguira voar para mais longe um pouco. "Isso é ruim. Isso é muito ruim.". Se ele ainda estava em Jakku, muito provavelmente BB-8 também estava. E a Primeira Ordem está rondando por aí. "Eu tenho um mau pressentimento quanto a isso", pensou.
-Ei, amigo, não tem nada de errado com Jakku.- falou o menino mais velho bairrista.
-Não, nada. As pessoas são muito simpáticas e o clima é muito agradável. Com certeza retornarei em breve.- Poe sabia que não deveria ser rude com as pessoas a quem ele literalmente dependia para sobreviver, mas a dor estava insuportável e quem sabe eles acreditariam mais que ele era da Primeira Ordem se fosse grosso.
O piloto começou a ouvir alguns barulhos de pessoas. Acreditou que estavam se aproximando de algum tipo de cidade ou o que quer que seja que Jakku tenha. "Ah, ótimo. Vou ser o assunto do dia.". Podia ver claramente as pessoas olhando espantadas para o homem ferido sendo carregado por um monte de crianças. Não olhara bem para o seu corpo, com certeza tinha algo torcido em algum lugar.
Notou que não sentia mais o calor do sol. Abriu os olhos. Estava debaixo do que parecia ser uma tenda.
-Mamma, achamos esse homem ferido no deserto.
-Ele diz que é da Primeira Ordem.
Poe olhou para os lados agitado, não conseguia ver com quem eles estavam falando.
-Tudo bem, meus queridos. Ponham-no ali.- disse uma voz calorosa de uma senhora.
Poe ficou um pouco aliviado. Pelo menos ela parecia gentil. Os garotos o colocaram no chão e ele gritou de novo.
-Vamos ver o que houve com você...
Dameron olhou para ela. Era humana. Não era uma senhora tão de idade assim, mas também não era muito jovem. Já possuia cabelos brancos e rugas pelo rosto. Ela usava óculos e observava Poe analisando-o.
Ele arriscou um olhar para si mesmo. Sua roupa estava suja de sangue e areia, sua calça estava rasgada e havia um corte enorme em sua coxa. Seus pés estavam em posições que ele não consideraria como ideais. Sua jaqueta havia sumido (o que era uma boa já que ela tinha o símbolo da Resistência), seu dedo mindinho da mão esquerda também estava torcido e a pele do seu braço direito se abrira de tal forma que ele podia ver suas artérias e tendões. Mas afora isso ele estava ótimo.
O pânico deve ter transparecido em seu rosto porque a mulher sorriu gentilmente.
-Não se preocupe, já curei coisas piores.
Poe não se sentiu muito reconfortado com aquilo, mas assentiu.
-Se acha isso feio devia ver sua cara.- disse um dos meninos sorrindo maldoso.
-Meninos, que tal vocês esperarem lá fora um momento enquanto cuido do seu amigo?
-Ele não é nosso amigo!- protestou um deles, mas obedeceram a mulher e sairam da tenda.
-Aqui, você deve estar com sede.- ela lhe deu um copo d'água e Poe teve que reunir forças para pegá-lo com a mão direita.
-Obrigado.- disse fracamente.
Ela trouxe alguns objetos e começou a trabalhar em seu braço aberto. Poe não se importou com as pontadas da agulha, era até bem relaxente deixá-la cuidando dele. Mas sabia que tinha que se manter acordado, ela parecia ter pensado a mesma coisa porque começou a puxar assunto.
-Então você é da Primeira Ordem?
-Sim, estava em uma missão muito importante. Por favor, me cure o mais rápido que puder. Devo voltar a ela imediatamente.
-Entendo.- ela disse, mas não se apressou nem um pouco. Poe viu um sorrisinho em seu rosto que o fez acreditar que ela sabia que ele não era da Primeira Ordem, mas tentou não pensar nisso.
A verdade é que ele não sabia o que fazer. Perdera BB-8. E daí se a Resistência o achasse? O mapa ainda estaria nas mãos da Primeira Ordem. Refez mentalmente seus passos até ali. O robô tinha que estar em algum lugar. Devia que achá-lo antes da Primeira Ordem, se é que ela já não o achara.
-Então... me diga uma coisa...- ele começou cauteloso.- Eu estava com um robô quando cai, você não chegou a ver um robôzinho em formato de bola rolando por aí, viu?
-Não que eu me recorde.
-Droga...- resmungou baixinho.
-Mas talvez seus amigos o tenham encontrado, a Primeira Ordem esteve por aqui.
-A Primeira Ordem?!- Poe tentou levantar-se com urgência, mas fez uma careta de dor e voltou a deitar-se. A mulher pode ter suspeitado de seu espanto, mas parecia achar engraçado.
-Sim, acho que estavam procurando por você, não?
-Ah, com certeza.- disse ele amargurado. Se a Primeira Ordem achou o BB-8 não havia mais esperança. Pensou na General Organa e gemeu.
-Você deve ser um piloto muito importante.
-Sou um idiota.- Poe nunca teve tanta vontade de morrer como naquele momento. Falhara em todos os sentidos. "Estúpido! Não consegue nem morrer direito, fica aqui definhando."
-Não diga isso, você fez o que pôde.
-Isso não é o suficiente! Bem que meu pai disse "Poe, devemos sempre dar o melhor que o melhor que podemos dar."- ele se arrependeu de ter revelado seu nome, mas agora já era tarde.
-Isso parece ser muito cansativo.
-Meu trabalho requer isso. Não posso falhar. Não posso decepcionar...- ia dizer o nome de Leia, mas se conteve.- A Primeira Ordem.
-Calma, garoto. Você é muito jovem para tanto estresse.
-Sou muito imbecil, isso sim.
A mulher deu um risinho.
-Poe, eu já vi pessoas de todas as partes da Galáxia por aqui. Desesperados, românticos, corajosos... e raramente vi alguém que tem todas essas características.
-O que quer dizer?
Ela segurou sua mão.
-Você é insaciável, querido.- disse e encaixou o dedo dele novamente. Poe urrou.- É hora de desacelerar.
-De jeito nenhum. Tenho que terminar minha missão.- disse quando a dor diminuiu.
A mulher levantou-se e andou até a outra ponta. Agachou-se próxima aos seus pés e tirou seus sapatos cuidadosamente. Poe virou o olhar quando percebeu um osso rasgando a pele.
-Com esses pés? Acho difícil.- ela agarrou os dois ao mesmo tempo os encaixou de volta com firmeza. Ele achou que nunca havia sentido tanta dor na vida. Pensou por um momento que ia desmaiar, mas por algum milagre conseguiu ficar acordado.
-Aqui.- ela lhe deu outro copo, dessa vez com uma bebida verde estranha.- Vai ajudar com a dor.
Poe pegou-o rapidamente e bebeu tudo. Não ajudou em nada. Ficou até pior, o gosto da substância era horrível.
-Obrigado.- disse educadamente.- Agora eu tenho que ir...
-De jeito nenhum! Tenho que fazer uma tala pro seus pés e esperar os ossos regenerarem. Mas não se preocupe, conheço uma pomada muito eficaz.
-Senhora, eu não tenho tempo...
-Fique quieto, vou avisar aos meninos que você está melhor e pedir a um deles que procure a menina Rey, estamos ficando sem madeira e ela deve ter achado mais.- a mulher levantou-se e saiu.
Poe não prestou atenção em nada que a mulher disse, ele só queria ir embora. Mas sabia que ela tinha razão, não conseguia andar, como poderia fazer o que quer que fosse? Lembrou-se de Finn. Desejou com todas as suas forças que por alguma benção divina ele achasse o BB-8 e resolvesse levá-lo até a Resistência. Riu só de pensar na impossibilidade daquilo.
Mas uma parte profunda dele não queria que fosse Finn quem levasse o mapa. Queria ver o rosto orgulhoso da General Organa quando ele lhe entregasse o que ela o mandara buscar. Queria ser o responsável pela sua felicidade ao descobrir onde o irmão estava. Não que ele fosse apaixonado por ela nem nada do tipo, mas ele queria fazer algo certo nessa vida. Ele queria ser o melhor, como ela era.
Insaciável? Talvez. Mas deveríamos todos sermos assim. "Quer dizer, menos a Primeira Ordem", pensou rapidamente. Queria que a Primeira Ordem fosse medíocre mesmo. O silêncio dominou o local. Poe olhou de lado, viu algumas poucas pessoas adormecidas. Pacientes dela também, concluiu.
Ele fechou os olhos. Plenamente ciente de que falhara em sua missão e estavam todos perdidos. Adormeceu.
Acordou com o barulho de uma porta se abrindo. Ouviu vozes do lado de fora.
-Tragam-no, com cuidado!
Poe abriu os olhos e olhou ao redor. Estava em uma nave. Entrou em pânico, fora capturado pela Primeira Ordem. Mas então viu um rosto familiar ao seu lado.
-Não se preocupe, Black One. Pegamos você.- disse Jessika Pava sorrindo. Poe também sorriu.
-Blue Three!- ele nem podia acreditar na sua sorte.- Onde estamos? O que aconteceu?
-Estamos na base da Resistência. Soubemos que a Primeira Ordem estava dando um passeio por Jakku e não podíamos arriscar perder nosso piloto.
Ela arrastou a maca em que ele estava para fora da nave. Viu a base cheia de gente com roupa laranja e sorriu exultante. Mas então lembrou-se.
-BB-8!- exclamou desesperado tentando se levantar. Pava riu e o empurrou de volta.
-Relaxe, a Primeira Ordem não está com o mapa. Continuam atrás de nós como loucos.
-Mas ele ainda está por ai!
-Na verdade...- disse a outra voz.-... já temos uma ideia de onde ele está. A General Organa já partiu para encontrá-lo.
-Wedge! Quer dizer, senhor...
Wedge balançou a cabeça.
-Sossegue, garoto. Você fez um bom trabalho, foi a própria Leia quem disse isso!
Poe ficou tão espantado que alguém do calibre de Wedge Antilles estava ali para recebê-lo que nem conseguiu dizer mais nada. Wedge quase nunca era visto, e certamente não por um reles piloto ferido que ainda a pouco estava morrendo em Jakku.
-Leve-no para a enfermaria. Você parece estar se recuperando bem, Dameron. Continue assim.
-Sim, senhor!
Jessika riu de novo.
-Pava, quando você terminar aqui me ajude a selecionar pilotos para me acompanharem na minha viagem a Coruscant. Não os conheço muito bem.
-Sim, senhor.- ela assentiu e então empurrou a maca de Poe até o prédio.
-Sentiu minha falta, Blue Three?- perguntou quando ficaram à sós.
-Sim, rir de você pelas costas não é tão divertido quanto rir na sua cara.
Ele respirou aliviado novamente. Se a General Organa estava cuidando das coisas agora então ia dar tudo certo. "Fiz um bom trabalho, hein? Ela não viu nada ainda.", pensou. Poe sabia que ainda estava para fazer o melhor que o seu melhor.
