Kaninho 51

I

Saga adentrou à confraternização com receio. Olhou para um lado, para o outro... e não se sentiu a vontade. Até porque não estava com Kanon... e ele, o irmão, era a sua companhia mais corriqueira e comum. Sem ele, parecia não ser ele mesmo...

Tentou se tranquilizar. Mas... o que achariam todos aqueles Cavaleiros ali presentes? Ele havia sido o responsável por toda aquela desgraça no passado... ele e Kanon. Talvez por isso o gêmeo ainda não estivesse presente.

Portanto, ainda vexado e sem conseguir se sentir à vontade, Saga se sentou isolado do grupo. Era, aliás, um grupo não tão "falante" assim: os Santos de Ouro não costumavam festejar. Mas àquele dia, sob as ordens da própria deusa, eles decidiram fazê-lo.

Tudo estava demasiado tranquilo para o que se chama de "festa". Umas poucas conversas baixas, nenhuma música, pouca empolgação. Até a hora em que o grande e simpático Cavaleiro brasileiro, Aldebaran, resolveu mostrar uma novidade...

- Bem, meu amigos e confrades! - disse ele, postando-se de pé, como se fosse discursar a um grande e importante público - Nos últimos dias eu visitei meu país de origem e trouxe uma bebida típica de lá. Como temos hoje esta pequena comemoração em grupo, gostaria de compartilhá-la com quem dela quiser se servir. Vejam!

Todos os presentes praticamente prenderam a respiração. Mal sabiam algo sobre o Brasil. Muitos inclusive pensavam que o local ainda era composto apenas por índios, negros ou ainda por ocas e casas de palha. Mal sabiam que, apesar de ainda ser um país em desenvolvimento, o Brasil tinha metrópoles e demais tecnologias como os outros países... muito mais do que o próprio Santuário de Atena. E que, apesar de haver lá negros e índios, havia também toda a sorte de etnias existentes no mundo.

A ignorância de alguns deles fazia aquele momento dar um certo "medo". Afinal de contas, aquela bebida, vinda de um local estranho, não poderia ser nada mais do que algo exótico. Aldebaran tomou umas cinco garrafas de um líquido levemente esverdeado, um pouco turvo, e o apresentou aos companheiros.

- O nome dessa bebida é "caipirinha". É basicamente uma mistura de limão, aguardente, gelo e açúcar. É um pouco forte em seu teor alcoólico, mas depende, claro, do quanto de cada coisa se coloca.

- "Agua" o quê?! - perguntou Aioria, que apesar de ser adulto, ainda apresentava uma característica quase infantil de impulsividade e curiosidade.

- Aguardente - repetiu vagarosamente o Santo de Touro em sua língua nativa, o português - Trata-se de uma bebida destilada de cana de açúcar. Tem uma graduação forte, mas se usada com prudência, não causa danos.

Saga olhou aquilo com certa curiosidade, mesmo que ainda de longe. Afinal de contas, ele lembrava do vinho que tomava quando queria escapar do tormento que era ser dividido em dois... mas o vinho era ainda mais fraco do que aquela bebida, dado que o vinho era fermentado. Deveria ele provar...?

Logo vieram as comidas. Algumas típicas da Grécia, outras não. Alguns dos presentes decidiram experimentar a tal "caipirinha de aguardente" com a comida, pois a mesma "quebrava" um pouco o efeito do álcool caso ingerida antes do consumo da bebida. Saga hesitou mais um pouco, ficou olhando para a comida, comeu um pouco, quase sem movimentos. Era nessas horas que via o quanto sentia falta de Kanon ali, naquele momento...

Pensando assim, hesitou mais um pouco para continuar. Após comer, ainda simulou reparar no local em volta de si e, apenas quando grande parte dos convidados parecia estar distraída, levantou discretamente e foi até uma das garrafas de "caipirinha". Tomou um copo de tamanho médio e o encheu...

- Ei, Saga, é muito esse copo. Tome cuidado pra não se sentir tonto depois...

Aldebaran disse aquilo em alto e bom som. Portanto, todos olharam diretamente para Saga pegando a bebida. O Cavaleiro de Gêmeos escondeu sua indignação dos outros e voltou a seu lugar. "Será que apenas isso pode mesmo me embebedar?!", pensou ele, talvez confiante demais em sua força e resistência.

Porém, quando tomou um gole da tal "caipirinha", percebeu que era realmente muito forte. Sentiu a bebida descer queimando por sua garganta, e em seguida, na primeira expiração, o ar saiu quente de suas narinas. Não sentiu nada além disso, mas ao mesmo tempo pensou que realmente não era bom beber muito daquilo...

Levantou-se, a fim de olhar a paisagem pelas janelas do recinto. Mas quando virou-se em direção a elas, sentiu uma tontura forte. Teve de fazer algumas pausas para conseguir enfim chegar à janela, e lá se apoiar. Seu rosto estava quente. Sua cabeça estava um pouco turva. Até mesmo sua boca apresentava um gosto estranho...

"Não devia ter bebido aquilo... não devia!"

Olhou para fora da janela, tentando distrair a mente do presente torpor que a bebida lhe causara. E eis que lá fora viu uma peculiar figura alta, masculina,, esbelta e forte, de longos cabelos louros, andando despreocupadamente em direção ao local onde se encontravam...

- Kanon!

Sim, era o gêmeo! E se ele próprio, Saga, que era comedido e bebera pouco, havia tido aquela tontura tão difícil de disfarçar dos demais, que se diria do irmão?! Teria os olhos maiores do que a boca, beberia demais e poderia até mesmo dar um escândalo de bêbado ali na ocasião!

"Aldebaran tinha de trazer essa tal de 'aguardente' para a reunião!", pensou o Santo de Gêmeos, não sabendo como livrar Kanon das possíveis enrascadas nas quais pudesse se meter.

Logo em seguida, Saga viu o gêmeo despontando na porta do local, parando e olhando a todos de cima a baixo. Parecia não se envergonhar ou ainda se auto-condenar por seu passado, como Saga fizera e continuava fazendo. Sorriu, acenou a cabeça afirmativamente para os presentes, fingiu não reparar no olhar de desdém de Aioria e foi diretamente até aquela janela onde Saga se apoiava.

- E aí, Saga? Como está? Essa galera metida a besta está te maltratando e ignorando muito?

- Kanon, shhhhh!! Quieto!! Eles podem ouvir, não estão tão longe!

- Que ouçam! Só devo fidelidade a Atena e a você. A eles...? Pff, que são eles?! Não dou a mínima. E eles pensam que não sabemos o olhar que nos dirigem... mas eu não preciso deles.

- Chega, Kanon! Comporte-se! Parece um adolescente rebelde!

- Bem... e o que tem de interessante nessa festa afinal? Se é que dá pra chamar isso de festa... ei, Saga, por que seus olhos estão avermelhados?!

- Não, não é o que você está pensando¹! É... bem, é que o Aldebaran, o Cavaleiro brasileiro...

- Sim, que tem ele? Te provocou? Te fez chorar?! E eu ainda pensava que ele era um sujeito tranquilo!!

- Não, Kanon, não!! Deixa eu terminar de contar! Ele trouxe uma bebida típica do país dele. E...

O primogênito não acabou de falar. Kanon abriu um sorriso enorme, seguido de um gesto de "eu já sabia", como que debochando de Saga.

- Saga parece certinho mas não é tanto assim!! Bebeu demais, hein?! Olha a carinha dele de manguaceiro!! Veja só, bem que o Kanon não é uma boa influência pro Saguinha... aliás nunca foi, né...

Olhando ao rosto sem jeito do gêmeo, por ter de ouvir aquele tipo de "piadinha" insidiosa de Kanon, o mais moço sentiu uma vontade imensa de beijar os lábios de Saga, mas se conteve. Afinal, na frente dos outros... gêmeos... aquela coisa toda.

- Eu não bebi demais, Kanon! Não! Apenas um gole!

Dessa vez o mais moço fez uma expressão de surpresa.

- Só um?! O que é isso que ele trouxe? Conhaque? Absinto?!

- Não. É um negócio chamado... agua... agua...

- Aguardente?

- Está bem espertinho pra essas coisas, hein, Kanon...

- Bem, "espertinho" não digo. Bem informado! Mas foi aguardente pura, Saga?! Se foi, é forte mesmo...

- Não! É uma mistura de açúcar, limão e...

- Caipirinha?! Olha só, estamos bem servidos aqui hoje!!

- Está me saindo mais informado do que a encomenda, hein?!

- Mas caipirinha não devia ser tão forte. Vou lá experimentar!

- Ei, Kanon! Kanon, cuidado!! Não vai fazer besteira, isso derruba qualquer um!!

E despreocupadamente, quase sem escutar as palavras do gêmeo mais velho, o caçula foi até a mesa, ao assento onde Saga estava sentado anteriormente, e observou o copo que ainda tinha bastante da tal "caipirinha"...

To be continued

OoOoOoOoOoOoO

¹O Saga quando ficava "mau", apresentava olhos vermelhos... não era pra menos o receio do gêmeo!

Rsssss, Kanon e "cana" não pode sair coisa boa!! Em breve continuo!

Beijos a todos e todas!