Short-Story.

Lovez/Semi.

Original.


Tentava prestar atenção no homem naquele humilde palco mas por algum motivo não conseguia acreditar em suas frases.

Ouvi um suspiro da mulher ao meu lado. Ela ainda estava irritada por estar mostrando meus joelhos no vestido "curto" que ganhei de uma tia.

- Isso não se usa na igreja – brigou antes de sairmos de casa. – Aliás, não se usa em lugar nenhum.

Meu pai sempre me pedia paciência, mas era tão difícil manter a boca fechada. Sempre acabava chorando escondida por suas broncas, afinal, nunca realmente entendi seus motivos. Quando ela iria perceber que somos duas pessoas e não apenas uma? Não era a filha perfeita, ela já tem meus dois irmãos para isso. Dois exemplos dentro da igreja.

Justin era divertido e popular entre a mocidade mesmo sendo casado. Um casamento preparado por Deus, como minha mãe sempre frisa. Julieta toca órgão em nossa igreja comum e toda a família sabia o quanto Justin a observava. Ele toca violino, realizando o sonho do meu pai de ter um filho musico.

Max era o mais novo e, já batizado, recebeu o dom da promessa pelo cargo de auxiliar nas reuniões destinadas aos jovens e menores de idade. Ele distribuía os versículos de um determinado capitulo da bíblia para a igreja-jovem recitar a cada culto. Uma grande responsabilidade que todos tinham orgulho.

E eu: a filha do meio. Nunca me interessei por algum desses cargos comunitários, nunca gostei das saias e vestidos que impunham para as mulheres, e muito menos, em fazer amigos dentro daquelas quatro paredes brancas.

Quebrei todos os sonhos de minha mãe para com sua única garota desde muito pequena, quando preferia brincar de "carrinho" com meus primos meninos que de "mamãe-e-filhinha" comas meninas, e tudo piorou cada vez mais conforme fui ganhando anos.

Não tinha culpa se as brincadeiras de menino eram muito mais legais. Sempre fui um garoto-afeminado e minha mãe parece ignorar o fato até hoje, mas meu pai sabia. Eu era seu menininho.

Enquanto minha mãe ajeitava a gravata dos meus irmãos eu ficava correndo atrás de meu pai, perguntando onde podia ajudar. Um dia me deu a tarefa de varrer a lanchonete e reclamei de ser "serviço de menina". Ele só ria. O tempo me fez mais menina, mas aquele espírito aventureiro nunca saiu.

- Olhe, que bonita. – parei minha mãe mostrando a calça jeans vestida no manequim da loja.

- Calça, Alex? – suspirou cansada. – Você esta muito moça para continuar vestindo isso. Conheço uma loja de vestidos maravilhosos por aqui.

Minha salvação era o salário que recebia na lanchonete. Ele pagava tudo que minha mãe se negava.

Era claro o caminho que todo meu histórico de vida apontava, mas parecia que todos tentavam não-ver o que acontecia. Inclusive eu.

Se fosse para escolher um dos dois sexos para namorar me obrigaria a escolher um homem. Não me via namorando uma menina, não podia me ver assim. Seria o desgosto da família, ou o desastre mais destacável da lista.

- Alex. – minha mãe disfarçou, sussurrando. – Ele esta olhando pra cá de novo.

Sentia a animação em sua voz.

Meus lhos encontraram os do garoto moreno, filho do senhor que atendia os cultos adultos. Manson tinha fama de gentil entre as moças, sempre carregando a pequena maleta de sua flauta.

Ele sorriu sem graça quando acenei com a cabeça.

Nunca realmente tínhamos nos falado, com exceções de uns contados cumprimentos rápidos. Concordo com minha mãe quando fala o quão ótimo seria namorá-lo. Era bonito, de boa família e participava da orquestra. Mas não estava apaixonada e sentia que nunca estaria... porque ele não era uma garota.

Tinha tanto medo de me apaixonar por uma garota que isso chegou a ser o desejo mais forte de todas minhas orações noturnas antes de desabar chorando no travesseiro, implorando ainda mais para que não acontecesse.

Daí ela apareceu.

Era meu primeiro dia de colegial. Como se minha timidez não fosse o suficiente, aquela menina apareceu em minha vida. Seu sorriso era maravilhoso, andando em direção de mais três garotas que comemoravam em voz alta.

Comecei a tremer e tive de mentir qualquer coisa para Harper ao meu lado quando perguntou se estava bem. Não conseguia tirar meus olhos dela. E tudo só piorou quando descobri estarmos na mesma turma.

Passei praticamente dois meses inteiros observando Mitchie arrastar as unhas na franja reta, lutando contra um sorriso quando uma risada alta lhe escapava, tentando controlar aquela sensação densa no estomago quando nossos olhares se encontravam e ela arqueava as sobrancelhas com um puxão de lábios. Até o dia que nós falamos de verdade pela primeira vez.

- Eu simplesmente odeio essa aula. – reclamou Harper, virando para trás em sua cadeira. – Não entendo uma palavra de física! Nem sei porque temos isso.

- Concordo plenamente. – meu coração perdeu o compasso por alguns segundos ao ouvir aquela voz tão perto. – Desculpa interromper – começou apoiando uma agenda em minha mesa. –, mas vou dar uma festa de 15 anos e gostaria de saber seus nomes para colocar no convite.

- Claro. – falei um pouco rápido demais. – Alex e Harper, quer que anote?

- Por favor. – pediu estendendo-me uma caneta.

Poderia ter usado a minha, mas foi a primeira vez que nossas mãos se tocaram.

- Sou péssima em guardar nomes. – continuou divertida. – Confundo até hoje a Hannah com a Miley mesmo depois de uma vida estudando juntas. – apontou as gêmeas em sua panelinha.

- Não tem problema. – entreguei-lhe o caderninho. – Aqui esta.

- Obrigada. – pegou. – Bela letra.

Fiquei o resto do dia planejando modos melhores para aquela conversa, mas sempre acabava caindo na real e percebendo que não posso voltar do tempo e corrigir minha estupidez. Eu mal falei. Mal a olhei.

Acabei não indo a sua festa, mas guardei o convite preto e rosa com carinho. Lembro do dia seguinte quando chegou na escola com os olhos cansados e acenando para todos que a parabenizavam pela "festa do ano". Alguns dias depois nos encontramos no corredor e ela perguntou porque não fui, paralisei novamente e não encontrei nenhuma desculpa boa o bastante e só balancei os ombros.

- Nem te conheço direito, seria estranho. – falei.

- Foda-se. – riu. – Mas tudo bem, eu te desculpo.

E só.

O primeiro colegial foi uma tortura em todos os sentidos da palavra. Eu estava tão ridiculamente atraída por essa pessoa impossível. Sempre tentava deixar claro o quanto acabaria quebrada no final, mas a verdade era que já estava.

Sempre esperei um convite seu para sentar em grupo, almoçar, ou que seja, mas não podia culpá-la por não me ver. Ninguém se importava o bastante para isso e sentia meu coração esfarelar na consciência de que ela não estava interessada em nada relacionado a mim simplesmente porque não existia em seu mundo.

Nessa época as brigas com minha mãe começaram a ficar mais freqüentes. Desisti de tudo e todos.

Implorei tanto para não me apaixonar por uma menina e Ele, ignorando completamente minhas orações, não me deu somente esse sentimento mas também sendo por alguém que não tenho chance alguma.

Não queria mais ir a igreja. Se era para meu caminho ser torto que seja por completo, sem essa ilusão idiota de que indo á igreja estarei fazendo minha parte ou ao menos tentando. Não estava tentando porra nenhuma.

Não culpo minha mãe por me querer dentro do caminho que a faz feliz, afinal, ser mãe se resume em querer e lutar para o melhor do filho e esse era o modelo que fez sua vida em paz. Ela também quer paz na minha vida, mas eu só queria superar isso sozinha. Esse era o meu problema, não dela, não de ninguém.

As férias de final de ano chegaram e o segundo ano de colegial também.

Lembro de entrar na sala de aula rindo com Harper e Stevie, jogando minha mochila na mesma mesa do ano passado. Acho que tentei tanto prestar atenção na narração de Harper sobre seu encontro com Zeke que acabei conseguindo. Meu primeiro reflexo ao perceber que havia esbarrado em alguém foi apoiar-me em seus ombros, afinal, não sou estúpida e se formos cair que eu caia encima.

- Jesus. – ouvi quando nos equilibramos para não cair. – Começando o ano bem, Russo.

- Desculpe, eu não... – parei quando olhei para a menina de cabelos pretos. – Mitchie?

- Ah, sim. – percebeu que estava falando sobre o cabelo. – Gostou da cor? Me pareceu uma boa opção quando pintei, agora já não tenho certeza.

- O quê? – franzi o cenho. – Está ótimo. Sério, esta bonita.

Acho que essa foi a primeira vez que não me arrependi de uma conversa nossa. Digo, da minha parte da conversa.

- Sério? Obrigada. – sorriu.

Voltei para a história de Harper mas ouvi as primeiras três palavras e desliguei completamente. Tinha acabado de ter uma pequena conversa com Mitchie sem parecer uma completa idiota, talvez ou pouco efusiva, mas já era algo. Me senti bem a aula inteira. Principalmente pelo fato dela estar sentada ao meu lado.

Certo que não nos falávamos, mas algo dentro de mim fazia isso parecer muito maior do que realmente era. Na verdade não era nem bom. Deveria ter mudado de escola, a excluído do Facebook ou ao menos parar de responder suas perguntadas sobre que horas eram. Acabei me sentindo estúpida novamente.

- Ei, Alex, posso baixar um negocio no seu celular? – Mitchie perguntou no meio de uma aula.

- O que é? – estendi o telefone.

- É um programa, espere. – pegou, escondendo o aparelho entre os livros enquanto o professor dava a aula.

Ela estava com meu celular. Ela.

Porque tinha de ser tão emotiva com tudo que a envolvia?

Harper, a pessoa que mais confio nesse mundo, me conhece desde o jardim de infância e esta acostumada comigo sendo mais fria que o normal e chega essa garota e muda tudo. Me faz virar uma... uma... uma garota!

- Qual teu número? – perguntou, colocando seu iPhone ao lado do meu.

- Pra quê? – ri.

- Só fala. – sorriu digitando os números que ditei. – Aqui, olha.

Me entregou o celular. Segundos depois ele apitou com uma mensagem na tela.

55293639: aeeeeeeeeee.

Ri baixo para o sorriso largo em seu rosto ao ver minha reação.

- É um aplicativo conectado na internet, estamos ligadas nele. – explicou. – Ae pessoal – chamou as meninas sentadas atrás. – tenho uma nova pessoa para perturbar quando não conseguir dormir. – apontou para mim.

- Mitch, que dó da garota. – Hannah, a gêmea loira, comentou sem tirar os olhos do caderno.

- Sinto muito Alex, sinto mesmo. – Caitlyn colocou a mão em meu ombro.

- Ei, assim ela vai pensar que não sou legal. – reclamou Mitchie.

- Exato. Não será iludida como todas nós fomos. – rebateu Miley, a gêmea morena.

As brigas com minha mãe ainda eram constante, mas comecei a aprender fechar a boca na hora certa. Não sei quando exatamente percebi estar dormindo mais tranqüilamente, pulando alguns tópicos de minhas orações e colocando a TV no mudo enquanto esperava o sono vir, mas ainda era assombrada pela insegurança. Ninguém podia saber.

Não sei porquê sai do meu quarto naquela noite. Já havia um tempo que estava conversando com Mitchie por mensagens e acho que simplesmente estava em um bom dia. Minha mãe e irmãos tinham ido á igreja e pouparam-me o convite já que meu pai ficaria em casa.

- Ei. – chamou minha atenção.

- Que susto. – sorri tirando o cobertor do livro em minhas mãos.

- Lendo Harry Potter de novo? – riu sentando-se ao meu lado no sofá.

- Amo a história, pai. – defendi.

Jerry era a única pessoa que compreendia minha necessidade de querer tomar decisões sem segundas opiniões. Sabia que não me apoiava com por cento, mas sempre deixou claro que a palavra final era minha.

- Queria conversar. – pediu quando fechei o livro. – Venho querendo a algum tempo.

- É algo grave? – preocupei-me.

- Sim e não. – sorriu.

Vi sua dificuldade para encontrar as palavras certas, já começando a sentir a tensão.

- Você sabe que pode me contar tudo, certo? – começou.

Fiquei em silêncio. Não podia tentar falar nada sem me trair.

- E... como nunca tocamos nesse assunto por sua espontaneidade acho que é melhor tirar minha duvida hoje. – continuou.

Queria correr para meu quarto. Comecei a pedir força para meu Deus, mas não tinha saída.

- Esta apaixonada, filha? – perguntou.

- Eu... n-nã... – gaguejei, fechando os olhos com força. – Pai...

Continuava quieto, esperando uma resposta inteira. Minha cabeça praticava o som completo da palavra não.

- Sim. – encarei a TV desligada.

- Por um... menino?

Prendi o choque nas minhas articulações que pulsavam em desespero. Tudo que conseguia pensar eram em mentiras. Desculpas. Uma lágrima rebelde escapou da tensão corporal e corri limpá-la, tentando não deixar o homem sério perceber. Não sabia se seu olhar era terno, bravo ou de pena, simplesmente não conseguia encará-lo com essa mascara de pecado.


Sei que começos são irritantes mas espero que gostem. Não terá muitos capítulos.

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Review :)