ARMISTÍCIO
Hermione desceu hesitante os grandes passos das escadas da cabana de Hagrid, os olhos ainda estavam embaçados. Buckbeak saudou-a enquanto Hagrid acenava pela última vez e fechava a porta. Era uma pena que tivesse que morrer em breve. Pensou que devia ser solitário viver daquela maneira, ter apenas uma pessoa em quem contar, mas isso se assemelhava demais com sua própria história, como tudo fazia esses dias, e mais uma vez ela quis voltar para sua casa de verdade.
Ela já havia brigado com Harry e Ron antes, milhares de vezes. Tudo parecia muito pior no Natal, a escola se tornava mais opressiva quando vazia, as decorações bonitas para ninguém ver. Havia sempre um espaço ao redor dela, e os minutos que deveriam pertencer ao riso dos amigos. Ela via os presentes embaixo das árvores encantadas de Hogwarts, um costume emprestado dos não-mágicos, e era impossível manter as lembranças da infância — tempos mais solitários, Natais mais felizes — longe. Ela quis, mais do que tudo, voltar à vida solitária que viu em Buckbeak.
Foi então que Hermione decidiu que libertaria o hippogriff.
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Hermione Granger sabia pesquisar e conhecer como ninguém, e isso funcionava para pessoas também, mas não era o necessário para recompor uma amizade. Ela via Harry e Ron na mesa do Grande Salão todas as noites, eles pareciam se esforçar para não encará-la. Seis dias depois do Natal, se levantaram juntos, andavam no mesmo compasso para a porta, era como nos velhos tempos de descobertas. Eles foram para a Sala Comunal. Ela foi para a biblioteca, para conseguir alguma resolução que a mantivesse de pé.
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Duas semanas depois da briga, quando todos já haviam retornado aos corredores estreitos do castelo, Ron esbarrou nela. Hermione estava voltando da biblioteca em um dia em que se sentia especialmente mal. Ela reconheceu seu gato nos braços dele, e se não o conhecesse tão bem poderia ter confundido o gesto com um pedido de desculpas, mas ela entendia todas as suas expressões por agora. A história do hippogriff chegou ao raciocínio e ao coração; ela também estava com uma sentença marcada, mas não tinha mais ninguém lá.
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Em um daqueles dias — Hermione não os distinguia mais, tinha tinta nos dedos e os olhos cansados em todos eles —, a decoração de Natal foi retirada. Ela percebeu que não seria nada fácil ajudar Hagrid, assim como não seria fácil se reaproximar dos amigos. Mas Hagrid sorriu para ela mesmo quando disse que Buckbeak provavelmente não escaparia do Ministério, então ela já devia ter sabido o que viria quando Harry e Ron atravessaram a sala de aula olhando diretamente para ela.
Mais tarde, pensou que os tinha desculpado muito facilmente, que não poderia ter esquecido tudo o que havia se passado. Tudo isso passou a não importar quando eles encantaram a cabana de Hagrid com decorações natalinas pouco inspiradas, mas deles, e tiveram o feriado que ela queria. E se isso era possível, com a sintonia que tinham apesar de tudo, conseguiriam libertar todos os hippogriffs que quisessem.
