Título: Encontro

Autor: Umi no Kitsune / Adriana Adurens

Disclaimer: Tudo pertence a Takeshi Konomi, menos a estranha e avassaladora vontade de colocar dois homens juntos... . Essa vontade é minha mesmo. "

Avisos: Yaoi. Fic de mesmo universo de "Flácido" e "Acidente". Se você gostou da fic e a quer em seu site, por favor, peça permissão.


Fuji estava cansado de brincar. Já tinha deixado de se preocupar com os sentimentos e conseqüências de seus atos e palavras há muito tempo. Estava cansado e não conseguia entender, por Deus, como ele não se cansava.

"Fuji, escute!"

Uma mão segurou-o pelo cotovelo, mas Fuji, impaciente, libertou-se com um movimento brusco demais para seus padrões, continuando a andar, determinado a se afastar de seu perseguidor.

"Fuji, não faça assim!"

Ele é preso novamente, pelos braços, vendo-se obrigado a olhar nos olhos da pessoa que o importunava há exatos três anos e cinco meses.

"Me solte, Takeru.", Fuji ordenou, ainda com a voz calma e controlada, mas com uma raiva incontida no olhar, "Estou cansado."

"Me escute, por favor.", Takeru pediu, abraçando-o fortemente, "Eu tento, eu tento... não consigo tirar você da minha cabeça..."

Fuji suspirou, entediado por ter que ouvir a mesma ladainha mais uma vez. Chegava a ser irritante, mas Fuji não era alguém que se irritava fácil. E, se irritava-se, ninguém ficava sabendo. Ele era discreto para tanto. Mas Takeru conseguiu extrapolar vários limites com Fuji.

"Você não precisa me tirar da sua cabeça.", ele disse pacientemente, apoiando as mãos no peito de Takeru e tentando impor alguma distância entre si, "Basta que saia da minha vida.", ele sorriu ao afastar-se completamente, acenando com a cabeça um breve adeus e voltando a andar.

"Fuji!"

Sem sequer prestar atenção nas palavras de Takeru, Fuji continuou andando, disposto a caminhar o quanto fosse, no meio da madrugada, para alcançar a casa da irmã. Lá, poderia descansar e pensar com mais calma como faria para recuperar as chaves do próprio apartamento e do carro que lhe foram tomadas.

Fuji não surpreendeu-se quando foi agarrado novamente, mas arregalou os olhos ao ver um lenço branco aproximar-se rapidamente de seu rosto.

Com reflexos rápidos, Fuji abaixou o rosto e ergueu os braços, sentindo o pano úmido esbarrar nas suas mãos, "Takeru!", ele disse em tom de aviso, travando uma pequena batalha de mãos e braços.

"Me desculpe, Fuji... mas... É preciso!"

Fuji consegui fazer o lenço escapar das mãos de Takeru e, no chão, pisou nele para que não pudesse ser recuperado. Ao ver que seu recurso desesperado não tinha surtido efeito, o rapaz franziu o cenho, fazendo uma careta de ódio e ergueu o braço, acertando-o na lateral do rosto com o cotovelo.

Fuji apenas escutou um forte baque no ouvido, recuando alguns passos para não cair no chão, mas acabou caindo mesmo assim, como um bêbado. Sua cabeça zunia fortemente e uma leve tontura o possuiu. Não tinha dado tanto crédito assim a loucura possessiva de Takeru, mas podia começar a se preocupar, pelo visto.

Ainda com a mão sobre a orelha esquerda ele surpreendeu-se ao ver a rua toda iluminada de repente. Um carro preto de faróis acesos aproximou-se deles em alta velocidade manobrando e brecando com certa eficiência ao lado da calçada.

Takeru, por instinto, aproximou-se possessivamente de Fuji, postando-se na frente dele.

"Afaste-se.", uma voz grave disse de dentro do carro. Com os faróis ainda acesos, nenhum dos dois pôde ver quem era a pessoa que saiu e caminhava até eles.

"A-afaste-se você!", Takeru exigiu, quase gritando, erguendo e puxando Fuji para trás junto com ele. Sem escutar de um ouvido e, ainda um pouco tonto, Fuji quase tropeçou nas próprias pernas, tal o desespero do outro em levá-lo.

"Solte-o e afaste-se.", o homem ordenou novamente, com uma voz controlada de quem já parecia acostumado a lidar com situações parecidas.

"Você é da polícia, não é?", Takeru perguntou, colocando uma mão sobre os olhos, tentando identificar o homem, "Não se preocupe... não há nada de errado aqui."

O homem apenas ergueu a cabeça, indicando que gostaria de ouvir a opinião de Fuji também.

"Ah...", Fuji suspirou, "A polícia, claro... eu deveria ter procurado a polícia antes.", ele disse pensativo, com um sorriso no rosto.

Isso foi o suficiente para o homem aproximar-se mais, com passadas largas e decididas, "Afaste-se.", ele ordenou pela última vez, pegando Takeru pelo braço e torcendo-o nas costas dele, "Você está preso."

"O quê? Mas... isso não é da sua conta!", Takeru tentou argumentar, mas calou-se ao ouvir o som de algemas fechando, percebendo-se preso, "Você é policial de verdade?", ele perguntou incrédulo, não acreditando no próprio azar.

O homem apenas recuou um passo, tirou o celular de dentro do casaco e, ignorando os protestos de Takeru, começou a passar as indicações do endereço onde estavam.

"Fuji! Fuji, por favor, diga a ele que não aconteceu nada demais.", Takeru virou-se implorando para Fuji, que estava apoiado a um poste de luz massageando a orelha, "Diga que foi só uma briga rotineira."

"Se é rotineira já é um problema.", Fuji comentou distraído, ainda preocupado com seu ouvido, "Sendo briga rotineira é pior ainda. Nunca percebeu isso?", ele afastou-se do poste, passando por Takeru para falar com o suposto policial.

"Uma viatura estará aqui em alguns minutos.", ele informou, assim que Fuji se aproximou, "Você poderá acompanhá-los e garantir seus direitos."

"Você é um policial estranho.", Fuji comentou, cruzando os braços e sorrindo.

"... não sou um policial."

Franzindo o cenho, mas sem deixar de sorrir, Fuji caminhou devagar em volta do homem, ficando de costas para os faróis, "Carrega algemas dentro do casaco por diversão?", quando ficou completamente de frente para ele, Fuji conteve as próprias palavras, indeciso, "Tezuka?"

"Sinto muito por vê-lo em uma situação como essa."

"O que? Vocês se conhecem?"

A pergunta incrédula de Takeru ficou abafada em sua memória, mas Fuji não sabia dizer se era por causa do ouvido machucado ou por causa dos pensamentos desordenados que surgiram ao ver Tezuka depois de tantos anos. Com certeza, foi por causa do ouvido.

Assim que o som de uma sirene soou no final da rua, uma voz hesitante fez-se presente, "Kunimitsu, tudo bem?"

Os três homens voltaram-se para a delicada voz, feminina e submissa, vinda do carro.

"Sim, pode apagar os faróis, por favor?", Tezuka pediu, um pouco tenso.

Segundos depois, apenas a claridade fraca do poste de luz iluminava o cenário, mesmo assim, a luz era suficiente para que Fuji prestasse atenção na pessoa que saia do carro.

A porta abriu-se com um click cuidadoso, depois, um pequeno pé, calçado em um sapato de salto baixo e bem comportado, apoiou-se no asfalto, por fim, surgiu a mulher. Mas Fuji nem prestou atenção ao fato dela ser mulher. Nem muito se deu conta ao fato dela estar vestida como os padrões japoneses indicavam a uma senhora casada e respeitável, mas delicada o bastante para ainda ser admirada em sua feminilidade.

Os olhos azuis, o cabelo castanho claro, quase loiro, o pequeno nariz afunilado e levemente empinado, a pele rosada e luminosa.

Fuji poderia expressar-se sarcasticamente naquele momento, Tezuka poderia ignorar o óbvio e continuar com sua vida de defensor dos fracos e oprimidos da madrugada, mas foi Takeru quem primeiro decidiu verbalizar seus sentimentos, "Puta que o pariu! Isso é... isso é doentio!"

"Ah!", Fuji suspirou, voltando a massagear a orelha e ficando de costas para todos, "Olha só quem fala."

Tezuka aproximou-se da esposa, tocando levemente no ombro dela, "É melhor ficar no carro...", ele murmurou alguma explicação, mas a senhora apenas acenou e, com um doce sorriso, voltou a sentar educadamente no carro.

"Escuta, você precisa explicar isso direito.", Takeru disse nervoso, quando Tezuka voltou, "O que você pensa que está fazendo com uma réplica dessas no carro?"

Tezuka preferiu manter-se calado ao invés de se preocupar em reprimir o homem pelas suas palavras. A viatura já tinha alcançado-os e dois policiais saíram rapidamente do carro, postando-se na frente dele obedientemente. Com um aceno e poucas ordens, Takeru foi levado para a viatura, ainda reclamando do seu azar e da "réplica" no carro de Tezuka.

"Você quer vir no meu carro?", Tezuka perguntou a Fuji, que ainda estava de costas, com a mão na orelha.

"Não, obrigado.", ele respondeu com um breve sorriso, andando até a viatura, "Pode ir para sua casa. Vá cuidar de sua esposa."

"Fuji... talvez eu lhe deva explica--", Tezuka disse baixinho, caminhando ao lado dele.

"Não me deve nada.", Fuji o interrompeu, displicente, dando de ombros, "Eu não lembro de ter permanecido dívidas entre nós.", ele percebeu que Tezuka estava tenso e incomodado com o fato, parecendo insatisfeito com sua reação. Fuji suspirou, "Procure Oishi...", ele sussurrou, já na porta do carro com os olhares atentos dos policiais e de Takeru sobre si, "Se quer mesmo explicar o óbvio, procure Oishi, ele tem o meu número."

Tezuka apenas olhou-o seriamente, enquanto a porta do carro era fechada, ficando com o corpo rígido em pé na calçada, sem se mexer.

Antes de partir, Fuji desceu o vidro da janela, comentando sem olhar para ele, "Sabe, por um momento... eu achei que poderia considerar isso como um elogio.", um som de escárnio vindo de Takeru no banco de trás o fez rir, "Mas, não há como negar, não é? É uma piada mesmo."


"Kunimitsu, está tudo bem?"

Tezuka quase assustou-se com o som da voz doce de sua esposa ao seu lado. Estava com os pensamentos tão atordoados que esquecera-se da presença dela, "Sim."

A senhora não pareceu satisfeita com a resposta curta, mesmo que já estivesse acostumada com o jeito fechado do marido, "Ah... aquele rapaz... o que foi agredido...", ela comentou hesitante, olhando a paisagem deserta das ruas de Tókio de madrugada, "Vocês já se conheciam?"

"... hn.", Tezuka comprimiu os dedos contra o volante, mas manteve-se calmo, "Sim."

"Ah..."

O comentário monossílabo, apenas uma exclamação delicada de entendimento, de sua esposa conseguiu deixá-lo mais tenso ainda e Tezuka se viu obrigado a procurar explicações mais detalhadas, "Somos apenas conhecidos. Ele jogava tênis."

A senhora apenas abaixou a cabeça, alisando o tecido se sua saia.


"Hoi, hoi!", a voz alegre podia transmitir sua vivacidade através de um simples celular, mesmo com o timbre eletrônico, mesmo sabendo estar distante. Isso fez Fuji sorrir, desejando estar frente a frente com o amigo para poder presenciar o sorriso fácil e sincero dele, "Fuji, tudo bem?"

"Sim, obrigado. Está muito ocupado?"

"Não muito. Estou terminando de almoçar. E você?"

"Trabalhando.", ele respondeu, mas girou a cadeira e ficou de costas para o computador, "Preciso perguntar uma coisa."

"Vá em frente."

"Você já conheceu a esposa do Tezuka?"

Fuji notou o silêncio e podia até mesmo visualizar a expressão confusa e pensativa do amigo, "A esposa do Tezuka? Yumi-san?"

"Sim. Você já a conheceu? Pessoalmente?"

"Uhn... Nya, agora que você falou... Realmente, depois de todo esse tempo eu nunca a vi pessoalmente."

"Nem por fotografia?"

"... Fuji, você está fazendo com que eu me sinta muito burro agora.", a voz de Eiji saiu abafada, com certeza, o ruivo estaria escondendo o rosto de vergonha, mesmo que ninguém ao lado dele saiba do que seja a conversa, "Nunca prestei atenção nisso!"

Fuji riu, "Tudo bem..."

"Ah! Mas Oishi conhece a Yumi-san! Ele já se encontrou com ela, acho, umas duas vezes."

"E ele comentou alguma coisa sobre ela?"

Mais uma vez, um breve silêncio, "Fuji... por que quer saber essas coisas?", diante do silêncio como resposta, Eiji insistiu, "Pensei que vocês dois... quer dizer, você... não está pensando no Tezuka novamente, está?"

"Não...", Fuji suspirou, "Na verdade, eu não estava pensando nele."

"Mas...?"

"... parece que ele não quer que fiquemos por isso mesmo."

Uma exclamação soou do outro lado da linha, "Não acredito! Ele te procurou? Tezuka procurou você?"

"Não, não foi bem isso.", Fuji pareceu pensativo por um momento, "Poderia me fazer um favor?"

"Claro..."

"Pergunte a Oishi sobre Yumi-san, sim? Eu gostaria de saber o que ele acha dela."

"Sim... mas, Fuji... o que aconteceu?", a voz de Eiji saiu preocupada, sem a alegria e vivacidade de antes.

"Depois eu explico... isso não é conversa para celular."


"Oishi... eu me encontrei com Fuji outro dia."

Oishi, que estava analisando eletrocardiogramas de um de seus pacientes, quase amassou todo o papel, virando-se para Tezuka com os olhos arregalados, "O quê?"

Tezuka suspirou, tomando um gole de café puro, observando com calma a sala branca, limpa e bem organizada de Oishi, "Eu estava saindo de um jantar com meu superior quando vi alguém ser agredido na rua."

"Oh... Fuji?"

Tezuka assentiu, "Parece que ele está com problemas. Acho que era um antigo namorado..."

Oishi sentou-se, reclinando-se na cadeira, tentando relaxar, "Bem... deve ser Takeru-san."

"Esse mesmo."

"O que aconteceu? Fuji está bem?", Oishi perguntou preocupado.

"Ele levou uma cotovelada na cabeça, na altura da orelha.", Tezuka explicou brevemente, vendo o amigo fechar os olhos, suspirando, "Isso já aconteceu antes?"

"Não. Takeru nunca bateu nele antes... pelo menos, é o que eu sei.", Oishi respondeu, marcando na agenda o nome de Fuji. Iria telefonar para ele mais tarde, para saber se precisaria de alguma coisa, "Takeru tem certos problemas... ele é possessivo demais."

"Por que não me contou isso antes?", Tezuka perguntou sério.

"... Tezuka...", Oishi desviou o olhar, voltando a analisar o eletrocardiograma em sua mesa, "Você me pediu que não falássemos mais dele."

"Isso é diferente. Ele foi agredido."

Oishi sorriu, erguendo-se e indo até a porta do consultório, chamando uma enfermeira, "E o que você iria fazer, Tezuka?", ele perguntou após passar instruções para uma mocinha, "Um homem bem casado, com um emprego que lhe ocupa a maior parte do dia iria sair de sua rotina para ajudar o ex-namorado que está tendo problemas com o atual amante? Ex-namorado, não custa lembrar, que não deveria mais ser mencionado."

"Oishi..."

"Você mesmo me disse, Tezuka. Se fosse para lembrar de Fuji, que lembrássemos dele como se estivesse morto.", Oishi percebeu que tinha atingido um limite na sua liberdade com o amigo, vendo-o tenso, com os olhos fechados, "Tezuka... Fuji ainda é meu amigo e eu me preocupo muito com ele. Se isso alivia a sua consciência, eu peço que não se preocupe com ele também. Eiji e eu cuidaremos dele."

"Não é essa a questão."

Oishi suspirou, voltando a sentar-se atrás da mesa. Sabia que esse dia chegaria um dia, mas não sabia se estava preparado para encará-lo tão cedo.

"Fuji... Fuji viu Yumi."

Oishi arregalou os olhos, surpreso. Realmente, não estava preparado para o que estava por vir, "Ah... Tezuka, sinto lhe dizer, mas... essa não é a questão mesmo! Você está perturbado por que viu Fuji ou por que Fuji viu Yumi-san?"

"... eu não--", o alarme do celular de Tezuka disparou e ele interrompeu-se para atender. Depois de breves palavras sussurradas, ele desligou o aparelho e voltou-se para o amigo, "Desculpe, preciso ir."

"Eu entendo...", Oishi sorriu, sabendo que o trabalho de Tezuka o obrigava a horários nada convencionais, "Se quiser conversar mais a respeito, ligue para casa, depois da meia-noite."

Tezuka, já de casaco vestido, parou pensativo com a mão na maçaneta da porta, "Na verdade... eu gostaria...", Oishi olhou-o pacientemente, esperando o pedido, "... Não é nada. Bom serviço."

"Obrigado. Bom serviço pra você também.", Oishi murmurou preocupado, vendo o amigo fechar a porta atrás de si.


Fuji estava quase dormindo, sentindo-se bem demais para pensar em qualquer problema no momento. Estava na casa da irmã. O inspetor de polícia garantiu que Takeru ficaria preso, mas aconselhou-o a trocar as chaves do apartamento. Por isso, Fuji resolveu ficar na casa da irmã por algum tempo.

Estava deitado no colo dela, sentindo as mãos habilidosas fazendo um cafuné no seu cabelo, enquanto o som do noticiário local preenchia o ambiente da sala.

"Ele dormiu?", uma voz preocupada perguntou, da porta da sala.

"Ainda não...", Fuji respondeu com um sorriso preguiçoso, "Mas estou quase lá."

Yumiko riu, ajeitando a franja dele para trás, "Seria melhor ir para a cama, Syusuke. Vai ficar com torcicolo se dormir aqui."

"Tsc...", foi a única resposta dele, virando-se de costas para a televisão, procurando uma posição mais confortável.

Aos seus pés, sentiu Yuuta sentando-se no sofá, "Daqui a pouco eu vou embora.", como resposta, Fuji esticou as pernas, apoiando os pés no colo do irmão, que começou a brincar com a barra de sua calça, "Não quer mesmo que te acompanhe na consulta?"

"Hn-mm..."

Yumiko apoiou uma mão delicadamente sobre a orelha de Fuji, que exibia um roxo um pouco grotesco demais, comparado ao rosado da pele e estava quente ao toque, "E se for muito grave?"

"Eu irei viver com isso.", Fuji respondeu sonolento, não dando muita importância ao fato, mas sorriu ao lembrar-se de um pequeno detalhe, que nem ele mesmo se deu conta a não ser quando o inspetor lhe disse, "E ganharei uma boa indenização."

Os outros dois irmãos suspiraram. A última coisa que os preocupava era uma indenização. O silêncio tomou conta dos três novamente, quando o celular de Fuji tocou, despertando-o muito a contragosto.

No visor, viu que era um número desconhecido e, com a ajuda da irmã, sentou-se no sofá, "Alô?"

"Fuji?"

"Sou eu. Quem está falando?"

Um breve silêncio do outro lado da linha, até que, "Tezuka."

"Oh...", Fuji franziu o cenho, ponderando que realmente fazia muito tempo que não falava com o outro para já ter esquecido o timbre de voz dele e não ser mais capaz de reconhecê-lo, assim como na noite anterior.

"Preciso falar com você."

"Hm..."

"Você está livre amanhã?"

"Não.", Fuji respondeu calmamente, "Tenho uma consulta amanhã."

"É o seu ouvido?"

"Hm-mm."

"Oishi está sabendo?"

"Não."

"E...", Fuji escutou o som de folhas sendo viradas, "Quando será sua consulta?"

"De manhã."

"Posso pegá-lo depois?"

"No consultório?", nisso, Fuji percebeu que seus dois irmãos olharam-no curiosos e gesticularam perguntando quem era, "Eu não sei. Minha irmã irá me pegar."

Um pequeno silêncio se fez no outro lado da linha e Fuji aproveitou para acenar para seus irmãos que estava tudo bem, "Você está escutando com o outro ouvido?"

Fuji ponderou se diria a verdade ou não, visto que Tezuka realmente não tinha necessidade de ficar sabendo de um detalhe como aquele, mas acabou dando de ombros, dizendo como se o fato não o incomodasse, "Não."

"Diga a sua irmã que eu o pegarei no consultório e nós iremos almoçar juntos."

Sem resistir, um sorriso apareceu no rosto de Fuji, que voltou a deitar no colo da irmã, "Oh... então, será assim?"

"Será assim.", Tezuka respondeu com um tom que não toleraria negações.

Fuji indicou o endereço da clínica e desligou o aparelho, sentindo um estranho sentimento de deja vu.

"Quem era?", Yuuta perguntou rapidamente.

"Tezuka.", Fuji respondeu, virando-se novamente no colo da irmã, querendo voltar a dormir.

Os dois irmãos se entreolharam confusos e Yuuta perguntou novamente, "Tezuka... Tezuka Kunimitsu? Da Seigaku?"

"Esse mesmo."

"Aconteceu alguma coisa?"

"Não."

"Você não vai querer que a gente adivinhe a razão desse telefonema estranho, não é?", Yumiko perguntou, brincando com os fios de cabelo do irmão, "Pode ir contando!"

Fuji sorriu para a irmã, abrindo um olho sonolento, "Ele quer me ver. Vai me pegar amanhã, na clínica.", ao conseguir as expressões de surpresa nos irmãos, ele fechou novamente o olho, aconchegando-se no sofá, "Vamos almoçar juntos."


Depois da consulta, depois, mais especificamente, de levar uma bronca do médico por não ter procurado uma assistência no dia da agressão, Fuji tinha um envelope cheio de exames marcados nas mãos. Ao sair do consultório e despedir-se do médico, encontrou Tezuka sentado na sala de espera, celular no ouvido.

Ao vê-lo, Tezuka despediu-se de quem quer que fosse e ergueu-se, olhando o envelope rechonchudo nas mãos de Fuji, "Como está?"

"Nada muito certo.", Fuji desconversou, aproximando-se, "E você?"

"Vamos embora.", Tezuka ordenou, virando-se de costas e começando a andar.

Fuji o seguiu, encontrando o mesmo carro preto, bem cuidado e moderno. Não precisou esperar muito para recomeçar a conversa.

"Me desculpe."

"... pelo o quê?"

"Pelo seu ouvido.", Tezuka explicou, "Eu poderia ter evitado... Deveria ter intervindo assim que o vi te perseguindo, mas..."

Fuji não sabia que Tezuka tinha visto tanto assim de sua discussão com Takeru, "Não se culpe."

"Mesmo quando ele tentou--"

"Tezuka.", Fuji disse em tom de aviso, "Já disse: não se culpe. Há outras coisas mais importantes para se culpar no momento."

Os dois permaneceram em silêncio até que Tezuka estacionou o carro e guiou-o até a entrada do restaurante. Ele não pediu a opinião de Fuji na escolha dos pratos, apenas pediu e esperou, observando o movimento da casa enquanto Fuji mexia com as pontas do cabelo, ao lado do rosto.

Depois de alguns minutos, após a chegada dos pratos, ele comentou, "O que você está fazendo?"

Fuji desviou os olhos das outras mesas em volta deles e encarou Tezuka, com um sorriso satisfeito, "Estou comendo."

Suspirando, o moreno explicou, com certa impaciência, "Eu quero saber se está trabalhando e no quê."

"Sou ecólogo.", ao aceno de Tezuka, ele continuou, "E advogado.", outro aceno, "Trabalho para organizações não-governamentais como advogado ambientalista.", mais um aceno, dessa vez, um pouco desinteressado, "E tenho a leve impressão de que você já sabia disso tudo."

Tezuka ergueu os olhos do prato, desconfiado, "Oishi contou-lhe alguma coisa?"

"Ele deveria?"

"Não.", ele voltou a comer, um pouco menos tenso, "Eu trabalho como policial para assuntos políticos e governamentais."

"Ah, então você é um policial.", Fuji inclinou-se sobre a mesa, aproximando-se de Tezuka e sussurrando-lhe, sarcástico, "Você não deveria mentir nessa hora?"

Tezuka olhou-o sério, "Não acredito que você vá fazer alguma coisa com esse tipo de informação."

"Posso pensar a respeito.", Fuji deu de ombros, continuando, "Então, creio que você já deve saber um bocado interessante sobre a minha vida, tendo acesso tão facilmente a informações."

"Sim."

"E você já sabe tudo isso sobre mim desde ontem ou desde... não sei... mais cedo?"

"Desconfia que eu fiquei vigiando você esses anos todos?", Tezuka perguntou, encarando-o seriamente.

"Não...", Fuji tomou um gole de suco, passando a língua sobre os lábios depois, "Mas com quais dados você construiu sua esposa?"

Tezuka estreitou os olhos, sua expressão mudando rapidamente, "Foi uma infeliz coincidência."

"Eu imagino... deve ser muito difícil pra você conviver com uma mulher com um rosto tão parecido com o meu."

"Você está tomando conclusões precipitadas.", Tezuka disse entredentes, apoiando os talheres no prato, "Acha que eu só me casei com ela por causa da aparência."

"Não acho isso."

"Eu disse que foi uma infeliz coincidência."

Fuji suspirou, fechando os olhos e recostando-se na cadeira, "É tão ruim assim, então, ela ter um rosto como o meu?"

"Não... não é ruim.", Tezuka relaxou um pouco também, "Na verdade, não foi infeliz..."

"Tezuka, eu pensei que estava olhando para um espelho!", Fuji disse, de repente, rindo, "Pensei que olhava para minha própria irmã, só que minha irmã de doze anos atrás."

"... Você está exagerando."

"Exagerando? Eu? Quem foi que exagerou ao escolher a própria esposa?"

Tezuka ergueu o rosto, bravo, "Eu não escolhi a minha esposa."

"Certo.", Fuji concedeu, apoiando o queixo na palma da mão e o cotovelo na mesa, "Me diga, então, por que se casou com ela?"

Tezuka abriu a boca, mas demorou alguns segundos para responder, "Porque a amo.", ele disse finalmente, com um tom decidido e firme.

"Que pena, então...", Fuji disse, limpando os lábios no guardanapo, "Como eu disse: deve ser muito triste para você amar alguém que se parece tanto comigo.", ele então levantou-se, pegou o envelope com os exames e saiu do restaurante.

Na rua, caminhou a passos rápidos para o posto de táxi, acenando para o motorista, que abriu a porta do carro para ele. No mesmo instante que o motorista sentou-se, Tezuka abriu a porta ao lado de Fuji e agarrou-o pelo braço, puxando-o para fora.

"Você não deve fazer isso."

Fuji suspirou, deixando ser levado, "Já passei por uma situação como essa há dois dias atrás. Não estou com paciência para uma segunda vez."

Tezuka parou de andar, olhando-o com um misto de incredulidade e raiva, "Não vou machucá-lo, você sabe disso."

"Tezuka, nós não nos vemos há quase dez anos.", Fuji argumentou pacientemente, "Não sei mais se conheço você como eu conhecia para saber se vai me machucar ou não."

O celular de Tezuka tocou, quebrando a tensão entre os dois. Suspirando, ele retirou o aparelho do casaco, soltando o braço de Fuji. Enquanto respondia a chamada, o outro se afastou, voltando para o táxi.

"Só um momento.", Tezuka disse rápido, correndo atrás de Fuji, "Já falei que não deve fazer isso.", ele o recriminou segurando-o novamente e puxando-o para o estacionamento, onde estava o próprio carro, voltando a falar no celular, "Desculpe. Sim, sim... estarei lá. Sim. Até mais."

Quando terminou a ligação, já estava perto do carro, abrindo a porta para Fuji e indicando para que ele entrasse.

"Certo.", Fuji disse, calmo, "O que, exatamente, eu não deveria fazer?"

"Sair.", Tezuka respondeu simplesmente, prestando atenção no trânsito.

"Achei que já poderia, me desculpe.", Fuji disse sarcástico, "Conversamos o que tínhamos que conversar... pensei que pudesse ir embora."

"Pensou errado."

"Sim, percebo isso."

Segundos depois, Tezuka socou o volante, mantendo, no entanto, uma expressão contida, "Você sempre teve essa mania."

"O quê?", Fuji perguntou, não acreditando no que ouvia.

"Sempre quer ser o último a falar, gosta de deixar os outros falando sozinhos para que não tenham a chance de retrucar... sempre foi assim."

"Eu não sou assim."

"Você é assim. Sempre foi assim.", Tezuka pontuou suas palavras, olhando-o de relance, "Quando discutíamos, você sempre vinha com uma das suas conclusões óbvias, achando que o assunto estaria encerrado assim, simplesmente, e saia do quarto sem querer ouvir o que eu tinha a dizer."

Fuji riu, negando com a cabeça, "Entendi... o que você tem a dizer, então, Tezuka?", após alguns longos segundos de silêncio, ele voltou a rir, "Tudo isso? Nossa... precisarei de tempo para pensar em uma conclusão óbvia boa o bastante agora."

"Não é culpa minha.", Tezuka respondeu, entredentes, tenso.

Fuji arregalou os olhos, fingindo surpresa, "Ah, olha só uma mania sua também aparecendo dez anos depois!", ele disse, apontando para Tezuka, que o olhou bravo, "Não me diga que esqueceu de todas as vezes que você me disse que a culpa não era sua?"

Tezuka suspirou, "A culpa não é minha."

"Sim, claro. É minha. Sempre foi minha.", Fuji disse dando de ombros, "Por isso que eu sempre dizia conclusões óbvias. Para cada vez que você me culpava, eu dizia uma conclusão óbvia e deixava você falando sozinho. Justo o bastante, não acha?"

Tezuka imitou-o, dando de ombros também, "Pelo menos, você admite."

"Está bem! Está bem! Eu admito.", Fuji disse, sem perceber que Tezuka estacionava o carro, "Mas, então, por que você tem uma esposa com a minha cara?"

Tezuka saiu do carro e andou até o outro lado, abrindo a porta para Fuji, puxando-o para fora e pressionando-o contra a lataria, "Ainda não percebeu? Culpa sua."

"Ora, mas que conclusão óbvia, não?", antes que Fuji pudesse continuar, Tezuka inclinou-se e o calou num beijo tão feroz e violento que sua cabeça bateu contra o capô do carro.

No momento que sentiu a língua de Tezuka forçando seus lábios, Fuji não resistiu e sentiu como se estivesse rejuvenescendo dez anos, como se todas as brigas e discussões que tiveram não foram suficientes para que se separassem, como se ainda tudo pudesse dar certo com um simples beijo.

Os dois beijaram-se e acariciaram-se, esfregaram-se e arranharam-se. Deixaram-se levar tão facilmente pelos sentimentos que insistiam em permanecer como feridas entre eles que não perceberam a própria excitação.

Fuji abriu as pernas, envolvendo a cintura de Tezuka, que segurou-o pelo bumbum, erguendo-o contra a lataria do carro.

Tezuka percorreu com lábios e dentes toda a extensão do pescoço de Fuji, passeando com as mãos pelo corpo esguio, ainda jovem e macio nas suas lembranças e no presente. Foi quando suas mãos seguraram a cabeça de Fuji para beijá-lo que o encanto quebrou.

"Ai! Ah...", Fuji afastou-se dele, com a mão sobre a orelha roxa.

Tezuka ofegou, suspirando fortemente para controlar a respiração, "Desculpe..."

"Tudo bem...", Fuji estava com os olhos fechados, tentando controlar uma pequena careta de dor que insistia em tomar conta de seu rosto. Sua orelha latejava e um pequeno zunido começou a irritar-lhe.

"Deixe-me ver.", Tezuka insistiu, retirando a mão protetora de Fuji sobre a orelha e afastando o cabelo, "O que o médico disse?"

"Que talvez haja sangue coagulado dentro da cavidade, impedindo a propagação do som. Por isso minha surdez temporária.", Fuji explicou, mal sentindo os dedos de Tezuka sobre sua pele, "Aliás, alguns dos meus exames são para hoje à tarde."

"Por que não me disse?"

Fuji sorriu, "Achei que terminaríamos rapidamente a nossa conversa."


"Ele diz que a culpa é minha."

"Mas que absurdo! Não se preocupe: ele sempre diz isso!", Eiji comentou indignado, com um pote de sorvete enorme na sua frente.

Fuji riu, experimentando o doce também, "Sim, foi o que eu disse pra ele. Que ele sempre diz que a culpa não é dele. Ou seja, a culpa é minha."

"Ele não se toca, né não?", Eiji riu, balançando a colher no ar, "Desde os tempos do colégio, ele não se toca."

"Talvez ele tenha percebido... mas não quer admitir."

"Ou arcar com as conseqüências.", o ruivo acrescentou, sério, "Não é fácil admitir para o mundo que você ama outro homem."

Fuji riu novamente, adorando passar a tarde com o amigo.

Sua orelha estava em piores condições do que imaginou. Após o diagnóstico preciso dos exames, Fuji foi encaminhado direto para a sala de cirurgia para a retirada dos coágulos. Estava agora com a orelha coberta com gaze, já sabia que tinha perdido parte da audição, que seria exatamente medida em novos exames no dia seguinte e que teria que passar a noite no hospital.

Sua irmã iria dormir com ele, mas aproveitou a visita de Eiji para sair e resolver coisas com uma nova editora para um novo livro seu.

Sabendo da precariedade de sabores existentes nos hospitais, Eiji contrabandeou um pote de sorvete de rum com passas para o quarto, dividindo-o com muito gosto com o amigo.

"Ele não precisa admitir para o mundo.", Fuji comentou, tomando outra colherada.

"Oh! Você precisa ouvir isso!", Eiji arregalou os olhos, calando Fuji, "Não sabe como Oishi fez para me contar sobre Yumi-san!"

"O que ele fez?"

"Ele pediu que eu o imaginasse com seios!", Eiji disse entre risadas, "E eu não conseguia! Ficava uma coisa muito estranha... eu imaginava você com duas laranjas embaixo da roupa. Mas não adiantava porque as laranjas escorregavam! E eu não entendi por quê ele me pediu pra imaginar você com seios."

"Ele explicou depois?", Fuji perguntou, rindo.

"Ele tentou... ele tentou fazer com que eu entendesse por adivinhação, sem que ele tivesse mesmo que explicar."

"Esperto ele, hein?"

"Nem tanto... porque, no final, ele teve mesmo que dizer, com todas as letras..."

"Você fingiu que não tinha entendido só pra obrigá-lo a isso, coitadinho.", Fuji disse com um tom de reprovação.

"Claro! Todo esse tempo e ele nunca me disse que a Yumi-san era a sua cover!", Eiji cruzou os braços, defendendo-se, "Eu merecia saber."

"Eiji... se você soubesse, eu ficaria sabendo também. Muito mais cedo."

Com uma enorme colherada de sorvete posta na boca, Eiji respondeu, "O que não seria muito ruim, convenhamos."

"É, talvez...", Fuji disse pensativo, "Há quanto tempo mesmo eles estão casados?"

Eiji olhou para cima, fazendo um rápido cálculo mental, "Seis anos... eu acho."

Fuji franziu o cenho, confuso, "Sem filhos?"

"Hm... Oishi me disse uma vez que nasceu uma menina, mas ela já estava morta.", Eiji respondeu seriamente, abaixando os olhos, "Deve ser muito triste..."

"Sim..."

"Er...", o ruivo balançou a cabeça, explicando, "Deve ser muito triste casar com alguém que não te ama e... perder um filho ainda por cima."

Fuji apoiou a colher dentro do pote, dizendo cuidadosamente, "Eiji... é claro que Tezuka ama Yumi-san.", diante do olhar do amigo, ele acrescentou rapidamente, "De alguma forma, ele deve amá-la. Do contrário, não estaria com ela por seis anos."

"Bom... Tezuka deve amá-la de uma forma bem diferente de como ama você.", antes que o amigo pudesse retrucar, ele continuou, sério, "E vai me dizer que ela não percebe? Fuji, é tão fácil saber quando alguém não ama a gente... pode ser difícil admitir, mas, no fundo, a gente sabe."

"Eiji..."

"Assim como é fácil saber quem ama a gente. Veja os meus irmãos, por exemplo... eles não cansam de tentar me separar do Oishi, parecem os quatro cavaleiros do apocalipse quando vem me visitar!", Fuji não pôde deixar de rir da comparação, "Mas eu sei que eles me amam. E fazem isso só pensando no melhor pra mim, apesar de não entenderem exatamente o que é o melhor pra mim."

Fuji esperou que suas risadas diminuíssem para perguntar, ainda com um sorriso no rosto, "Eiji... alguém que ama verdadeiramente uma pessoa agüentaria ficar dez anos sem vê-la?"

Eiji ponderou por alguns segundos e respondeu, "Talvez... se todo mundo conseguisse o mesmo recurso que Tezuka. Mas não é tão fácil assim encontrar covers da pessoa que ama, né? E, de qualquer forma, mesmo que ela seja parecida com você, ela não é você. Ela nunca vai conseguir substituir Fuji Syusuke."


"Alô?"

Fuji calou-se ao ouvir a voz feminina. Pensou que o número gravado em seu celular, quando Tezuka lhe telefonou, fosse um pessoal do moreno, "Por favor, Tezuka Kunimitsu?"

"Quem deseja?"

"Fuji Syusuke."

"Só um instante, por favor."

Fuji ouviu passos e uma porta sendo aberta, "Kunimitsu. Telefone pra você.", ele escutou um suspiro e a voz de Tezuka perguntando, "Quem é?", ao invés de responder para o marido, Fuji escutou a voz de Yumi, clara novamente, "Quem deseja?", e, antes que ele pudesse falar, ela disse, "Oh, acho que a ligação caiu."

O telefone foi desligado.

Fuji sentiu uma pequena vontade de rir, mas estava admirado demais com o comportamento petulante de Yumi. Para uma mulher tão submissa e recatada como ela, essa atitude realmente foi de surpreender. Balançando a cabeça, achando tudo muito divertido, preparou-se para discar o número novamente, mas, antes que seu dedo alcançasse o primeiro botão, seu celular vibrou, com o número de Tezuka piscando no visor.

"Alô?"

"Por que ligou pra cá?", a voz de Tezuka aparentava um cansaço que Fuji desconhecia no outro.

"Como sabe que fui eu?"

"Por que ligou pra cá?"

Fuji sorriu, achando que os anos deixaram Tezuka impaciente demais, "Por que pagou minha diária?"

"Não sei o que quer dizer."

"Tezuka, eu passei uma noite no hospital. Você não deveria saber disso, pois me deixou no laboratório para fazer os exames e não teria como adivinhar os resultados deles e que eu iria passar por uma cirurgia.", Fuji explicou devagar, não querendo deixar brechas para o outro mentir, "Hoje, quando fui acertar as contas, a diária já estava paga."

"Deve ter sido um dos seus irmãos.", Tezuka respondeu em um murmúrio e Fuji pensou se ele não estava falando escondido da esposa, "Eu não tenho nada a ver com isso."

"Sem mentiras, Tezuka. Se você sabe da minha vida tanto quanto eu acho que sabe, imagino que não se esqueceu que eu e meus irmãos dividimos uma conta conjunta e nós três sabemos as senhas de nossas contas pessoais."

"Você verificou o saldo dos seus irmãos?"

"Mas é claro! Uma diária no hospital que fui internado não é tão barato assim."

"Pode ter sido Eiji ou Oishi."

"Tezuka.", Fuji o alertou, perdendo a paciência, "Por que fez isso?"

Após alguns segundos de silêncio, Tezuka perguntou, "Como descobriu?"

"Sou advogado, não é muito difícil conseguir informações conhecendo leis e ditando-as enfadonhamente para as pessoas.", Fuji respondeu, mais calmo, com um sorriso no rosto.

"Suponho que você queira restituir o valor na minha conta."

"Suponho que você não queira que isso aconteça."

"... então, foi uma perda de tempo mesmo você ter ligado.", Tezuka concluiu, suspirando, "Se é só isso..."

"Ah... mas é sempre bom ter certeza de que sou culpado de tudo, não é?"

"Escute, eu tenho trabalho a fazer.", Tezuka cortou-o rapidamente, "Preciso desligar. Adeus."


"Sinto muito ter ligado."

Fuji suspirou, inclinando o rosto para trás e fechando os olhos, "Tudo bem..."

"Eu quero pedir um favor."

"Estou dentro de um navio, no meio do mar do Japão.", Fuji disse, imaginando que esse tipo de detalhe já era do conhecimento de Tezuka, "Dependendo do favor, verei o que posso fazer."

"Troque o número do seu celular, por favor."

"Ah... claro.", Fuji sorriu, caminhando pelo convés e admirando a paisagem mórbida de neblina e cinza da madrugada no mar, "Na verdade, sua esposa não me incomoda muito."

"Por favor.", Tezuka repetiu, paciente.

"Qual é o problema?"

"Você é o problema. Seu número na minha conta de telefone é o problema."

"Hm... mas conversar com Yumi-san é muito divertido.", Fuji comentou displicente, "Aposto que sei mais sobre sua vida de casado do que Oishi. E não é tão ruim assim... ela passou dois meses sem telefonar, uma vez."

"Foi um erro colocar você de volta na minha vida.", Tezuka murmurou, suspirando, "Eu quero que tudo volte ao normal."

Desde o acidente com Takeru, depois do almoço que tiveram juntos, os dois não se encontraram. Sete meses se passaram desde a última vez que se falaram, por telefone. Tezuka não procurou mais Fuji e este continuou a viver, sem querer atrapalhar o que parecia tão bem, como um acordo silencioso.

Se Tezuka sentia-se realmente satisfeito com o casamento, o que Fuji poderia fazer, a não ser afastar-se e deixar que ele seja feliz da maneira dele?

"... está bem."

"Obrigado."

Duas semanas depois, Tezuka apareceu na porta do apartamento de Fuji.

Fim