Capítulo I – Aquele que ainda não há Mary Sue!

Harry Potter ainda tinha catorze anos. Faltava pouco para virar a meia-noite. Em alguns minutos, já seria um rapaz feito: quinze anos, corpo já crescido, os primeiros fios da barba rala nascendo no rosto. Contudo, não parecia fazer absolutamente nenhuma diferença de quando tinha seus catorze, treze, doze ou onze. O tempo passara tão rápido que parecia simplesmente não ter passado.

Na verdade, Harry tinha mudado, e muito, no decorrer desses últimos quatro anos. Descobrira, de uma hora para outra, a verdade sobre muitas agruras que lhe eram escondidas. A principal revelação dizia respeito a sua própria existência e à morte de seus pais.

Harry era um menino normal! Talvez normal seja exagero. Mas era um menino apenas esquisito. No dia seguinte, era o filho de dois bruxos assassinados por outro feiticeiro. O último, por sua vez, era um louco homicida que tinha uma implicância cármica com o menino.

Tudo isso era intenso para um moleque de onze anos. Agora, Harry estava na iminência de completar sua décima quinta primavera. E pouca diferença fazia. A vida estava tão confusa e assustadora quanto parecera ao entrar pela primeira vez no Caldeirão Furado.

Dumbledore e Hogwarts estavam em estado de alerta. Voldemort retornara com força total. Cedrico Diggory estava morto. Sentia saudades de Rony e Hermione. E de Cho. Pensara muito nela durante as reclusas férias na casa dos Dursleys.

O jovem despertou de seus sonhos ao ouvir a excitação de Edwiges na gaiola. O piado da coruja também não passou despercebido pelo tio Válter:

– DÊ UM JEITO DE CALAR A GALINHA, POTTER! OU AMANHÃ NO ALMOÇO TEREMOS CANJA!

Harry tapou o bico de Edwiges rapidamente. A coruja, muito contrariada, calou-se. Mas tratou de meter um a boa bicada no dedo do dono antes de se resignar ao silêncio.

A causa da fatídica animação era um mocho que pousara no parapeito da janela gradeada. Harry reconheceu o belo corujão castanho como sendo de seu padrinho, Sirius Black.

Puxou a carta que estava no bico do animal e deu-lhe um pouco de ração. Sentou e leu, com um sorriso abobalhado no rosto. Já sabia do que se tratava. Sirius lhe dava os parabéns, lhe falava que já era praticamente um homem, que teria responsabilidades muito grandes esse ano, que a vida seria difícil...

Seria o mesmo de sempre, se não fosse pelo PS que vinha ao final da carta:

Se cuide!

Ass: Sirius

Ps. Descobri que tenho uma filha! Quem diria, não?

– O QUÊ? – Harry arregalou os olhos. Ajeitou os óculos na cara e leu de novo. E de novo! E releu! Nunca ficara tão perplexo na vida! Nem quando soubera a verdade sobre o que acontecera com seus pais.

Na manhã seguinte, Harry estava sentado à mesa, para tomar o seu café. Tia Petúnia encheu o seu prato de ovo mexido e fatias bacon.

– Coma bastante! Quero você muitíssimo bem alimentado para a viagem!

Harry estranhou a preocupação. Duda também. O gordo é quem reclamou:

– Ei, mãe! Que história é essa? Desde quando o Harry ganha um prato tão cheio quanto o meu?

Naturalmente, Duda estava exagerando. Seu prato era o TRIPLO do tamanho do de Harry.

– Ora, meu filho! Seu primo precisa estar preparado para a viagem de trem que ele vai fazer para aquela escola de bruxos! A última coisa que eu quero é que ele tenha um desmaio no meio do caminho!

Harry chegou a esboçar um sorriso, surpreso com aquela preocupação que a Tia nunca demonstrara antes.

– Imagine, meu Dudinha! E se resolvem devolvê-lo? Vamos ter de aturá-lo na nossa casa e nas nossas vidas pelo resto do ano!

Duda balançou a cabeça concordando. Harry fechou a cara e traçou algumas fatias de bacon numa única garfada.

– Mastigue devagar, seu porquinho! – ralhou Tia Petúnia.

– Foi mal! – desculpou-se Duda.

– Não estou falando de você, meu docinho! – a mulher arregalou os olhos. – E sim desse garoto mal educado e sem costume! Não tem estudo, não, menino? Não te dão educação naquela escola?

– É verdade! – Duda de repente pareceu despertar uma curiosidade adormecida há tempos. – O que vocês aprendem na sua Escola? Matemática dos bruxos?

– Claro que não, tesouro! – riu Petúnia. – Eles são todos uns boçais desocupados que ficam se aleijando como uns animais carniceiros! Nem fazem idéia do que seja uma fração!

– Aleijando? – repetiu Duda incrédulo. – Mas, então, como o Harry continua inteiro e nunca voltou para cá separado em caixas?

– Ah, querido! É que no caso do seu primo se trata de um retardamento MENTAL! Note a cara de debilóide completo dele!

Harry levantou-se da mesa aborrecido. Enquanto subia as escadas ainda pôde ouvir a tia e o primo discutindo.

– Ele realmente não é uma pessoa normal!

– Uma pessoa normal andaria mais alinhada!

– E daria um jeito naquele cabelo desgrenhado!

– Isso para não falar daquela pomba maluca que ele guarda no quarto!

– Aquilo é para macumba, filho!

– Mesmo assim! Sabe lá quantas doenças aquele bicho não passa?

– Isso, sem falar que faz uma barulheira danada de noite, pia como uma condenada, caga a casa toda...

– E ainda teve aquela vez que ela arrancou um tufo de cabelo da cabeça do papai!

Harry bateu a porta com força. Sentou-se na cama. Um dia ainda esquecia da proibição de uso de magia fora de Hogwarts e transformava os tios em alguma coisa gordurosa e fedorenta.

A viagem de carro até a Estação King's Cross, de onde saía o Expresso de Hogwarts, transcorreu normalmente; em silêncio sepulcral. Tio Válter estava com cara de poucos amigos, e Harry não fazia a menor questão de puxar assunto.

Após ser praticamente expulso do carro, Harry recolheu suas malas e a gaiola de Edwiges, que o Tio Válter fez questão de arremessar o mais longe possível.

– Tudo bem, Edwiges? – perguntou o menino, ao atravessar a passagem que dava na Plataforma 9½.

Do outro lado do portal, Harry pôde perceber como havia menos alunos do que o normal.

– Muitos devem estar com medo de ir para Hogwarts, agora que Voldemort voltou! – pensou.

Em meio à multidão – apesar de serem menos do que eram antes, ainda havia muitas pessoas na Plataforma –, Harry vislumbrou seu ruivo amigo Rony, que mostrava a bunda para uma velha que vinha passando.

– Dá uma boa olhada, aí, minha senhora! Na sua idade e com essa cara feia, essa vai ser a única bunda masculina que você vai ver para o resto da sua vida!

– Oi! – disse Harry. – Vista a sua calça para a gente poder conversar direito!

– Oi, Harry! – disse Rony, suspendendo os fundilhos. – Como está? Como passou as férias?

– "timas! Nem te conto! Fui à China, peguei pneumonia asiática, depois fui preso porque me confundiram com um traficante de papoula e fui torturado pela polícia! Aí eu acordei e me lembrei que estava na casa dos Dursleys, que é mil vezes pior!

Silêncio se fez por alguns instantes, enquanto o Expresso chegava à Plataforma, enchendo os ouvidos com o barulho de suas possantes engrenagens. Rony e Harry fitaram os trem por alguns instantes e pegaram suas malas, preparando para o embarque.

A família Weasley surgiu quase toda nesse momento; todos barulhentos e alegres como sempre. Molly vinha à frente, pajeando Gina:

– Agora, querida, vamos ver se você entendeu direitinho o que a mamãe te falou! Se um estranho te entregar um diário encantado que contém o segredo para abrir a câmara onde mora um monstro que vai matar todos na escola, o que você faz?

– Eu... Gah... Uhm... Pô, mãe! Não tem uma pergunta mais fácil?

– Você NÃO ACEITA, minha filha! Entendeu?

Gina balançou a cabeça afirmativamente.

– Então pode embarcar! – Molly voltou suas atenções para os gêmeos, que tentavam colocar uma bomba dentro da mala de Snape. – Ei! Vocês dois! Venham cá, agora!

Enquanto a senhora Weasley passava um carão nos gêmeos, Lúcio Malfoy se aproximou da pequena Gina com um diário de capa de couro preta nas mãos.

– Querida, pode me fazer um favor? Pode guardar esse diário encantado que contém o segredo para abrir a câmara onde mora um monstro que vai matar todos na escola?

– Tá bom! – Gina estendeu o braço e pegou o diário.

– Obrigado, queridinha! Pode folhear o diário o quanto quiser, viu?

– OBA! – Gina subiu a escadaria do trem toda serelepe, já abrindo o diário que acabara de ganhar.

Rony e Harry se arrumaram no vagão. Hermione apareceu à porta e cumprimentou os amigos!

– Oi, pessoal! Há quanto tempo!

– Oi, Hermione! – os rapazes responderam em coro.

– E, aí? Quais as novidades? – a menina sentou-se junto aos amigos.

– Bem, Carlinhos morreu na Romênia, porque um dragão sentou em cima dele! – respondeu Rony.

– NOSSA! QUE TRAGÉDIA!

– Nem! Consegui ficar com o quarto dele!

– Ai, Rony! Você não se sente mal?

– Eu, não! Em casa de pobre é assim, minha filha! Cada um que morre é mais comida no prato dos outros!

– E você, Harry? Algo para contar?

– Parece que o Sirius tem uma filha!

– Que barato! – disse Rony.

– O Sirius é o meu padrinho, o que faz dessa menina alguma coisa minha, não?

– Uma prima emprestada, eu acho! – falou Rony.

– Não... Ela não é nada sua, Harry! A não ser... – ponderou Hermione.

– A não ser o quê?

– A não ser que sejam fundamentadas aquelas teorias de que o Sirius é, na verdade, seu pai!

– Sirius? Meu pai! Mas que absurdo!

– Bem, Harry! – falou Rony. – Sua mãe não tem exatamente a fama de ser uma santinha...

– O que está querendo insinuar?

– Ele está dizendo que sua mãe era uma piranhona caidaça! – esclareceu Hermione.

– O QUÊ? – Harry estava chocado.

– Peraê! Popará! – interveio Rony. – Eu só chamei de piranhona! O caidaça é por conta dela!

– Não acredito que falem isso de mamãe! – Harry estava incrédulo.

– Isso não é nada, meu filho! – Hermione encarou Harry. – Já ouvi poucas e boas a seu respeito! Já ouvi que você é filho do Sirius, do Dumbledore, do Voldemort, do raio que o parta! Até do Neville!

– DO NEVILLE?

– Neville que, segundo contam, é o herdeiro de Helga Hufflepuff! – lembrou Rony

– Então por que diabos ele está na GRIFIN"RIA? – questionou Harry.

– São rumores, Harry! Não precisa fazer sentido para existirem, ou para passá-los adiante!

Enquanto o trio conversava, o trem Expresso seguia sua viagem rumo ao Castelo de Hogwarts.