04/09/2017
06:12 am:
Enfim, é inverno e como qualquer jovem no terceiro ano do ensino médio tenho pensado muito no que fazer após me formar. Há alguns anos atrás ao fechar os olhos podia me ver em um apartamento sozinha, fazendo projetos de plantas para casas e tomando uma xícara de café com leite bem quentinho, quando um homem de aparência gentil entrava na sala e me chamava para comer algo com meus filhos, um belo sonho simples e sem muitos enfeites, bonito e puro. Hoje já não é assim, quando fecho os olhos tudo o que vejo é o escuro, escuto os ruídos à minha volta, sem detalhes, sem nada além dos impiedosos pensamentos sobre o que vai acontecer até o fim desse dia sem sentido. Não tenho mais sonhos, em algum momento da minha adolescência desisti disso, talvez por sempre escutar que a família dependia de mim eu tenha me desandado de propósito. Não queria esse fardo, não queria assumir a responsabilidade pelo que outros não puderam fazer. Ou apenas me deixei levar pela emoção de finalmente ter amigos, fiquei presa por momentos e esqueci da minha vida como um todo.
A questão é: Existe um futuro se eu mesma não posso me imaginar nele?! Sim! Existe! Infelizmente não posso simplesmente desistir da vida por não achar sentido nela. Ou posso?! Tantas pessoas fazem isso e após vários dias de observação percebi algo que já estava óbvio, ninguém liga se eu estou ali. Meus amigos nem mesmo percebem quando eu falto na escola ou saio no meio das conversas, pior que isso, me ignoram quando eu estou tentando chamar a atenção deles. Não é de propósito, eles não tem maldade, só tenho predisposição a ser invisível e ninguém mais é obrigado a passar por cima dos meus defeitos além de eu mesma.
Ser invisível não é de tudo ruim. Nunca sou assaltada, não entro em brigas na escola nem que eu queira, minhas notas estão sempre na média pelos professores nem saberem quem eu sou e não importa o quão estranha minha roupa esteja, ninguém irá me falar coisas ruins ou sequer reparar nisso. É que as vezes, só de vez em quando, eu queria ser vista pelas pessoas as quais eu sempre vejo, ser vista pelos meus amigos, pelos meus familiares e por outros que não sabem nem da minha existência. De certa forma é cansativo todos os dias me sentir como um narrador em terceira pessoa, posso ver tudo o que se passa, dar minha opinião e ainda assim isso não muda o curso da história que estou assistindo de perto. Meus pensamentos atuais me assustam a medida que se tornam palavras escritas.
8:50 pm.
Depois do dia de hoje sei que simplesmente não faz diferença. As vezes as pessoas nem me escutam, isso é engraçado, me deixa um pouco envergonhada, quando sei que ninguém está vendo e apenas eu vi que fui ignorada. Ainda assim me atrevo a responder, ser gentil e em muitos dias sinto a falta dessas pessoas que não me percebem. Duvido que mais alguém além da minha irmã sinta minha falta, na verdade tenho me questionado se mesmo ela o faz. Eu tenho dentro de mim aquela sensação de estar sozinha numa sala de fundo branco, apesar de estar com várias pessoas ao meu redor num lugar agitado e festivo. Sou diferente de todos eles, sei disso e admito que muitas vezes estar sozinha me deixa mais confortável, porém é ruim estar sempre de lado enquanto se esforça muito para conseguir uma pequena parcela da atenção que é dividida entre os outros. Já ouvi que me deixam sozinha por achar que eu gosto disso quando eu nunca pronunciei tais palavras. Ninguém gosta de estar sozinho. Ninguém gosta de um silêncio eterno. Ninguém quer morrer sem viver uma história antes. Eu, nesse momento, não tenho ninguém, não tenho barulhos ao meu redor e muito menos qualquer história para ser contada. Sinceramente, nem sei o por quê de escrever isso. Não existe ninguém que leia o que eu escrevo ou que me siga em qualquer rede social por interesse em meus pensamentos. Se nem mesmo virtualmente sou notada, por que eu seria no mercado de trabalho?! Como eu teria clientes e fornecedores?! Por que alguém iria querer sair para beber comigo?! Quem me convidaria para passar uma tarde em sua casa?! Existe qualquer pessoa que se apaixone por mim?! Perguntas essas que me ferem cada vez que passam por minha mente induzindo respostas negativas e depreciativas. Serei capaz de me livrar delas e me amar em algum momento da vida? A frieza do vento de inverno que bate em meu rosto no caminho de volta para casa me diz que não existe fim para o sentimento de abandono, apenas uma maneira de o cobrir e fingir que pode seguir em frente.
