Fringe não me pertence. Se me pertencesse eu teria a consciência de haver criado uma personagem excepcional.


Foi criada dentro da estranheza. Para descer ao Hades. Atravessar o labirinto. Navegar pela estreita passagem guardada por Cila e Caribde.

Nada disso a assusta. Só algumas coisas comuns.

Não se permite contemplar a paisagem porque nela poderia se perder.

Teme o amor porque deixa os seres vulneráveis.

Admite –apenas no escuro- que ama o homem que luta a seu lado.

Quando o perde sente desespero.

Busca um caminho.

Ela o resgata, mas perde a si mesma.


Está presa a uma realidade que não é a sua.

Primeiro impulso: fugir.

Segundo: submergir nas memórias alheias.

Terceiro: tentar sobreviver. Desliza então entre a loucura e a sanidade.


Ganha a confiança de um taxista desconhecido.

Usufrui, respeitosamente, do reencontro com uma mãe que não é a sua.

Percebe que a amizade não é privilégio de nenhum dos lados.

Seu desejo pela verdade recua para fazer justiça ao homem que ficou preso no âmbar.

Continua a sonhar com um céu que não é atravessado por dirigíveis.


Reconhece a delicadeza de um homem que nunca foi seu, mas que a tratou com respeito.

Evoca a presença do ser amado para continuar lutando.

Ajuda uma criança cega.

Recebe ajuda de um homem naturalmente bom.


Retorna.

Tem a ilusão de que a engrenagem entrará nos eixos. Efêmera.

Ingenuamente almeja recuperar sua individualidade usurpada pela substituição.

Sua trilha de retorno é um acúmulo de experiências decepcionantes.

Experimenta ciúme, inferioridade, revolta, tristeza.

A solidão predomina sobre tudo.

Sente a tentação de afundar no caos.

Vai ao chão.


Levanta.

Estende sua compreensão ao homem que ama, mas que não soube discernir a essência da aparência.

Consegue falar com ele.

Consegue olhar para ele.

Tem forças para tocar o livro que não lhe era destinado.

Prossegue.


Bebe um café que não era dela.

Exerce a tolerância diante de pequenas violações cotidianas que esse homem comete inconscientemente.

Encontra forças para expressar o que a incomoda.


Assimila dolorosamente a certeza de que ele pensa na outra.

Faz da resignação parte de sua disciplina.

Continua trabalhando.

Consegue continuar falando com ele.

Consegue continuar olhando para ele.

Percebe que, apesar de tudo, ainda o ama.

Sente medo por vários motivos.

Todos reais.

Afronta o medo.

Falha.

Torna a tentar.

Faz dádiva de si.


N.A. Menos un fanfic, mais homenagem.