Agradecimento: ao Tolkien Group e a Sadie, que me incentivararam muito.
Dois amores
Quando Aislin foi para Valfenda procurava somente ajuda para seu filho, Fionnlagh, que já tinha oito anos e ainda não andava e nem falava. O que ela não sabia é que naquele lugar aconteceriam coisas que mudariam sua vida e seus valores para sempre.
Foram bem recebidos na cidade, pois Aislin era amiga da mãe de Estel, o irmão de criação dos gêmeos, além do que, todos que o viam ficavam fascinados pela beleza de Fionnlagh.
O senhor de Imladris, com seu coração bondoso, fizera questão de hospedar a amiga de Gilraen em sua própria casa, onde o encanto daquele anjo personificado em menino logo cativou também a seus filhos. Ajudavam-na sempre que se quedavam em casa, e de forma natural o sentimento que devotavam à criaturinha desamparada logo estendeu-se à mãe.
Elladan, que se responsabilizara de pronto pelo menino e, junto com seu pai, envidava todo seu esforço e conhecimento para estimular o menino e ajudá-lo a progredir, era objeto de uma gratidão imensa por parte de Aislin.
O favorito dela e do filho, entretanto, era Elrohir. Mais do que animá-la com seu jeito alegre.a mera presença do mais novo dos gêmeos deixava o menino saudavelmente agitado, e seus gritinhos de felicidade ao vê-lo enchiam de contentamento o coração da mãe.
Sim, era a alegria do filho que a fazia alegre, sua vivacidade ao ver-se nos braços do gêmeo aquilo que a fazia sentir mais viva próxima a ele, era a reação de Fionnlagh ...
Era o amor de seu filho pelo gêmeo – acreditava Aislin.
Era o amor de seu filho por Elrohir – repetia.
Era o amor de Elrohir por seu filho – insistia.
Era o amor daqueles irmãos tão parecidos pelo seu Fionnlagh ... O amor dos gêmeos era pelo seu filho, e qualquer coisa a mais seria apenas uma impressão confusa sua, fruto da dedicação e generosidade que encontrara naquela família, do amparo que lhe ofereceram ...
Um amparo do qual ela e o filho precisavam tanto ...
Um amparo, uma generosidade e uma dedicação da qual ela jamais poderia esquecer, aos quais seria grata até o fim de seus dias mortais ...
...
Gratidão e respeito.
Gratidão e respeito
Aislin passou a repetir para si mesma também estas palavras.
Simbolizavam aquilo que devia aos que, mais que seus anfitriões, considerava seus salvadores.
Tinha de manter tais palavras em mente ...
Começara aos poucos, ela não sabia bem quando ... a sensação de um olhar fixo ... um rosto que se desviava depressa demais ... mãos que se tocavam e se afastavam muito rapidamente nos cuidados do menino ...
Elladan, Aislin, Elrohir ... olhares ... mãos ... sorrisos.
Gratidão e respeito.
Gratidão e respeito...
Gratidão e respeito!
...O olhar de um irmão...
...O desejo de outro..
... Um fogo queimando em seus pensamentos ...
NÃO!
Gratidão e respeito!
Gratidão e respeito!
Não podia gerar contendas entre eles.
Não podia separá-los.
&&&
Certa manhã, Fionnlagh estava particularmente preguiçoso, sem responder aos estímulos oferecidos por sua mãe. Nada que Aislin fazia dava resultado naquele dia...
A moça, por fim, decidiu-se a levá-lo para fora.
Talvez ao ar livre ele mostrasse algum interesse nela ou em algo. Para a mãe, qualquer coisa era melhor do que vê-lo naquela prostração.
Um lindo dia os recebeu na praça central de Imladris e, recostando-se com o filho em uma árvore, começou a cantar para agradá-lo.
O dia estava mesmo lindo, como lindo era aquele lugar cheio de encantamento élfico, um recanto verde onde se esquecer das preocupações e sentir-se leve como aqueles seres que às vezes pareciam flutuar, como Aislin quase se sentia flutuar agora, esquecida do que a atormentara um momento antes, até que, sem perceber, a moça ergueu-se e começou a dançar por entre as árvores do local, saboreando aquele pequeno gosto de felicidade que a cidade que a recebera lhe proporcionava.
O que ela não percebia, também, era que mais alguém estava lá e a observava atentamente.
&&&
Elladan a observava encantado, cada pequeno gesto que a moça fazia aumentava mais seu enlevo e seu amor por aquela humana.
Toda vez que ela se aproximava do lugar no qual estava escondido, ele tinha vontade de sair e dançar com Aislin. Só não o fazia, porém, porque tinha medo de assustá-la e deixá-la acanhada. Então se contentava com o privilégio de vê-la.
Num momento em que o ritmo tornou-se mais rápido a fita que prendia a negra cabeleira da mulher soltou-se. Então as belas ondas dos cabelos da mãe de Fionnlagh tocaram suavemente seus ombros, deixando-o inebriado, a ponto de quase perder o juízo, com um aroma floral.
Aislin só percebeu que mais alguém estava ali quando esbarrou levemente no gêmeo.
-Desculpe, Ro- Ela arriscou, muito acanhada, não só por ter dado um encontrão no elfo, mas também por não saber ao certo com qual dos irmãos estava falando. Seu coração, no entanto, levava-a instintivamente a repetir o apelido pelo qual fazia questão de ser tratado aquele que escolhera amar. – Desculpe, Ro. Sou tão desastrada! Prometo que não farei mais isso - Acrescentou rindo como uma criança travessa e desamparada em busca de aprovação.
Elladan pensou em dizer-lhe a verdade, porém queria que ela mesma descobrisse quem ele era.
- Parar? De dançar? De forma alguma! Só que agora, minha senhora, você dançará comigo!- Disse puxando-a para si.
– Desculpe-me por tê-la espionado, senhora dançarina.- Murmurou enquanto rodopiavam, entretanto.
- Sabe que isso não é preciso entre nós, elfinho – arriscou-se mais naquela intimidade o coração da mulher que a tanto desejava por isso - Somos amigos.
O filho mais velho de Elrond começou a cantarolar uma música bem lenta, então a mulher colou seu corpo ao dele. Ela não devia, mas era incapaz de lembrar-se disso, não conseguia resistir.
Assim permaneceram por um longo tempo, até que Elladan, arrebatado pelo desejo, olhou nos olhos de Aislin e a beijou.
As restrições que a mãe de Fionnlagh se impusera quiseram voltar-lhe à consciência no instante em que ela, assustada, percebeu o que lhe ocorria, mas era tarde, e a mulher, aos poucos, foi se entregando e o beijo tornou-se apaixonado.
Aislim e seu par ouviram então um gritinho alegre de Fionnlagh, sem, contudo lhe dar importância. Porém, logo perceberam o motivo pelo qual o menino gritou: o outro gêmeo chegara ao local.
-Olá! - Ele cumprimentou-os, disfarçando o embaraço que a situação causara - desculpem-me por atrapalhar o seu idílio, vim apreciar a bela paisagem, incomodo?
- Que idílio qual o quê, Dan!- Retrucou a mulher muito envergonhada por toda a situação.
-Dan?! – Exclamou Elrohir, para quem estava sendo difícil conter-se - Suponho que o beijo de meu irmão deixou-a confusa, Ais. Sei nossa aparência é idêntica, porém seu filho sempre me reconheceu. Estou decepcionado que o mesmo não ocorra com você, Ais.- Disse usando seu tom mais sentido.
A mãe de Fionnlagh não ofereceu nem esperou qualquer tipo de explicação, tirou o menino do colo de Elrohir e saiu correndo e chorando, sentindo-se usada e enojada com a brincadeira de Elladan. O filho em seus braços, também aos prantos, gritava com as com as mãos para frente:
-Eloiiiiiiiiiiiiiii! !
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- Dan, toron-nin, diga-me que você não fez o que estou pensando?! Você não se passou por mim, não é ?!- Disse avançando com ferocidade para o irmão.
- Calma, Ro! Calma, toron!
- Isso é tudo que tem para me dizer, Elladan?!-Perguntou agarrando a camisa do irmão e tirando-o do chão.
- Era para ser uma brincadeira! Não imaginava que iria acontecer algo como isso!-Replicou o outro.
-Brincadeira?! Você brinca com os sentimentos dos outros e depois diz que foi tudo uma brincadeira, seu infeliz?!-
Dizendo isso ele não se conteve e acertou um soco no olho de Elladan, largando-o no chão.
-Deixe-me ir, agora que sabe o que penso de você e suas gracinhas, Elladan!- exclamou Elrohir, já se virando e correndo em direção a casa.
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Chegando ao quarto de Aislin, Elrohir bateu na porta já dizendo:
-Ais, por favor, abra essa porta! Eu não sabia que meu irmão a estava enganando, eu juro! Abra, por favor!
Após alguns momentos, Aislim finalmente abriu a porta do aposento, permitindo ao caçula de Elrond verificar que mãe e filho estavam prontos para partir.
-O que é isso, Ais? – exclamou o gêmeo sentindo faltar-lhe o chão - Por favor, Ais, não vá. Pense em quanto seu filho ainda pode progredir, se vocês ficarem.- Pediu segurando o braço da mulher.
-Desculpe-me, Elrohir, mas depois do que passei hoje não posso ficar.
-Fique por... mim. – suplicou subitamente o elfo – Eu ... eu a amo, Ais ... demais ... aliás amo muito vocês dois.-Disse aproximando-se de Fionnlagh.
-Eloiiiiiiiiiiiiiiiiii!- Exclamou o menininho, agitando as mãos.
- Eu ... não posso ficar ... Ro.- A voz de Aislin era a de um coração despedaçado ... um coração tolo ... um coração que ela se esforçara tanto e por tanto tempo em manter trancado, e de repente ...
-Então irei com você.
- Como?! – Exclamou incrédula a mulher. Não compreendera direito.
- Irei com você.
-Mas ... mas ... e a sua família? – sentia-se zonza.
-Meu pai e minha irmã vão me entender. E Elladan não me interessa mais. – respondeu o elfo com a impetuosidade que lhe era característica -Espere-me, já volto. Só vou pegar minhas coisas.
- Não, Ro, não pode fazer isso ... – ainda tentou redargüir a mulher.
-É claro que posso.- respondeu o gêmeo já indo para seu quarto.
E retornando em pouco, com seu alforje na mão.
- Não vê que isso é uma loucura?-Indagou a moça, querendo dissuadi-lo, e querendo mais ainda fracassar.
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-Sim.-Disse ele em uma resposta selada com um beijo.
E Aislim não sabia mais o que era certo e o que era errado, o que era sonhar e o que era estar acordada...
