Traduzida em: 29/12/2008

Autora: Sophie

Parte 1

"O que você está fazendo, David?" essa era a única coisa que me aborrecia sobre aquela criança. Como ele corria diretamente para a rua, sem nem ver se estava vindo carro antes. Apenas pela diversão disso. É estranho pensar que, apenas alguns anos atrás, ele era uma das crianças mais quietas que você poderia encontrar, mas ele se transformou nesse carinha barulhento e louco, que ficava feliz em verbalizar suas opiniões ou se fazer de idiota em locais públicos, ele apenas não se importava. "Vamos lá, saia da rua, você vai se matar."

Ele afundou os ombros para frente e, lentamente, apenas para me dar nos nervos, fez seu caminho para fora da rua sem olhar para os lados de novo. Era como se eu fosse a mãe dele repreendendo-o ou algo assim, mas eu sabia que ele estava apenas tirando da minha cara.

"Você nunca me deixa me divertir." Ele disse.

"Eu não me importo de você se divertir, eu apenas não quero que você seja atingido por um carro." Ele estava andando bem à frente de mim e eu notei que ele estava sobre seus dedos novamente. Ele sempre fazia isso, antes na ponta dos pés. Eu apenas imaginei que os tendões dos tornozelos dele eram um pouco pequenos e não permitiam que seus calcanhares tocassem o chão.

"Eu não sou tão estúpido, eu nunca seria atingido." Ele estava certo nas duas coisas. Ele era a criança de onze anos mais esperta que eu já tinha visto, e ele era tão magro, que um carro teria que virar realmente rápido para apenas arranhar o seu braço.

Ele estava bem mais a frente agora, girando ao redor realmente rápido, com seus braços abertos. Eu sempre tive um pouco de problemas em alcançá-lo quando ele estava nesse humor hiperativo, apesar do fato de eu ser maior e mais atlético. Ele estava girando tão rápido, que ele sequer viu o poste de luz e acabou batendo direto nele. Nem era daqueles ocos de metal, era um daqueles postes grandes, grossos e feitos de concreto. Eu estou muito surpreso que ele não tenha chorado, para ser honesto; ele apenas riu para si mesmo.

"Cara, isso deve doer." Eu disse, finalmente conseguindo alcançá-lo.

"Engraçado, não é?" ele respondeu. "Eu posso brincar apenas bem com o trânsito, mas quando eu ando, eu consigo me dar contusões de um jeito ou outro."

"Cavalinho? Parece que você não consegue usar os próprios pés."

"Sério?"

"Yeah, sobe." Ele tinha esse sorriso grande no rosto quando eu disse que estava tudo bem. Eu amava vê-lo todo animado desse jeito. Eu nem tive que me abaixar para ele subir, aquelas pernas magras dele eram como um jato-propulsor ou qualquer coisa assim, ele conseguia pular tão alto.

"Se eu ficar muito pesado, apenas me deixe saber, certo?" Ha! Como se ele pudesse ficar muito pesado, ele era pequeno para a idade. Inferno, ele era pequeno para uma criança dois anos mais nova do que ele. "Pierre?"

"Sim?"

"Eu amo você."

"Amo você também, David." Isso era estranho, por que nenhum de nós estávamos exatamente certos do que 'amor' significava, nós apenas falávamos um para o outro, por que nossos pais o faziam e nós víamos isso em filmes e coisas assim. Eu surgi com essa teoria de que isso era como quando você estava na primeira série ou algo assim, realmente novo, e alguém te conta um segredo pela primeira vez. Você fica todo animado e você nunca, nunca conta, por que você quer ser a única pessoa a saber. Então, você faz disso grande coisa, então as pessoas vão ficar realmente invejosas quando elas descobrirem, por que elas não souberam primeiro. Era isso que eu e David estávamos fazendo, eu acho, apenas fazendo do nosso pequeno segredo tão maravilhoso quanto possível.

Nós estávamos extremamente certos do que 'gay' significava, entretanto; eu descobri primeiro. Quero dizer, vivendo com um pai e dois irmãos adolescentes que estavam lotados de testosterona da cabeça aos pés, era difícil não saber. Eles não usavam o termo da maneira certa, contudo; virou um sinônimo para qualquer coisa que era um pouco chata ou deprimente. Tipo, se eles não pudessem ir assistir ao jogo de hockey por que tinham que estudar, meus irmãos marchariam até nossa mãe e diriam coisas, tipo "isso é tão gay!". Eu desprezava isso absolutamente, como uma palavra que era suposta a significar 'feliz e satisfeito' era usada com um significado completamente diferente por algumas pessoas homofóbicas.

David descobriu na escola, eu não estava lá, por que nós íamos a escolas diferentes, mas ele me contou. Algum garoto o chamou de gay e quando David perguntou o que isso significava, o cara explicou. Eu pude apenas imaginá-lo ficando todo ressentido e aborrecido tendo que explicar. Com sua mão no quadril e a cabeça inclinada para o lado, como se fosse um conhecimento geral que todas as crianças de onze anos eram supostas a ter.

"Hey, David?" eu chamei. Ele deve ter entrado num devaneio também, por que ele não respondeu. Eu notei que ele tinha escorregado um pouco nas minhas costas e seus braços tinham ficado frouxos ao redor do meu pescoço. Esse garoto era tão louco; ele tinha se esquecido de fazer algo bem no meio de fazê-lo. Eu meio que pulei um pouco para colocá-lo no lugar e continuei a andar. "David?"

"Hmm?" ele tinha meu ombro debaixo do seu queixo, sua orelha pressionada na minha bochecha.

"Você me deixaria?" eu senti seu corpo endurecer um pouco perante a minha pergunta, suas pernas se apertando ao redor da minha cintura.

"O que quer dizer?" ainda que ele não conseguisse se concentrar em algo por mais que cinco segundos, ele sempre precisava saber os detalhes por trás de certas perguntas, apenas para ter certeza de que responderia apropriadamente.

"Se você me deixaria, tipo, ir embora e nunca me ver de novo, me deixar sozinho."

"Não! Eu nunca te deixaria." Eu sorri perante isso. "Eu prometo. Alguém teria que me forçar para longe de você."

David não foi forçado a ir embora, ele meio que teve que ir. Com seus pais se divorciando e tal, a mãe dele não conseguiu mais viver naquela casa. Ela comprou uma nova do outro lado de Quebec, bem na borda oeste, enquanto eu estava preso na costa leste, em Montreal. Eu não sabia por que seu pai tinha partido, entretanto. A mãe de David era uma mulher terrivelmente bonita, ela era tão legal e cheirava à cookies o tempo todo; ela era apenas adorável. David, definitivamente, herdou seus genes dela.

O dia que eles vieram me contar foi realmente difícil; eu chorei, David chorou. Eu não sabia o que fazer. Eu fico nervoso e inconfortável ao redor de pessoas que estão chorando. Tudo o que eu consegui pensar em fazer foi abraçá-lo. Ele estava soluçando e ele deixou um sinal úmido na minha camiseta, mas eu não me importei. Eu odiava vê-lo desse modo, machucava tanto.

"Eu te mando meu novo número de telefone, quando eu o tiver." Ele disse por entre as lágrimas. "Minha mãe disse que você pode ir passar o verão com a gente e tal." Eu nunca recebi o número de telefone, eu nunca fui à casa dele. Cinco anos depois, e eu ainda não tinha notícias dele. Pelo que eu sabia, ele poderia estar morando na Rússia.

De todo modo, por essa época, eu tinha dezoito anos, e estava estudando para essa prova de matemática, que estava acontecendo antes da pausa de natal, quero dizer, péssima hora? Então, minha mãe entrou com um prato grande de cookies. Ela ainda estava usando as luvas do forno e tudo o mais. Eu podia apenas imaginá-la em um desses filmes ingleses que se passam em mil e oitocentos e alguma coisa, vestindo um daqueles vestidos que iam do pescoço ao tornozelo, então tudo o que você consegue ver eram as mãos, pés e cabeça. Ela tinha aquela aparência da pajem Victorian ao seu redor, eu sei lá.

"Você pode me fazer um favor, Pierre?" eu vejo agora que os cookies eram para me bajular um pouco, por que eu obviamente não ia gostar do que fosse que ela precisava que eu fizesse. Ela os abaixou lentamente, como se estivesse tentando focar minha atenção neles.

"O que é?" eu perguntei, pegando um dos cookies; tinha o formato de Papai Noel e tinha uma pequena cobertura como barba e tudo o mais, com pequenos botões feitos de gotas de chocolate.

"Você pode ir buscar o carro do seu irmão?" a guarnição do carro de Jay tinha estragado alguns dias antes e o carro teve que ser levado ao mecânico para ser concertado.

"Por que ele mesmo não pode fazer isso?"

"Ele machucou o tornozelo, lembra?" Ah, esse infame tornozelo dele estava sempre sendo machucado; dessa vez, ele tinha conseguido 'cair comicamente' quando ele estava jogando hockey. Ele sempre me fala que ele está fingindo, mas sempre que eu falava isso para a mamãe, ela nunca acreditava em mim, então eu desisti eventualmente e me uni em todo esse fiasco de 'vamos visitar Jay'.

"Ótimo, eu faço isso." Eu disse mal humorado, agarrando meu agasalho e forçando meu caminho porta à fora. Eu consegui chegar à metade da escada antes dela me parar novamente.

"Sabe, eu estava falando com Sarah, no final da rua, e o filho dela acabou de, sabe? 'Sair do armário', é assim que vocês falam?"

Eu ri. "É, é assim."

"Certo, bem, ele é um garoto muito simpático e bonitão também; eu acho que você gostaria dele." Eu vesti meu agasalho com uma risada e fiz meu caminho direto para fora da casa. Sim, minha família sabia sobre minhas, uh... 'Preferências'. Minha mãe aceitou bem, ao invés de me forçar garotas como ela costumava fazer, ela tentava me empurrar para caras aleatórios, que eu nunca vi. Antes, eu achei que ela apenas queria netos ou algo assim, mas agora eu acho que ela queria que eu fosse feliz. Meu pai e irmãos não ficaram muito animados sobre isso, para dizer o mínimo. Eles me baniram por uns bons dois meses, antes de superarem.

Do lado de fora, tinha nevado e as escavadeiras não tinham saído para limpar as ruas. Parecia realmente legal do lado de fora, eu meio que tinha esperanças de que ninguém viesse e arruinasse, mas isso aconteceria, era inevitável. Eu não podia evitar chutar a neve enquanto andava, então eu acho que eu era um pouco hipócrita. Eu estava quase lá e eu notei que o pequeno lago no parque estava congelado, e algumas crianças estavam patinando no gelo e tal; eu costumava fazer isso o tempo todo quando era mais novo. David era péssimo em patinar, ele era como o Bambi no gelo, abençoado seja.

Nossa vizinha, a senhora Tyler, estava sentada no banco na borda, provavelmente observando seus netinhos. Ela era uma senhora simpática, com bochechas vermelhas e toda vestida de tweed. Ela estava sempre nos trazendo comida e perguntando como eu estava indo na escola. Jay e Jonathan diziam que ela gostava mais de mim, eu achei que eles estavam apenas com ciúmes. Ela logo descobriu sobre minha 'saída do armário', como minha mãe diz. Ela aceitou isso bem também, ela era, tipo, "O coração quer o que o coração quer.". Ela estava certa.

O mecânico era nesse prédio pintado de vermelho, mas algumas partes estavam descascando um pouco. Parecia que pertencia à algum filme de cowboy, com cavalos bebendo em algum balde do lado de fora. Como De Volta Para o Futuro III, esse filme é incrível.

Eu vi o carro de Jay logo, todo batido e coberto de arranhões; era algo feio, mas ele tinha algum orgulho. Sempre o polindo ou verificando se os cintos estavam alinhados; meu irmão é um pouco estranho, eu sei. Uma vez que eu estava lá dentro, eu gritei para ver se tinha alguém, mas sem resposta. Eu andei ao redor do carro, vendo se algo tinha mudado. Bem, estava diferente.

O capô estava aberto e a metade de cima do corpo de alguém estava escondida lá. Ele estava vestindo um daqueles macacões azul-marinho, apenas a parte das pernas, entretanto; os braços estavam amarrados ao redor da cintura do cara.

"Olá?" eu disse. Quem quer que fosse, deve ter se assustado, por que ele pulou e bateu a cabeça naquela vara de metal que segura o capô aberto, eu não sei o jargão. Esse cara não parecia que pertencia à esse lugar, entretanto. Seu cabelo era, tipo, o loiro mais brilhante que eu já vi. Sua camiseta era tão malditamente justa que se ele fosse um daqueles caras cheios de músculos, você poderia ver seu peitoral através da camiseta. Ele era bastante esbelto, entretanto, reto, meio que como uma tábua de passar, não de um jeito estranho e nerd, contudo, era legal.

"Posso ajudá-lo?" ele perguntou, esfregando um pouco sua cabeça. Ele tinha essa macha de óleo na bochecha direita. Eu, subitamente, o imaginei agindo como uma daquelas garotas nos filmes, que trabalhar nos carros com suas tranças e suas saias curtas. Elas sempre agiam como se elas não soubessem que o óleo estava lá, mesmo que elas mesmas, provavelmente, o colocaram lá de propósito e, tipo, lambem seu dedão e tiram a mancha de lá, então secam o dedo no peito, então há uma grande macha de óleo lá também. Eu não teria me importado se ele fizesse isso, quero dizer, ele era bem bonito, para dizer o mínimo.

"Eu vim buscar o carro." Eu disse, apontando para o veículo.

Ele assentiu. "Ele ainda não está pronto; temos estado cheios com pessoas precisando de seus carros arrumados, antes dele irem viajar no feriado. Você poderia esperar vinte minutos?"

"Yeah, não vejo por que não."

"Você pode se sentar lá." Ele apontou para essa cadeira bem atrás dele, uma daquelas beges, onde o tecido parece ser feito de palha. Ela tinha sido tão usada, que a espuma sob ela estava à mostra. Eu não me importei muito, entretanto. O cara estava curvado sobre o carro, bem na minha frente, eu não tinha [i]nada[/i] do que reclamar.