N/A: Então, essa NA é só pra agradecer a Puri por ter betado a fic e dizer que, para escrever, eu ignorei alguns aspectos de Deathly Hallows, como o epílogo, por exemplo, mas outros ainda estão por aí. Ah, e eu espero do fundo do meu coração que a Moonlit goste (L) Feliz Natal!

Prímula

Hermione rolou na cama, tateando suas pernas e seu tronco incessantemente. Trouxe os joelhos até perto da cabeça e tateou as canelas e os pés, mas não encontrou o que procurava. Abriu os olhos devagar e levantou a cabeça, querendo encontrar logo a droga daquele lençol para, então, virar para o lado e continuar dormindo. Encontrou-o e puxou-o até o queixo, abraçando-o como se fosse algo extremamente valioso, fechando os olhos logo em seguida, pronta para voltar para seu sonho.

Fazia tempo desde a última vez em que ela se sentira como se não tivesse mais nada com o que se preocupar além de lençóis e sonhos. Desde que a guerra começou a ser desenhada, na verdade. Ser amiga de Harry Potter não era um suplício, mas também não era a coisa mais fácil do mundo; pode-se dizer, no entanto, que Hermione soubera cumprir aquela tarefa perfeitamente, como quase tudo que fazia. Ficara ao lado do amigo em todos os momentos que pudera, até para roubarem Gringotes, e era exatamente isso que os amigos deveriam fazer. Não ajudar o outro a roubar um banco, mas estar ao seu lado, não importa como.

— Janela — balbuciou, mais uma vez rolando na cama, enquanto atirava o lençol pelo qual tanto lutara para o lado e se arrastava preguiçosamente na direção da janela, com a intenção de fechá-la. Mal voltara para a cama, ouviu passos apressados nas escadas, mas como havia muita gente naquela casa, achou melhor admitir que eram apenas passos aleatórios e continuar dormindo. Dormira incrivelmente bem naquela noite e queria continuar a fazê-lo, mas parecia ser a única com tal opinião: logo que decidiu ignorar os passos, eles cessaram e foram seguidos por uma série de batidas em sua porta.

— Hermione — chamou a voz do outro lado da porta, provavelmente a do autor das batidas.

— Ron — respondeu ela, ainda preguiçosa, sem vontade nenhuma de levantar-se para abrir.

— Não é o Ron, é o Charlie — respondeu o dono da voz. — Mamãe está chamando para tomar café.

— Vocês todos tem as vozes iguais — murmurou ela, pretendendo que ele não ouvisse, mas duvidava muito que tivesse conseguido. Tornou a se levantar, desta vez tão ou mais preguiçosamente do que antes, sentou-se na cama, esfregou os olhos, ficou de pé, espreguiçou-se. Não deu muita atenção a Charlie quando ele respondeu um "não temos não" um tanto ofendido e virou-se para a mala com as poucas roupas que trazia. Uma parte delas fora perdida na viagem em busca das horcruxes, e isso significava muita coisa. Puxou uma blusa verde de mangas curtas e uma bermuda jeans da mala e vestiu-se rapidamente, saindo sem pentear os cabelos por dois motivos: 1) estava morrendo de fome; 2) eles ficariam ainda piores do que já estavam.

— Bom dia, Hermione, querida — cumprimentou a sra. Weasley, feliz, enquanto despejava uma montanha de salsichas malpassadas no prato de Bill. Hermione respondeu, não com a mesma animação que Molly lhe dirigira, e andou até a primeira cadeira vazia, ao lado de George. De frente para ele estava Fred, e ao lado deste, Charlie, de frente para Bill. O sr. Weasley ocupava a ponta da mesa. — Espere um minuto, vou encher os pratos desses mortos de fome — e olhou severamente para os filhos que já tinham acordado — e já sirvo você.

— OK — respondeu ela, simplesmente, e debruçou-se sobre o prato. Ainda estava com muito sono, mas agora a fome era tanta que lhe impedia de dormir à mesa. O que era ótimo, aliás. Molly Weasley não era o tipo de pessoa que suportava pessoas dormindo na mesa de jantar em pleno café-da-manhã e enfiando os cabelos no prato.

Não acredito que ninguém tirou aquele vampiro velho de cima do meu quarto, ainda! — A voz que ralhava veio acompanhada de passos fortes na escada e de um arrepio que percorreu a espinha de Hermione da nuca até a extremidade das costas. Sentou-se direito e baixou os olhos para o prato, sentindo o corpo todo gelar. — Eu e Harry não conseguimos dormir um segundo sequer! Estamos cansados! Ficamos o ano todo correndo atrás de Vocês-Sabem-Quem e das horcruxes deles, não conseguimos pregar o olho direito há uns dois anos, e quando eu chego em casa encontro a droga de um vampiro em cima do meu quarto!

— RONALD — a sra. Weasley apontou o garfo com o qual mexia as salsichas na frigideira para Ron de um modo ao mesmo tempo ameaçador e cômico; Hermione riria, se não estivesse ainda congelada. — WEASLEY. — Todos os irmãos de Ron abafaram as risadas, e o patriarca da família abaixou a cabeça, fitando o prato como Hermione, mas para conter a vontade de rir frente à ameaçadora Molly com seu garfo engordurado e a Ron, que parecia ter perdido toda a coragem que acumulara durante aquele ano. — Se você esteve durante um ano fugindo como um criminoso, isso é problema seu. — Molly brandia o garfo com energia, enquanto Ron recuava para a escada novamente, parecendo pronto para fugir a qualquer reação da mãe. — Você podia ter ficado aqui e tirado, você mesmo, o vampiro de cima do seu quarto. Assim teria um ano a mais de sono.

Ela voltou a mexer as salsichas com o garfo e, depois de alguns minutos, Ron conseguiu sair do lugar onde estava. Tão logo a mãe deu as costas, os gêmeos e Charlie riram sem fazer barulho, enquanto Arthur sorria e Bill atacava suas salsichas com vigor. Quando Hermione ouviu passos e arrastar de cadeiras, supôs que Ron já estivesse sentado longe de sua vista e saiu do seu estado de congelamento, levantando a cabeça e dando de cara com o olhar do ruivo cruzando com o seu. Dessa vez não voltou a ficar paralisada porque a sra. Weasley estava chegando com uma frigideira de salsichas para servir a ela, Fred e George, e a morena se concentrou na comida.

— Bom dia — cumprimentou Harry, que vinha descendo as escadas desanimado, seguido de uma Ginny tão radiante que quase o derrubou no caminho, tentando acessar a sala de jantar. Ele largou-se na cadeira ao lado de Hermione e recebeu uma pequena pilha de salsichas como a da amiga em seu prato. Minutos depois a sra. Weasley coroaria todos os pratos com fatias de bacon.

— Bom dia, Harry querido — desejou a matriarca Weasley, assim que se aproximou do garoto para servi-lo. — Ron nos contou que vocês dormiram um pouco mal essa noite, é mesmo?

— Ah, um pouco — disse Harry, e Hermione soube que ele estava tentando ser educado. Ela mesma, que estava a uns dois aposentos do quarto dos garotos, ouvira o som da bagunça do vampiro.

— Então acho que George, Bill e Charlie ficariam felizes em retirar o vampiro de lá antes do almoço — disse Molly, direcionando um olhar bondoso, porém rígido, aos três. — Assim você e o senhor Ronald podem dormir em paz depois do almoço. — Hermione percebeu que ela disse a última frase olhando para Ron de uma forma tão matadora que parecia que faíscas sairiam de seus olhos a qualquer momento. — E você, Fred — ela apontou para ele o mesmo garfo que apontara para Ron, mas não com o mesmo porte ameaçador —, vai desgnomizar o jardim com a sua irmã. Ronald vai dobrar roupas como trouxa, ouviu, Ronald?

Ele bufou e resmungou baixinho, cuidando para que a mãe não ouvisse. Se havia algo que Ron detestava fazer como um trouxa, era dobrar roupas. Ele normalmente não fazia nenhuma distinção entre trouxas e bruxos, a menos que tivesse que fazer alguma tarefa doméstica. Na maioria das vezes, o que os trouxas demoravam horas fazendo era executável com um floreio de varinha, e dobrar roupas era uma dessas tarefas. Não demorou para que todos terminassem de comer, e então a sra. Weasley recolheu os pratos e enfeitiçou-os para que se lavassem sozinhos, enquanto cada um ia cumprir com a tarefa para a qual havia sido designado. Harry e Hermione podiam ficar à toa, se quisessem, mas o garoto achou melhor ir ajudar Fred e Ginny com a desgnomização – o jardim dos Weasley não era desgnomizado desde o casamento de Fleur e Bill, e havia muito trabalho a fazer por lá. Hermione não era boa com gnomos e nem com vampiros, mas podia dobrar roupas.

Não que ela fosse exatamente fazê-lo.

Normalmente, Hermione não deixaria um amigo fazer tudo sozinho, como estava prestes a fazer com Ron, mas ela não conseguia encará-lo há dois dias. No calor do momento e com a certeza de morte que tinham, lhe pareceu uma ótima ideia beijá-lo no meio de uma batalha; agora se arrependia profundamente disso. Não que tivesse sido ruim, pelo contrário. Ron beijava mil vezes melhor que Krum, para falar a verdade. O problema era que eles tinham passado seis anos de sua vida juntos, haviam praticamente crescido juntos, eram quase irmãos. Além do mais, ele a fazia sentir estranha. Seu coração não costumava dar pulos quando ela se encontrava com Krum.

— Obrigado pela ajuda, viu? — Disse Ron, olhando aborrecido para ela, que estava parada no batente da porta da lavanderia. — Você é uma ótima amiga. — E dobrou de qualquer jeito uma camisa preta, jogando-a para o lado antes de parar tudo o que estava fazendo e se virar de costas para encarar Hermione, que pareceu muito chocada com o ato. — Não vai conseguir fugir de mim para sempre, sabe.

— Eu? Não... Não estou fugindo — ele estava encarando-a. Ele estava encarando-a e ela estava ficando sem ar. Tentou desesperadamente respirar, mas parecia tremendamente difícil. Olhou para os lados, não havia ninguém na cozinha para quem correr. — Eu só... — Tentou dar um passo para trás quando percebeu que Ron estava chegando mais perto, mas não conseguiu. Parecia que ela queria ficar perto dele, mas não queria realmente. Quer dizer, ela queria, mas não queria.

— Claro que está fugindo — sua voz estava carregada com um tom triste, que Hermione vira poucas vezes em Ron. Ele se virou bruscamente e voltou a dobrar roupas, jogando-as para o lado de qualquer jeito, como estava fazendo antes, mas agora parecia mais agressivo. Cansada de ficar parada, a garota deu alguns passos na direção da pilha de roupas que o amigo ainda tinha para enfrentar, pegou a primeira peça – uma blusa de Ginny – e começou a dobrar com cuidado.

— Você está fazendo errado — observou, e um pequeno sorriso se formou nos lábios de Ron. Essa sim, era a Hermione que ele conhecia. — Olhe. Tem que dobrar as mangas para dentro antes de tudo, não é só fingir que dobra e está tudo bem. Sua mãe vai te dar uma bronca por isso aí — acrescentou, quando uma calça foi embolada e jogada na pilha onde estavam as roupas "dobradas". Ron, como Hermione mesma já esperava, não pegou a calça de volta para dobrá-la, mas também não continuou a fazer seu trabalho: ele simplesmente parou e começou a olhar para ela. Fingindo não perceber essa mudança no ritmo de trabalho do ruivo, ela continuou a dobrar as peças com todo o cuidado e colocá-las numa pequena pilha, logo ao lado daquelas que Ron havia dobrado.

Assim que pousou um vestido azul turquesa em sua pilha, Hermione sentiu uma mão se fechar em torno de seu punho e segurá-lo com firmeza. Não encarou Ron porque sabia que a mão era dele, e a falta de ar estava voltando. Encará-lo provavelmente não seria uma boa ideia nessas condições. Com um puxão não muito forte, de modo a não machucar Hermione, Ron fez com que ela virasse de costas para a tábua onde estavam dobrando as roupas e soltou seu pulso, apoiando as mãos na mesma tábua, de modo a encurralar a garota. Agora a falta de ar dela estava tão forte que ela sentia como se Ron estivesse roubando todas as moléculas de oxigênio à sua volta, e não seria difícil, dada a (pouca) distância à qual se encontravam; só não afirmava que ele estava de fato roubando seu ar porque ele também estava ofegante. Cansada de assistir o peito de Ron subir e descer, e de sentir aquela falta de ar terrível, Hermione levou uma das mãos ao pescoço do ruivo e puxou-o contra si, sem se importar com o remorso que provavelmente sentiria depois.