Disclaimer: Lost e seus respectivos personagens não me pertencem, esta fanfiction é totalmente sem fins lucrativos.

Censura: M.

Spoilers: nenhum realmente.

Jate, Sana, Sayd/Shannon, Hurley/Libby, Charlie/Claire, Desmond/Penny.

Sinopse: E se tudo tivesse acontecido diferente? Um novo ângulo para a história.

Nota da autora: Sempre quis escrever uma fic de universo alternativo pra ver no que ia dar, daí saiu essa...

By: Renata Holloway.

Coincidência ou Destino?

Capítulo 1- A primeira impressão é a que fica!

O Dr. Jack Shephard chegou em casa debaixo de chuva, depois de mais um dia exaustivo de trabalho. Na verdade, já estava de serviço desde a noite passada, mas tivera que virar o plantão porque os outros dois cirurgiões que trabalhavam no hospital St. Sebastian com ele tinham adoecido, aparentemente da mesma moléstia, gripe.

Estava encharcado porque descera do carro na chuva, não sabia porque o controle remoto da porta da garagem não queria funcionar. Deixou o carro na frente da casa e entrou. Tirou o casaco, a camisa e os sapatos na sala e caminhou até a cozinha. Acendeu a luz e abriu a geladeira, retirando uma garrafa de suco de laranja. Bebeu no gargalo e sorriu. Sua esposa o mataria se o visse fazendo isso, ela era uma mulher tão organizada. No entanto, foi aí que se deu conta. A cozinha estava uma verdadeira bagunça, pratos, talheres e taças sujas na pia. Na mesa velas vermelhas usadas sobre os candelabros.

Andou até o fogão, havia uma panela destampada com vestígios de paella. Ele ficou confuso, e passou as mãos pela cabeça. Com quem Sarah jantara e depois não se dera ao trabalho de arrumar a cozinha? Foi até a sala e acendeu. Também estava uma bagunça, assim como a cozinha. As almofadas espalhadas, cd's esparramados em cima do estéreo. Ele conferiu um deles, Norah Jones.

- Mas o que aconteceu aqui?- murmurou.

Resolveu ir logo até o quarto e questionar o estranho comportamento da mulher. O quarto estava completamente escuro, e ele notou que ela estava dormindo em sono profundo. Achou melhor não acordá-la. Talvez a explicação para tudo aquilo fosse que Sarah estando entediada em casa e percebendo que ele não voltaria tão cedo do hospital, chamara uma amiga para jantar e ficaram ouvindo música, até que ela foi dormir. Sim, era isso. Deixou pra lá, conversariam de manhã, teria o dia inteiro de folga.

Decidiu por fim tomar um banho e dormir estava mesmo muito cansado. Acendeu o abajur somente para procurar o pijama na cômoda quando levou um susto enorme. Sarah, sua esposa, aquela que lhe jurara fidelidade eterna diante do altar e de todos os seus amigos e familiares dormia abraçada com outro homem em sua cama.

- Sarah!-gritou furioso.

Ela acordou assustada, e o homem que estava com ela também.

- Jack!-ela exclamou. – Você chegou...

Ele apertava os olhos e mordia os lábios, indignado. Não conseguiu dizer nada, a raiva tomou conta de si e num impulso ele socou a cara do homem que gemeu de dor em resposta.

- Jack, não, pare com isso!- Sarah pediu.

O homem deu um soco em Jack de volta, e os dois começaram a brigar sem controle. Sarah pulou da cama e vestiu o robe se metendo entre os dois.

- Parem com isso! Por favor!

Jack soltou o homem e deu uma última olhada para ela, saindo de casa furioso.

- Oh Deus!- Sarah levou as mãos aos olhos, chorando.

- E agora?- o homem indagou limpando o sangue do nariz, onde Jack tinha lhe acertado.

- Eu não sei Paulo, eu não sei.

Jack entrou no carro. A chuva tinha parado. Vestiu a mesma camisa e colocou o casaco e os sapatos às pressas, terminando de calçá-los dentro do carro. Enterrou a cabeça no volante e chorou, não acreditava no que estava acontecendo. Deu partida no carro e saiu cantando pneus. Não sabia para onde iria, deixou o carro lhe levar. Rodou Los Angeles por cerca de quarenta minutos, até que parou o carro em um estabelecimento duvidoso. Leu as letras em néon mentalmente: "Bar do Coyote". Desceu do carro, queria beber, esquecer tudo o que acabara de presenciar.

Entrou no bar, e se surpreendeu com o que viu. Por fora, o lugar era medonho, mal-cuidado, mas por dentro era luxuoso. Estava lotado, as pessoas dançavam, bebiam e conversavam muito a vontade. Observou alguns sofás de estofado de pele de oncinha, onde alguns casais trocavam uns "amassos". Nunca fora muito de freqüentar esse tipo de lugar, e depois que tinha se casado então, abandonara suas parcas saídas noturnas para sempre.

Mas naquela noite seria diferente, beberia, curtiria e esqueceria de Sarah, pelo menos por enquanto.

- È isso aí! Eu ainda sou o rei dessa bodega!- gritou um homem loiro, com jeito de caipira, muito empolgado na mesa de sinuca, rodeado de mulheres.

Elas riam e cantavam em coro:

- Sawyer!Sawyer!

Jack balançou a cabeça, rindo do sujeito e se dirigiu até o balcão de bebidas. Uma mulher loira, com jeito simpático e um belo sorriso no rosto, perguntou a ele:

- E então, o que vai querer?

- Uísque, dose dupla.- ele respondeu calmamente.

- Dia ruim?- a mulher indagou.

- Talvez.

Ela serviu a bebida a ele, e acrescentou:

- Se quiser conversar, eu sou Juliet. Fique á vontade.

Jack sorriu e começou a degustar sua bebida.

- Tequila e tônica, por favor!- pediu uma mulher de voz rouca, cabelos negros, estilo latina.

Ele voltou seus olhos para ela, que sorriu ao perceber que ele a observava.

- Hey!- ela disse sorrindo. – Nunca te vi por aqui...

- Na verdade é a primeira vez que eu venho aqui.- ele disse, gostando de puxar conversa. Fazia muito tempo que não paquerava.

- Eu gosto daqui, me ajuda a relaxar depois do trabalho.

- E o que você faz?- ele indagou.

Juliet trouxe a bebida dela, a mulher agradeceu com um gesto e começou a bebê-la.

- Eu sou uma super-heroína, mas nas horas vagas trabalho em um banco. E você?

Jack riu, e respondeu:

- Médico.

Um barulhinho eletrônico cortou a conversa deles.

- Desculpe, é o meu bip!- ela disse. – Preciso ir, tenho que salvar o mundo! .- bebeu o resto do seu drink de uma golada só e deixou dinheiro sobre o balcão. – Foi um prazer conhecê-lo doutor, te vejo por aí?- ela indagou a Jack.

- È, quem sabe eu não estou precisando transferir a minha conta para outro banco.

Ela riu e piscou pra ele antes de se retirar. Caminhou para fora do estabelecimento e retirou um mini walk-talkie do bolso da jaqueta de couro preta.

- Aqui é Cortez, câmbio!.-falou ao aparelho, discretamente.

- Câmbio Cortez, Marshall falando. Prossiga!

- O alvo está aqui, joga sinuca todos os dias.Câmbio!

- Certo, prosseguiremos com o plano. Retorne à base para acertarmos os detalhes. Câmbio e desligo.

Jack já estava no terceiro copo de uísque quando o empolgado vencedor da mesa de sinuca puxou um banco ao seu lado e pediu uma cerveja para a barwoman.

- O de sempre, Julie, querida!

- Pagamento adiantado, Sawyer!- a mulher disse, um pouco ríspida.

- Qual é benzinho, sou o melhor cliente daqui!-ele retorquiu entregando dinheiro a ela, que em seguida serviu-lhe a cerveja.

De repente, o local ficou ainda mais escuro. Luzes coloridas se concentraram apenas no pequeno palco que existia ao centro. Um homem de cabelos grisalhos e gravata borboleta apareceu com um microfone, e disse:

- E agora, o momento que todos esperavam. Com vocês a tigresa, magnífica e poderosa: Molly!

Os homens ficaram enlouquecidos, e pararam tudo o que estavam fazendo, sentando-se nas mesas. Algumas mulheres torceram o nariz, mas mesmo assim pararam para observar quando ela entrou ao som de "Fly Away" do Lenny Kravitz. Usava uma calça jeans justa, com um cinto largo, corpete de couro preto e um chapéu de cowboy também de couro, e botas. Quando ela tirou o chapéu e seus longos cabelos castanho-avermelhados esvoaçaram, Jack Shephard prendeu a respiração.

Não passou nem dois minutos e Jack já tinha concluído que aquela era a mulher mais linda que já vira. Estava extasiado, o coração aos pulos. Ela dançava de modo sensual, mantendo a atenção de todos os homens para ela. Parecia muito segura de si. Ela desceu do palco dançando entre as pessoas. Os homens queriam tocá-la, mas sabiam que não podiam, havia muitos seguranças de prontidão. Jack pediu mais uma dose de uísque quando a viu dançar perto dele, próxima ao bar. Sawyer, o homem que bebia ao seu lado, disse malicioso:

- E aí sardenta?

Ela sorriu para Sawyer, e já ia voltar ao palco quando seu olhar encontrou o de Jack. Demorou-se nos belos olhos castanho-esverdeados dele por alguns segundos. Nunca o tinha visto lá. Jack retribuiu o olhar dela, medindo-a dos pés a cabeça. Ela sentiu um estranho calor pelo corpo todo diante do olhar dele, mas não se deixou abalar e voltou para o palco.

A apresentação dela não durou mais que dez minutos, mas foi o suficiente para causar frisson entre os freqüentadores do bar, que não paravam de aplaudi-la e gritar seu nome mesmo depois dela ter ido embora.

- Está vendo porque eu venho aqui nesse bar todos os dias.- disse Sawyer. – Ela é um furacão.

Jack nem sabia o que dizer, ainda estava tomado pelo êxtase da aparição repentina dela. Naquele momento, Sarah pareceu a ele nunca ter existido. Tomado por um impulso, indagou a Sawyer:

- Como é que eu faço pra falar com ela?

Sawyer riu, debochando dele.

- Como é cara? Você quer falar com ela? Então entra na fila. Desde que chegou aqui há pouco mais de um mês, Molly lota essa casa. Mas ninguém conseguiu se aproximar dela ainda. È muito esquiva!

Jack sorriu:

- È porque ela ainda não me conheceu.- ele já estava ficando um pouco alto.

Pediu mais uma dose para Juliet, que o serviu fazendo objeção:

- Talvez você já tenha bebido um pouco demais.

- Ora, o seu papel não é vender bebida pra quem pode pagar? Então...- Jack disse meio ríspido.

Juliet o serviu a contra-gosto, e sussurrou no ouvido de Sawyer:

- Faz um favor pra mim! Se ele passar da conta, me ajuda a colocá-lo num táxi e mandá-lo de volta pra casa dele. Esse homem não me parece um desses caras acostumados a beber a noite toda em um bar.

Sawyer riu:

- O que foi Julie? O bonitão já fisgou seu coração?

- Sawyer!- ela insistiu.

- Está bem, está bem! Pode contar comigo.- ele beijou a mão dela, que se afastou para atender outro cliente.

- E então cara, o que o traz ao Bar do Coyote? Nunca te vi por aqui.

- A vida. Foi ela quem me trouxe até aqui.

- Talvez Julie tenha razão, acho que você está passando da conta, já está começando até a filosofar

Umas duas horas se passaram, Jack bebeu muitas doses enquanto conversava animadamente com Sawyer sobre todo o tipo de assuntos possíveis, política, esporte, música, filmes. Jack acabou contando a ele sobre sua profissão e que por causa dela levara um "chifre" da mulher.

- Doutor, chifre não existe, é uma coisa que colocaram na sua cabeça.

Jack riu, descontraído e falou:

- Seja lá como for, meu casamento acabou. E eu estou muito bêbado, preciso ir embora.

Juliet ouviu as palavras de Jack e olhou para Sawyer.

- Você está de carro?- Sawyer perguntou.

- Estou.- ele disse apalpando os bolsos enquanto procurava pela chave do carro.

- Bem, não seria melhor você tomar um táxi?- indagou Juliet, preocupada. Havia simpatizado muito com o médico.

- Não, eu vou pegar o meu carro e dormir na primeira praça que eu encontrar, e ficar pensando nela.

- Em quem? Na sua mulher? Não vale a pena.- disse Sawyer.

- Não estou falando na minha mulher. Estou falando da Molly.- Jack disse se encaminhando a passos trôpegos para a saída.

Sawyer riu muito do comentário dele.

Já era mais de três da manhã, a maioria das pessoas já tinha ido embora, ficando apenas os bêbados de plantão. Juliet começou a limpar o balcão e avisou a um dos seguranças que iriam fechar em meia hora.

- E a Molly? Já foi embora?

- Você sabe como ela é, depois do show ela não fica de jeito nenhum.

- Mas eu tinha dito a ela que hoje lhe daria uma carona, estou de moto. È perigoso ela ficar andando sozinha de táxi por aí.

Juliet riu:

- Pois eu acho mais seguro ela ir pra casa de táxi, do que subir numa moto com você.

- Engraçadinha!- ele disse. – Pois eu também já vou indo, e como a Molly não está aqui, ofereço a carona pra você.

- Obrigada, mas eu não gosto de ser o prêmio de consolação.- ela falou. – Além do mais meu marido não ia gostar disso.

- Ah, qual é Julie? Seu marido não honra nem as calças que veste. Você devia deixar o Ben, pegar o Jimmy e se mudar pra um lugar melhor do que essa porcaria de cidade.

- Ai, não me vem com essa conversa de novo, Sawyer.- Juliet reclamou.

- Está bem, não tá mais aqui quem falou. Te vejo amanhã, tchau.

E dizendo isso, ele saiu porta afora. Procurou o médico com os olhos e sorriu ao contatar que ele conseguira dar a partida no carro e ir pra casa.

- Menos mal!- murmurou consigo mesmo.

Caminhou até a sua moto que estava estacionada não muito longe, quando viu uma mulher de cabelos negros usando calça justa e jaqueta de couro preta gritando ao celular.

- Mas como é que é? Como você não pode trazer o guincho? A porra do meu carro tá no prego!

Sawyer ficou observando-a, e notou que ela era muito bonita. Sorriu maliciosamente e se aproximou dela quando ela desligou o celular chamando mais um palavrão.

- Algum problema, muchacha?- indagou vendo-a tão nervosa.

- Nada demais, o meu carro não está pegando e é muito tarde, não consigo um guincho.

- È meio difícil conseguir guincho a essa hora da madrugada. Você mora muito longe?

- Bem, minha mãe me ensinou a não conversar com estranhos- ela disse sorrindo.

- Deixa disso meu bem, quer uma carona na minha moto?

Jack dirigia tirando fino dos carros, a bebida o tornara temporariamente irresponsável. A chuva voltou a cair novamente com bastante intensidade. Os pneus derrapavam no asfalto molhado. No entanto, uma visão o fez parar o carro imediatamente. Era a garota do bar, Molly. Atravessava a rua toda encharcada, segurando a sua bolsa, tinha uma expressão amedrontada no rosto, diferente da que ele vira mais cedo no palco.

De repente Jack não sentiu-se mais tão bêbado. Desceu do carro no meio da chuva e correu até ela.

- Moça, moça! Você está bem?

Ela voltou os olhos verdes tristes para ele, e uma lágrima rolou por seu rosto.

- Eu fui assaltada, não sei o que fazer. Foram dois caras, eles levaram todo o dinheiro que ganhei esta noite. Eles tentaram me agarrar, eu fugi e estava voltando a pé pra casa, daí começou a chover...- ela falava rápido, atropelando as palavras.

A chuva caía sem parar, encharcando-os.

- Ei, ei, calma!- disse Jack, instintivamente apertando-a junto de si. Tinha um fraco por mulheres desprotegidas. Ela não fez nenhuma objeção e se aninhou no peito dele como se fosse a coisa mais natural do mundo. – Vamos sair dessa chuva.- Jack disse finalmente, puxando-a para o seu carro.

Quando eles entraram no carro, Jack retirou um lencinho de papel de uma caixa no porta-luvas e deu para que ela enxugasse o rosto.

- Obrigada.- ela disse. – Eu não te conheço de algum lugar?

Jack sorriu, embaraçado:

- Acho que sim. Eu estava a pouco no Bar do Coyote, onde você dança.- ele parou de falar por alguns instantes e em seguida cantou o nome dela, saboreando cada palavra: - Molly.

- Ah sim, é claro. Eu me lembro de você.- Molly disse, sorrindo para ele.

Jack observou seus dentes, levemente saltados e a covinha do lado direito do rosto, seu coração acelerou, achou-a ainda mais linda do que quando estava no bar, assim assustada, molhada e sorrindo.

- Se lembra de mim?- ele indagou, tentando manter o assunto, fugindo dos próprios pensamentos. – Eram tantas pessoas lá.

Ela deu uma gostosa risada que soou incrivelmente doce aos ouvidos de Jack.

- Não se esquece um cara como você assim.

Pronto, se ele já estava aturdido e extasiado com ela desde o primeiro momento em que a vira, aquela última frase que lhe dissera o levara às alturas e ele se segurou para não avançar em cima dela, se arriscando a perder a compostura.

- Esse casaco está tão molhado que estou sentindo calafrios- ela sorriu, tirando o casaco. – Sabe, eu senti tanto medo quando aqueles homens me abordaram, não sabia o que fazer...

Jack não estava mais escutando o que ela dizia, seu olhar, sua mente não conseguiam mais se desvencilhar da esplendorosa visão dos seios rijos dela aparecendo por sob a camiseta branca molhada. Ela continuava falando, narrando o assalto.

- Então depois disso, eu fugi pensando no quanto eu teria que andar por essas ruas escuras até chegar à minha casa, correndo o risco de fazerem coisa pior comigo.- voltou os olhos verdes pra ele. – Mas ainda bem que ainda existem boas almas como você no mundo.

- Eu posso te levar em casa.- Jack disse, tentando não olhar pra ela.

- Obrigada, mas acho que já tomei muito o seu tempo. Vou seguir meu caminho.- ela disse abrindo a porta do carro dele.

- Não, não!- Jack disse. Ela fechou a porta. – Eu te levo em casa, é só me dar o endereço. Te levo pra onde você quiser.

- Ai, mas isso seria abusar demais da sua boa vontade. Não posso aceitar, você não é meu motorista.

- Que é isso? Não vai ser incômodo algum.

- Está bem.- ela assentiu. – Mas tenho que te confessar uma coisa. Eu não queria ir pra casa ainda, estou devendo o aluguel e assim que o meu senhorio me vir vai cobrar o dinheiro, então eu queria um tempo pra pensar na desculpa que vou dar, porque ele é terrível não vai acreditar em mim e...

Jack a cortou, seus olhos brilhando de desejo por ela:

- Quer ir até um lugar comigo?

- Mas que droga de chuva! Por que essas coisas só acontecem comigo? Um dia ainda vou apresentar um programa de tevê, intitulado "Conspirações da vida contra Shannon Rutherford".- ela falava consigo mesma, muito irritada. Estava a ponto de esmurrar o próprio carro, quando decidiu ligar para o irmão, Boone. – Anda palhaço, atende!

Ele atendeu ao terceiro toque, muito zangado.

- Que que foi dessa vez? O que aconteceu de tão importante pra você me ligar de madrugada, Shannon?

- Meu carro quebrou no meio da rua, não pega de jeito nenhum. E você sabe que esse horário não dá pra conseguir guincho.

- Liga pro seu pai.- ele bradou, já querendo desligar o telefone.

- Eu não. Você sabe o quanto a Sabrina adora quando eu ligo pra lá, ainda mais de madrugada.

- E onde você está?

- Na 29 com a 30.

- Mas é perto da casa do Bruce. Por que não pede ajuda a ele, é seu namorado deveria servir pelo menos pra isso.

- Boone, você não está entendendo né? Eu e o Bruce terminamos, eu estou aqui dentro do meu carro quebrado, ilhada em uma chuva torrencial. Não peço ajuda pro Bruce por nada nesse mundo, por isso será que dá pra você vir me ajudar, maninho?

- Você é uma inútil mesmo!- ele reclamou. – Tá legal, chego aí em trinta minutos.

Mas o tempo passou, e nada de Boone aparecer. Shannon já estava começando a se preocupar quando um carro parou ao lado do seu. Ela baixou um pouco o vidro esperando ver o irmão, no entanto quem apareceu diante dela foi outro homem. Alto, forte, cabelos encaracolados, pele amorenada e barba. Ele sorriu para ela e indagou gentilmente:

- Está precisando de ajuda moça?

Ela deu um falso sorriso para ele, e respondeu:

- Na verdade não. O meu carro quebrou, mas, já liguei pro meu irmão, ele está vindo me apanhar. Pensou consigo mesma: - "Ótimo, era só o que me faltava ser abordada por um terrorista uma hora dessas".

- Certo.- ele disse .- Há quanto tempo faz que ligou? É muito perigoso a senhorita ficar sozinha aqui nessa região, debaixo dessa chuva. Acontecem muitos assaltos por aqui.

- E como eu vou saber que você não é um assaltante?- murmurou.

- Como disse?- ele perguntou, erguendo a sobrancelha.

- Eu não disse nada.- ela respondeu amaldiçoando-se por sua boca grande.

- Bom, eu sou um cara habilidoso para consertar coisas. Posso dar uma olhada no seu carro se permitir.

- Eu vou ligar outra vez pro meu irmão, saber o que aconteceu. Só um minuto.- ela pediu.

Discou o número de Boone, mas dessa vez ele não atendeu. Na verdade, a ligação nem completava, devia ser a chuva. Resolveu aceitar a oferta do estranho, ou então, ficaria ali a noite inteira.

- Está bem, seria muita gentileza se o senhor pudesse dar uma olhada no meu carro.

O homem riu:

- Por Alá, não me chame de senhor, faz eu me sentir um velho. Meu nome é Sayd, e o seu?

- Shannon.- ela estendeu a mão pra ele que a beijou, galanteador.

- Pronto, señorita. Está entregue.-Sawyer disse tirando o capacete, ao deixar a garota para quem dera carona na moto à porta de sua casa.

- Gracias.- ela respondeu sorrindo para ele, devolvendo o capacete que usava.

O passeio de moto tinha sido muito divertido para ambos. Ela sabia que o endereço que dera a ele não era muito longe do Bar do Coyote, mas Sawyer fora pelo caminho mais longo somente para aproveitar bastante a companhia dela.

- E quando é que eu vou te ver de novo, chica?

- Eu não sei.- ela respondeu. – No bar quem sabe...

Sawyer riu:

- Não, uma garota como você não posso deixar passar assim. Vai que de repente encontro com você no bar e já está acompanhada de outro.

Ela ergueu uma sobrancelha.

- Além do mais.- ele continuou. – Nem dissemos nossos nomes. – Sawyer!- estendeu a mão pra ela.

- Ana-Lucia.- ela respondeu estendendo a mão pra ele que a puxou para perto de si e beijou seu rosto, de um jeito nada inocente.

- È um belo nome.- ele disse sussurrando ao ouvido dela.

Ana-Lucia sentiu o corpo inteiro formigar com a respiração quente e a voz sedutora dele em seu ouvido, mas conteve-se e se afastou.

- Eu preciso ir, boa noite.

- Ainda não Lucy.- ele falou prendendo a mão dela na sua. – E quanto ao seu telefone?

- Me dê o seu que eu ligo pra você.- ela disse encarando-o de modo sedutor, do mesmo jeito que ele a encarava.

- Então você é uma mulher moderna, hein baby? Está bem, gosto do seu tipo. Tem uma caneta?

Ela retirou uma caneta do bolso da jaqueta e entregou a ele, que tomou sua mão novamente e escreveu um número de telefone nela. – Mas liga mesmo!- insistiu.

- Eu vou ligar.- Ana-Lucia disse, se afastando dele e virando de costas, caminhando em direção à entrada do prédio. Andava rebolando, propositadamente. Sawyer prendeu uns segundos de sua atenção no traseiro dela, e murmurou consigo:

- Mal posso esperar!

Colocou o capacete na cabeça e arrancou com a moto. Assim que ele já estava longe, Ana-Lucia correu até a pista e chamou um táxi. Aquele não era o seu apartamento, não podia mostrar a ele o verdadeiro. Suspirou fundo e pensou consigo:

- Oh Dios, que homem mais sexy! Preciso me controlar, isso é só um trabalho. Esse homem é um golpista e eu preciso prendê-lo. Então por que eu disse o meu nome verdadeiro pra ele? Merda!- gritou.

O motorista do táxi voltou seus olhos para ela.

- Ah me desculpe, não é nada com o senhor. Voltou a pensar: "Que mancada! Marshall vai me matar! A missão nem começou e eu já estou comprometendo-a desse jeito. E agora?

"Pronto, enlouqueci"!- pensou Jack consigo mesmo enquanto levava Molly, a dançarina do Bar do Coyote que acabara de conhecer, para o primeiro lugar que lhe veio à cabeça, seu antigo apartamento de solteiro.

Olhou para ela ao seu lado, no banco do carona. Parecia tão frágil e aturdida quanto um coelhinho. Jack não se cansava de admirar sua beleza. Estatura mediana, corpo esguio, cintura fina, seios pequenos e o rosto tomado por sardas, milhões de pontinhos como estrelas refletidas do céu para tocar seu belo rosto. Os cabelos eram castanho-avermelhados e formavam uma linda cascata cacheada que descia sob os ombros.

- Chegamos!- ele disse quando estacionou o carro à entrada do prédio.

Ela assentiu, embaraçada:

- Obrigada. Nossa, eu estou me sentindo tão abusada em estar dando trabalho pra você.

- Que é isso! Já disse que quero ajudá-la.

Resolveu não entrar com o carro na garagem, porque se ela resolvesse ir embora dali naquele mesmo momento por achá-lo atrevido em levá-la para lá, ele daria meia-volta com o carro e a deixaria em casa.

Jack abriu a porta do carro, ela fez menção de abrir a dela e descer, mas ele a impediu com um gesto. Deu a volta no carro e abriu a porta para ela. Molly sorriu com o gesto galanteador dele e pôs o casaco no ombro, enquanto segurava sua bolsa e descia do carro. Num gesto inconsciente, Jack tomou sua mão e entrou com ela no prédio, cumprimentando o porteiro:

- Bom dia Wilson.- disse olhando para o relógio, quatro horas da manhã.

- Bom dia Dr. Shephard- falou o porteiro surpreso ao vê-lo ali aquela hora da madrugada e acompanhado de uma bela mulher que não era sua esposa.

Jack sentiu-se um tanto desconfortável com o olhar do porteiro, mas ignorou-o e tomou o elevador.

- È aqui que você mora?- ela indagou dentro do elevador, enquanto ele apertava o botão para o quarto andar.

- Sim.- ele mentiu. Não contaria a ela que era casado, até porque não sabia que rumo tomaria seu casamento depois da cena que presenciara em sua casa. A aliança estava guardada no porta-luvas do carro desde da hora em que resolvera entrar no Bar do Coyote.

Estava fascinado por aquela mulher. Trazê-la ao seu antigo apartamento seria uma vingança contra Sarah, ou acabara mesmo de se apaixonar perdidamente por uma dançarina de bar? Ignorou os próprios pensamentos, não queria saber de nada, só de aproveitar o momento.

Finalmente chegaram à porta do apartamento, cujo número 23 em tamanho garrafal emitia um brilho dourado na porta de madeira de cedro. Já fazia um bom tempo que ele não ia até lá, mas sabia que o apartamento estava bem conservado. Sarah pagava alguém para limpá-lo umas três vezes por mês. Apesar disso, ela insistia com ele que deveriam vender o imóvel, porém Jack gostava muito dele, e sempre pensava que um dia poderia precisá-lo, como agora.

- Fique à vontade!- disse Jack a Molly enquanto acendia a luz de um abajur ao lado do sofá, deixando o ambiente na penumbra.

- Obrigada.- ela disse, sentando-se no sofá e erguendo a calça jeans para retirar as botas encharcadas.

Jack acompanhou o movimento lento das mãos dela fazendo isso, e por alguns segundos a imagem dela dançando em cima do palco lhe veio à cabeça, enviando ondas de calor por todo o seu corpo. Antes que pudesse passar por uma situação constrangedora, recuperou o auto-controle e indagou:

- Quer beber alguma coisa?

- Yeah.- ela sorriu, aceitando.

- Se quiser usar o banheiro, segundo porta á direita no corredor.

Molly se levantou do sofá e se dirigiu para lá. Jack se lembrou de que estavam ambos encharcados, e antes de ir procurar uma bebida no barzinho, resolveu ver se encontrava algo no quarto para ela vestir. Abriu o guarda-roupa e para sua felicidade encontrou algumas roupas lá. Trocou de camisa, e escolheu uma blusa de Sarah para ela vestir, parecia irônico, mas ele não se importou em levar a blusa para ela. Caminhou até o banheiro segurando a blusa quando notou que a porta estava entreaberta. Como um imã seus olhos foram atraídos para a brecha e ele a vislumbrou lavando o rosto, havia retirado a blusa branca molhada. Molly sabia que ele a observava, sentiu o corpo inteiro arrepiar-se com a situação.

Fingindo não estar ali há muito tempo, Jack bateu na porta, e disse:

- Eu trouxe uma blusa pra você vestir, se ficar usando essa que está encharcada vai ficar doente.

Ela sorriu, e indagou de dentro do banheiro:

- E o que você é, médico por acaso?

- Na verdade eu sou.- ele respondeu sorrindo.

Molly foi até a porta e passou seu braço pela fresta pegando a blusa das mãos dele. Vestiu-a e depois o encontrou na sala com uma taça de vinho para ela e outra de água para ele, já havia bebido demais aquela noite. Uma antiga canção dos Eagles, "Hotel Califórnia", tocava no som da sala. Ela pegou a taça das mãos dele e sentou ao seu lado no sofá.

- Eu gosto muito dessa música.

- Eu também.- ele respondeu. – È...você dança há muito tempo no Bar do Coyote?

- Não.- ela disse.

Ficaram em silêncio por alguns momentos. Jack bebia a água devagar, o desejo que sentia por ela naquele momento era tão forte que não sabia mais por quanto tempo iria resistir. Ele continuou puxando assunto, queria descobrir tudo o que pudesse sobre ela.

- E você só trabalha lá?

- Eu não sou uma prostituta se é isso que está pensando.- ela falou com seriedade.

- Não estou pensando nada disso.- ele respondeu sincero.

- Eu danço no Bar do Coyote para pagar o meu aluguel. Preciso terminar os meus estudos, sou completamente sozinha, não tenho ninguém por mim.

Jack percebeu algumas lágrimas se formando no rosto dela, e acariciou seu rosto com ternura. Ela perguntou divertida, olhando para a blusa que vestia, queria cortar aquele clima:

- E de quem é essa blusa, afinal?

- Da minha irmã.- Jack mentiu outra vez. – Ela dorme aqui no meu apartamento às vezes.-apontou para o retrato da irmã na mesinha de centro, de modo que a sua história fosse mais convincente.

Molly pegou o retrato de cima da mesinha e o admirou:

- Ela é muito bonita, lindos olhos. Quantos anos tem?

- Acaba de completar dezoito anos. È mesmo muito linda, se chama Claire e é uma das melhores alunas da sala.

Molly sorriu e bebeu mais um gole de vinho.

- Estamos em desvantagem.- ela disse. – Você sabe o meu nome, mas eu não sei o seu.

- Jack Shephard.- ele disse.

- Jack!- ela murmurou sensualmente, provando cada letra do nome dele.

Seus olhos se encontraram, e Jack não resistiu mais. Tomou o rosto delicado dela em suas mãos, acariciando sua nuca e puxou-a para perto de si. Os lábios se tocaram, como eram doces, Jack pensou. Beijaram primeiro bem devagar, até que ela partiu os lábios e permitiu que ele afundasse vorazmente a língua em sua boca. Há quanto tempo ele não se sentia assim, vivo. Os beijos se intensificavam cada vez mais. Jack se sentia no céu, desfrutando do amor com um anjo.

Suas mãos passearam pela cintura fina dela e ele ergueu sua blusa, tirando-a. Deitou-a no sofá e colocou-se em cima dela, mordiscando seu pescoço e acariciando os seios por cima do sutiã. Beijou-os, passando a língua entre eles quando a ouviu murmurar:

- Não.

Instintivamente ignorou a negativa dela e desceu a alça do sutiã até libertar um dos seios, tomando-o em sua boca. Molly gemeu, mas murmurou outra vez:

- Não!

Jack desceu a outra alça do sutiã terminando de desnudar-lhe os seios e ficou acariciando-os com as mãos e a boca. Ela gemia baixinho, mas quando sentiu a mão dele desabotoar-lhe o fecho da calça, se debateu e disse, enérgica:

- Não!

Jack não queria soltá-la, seu corpo desejava tomar o corpo dela até o fim, mas diante das negativas dela teve que parar. Saiu de cima dela, que imediatamente recolocou o sutiã no lugar. Notou que os olhos dela mostravam o mesmo desejo que sentia, mas expressavam dúvida também, e medo. Ele exasperou-se, passando as mãos pela cabeça.

- Molly, me desculpe, eu não quis me aproveitar de você. Jamais te faria mal.

Uma lágrima escorreu dos olhos dela.

- Eu não sou uma prostituta.- ela disse se levantando do sofá e indo até o banheiro para vestir sua blusa molhada.

Voltou correndo para a sala e calçou as botas rapidamente.

- Molly, por favor não vá embora. Eu sei que você não é uma prostituta, me perdoe. Eu fiquei louco por você desde o primeiro momento em que te vi...

- Isso não te dava o direito.

Ela passou correndo pela porta. Jack foi atrás dela.

- Molly, volte aqui. Eu vou te levar em casa.

- Não, eu vou sozinha.- ela disse nervosa apertando o botão do elevador. Voltou seu olhos para Jack que estava em pé atrás dela.

- Você não é diferente daqueles homens nojentos que vão me ver todo o dia no bar! Adeus.

O elevador se abriu e ela sumiu no meio da madrugada, tão rápido quanto apareceu deixando Jack arrasado. Ele voltou para o seu apartamento, batendo a porta atrás de si, esbravejando sua raiva.

- Droga! Que inferno de vida!

Foi até o bar e se serviu de uma dose de uísque, se afundando no sofá, sentindo-se um traste. O que dera nele para agarrar a moça daquele jeito? Que noite terrível tinha tido, esperava que tudo acabasse logo. No entanto, pelo jeito, aquilo estava longe de terminar. Não percebeu, mas Molly esquecera sua bolsa sobre a mesinha de centro ao lado do retrato de Claire.

- Agora tenta mais uma vez, vamos!.- pediu Sayd a Shannon. Depois que ele consertara o vazamento no motor, era a segunda tentativa de fazer o carro pegar.

Ela girou a chave na ignição novamente, não acreditando muito que fosse funcionar até que o carro pegou. Shannon sorriu. Sayd foi até a janela do carro, suas mãos estavam sujas de graxa.

- Obrigada.- ela disse. – Se não fosse por você eu passaria a noite inteira nessa chuva.

Sayd devolveu o sorriso a ela. Shannon estendeu a ele alguns lenços de papel para que ele limpasse suas mãos. A chuva tinha dado uma trégua e ela pôde apreciar melhor a forma física do desconhecido.

Era um homem bem afeiçoado, de trinta e poucos anos, belo corpo, postura de soldado, mas com jeito de herói romântico, e ela se sentiu inevitavelmente atraída por ele apesar de ser muito mais jovem e preconceituosa a respeito de estrangeiros. Shannon era a típica garota norte-americana, loira, alta e esguia. Morava no melhor bairro de Los Angeles, junto com o pai, a madrasta e o meio-irmão Boone. Do alto dos seus dezoito anos, a única coisa mais importante que vencer todo o ano o campeonato de líderes de torcida, era ser a mais popular da escola.

- Então...- ela disse.

- Então...- Sayd repetiu.

Nesse momento, Boone finalmente chegou, descendo do carro muito mal-humorado.

- Cinco horas depois...- debochou Shannon ao vê-lo.

- Eu estou aqui não, estou?- esbravejou ele, as bochechas naturalmente coradas assumindo uma coloração ainda mais escura devido à irritação dele.

Boone era apenas um ano mais velho do que ela, estudavam na mesma classe. Brigavam feito cão e gato, mas a verdade é que o irmão era apaixonado por ela platonicamente desde que seus pais se casaram quando ela tinha oito e ele nove anos. Reclamava de todas as bobagens que ela fazia, mas estava sempre pronto a consertá-las também. Era um rapaz muito bonito, de feições coradas e grandes olhos azuis. Tinha um senso de responsabilidade muito grande em relação às coisas, se importava com tudo e com todas, prestava até serviço voluntário de vez em quando, tudo pelo bem da humanidade. Notando que ela aparentemente já tinha resolvido o problema com seu carro, queixou-se:

- Você não tem idéia do que eu passei para chegar até aqui. Estava tendo um "racha" na avenida principal, a polícia caiu em cima matando e eu fiquei preso no trânsito debaixo de toda aquela chuva, daí encontro você toda sorridente e de conversinha. Ora, faça-me o favor!

Shannon interrompeu o monólogo dele com o olhar e voltando-se novamente para Sayd, disse:

- Obrigada por consertar meu carro.

Boone notou o olhar de Sayd para Shannon e disse, enciumado para ele:

- Você resolveu o problema do carro, muito obrigado. Poupou-me de mais dor de cabeça.

E em seguida puxou a carteira do bolso da calça, tirando de lá uma nota de cinqüenta dólares e entregando-a a Sayd. O árabe fez uma expressão divertida, e falou:

- Não quero seu dinheiro. Não costumo cobrar para ajudar uma dama em apuros.

E, ignorando Boone que ficou lá parado com a mão estendida segurando o dinheiro, disse a Shannon:

- Foi um prazer conhecê-la. Até mais, Miss América.

Shannon sorriu para ele, e antes que Sayd entrasse em seu carro, ela disse só para deixar as bochechas de Boone ainda mais avermelhadas:

- Mas eu queria mesmo te agradecer, por que não janta comigo amanhã?

- O quê? Você vai jantar com ele, Shannon. Mas nem o conhece!- reclamou Boone.

- Cala a boca, Boone!- ela disse pegando um bloquinho de anotações cor-de-rosa de dentro do porta-luvas, junto com uma caneta de pom-pom perfumada e da mesma cor do bloquinho. Escreveu o número do seu celular no papel, diante do olhar repreensivo de Boone e entregou o papel a Sayd, que indagou:

- Aonde gostaria de ir?

- Onde você quiser me levar.

Sayd sorriu e beijou a mão dela, guardando em seguida o papel com o telefone dela em seu bolso. Entrou em seu carro e partiu. Boone gritou com a irmã:

- Você não toma jeito mesmo, sempre iludindo esses coitados. Eles resolvem seus problemas de graça, daí você dá esse sorrisinho, promete coisas e fica tudo bem mesmo que você não cumpra. Por que disse ao cara que jantaria com ele se eu sei que você não vai?

- Vou sim. E quer saber, que te importa se eu vou jantar, almoçar ou tomar café com ele? Isso é problema meu!

- Tá bom, você é quem sabe! Mas na próxima vez que me ligar no meio da noite, debaixo de uma chuva torrencial e me pedir pra vir te socorrer eu não virei e muito menos vou te dar cobertura quando sair para as suas noitadas.

- "Lá, lá, lá, lá..."- Shannon cantarolou tampando os ouvidos. Deu a partida outra vez no carro e pisou fundo no acelerador, deixando Boone sozinho.

Irritadíssimo, ele não teve outro remédio senão voltar para o seu carro e seguir a irmã até sua casa.

Ana-Lucia chegou em casa na ponta dos pés, tentando fazer o mínimo de barulho possível, tirando os sapatos e deixando as chaves sobre o criado-mudo da sala, tateando com dificuldade em meio ao escuro quando de repente o abajur grande ao lado da poltrona se acendeu como que por mágica. Ela assustou-se levando as mãos ao peito e reclamou:

- Mãe, não faça isso! Me faz sentir uma adolescente outra vez.

Sua mãe sorriu, e perguntou:

- Como foram as coisas na investigação? Já estão executando a fase 2?

- Sim.- ela respondeu, sem olhar nos olhos da mãe, tirando a jaqueta de couro e sentando-se no sofá.

- Que bom que tudo está indo bem.

- Aham!- ela disse ainda de cabeça baixa.

Sua mãe estranhou as respostas evasivas dela.

- Ana-Lucia, olhe pra mim! O que você fez?

- Eu não fiz nada, raios! Por que está me perguntando isso?

- Porque eu te conheço, está conversando comigo de cabeça baixa, e quando você age assim é porque aprontou alguma coisa ou ainda vai aprontar. Eu sei, você agiu assim quando me contou que estava grávida.

Ana-Lucia fechou a cara e caminhou até a cozinha, disposta a ignorar os comentários da mãe. Abriu a geladeira e se serviu de um pouco de leite gelado.

- Hija!.- a mãe disse, carinhosa, tocando o cabelo escuro dela. – Não falo pro seu mal, me preocupo com você. Essa missão é muito arriscada, não estou gostando dessa história de você ser a "isca" para pegar esse golpista. Pelo que eu li na ficha dele, é um homem muito esperto que já fez isso muitas vezes.

- O que está querendo dizer mãe? Que ele vai tentar dar um golpe em mim? Eu não tenho marido e muito menos sou milionária.

- Não é isso, mas é que você tem uma enorme dificuldade em fazer julgamentos. Sabe que desde o princípio fui contra essa missão, deveriam ter usado alguém mais imparcial.

- Acha que não sou capaz, madre?

- Você é uma excelente policial, eu sei. Mas se deixa envolver demais, eu vi a foto desse homem, e ele é muito atraente...

- Madre!.- ela esbravejou. – O que você está pensando? Estou no FBI agora e se me designaram para essa missão é porque acreditam no meu trabalho.

A mãe balançou a cabeça:

- Ana, se tudo fosse tão simples assim. Mas eu sei que você tem um fraco para...

- O quê mãe? Diga! Diga agora!- Ana-Lucia exaltou-se.

- Para foras-da-lei sedutores. Você sabe muito bem que a Inês é fruto disso.

Ela revirou os olhos, estava cansada daquela conversa.

- Não, eu não tenho que ficar escutando isso de madrugada. Não mesmo.

- Mamã!- disse uma voz de criança aos pés delas, que pôs fim à discussão.

- Chiquita, o que você tá fazendo acordada?- indagou Ana-Lucia a filha, tomando-a nos braços.

- Por que está brigando com a abuela?

- Não estamos brigando cariño, mamã só está conversando com a abuela.

A menina esfregou os olhinhos, sonolenta e deitou a cabeça no ombro da mãe. Inês era o orgulho dela, dali dois dias completaria quatro anos. Tinha personalidade forte e o gênio de sua mãe. Cada vez que a tomava nos braços, Ana-Lucia repetia interiormente que aquela menina pequena e roliça era só sua, porque do pai mesmo Inês só puxara os olhos verdes e felinos. E ela não gostava de lembrar do pai de sua filha, um perigoso traficante por quem ela se apaixonara e quase comprometera sua carreira como policial. Mas isso não importava mais agora, ele estava preso e ela tinha que continuar sua vida e seu trabalho com seriedade. Não cometeria os mesmos erros.

Sua mãe olhou para ela com semblante compreensivo e beijou-lhe a testa, sussurrando:

- Eu só quero que você tenha cuidado, sei que é perfeitamente capaz, hija.

Beijou a cabecinha da neta e se retirou para o seu quarto. Ana-Lucia caminhou para o quarto com Inês e a depositou cuidadosamente em sua cama, cobrindo-a com o lençol. Trocou de roupa e deitou-se ao lado da filha, abraçando-a. Logo o sono veio e levou todas as suas preocupações junto.

Continua...