DISCLAIMER: Saint Seiya é uma obra de Massami Kurumada, TOEI e empresas licenciadas. The Dark Duke é uma obra de Margaret Moore, que faz parte da série Romances Históricos, publicada no Brasil pela Harlequin.


Pois é... eu aqui de novo... Cheia das fics pra publicar e lançando mais uma... Eu sei, não tomo jeito... xD

Mas enfim...

O Duque Sombrio é um livro que eu achei despretensiosamente fuxicando pela página da Saraiva. Ele tava baratinho, li a sinopse, me agradou e panz e eu resolvi mandar buscar. Na época eu lia A Noite Maldita, do Andre Vianco e esperava a Harlequin me avisar sobre a chegada de A Noite Mais Sombria (que virou fic do Darkest Ikarus)... Enfim. Sem divagações. Pra minha surpresa o livro foi além das minhas expectativas e enquanto eu lia, minha cabeça se enchia de ideias para uma fic inspirada nele. A escolha das personagens não foi difícil, mas a decisão de escrever com elas sim. Eu não queria cair no costume de sempre, mas... Sim, teremos Saga e Kanon de novo.

Enfim... Espero que gostem.

Boa leitura.


Capítulo I

Londres, 1863.

- Contem vinte passos de distância um do outro. Ao fim, virem-se e atirem. O primeiro que cair será o perdedor.

Estava cansado de ter de resolver as coisas daquele jeito, mas sabia que aquela se tornara sua sina. Escândalos e mais escândalos. Este seria apenas mais um em sua lista. Por sorte não tinha muito com o que se preocupar sobre as habilidades de seu oponente.

- Dezoito, dezenove, vinte.

Dois tiros. Um deles foi ao chão com um tiro no ombro e o outro permaneceu em pé, com um tiro de raspão na perna.

*o*O*o*O*o*

Hampshire, 1863.

Havia quatro meses que Lady Annabelle Pimblett estava servindo de acompanhante para sua excelência, a Duquesa de Barroughby. Uma mulher rabugenta, imponente e reclamona.

- Estou com dor de cabeça Annabelle. Feche estas cortinas por tudo que é mais sagrado! – disse, os olhos castanhos queimando de fúria – E me traga algo para isso.

A jovem bem sabia que aquela dor de cabeça era sintoma de um mal estar imaginário e isso a fazia ponderar sobre sua decisão de trocar a casa de seus pais. Bem sabia que seus esforços para cuidar da duquesa e seus siricoticos eram bem inúteis.

Mais cedo ela havia recebido uma carta e amassara o pedaço de papel com seus dedos longos, como se ele fosse uma pessoa, tão logo havia terminado de ler. Annabelle se perguntava qual o conteúdo da missiva para ser capaz de deixá-la com tanta raiva assim.

Parecia ter sido escrita por um homem, mas dada a reação da mulher, com certeza não era de seu amado "filho". Sendo assim, a epístola só poderia pertencer a uma pessoa: o notório Duque de Barroughby, seu enteado.

- Este tratante! Depravado! Como ousa me procurar? Justo a mim que sou o oposto da sua falta de vergonha! Se seu pai soubesse a metade das coisas que ele tem feito morreria outra vez de desgosto!

Annabelle concluiu então que Lorde Saga Fitzwalter, também conhecido como o Duque Negro de Barroughby, o filho mais velho do duque, já falecido, estava voltando para casa.

Desde que Annabelle havia chegado a Barroughby Hall ele não visitara a mansão, deixando-a assim com um gostinho de curiosidade em conhecer o tal indivíduo de lendários "poderes" de sedução e de tão péssima reputação por onde quer que passe.

- Thomas! Thomas! Annabelle, peça a Thomas um pouco de vinho!

Thomas, o mordomo apareceu na porta da sala de estar.

- Vossa Excelência?

- Por favor Thomas, traga uma taça de vinho para a duquesa.

O mordomo deixou a sala e Annabelle voltou seu olhar para a velha mulher.

- Pelo menos Kanon não está aqui! Ainda que eu o esteja esperando para uma visita por tanto tempo. Eu deveria proibir a entrada de Saga nesta casa! Este depravado! Vou expulsá-lo daqui. Este impertinente! Biltre!

Annabelle preferiu ignorar todos aqueles xingamentos indignados dirigidos ao duque. Deixou que a duquesa continuasse esbravejando pelo tempo que quisesse. Sabia que nada que fizesse ou dissesse iria impedi-la de continuar a expressar sua forte opinião.

- E quando ele aqui chegar eu não o cumprimentarei! Não lhe darei nenhum tipo de atenção! E aqui ele não fica! Não posso permitir que um pervertido venha macular a imagem de Barroughby Hall! Ele que procure alguma estalagem pela cidade. Annabelle, chame o Dr. Benjamin. Não me sinto bem. Estou tonta! Onde está meu perfume?

- Agora mesmo excelência. – disse ela, mas ao invés de ir chamar o médico, passou ela mesma o perfume na testa da duquesa. – Quando o Duque vai chegar? – perguntou ao pousar o frasco na mesinha do canto. Sabia não ser necessário chamar o Dr. Benjamin. E ele já passava tempo demais na mansão atendendo a chamados sem tanta importância.

- Hoje. E nem esperou minha resposta. Mas que audácia! – ela cobriu os olhos com as mãos.

- Não esperei porque sei que a duquesa seria extremamente benevolente e ficaria muito contente com a minha chegada. – uma voz masculina se fez ouvir vinda da porta.

Annabelle virou-se na mesma hora e olhou para o homem apoiado no batente da porta. Braços cruzados sobre o peito largo. Era bem alto, parecia ser forte. Usava um casaco escuro, camisa de linho branca, calças também escuras e botas de montaria de cano alto. Sua pele era bronzeada pelas longas horas de cavalgadas por ai. Tinha os olhos de um azul bem forte e cabelos longos e negros, tão negros quanto a noite. Annabelle teve certeza de estar diante do próprio Duque Negro.

No entanto, havia algo de errado com ele. Sua aparência. Havia palidez em seu rosto.

Annabelle fez uma ligeira reverência e afastou-se da duquesa. O duque a fitou brevemente, e depois retornou sua atenção à duquesa. Para a surpresa de Annabelle, no rosto da velha mulher havia um misto de expressões. Surpresa, raiva e... medo? Sim, medo. E ela achava que em toda Inglaterra não poderia haver alguém capaz de intimidar a duquesa daquela forma. Mas percebeu que havia se enganado. Ali estava o indivíduo capaz do feito, em carne e osso.

Sua Excelência, aparentemente privada da capacidade de falar, observou o duque entrar e sentar sem ser convidado. Annabelle se dirigiu a porta, supondo que sua companhia não seria apreciada naquele momento.

- Annabelle, aonde você vai? Não dei permissão para que se retirasse. – disse de súbito a duquesa.

- Acredito madrasta, que sua encantadora acompanhante não ache uma delicadeza permanecer. Não é isso, milady? – ele lhe olhou com uma expressão ligeiramente indagadora que Annabelle achou bastante desconcertante. Não estava acostumada a nenhum olhar perscrutador. Ainda mais de alguém com a reputação do Duque. Antes que ela pudesse responder algo, a duquesa interveio.

- Esta é Lady Annabelle Pimblett. Seu pai é Lorde Pimblett.

- Encantado, Lady Annabelle. – disse o duque levantando-se e exibindo um sorriso sardônico. Logo ficou claro como ele havia conquistado a reputação de sedutor. Diante de seu olhar intenso ela corou. Mesmo sendo de uma família antiga e quase tão cheia de prestígios quanto a do duque, Annabelle se considerava em condições de igualdade perante sua Excelência, mas não foi capaz de evitar aquela reação.

- Quero que ela fique. Não me sinto bem. – disse a duquesa e Annabelle percebeu que ela havia voltado a forma normal após a inesperada chegada do duque.

Saga inclinou a cabeça em sinal de aceitação – ou seria relutância em discutir? – e Annabelle se conformou com o constrangimento da situação.

- Eu exijo saber o que você veio fazer aqui.

- Será que não me é permitido uma simples visita a mina madrasta?

A resposta da duquesa foi um fungado de desprezo.

- Desta vez a mulher era casada? Por isso você veio se esconder no campo? Por isso veio nos incomodar aqui?

- Não, ela não era casada. Mas na foi por isso que eu vi.

- E por que então?

Annabelle percebeu um brilho de irritação nos olhos do duque, porém ele permaneceu imóvel.

- Tenho todo o direito de vir para casa. – disse ele sem se alterar.

- Não me surpreende que tenha tido de deixar Londres. Outro duelo, suponho.

- Você tem o direito de supor o que quiser, Vossa Excelência. Não vou incomodá-la durante muito tempo. Onde está Kanon?

- Graças a Deus ainda na França.

- Ah. E quando o espera de volta?

- Qualquer dia destes, Saga. E devo dizer que me alegra muito que ele ainda esteja fora. Kanon não precisa ser maculado por outro de seus escândalos. Será que nunca pensa em nós? Não é capaz de pensar no seu irmão? É claro que não. A resposta é bem óbvia não é? Você só pensa em si mesmo!

Annabelle sentiu-se constrangida pelo momento, desejando não estar ali.

Saga ergueu-se lentamente.

- Se me der licença, vou me recolher aos meus aposentos.

- Eu ainda não acabei! Quero saber o que fez desta vez!

O Duque Negro olhou para a duquesa. Annabelle notou considerável desprezo naqueles olhos azuis que lhe prendiam a atenção.

- Ainda que eu esteja convencido do seu sincero interesse em saber os detalhes do escândalo, eu acabei por aqui, Excelência. Não houve somente um ferido e a não ser que queira uma poça de sangue sujando o tapete, não me manterá aqui. – as duas mulheres deixaram escapar exclamações de surpresa diante da afirmação, mas o duque não se alterou. – Lady Annabelle, lhe desejo um bom dia. Vossa Excelência, meus cumprimentos.

- Q-quer que eu chame um criado? – Annabelle perguntou levantando-se e avançando até o meio da sala, chamando a atenção daqueles olhos tão azuis.

- Annabelle! – gritou a duquesa – Eu preciso de você!

Com ligeiro interesse, Saga viu a mais recente "escrava" da madrasta hesitar. Surpreendentemente Lady Annabelle não voltou imediatamente para o lado da duquesa.

- Se me der licença, Excelência, não me demoro. – ela disse com uma expressão determinada, saindo do aposento sem esperar resposta.

Saga sorriria de satisfação ao ver a madrasta sendo desobedecida, mas não queria complicar as coisas para Annabelle, já que qualquer reação de sua parte aumentaria a raiva da duquesa.

Saga perguntava-se por que motivos uma jovem de berço desperdiçava seu tempo cuidando da duquesa. Ela era bonita, com seus cabelos castanhos escuros, presos de uma maneira que cachos ainda caiam por seus ombros, olhos castanho-esverdeados, nariz afilado, lábios delicados. O tom e a textura da pele, acetinada, não deixavam dúvidas de que ela fora criada no campo. Ela devia ter outras opções além daquela.

Conhecia seu sobrenome. Havia Sophie Pimblett, cuja beleza era invejada por várias moças em Londres, no entanto uma criatura vaidosa, esnobe e um pouco arrogante, havia também Georgia Pimblett, mas desta ele nada sabia além dela também ser bonita. No entanto não se lembrava de nenhuma Annabelle. E agora não entendia o motivo. Sabia apenas que sua beleza também chamaria atenção em Londres.

Annabelle Pimblett pelo jeito era uma jovem bem incomum, a julgar pela forma como respondera à duquesa. Saga não pensava haver em toda a Inglaterra alguém capaz de não se deixar intimidar pela madrasta. No entanto, havia encontrado-a em sua casa. A jovem acompanhante da duquesa.

Lady Annabelle apareceu no vão da porta, seguida de Thomas e mais dois criados. A essa altura, o ferimento de Saga doía muito e ele era capaz de sentir o sangue escorrendo através da atadura.

- Além do Dr. Benjamin, tomei a liberdade de mandar chamar um cirurgião para cuidar do duque. – disse Lady Annabelle, de forma agradável.

Ela dirigiu-se à duquesa, antes de fitá-lo intensamente. Ele retornou o olhar com igual intensidade, e sorriu com todo seu charme.

- Obrigado, Lady Annabelle.

Ela assentiu gentilmente e retornou ao seu assento. Saga procurou se convencer de que sua reação era pura delicadeza e nada mais. Provavelmente a fraqueza e a palidez resultantes da perda de sangue não o deixassem em sua melhor forma. Sim. Esse era o motivo pelo qual uma mulher como ela não respondia ao seu charme. Decidiu ignorar aquilo e mancou na direção da porta.

- Thomas, se eu puder me apoiar em você, pode dispensar os criados. Mande o cirurgião até meu quarto assim que ele chegar.

- Lady Annabelle! – chamou a duquesa – Por favor! Meus sais aromáticos! Não me sinto bem!

Sem direcionar nenhum olhar na direção de Saga quando ele deixou o aposento, a jovem correu para o lado da duquesa.

- Devo realmente parecer doente. – murmurou o duque.

- O que disse, Excelência?

- Nada Thomas. Nada. Estou somente divagando.

Entre dois lances de escada eles se detiveram para admirar o retrato do falecido Duque de Barroughby, o quinto em sua linhagem. Ao seu lado encontrava-se um pequeno retrato da mãe de Saga.

- Se Vossa Excelência me permite dizer, aqueles eram bons dias.

- Sim, Thomas. Aqueles eram bons dias.

- O duque parecia bem mais feliz.

- Talvez. – comentou o sexto Duque de Barroughby ao passar pelos quadros.

*o*O*o*O*o*

- Não fique carrancudo Aiolos. – Saga provocou o médico que estava trocando o curativo do ferimento da perna. – Já tive piores.

- E o que provocou este? – Aiolos Mapleton perguntou, ofegante por ter se esforçado ao se curvar sobre a perna do duque. – Espada não foi.

- Pistolas a vinte passos de distância.

- Explicado.

- Sangrou muito, mas, segundo o cirurgião de Londres, não houve dano permanente.

- Sorte sua. Mais uma vez, sorte sua. Mas um dia desses ela termina e o você vai acabar morto.

- Não tinha muito a temer do meu oponente. Só me preocupei que seu tiro não atingisse meu segundo ou algum espectador.

- Hum... – Aiolos começou a guardar seus pertences na bolsa preta – E qual foi o motivo? Uma mulher?

- Sim.

Aiolos lhe lançou um olhar desconfiado.

- Sua ou de Kanon?

- Acho que não precisamos de respostas, não é? – Saga desviou o olhar, cansado, para o outro lado da sala.

Aiolos se inclinou para frente e retomou seu trabalho.

- Kanon. Eu já devia saber. O tolo fugiu para a Europa para se esconder e você assumiu a culpa. Outra vez.

- Prefiro não tocar no assunto. Já está tudo resolvido.

- No seu lugar, eu descansaria um pouco mais, Excelência. Diga-me, não lhe passou pela cabeça a ideia de vir até aqui de carruagem? – perguntou Mapleton ajudando o duque a ficar de pé. Este estremeceu ao colocar o peso sobre a perna.

- Eu precisava do ar puro depois de Londres e bem, Florence precisava de exercício.

- Sei e por isso resolveu arriscar tudo. Sua madrasta não parece contente com sua visita. Ouvi a voz de Dr. Benjamin quando cheguei. – Aiolos comentou de modo sardônico.

- Sim. Às vezes me pergunto quando realmente ela parece feliz. Mas não me importo.

- Por que não a manda para a Casa do Dote?

- Para que diga a todo mundo que foi despejada? – Saga voltou a sentar-se, lentamente.

- Ela não tem direito sobre Barroughby Hall. Você é o herdeiro de tudo.

- É, sou. E, levando em conta minha reputação, acredito que mais um escândalo não fará diferença alguma. – o duque tirou um charuto de dentro do colete, riscou um fósforo e acendeu – Eu já pensei sobre isso, Aiolos. Acredite. Mas, meu pai iria querer que ela ficasse aqui.

- O Duque já faleceu há muito tempo.

- Promessas feitas a um pai a beira da morte agora vêm com um prazo de validade?

- Se não vêm, deveriam vir.

Saga sabia que Aiolos jamais concordaria com ele em determinadas questões. Os dois eram amigos há muito tempo e Mapleton sabia as desventuras pelas quais Saga havia passado. Talvez ele até estivesse certo, mas eram coisas que ele preferia não pensar.

- Chega deste assunto desagradável Aiolos. Sente-se e tome uma bebida comigo.

O convite fez Aiolos pensar por um instante e depois assentir.

- Deixe que eu pego.

Aiolos serviu dois copos de cristal com licor de uma garrafa lapidada. Entregou um dos copos a Saga e ficou com outro.

- Diga-me uma coisa. Há quanto tempo Lady Annabelle está aqui?

O duque perguntou ao amigo numa mudança estratégica de assunto. Não queria falar da promessa feita ao pai em seu leito de morte ou de qualquer coisa relacionada aquilo.

- Quanta sutileza. Está há cerca de quatro meses.

- Suponho ser eficiente para aturar a duquesa por tanto tempo assim.

- Dr. Benjamin não tem do que reclamar. Suas visitas a Barroughby Hall se tornaram menos frequentes desde que ela chegou.

- Me pergunto por que uma moça como ela fica aqui. E também por quais motivos ela agrada a duquesa.

- Já conjeturamos sua eficiência.

- Não. Não é só isso.

- E o que seria?

- Não sei. E os pais? Sabe se estão vivos, se já faleceram?

- Vivos. Passando uma longa temporada pela Europa. Ao que parece, Lorde Pimblett acha que ficar indo de um lugar a outro numa carruagem é bom para sua gota ao invés de um descanso num lugar sossegado.

- O que acha dela?

- Lady Annabelle é uma jovem inteligente e compassiva. E me parece bem centrada. Afinal de contas, só assim para aguentar a duquesa.

- O que outra vez nos leva a pergunta. Por que está aqui com minha querida madrasta?

- Por que não pergunta a ela?

- Talvez eu faça isso.

- Saga...

- Não. Isso vindo de você, não. Garanto a você que ela não precisa temer o Duque Negro.

- Nós dois sabemos disso. Mas passando tanto tempo assim com sua estimada madrasta, Lady Annabelle pode pensar o contrário.

- Quanto tempo será que ela vai ficar?

- E por que iria embora depois de aguentar a duquesa por tanto tempo?

- Exatamente porque eu cheguei e não sei o que ela pensa sobre o Duque Negro.

- Se ela não tem o que temer, não dê a ela motivos para pensar em algo. Preciso ir. Cuide bem dessa perna. Nada de cavalgadas pelos próximos dias.

- Mas e Florence?

- Peça a alguém para fazer exercícios com ela.

- Você quem manda.

*o*O*o*O*o*

Mais tarde, naquela mesma noite, Lady Annabelle tentava se concentrar nos pontos do bastidor que tinha em suas mãos, mas na conseguia. Seus olhos, apesar de sem motivos para tal, não se desviavam da porta da sala de estar. Apenas um dos serviçais poderia passar por ali, já que o duque não descera para jantar por causa do ferimento, apesar de o Sr. Mapleton não ter considerado o ferimento grave. Mas Annabelle desconfiava que na verdade, o duque de Barroughby não estava disposto a continuar ouvindo as acusações constrangedoras da duquesa, o que era bastante compreensível.

- Então Lady Annabelle, presumo que frequentava as melhores rodas da sociedade londrina. Jamais havia visto o meu enteado antes? – o tom de voz da duquesa era suave e até amável, considerando a maneira habitual que ela costumava falar. Provavelmente aquilo se devia pela ausência do duque naquele lugar.

- Na verdade eu não frequentava nenhuma roda, Excelência.

- E por que não? A posição de seu pai lhe garantia se uma boa frequentadora.

- Sempre preferi ficar em casa.

- Que adorável. Trocando as rodas da sociedade para ficar com a mãe.

Annabelle achou ser melhor não corrigir a duquesa. Se ela preferia acreditar que o motivo era aquele, que fosse. Com toda certeza ela seria mais uma que não acreditaria no seu desinteresse pelas rodas sociais da capital. Ainda que suas irmãs tivessem boa frequência por lá, isso não significava que ela também tinha que se submeter a tanta futilidade assim.

A duquesa sorria de satisfação, jogando cartas sozinha. Pelo jeito havia ganhado outra vez.

- Você sabe, Kanon é muito bom com as cartas. Quando jogamos juntos, ele até consegue me ganhar algumas vezes.

- É mesmo, Vossa Excelência?

- Sim. Ele é muito requisitado em mesas de carteado. Isso quando conseguem fazê-lo parar de dançar nos bailes. Mas estas são qualidades que você poderá avaliar pessoalmente quando ele chegar.

A jovem simplesmente assentiu.

- Até lá, vamos torcer para que o duque já esteja bem longe daqui.

Annabelle se perguntava por que a duquesa não mandava o duque embora se sua presença em Barroughby Hall era tão incômoda e detestável assim. Mas achou melhor conter aquela pergunta na ponta da língua e dentro da boca. Não sabia se a duquesa gostaria de ser questionada sobre o assunto e ela também não estava assim tão disposta a ouvir impropérios sobre o duque e sua reputação. Sendo assim, só lhe restava ponderar por conta própria sobre o assunto e o sobre o próprio duque.

Durante as poucas vezes que esteve em Londres, Annabelle jamais vira um homem tão bonito. O que de certa forma o fazia merecer sua reputação. No entanto, havia um ponto completamente inesperado. Depois de tudo que havia ouvido, esperava dele um temperamento mais explosivo, um tanto violento e desaforado. Porém, sua paciência com a madrasta rabugenta e reclamona foi surpreendente.

- Acredito que esteja na hora de ser recolher, Vossa Excelência. Maria já lhe espera na porta. – Annabelle disse baixinho para a duquesa.

- Ah, tem razão. – a duquesa se ergueu majestosamente da poltrona e olhou para Annabelle. – Você não vem?

- Ahn... Quero ler um pouco antes de dormir. Acho que deixei meu livro na biblioteca.

- Deste jeito vai acabar arruinando a vista. Devia ler só pela manhã, quando não tem que acender uma vela. Assim não tem perigo de adormecer e incendiar a casa.

- Vou tomar cuidado, vossa Excelência.

- Que seja. Não vá dormir muito tarde.

Annabelle jamais vira a duquesa com um exemplar que fosse nas mãos, de modo que não estranhava a falta de respeito da duquesa pela leitura. A biblioteca era um lugar onde ela jamais entrava e onde Lady Pimblett se refugiava quando procurava alguns curtos momentos para si.

Barroughby Hall era uma magnífica construção, resultado de gerações de trabalho. Tudo nela era imenso. A sala de jantar com sua gigantesca mesa de mogno, seus mais de cinquenta quartos, suas maravilhosas escadarias, seus inúmeros jardins e seu cômodo favorito, a biblioteca, que muitas vezes lhe lembrava uma igreja vazia e abandonada, o que só tornava o aposento mais atraente pra ela, a imensa sala de estar, copa, cozinha, sala de jantar e o gabinete do duque.

Não era lá um lugar aconchegante para morar, mas tinha suas compensações. Annabelle não precisava ficar o tempo todo cuidando da mãe, que pensava estar o tempo todo doente, e sempre ficava lhe pedindo cuidados, considerando ser obrigação da jovem, já que ela era tão diferente das irmãs e nunca fazia o mesmo que elas. Aliás, suas irmãs eram o segundo motivo para continuar ali. Mesmo que fosse tão bonita quanto elas, seu comportamento sempre era alvo de irritantes comparações. E apesar dos pesares, a duquesa parecia dar muito mais valor aos seus esforços.

Ela chegou à biblioteca, acho seu livro e seguiu rumo ao seu quarto. Como Barroughby Hall era imensa, ela procurou o trajeto mais curto para seu quarto, mesmo que este ainda fosse um tanto longo e enquanto fazia seu caminho, vinha pensando no quanto a estadia do Duque Negro tornava sua estadia ali mais empolgante.

Ao chegar ao andar de cima, deteve-se no corredor por certo tempo, notando que a porta que sempre estivera trancada e que ficava no caminho para seu quarto, agora estava entreaberta. Era o quarto do duque e ela teria que passar por ele.

Havia receio e empolgação dentro de si. Mas logo sentiu-se uma tola. É claro que, com a perna machucada, o duque não pularia de dentro do quarto, lhe agarraria e lhe arrastaria para lá. Além do mais, que tipo de interesse poderia alguém, como o Duque Negro de Barroughby , mostrar por ela, que já fora considerada indomável por seu temperamento tão diferente das irmãs? Nenhum, é claro. Então não tinha com o que se preocupar.

Sentindo-se orgulhosa e encorajada, desceu o corredor. Mas ao se aproximar da porta, seus passos ficaram mais lentos e um gemido chamou sua atenção.

E então a coragem que sentira antes se dissolveu dentro de si. Parou diante da porta, ponderando se entrava ou não. O duque poderia estar precisando de algo e não havia mais ninguém por perto. Então ela resolveu entrar.

O quarto estava extremamente escuro, com as cortinas fechadas, impedindo a luz do luar de entrar. Annabelle ergueu um pouco mais a vela, a fim de examinar o enorme e luxuoso aposento. Avistou o duque deitado de lado, sob a cama de dossel, virado na direção da porta. Em nada lembrava i homem daquela manhã. Frio e sardônico. Tampouco o vilão protagonista dos muitos mexericos. Parecia apenas um menino levado, ainda que não houvesse nada de infantil em seus sensuais lábios entreabertos.

Ela o observou, se mexendo de modo inquieto, virando de barriga para cima, cobrindo o rosto com o braço musculoso. O peito nu. Só então se deu conta de que ele também poderia estar nu sob as cobertas. Annabelle recuou. Era melhor ir embora.

Mas o duque gemeu novamente.

Talvez ele precisasse de ajuda. Mesmo escondido sob o braço, seu rosto contraído de dor era perceptível. Era melhor buscar alguém. Mas teria de explicar o que estava fazendo no quarto do duque. Essa definitivamente não era uma boa ideia. Poderia tocar a campainha, solicitando ajuda e sair do quarto antes que o criado aparecesse. Dessa forma todos pensariam que o duque o havia chamado.

E assim ela fez. Porém, temendo que alguém visse a chama da vela, apagou a mesma, tendo de permanecer um pouco mais de tempo por ali, até se acostumar com a escuridão. Andou lentamente até a cama, estendeu a mão para puxar a corda, mas distraiu-se ao admirar o nobre adormecido. Saga mexeu-se outra vez, virando-se para ela, expondo um pouco mais do peitoral musculoso e desnudo. Lady Annabelle estremeceu, engolindo em seco, puxou a corda e saiu do quarto o mais rápido possível, evitando fazer qualquer barulho.

Ao perceber que estava sozinho no quarto, Saga abriu os olhos e sorriu.

Continua...