Casal: Red Queen se desenvolve em seu tempo.

Sumário: Regina sempre se atraiu pela natureza majestosa dos lobos. Huntsman foi a coisa mais próxima de um que conseguiu dominar. Mas isso nunca a satisfez.

Headcanon: Por que um discurso tão encantado sobre lobos não poderia mencionar uma lobisomem?

Alertas: Relações de dub-con, possível BDSM.

Disclaimer: Todos os personagens e histórias de base em Once Upon a Time são propriedade intelectual de seus escritores, Edward Kitsis e Adam Horowitz. A mim só pertence a criatividade a partir de seu trabalho.


O quarto da Rainha cheirava a maçãs.

As janelas, longas e exuberantes, eram abertas ao ar do fim de tarde. O sol se pondo, cobrindo o céu com um manto alaranjado em sua despedida. A mesma cor entrando pelos vidros, sacadas e janelas; E tingindo o ambiente interior. O som dos pássaros pouco invadia seu quarto, enquanto os passos agudos de saltos marcavam o silêncio. Ela havia chegado.

Huntsman estava deitado sobre sua cama real, incapaz de se mover. O feitiço sobre seu corpo ainda era forte o suficiente para impedi-lo de levantar-se, mas enfim conseguira retomar o domínio de seus braços, que agora corriam seu corpo, tateando seus arranhões. Em um gemido de dor, ele sentou-se. E ela riu.

Adentrou o quarto com um longo vestido negro. A maquiagem forte voltava a cobrir sua pele, trabalhando junto de seu cabelo, sempre preso para trás, como sua própria coroa. Ela estava deslumbrante, como sempre.

Era irritante o ter de admitir que, apesar de odiá-la, Regina ainda parecia uma das mais belas criaturas do reino. Talvez, então, por ser a Rainha desse reino, era esse seu poder. Mas, ah, Huntsman sabia muito bem que suas habilidades excediam sua tão icônica aparência. Ela era uma bruxa. A mais forte que já tivera a infelicidade de conhecer. Ela o dominava, indiscutivelmente. Por muito além de sua beleza.

Mas o aperto em seu peito aliviou-se.

Ele descobriu - depois de acostumar-se com seu novo posto no castelo - que permanecer fisicamente distante de Regina fazia o lugar vazio em seu peito formigar, então pressionar, e então queimar. Era sufocante tentar escapar de sua presença.

Pois ela tinha seu coração. Mantido em uma caixa, em algum lugar inacessível para ele. Ele era seu animal de estimação, seu pet. Ele não detinha o direito de fugir dela. Pois com um pequeno aperto de seus dedos, seu coração seria pó, e ele deixaria de existir. Para sempre, assim, submisso a ela.

E ela sabia disso. Tanto era seu feitiço. Ela o prendia na palma de suas mãos, para usá-lo como bem entendesse. E assim o fazia.

Seu suspiro foi audível antes mesmo de ela cruzar a sua frente. Caminhava enquanto mexia em algo sobre a sua cintura, e logo a extensa calda de seu vestido se desprendeu, caindo ao chão para que qualquer ínfima empregada a recolhesse. Mais alguns passos e ela havia alcançado os pés da imensa cama, onde se deixou sentar. Sua postura inquebrável.

Seu rosto de pele impecável parecia torcido em curiosidade. Não para o Huntsman sentado, seminu, em sua cama, mas para algo em sua imaginação. Um olhar distante em seus olhos castanhos. Por uma fração de segundo, ele a enxergou doce. Mas, tão rápido, estava desfeito. Sua máscara de Rainha Má estava de volta; planos e intenções dançando pretensiosos por seus olhos.

— Eu ouvi histórias de um novo tipo de lobo circulando o reino.

Regina elevou a voz para chamar-lhe a atenção, como se não soubesse que ele sempre a ouviria. Ainda assim, não o olhava nos olhos. Preferia fitar algo além das paredes do quarto.

— O que você sabe disso, Pet?

Diante da nova informação, Huntsman sentiu seu corpo tencionar e seu sangue gelar. Ele sabia que, há tempos atrás, quando negociou suas condições para a Rainha, havia defendido seus amigos lobos. E nunca mais ela havia tocado em tal assunto. Não até agora.

Ele não escondeu sua surpresa.

— Como, novo tipo de lobo? Não são lobos normais? — Sua voz era contornada por uma mistura equilibrada de esperança e desespero.

Por que, no fundo de si, sabia que não havia cumprido com nenhum acordo, desse modo não garantindo por completo a segurança de sua família de lobos; A esperança, por outro lado, brotava do que sabia sobre a paixão de Regina a esse particular animal. Ela não guardava desgosto, mas apresso.

E a voz dela só confirmou tal interesse: Ela realmente era atraída ao poder dos lobos.

Seu rosto formou mais um sorriso venenoso.

— Não, não exatamente. — Regina enfim mirou os olhos do Huntsman, e viu ali o puro terror que se mostrava, em preocupação com seus queridos irmãos. Ela riu por dentro. Ele era um animal, tão exposto — Os rumores os descrevem como sanguinários, maiores, mais fortes e mais ferozes… — Ela observava as emoções passarem por trás dos olhos claros do homem a sua frente. — Mas que, curiosamente, só costumam assombrar rebanhos durante uma semana do mês? — O tom de sua voz sugeria que ela já soubesse muito mais do que relatava no momento.

Mas tudo era assim: suas conversas, suas respostas; Ela fazia de hábito jogar com as mentes à sua volta por pura diversão. Testando-as para ver até onde aguentavam. O nervosismo de Huntsman se atenuou ao perceber suas intenções. Mas, acima de tudo, por assegurar-se da verdade.

— São nômades, então. — Ele realmente acalmou-se. Seus queridos irmãos não poderiam corresponder a tão brutal descrição. Eles eram puros de coração: não matavam se não fosse por comida. Isso era algo jurado em sua mente.

— Não. Os mesmos lobos, nos mesmos lugares. Só surgindo durante a chamada "Wolfstime". — Ao pronunciar o nome, o rosto de Regina entregou-se a escuridão em si. Cruel e interessada no que descobrira, seu sorriso era mais diabólico do que nunca.

E ainda que soubesse que sua família não poderia ser o assunto de discussão ali, ele se preocupou. Não por seus lobos, mas por essas novas criaturas. Perigosas e misteriosas o suficiente para atrair a atenção de Regina. Ele se perguntou que tipo de ser teria tamanha significância para receber o tempo da Rainha Má.

Algo clicou em sua mente.

Ele lembrava- enquanto ainda era livre para andar pelas florestas - que seus lobos frequentemente eram perseguidos por outra alcateia. Essa maior e mais forte. Mas isso, como pontuara Regina, era um acontecimento mensal, que eventualmente se esvaia à medida que o Huntsman e sua família deixavam alguma área. Ainda assim, em sua memória, ficaram marcadas as noites em que uivos e rugidos - muito mais graves e animalescos do que os de seus irmãos - cortavam a noite e matavam homens, mulheres e crianças. Criaturas não totalmente animais, pois não possuíam pureza tão gloriosa. Criaturas semelhantes a…

— Você não está insinuando que… — Ele deixou sua voz morrer, receoso de pronunciar a palavra e dar vida às lendas de sua infância. Não poderiam ser reais, por mais plausíveis que fossem agora. Um ser como aqueles… poderia mesmo existir?

— Por que não? Duvido que sejam só histórias. — O sorriso de Regina ainda não desaparecera. — Ogros e trolls andam entre nós, de qualquer forma. Esse domínio não é isento de tal poder. - Novamente, mais fundo em sua voz, poderia sentir-se sua atração quase primal por referido poder.

— Sim, mas… lobisomens? — Ele riu de nervoso. Não queria acreditar. —- Homem e lobo, em um mesmo corpo?

— Uh, é inveja o que sinto em sua voz, Huntsman? — Regina aproximou-se dele, arrastando-se pela cama, do pé à cabeceira. Huntsman se reajustou para fugir de seu contato. — Uma dádiva como essa lhe soa interessante? — Ela deitou-se ao seu lado, felizmente não pondo suas mãos outra vez no corpo do homem.

— Dádiva? — Ele escolheu um tom frio. — Eu duvido que se possa considerar isso uma dádiva.

— Não entendo. — Regina respondeu; Sua voz mostrando agora genuína confusão. — Não são lobos os seus amigos, familiares? Não seria tão mais… aconchegante, se você pudesse correr lado a lado, como um verdadeiro irmão? Realmente pertencer?

A pergunta lhe pegou desprevenido. Ele não podia negar estar tentado. Nunca realmente pertenceu à sua família, por mais que seus irmãos e irmãs lobos o houvessem acolhido com sinceridade. Ainda assim, reconhecendo a pureza de seu carinho, Huntsman se sentia inadequado em sua pele de homem.

Mas nunca desejaria conhecer a escuridão de tal besta híbrida. Pois sabia, do que conhecida das lendas, que aquilo, fosse o que fosse, detinha o coração de homem. A impureza do homem. E ele não arriscaria sua bondade.

— Sim, eu suponho. — Regina tirou-lhe dos pensamentos. Seu tom ainda debochante.

— O que… — Huntsman tentou recomeçar. Tentaria entender mais claramente as intenções da Rainha. — O que você vai fazer sobre essas criaturas?

— Bom, elas não me causam problemas. Atacam vilarejos, matam gados e camponeses. Isso não me faz falta. Não vejo porque interromper seus hábitos.

A resposta era seca e fria. Mas verdadeira. Ele não detectava máscaras em sua fala. Ela realmente não se importava que a destruição que aquele animal causasse.

— Mas - não posso negar -, ter um animal desses como companhia… Um lobo, um verdadeiro lobo. — Seu rosto parecia sonhar. — Não, algo ainda mais magnífico do que um lobo. Mais sombrio e mais forte. Ah, seria um pet perfeito. — Ela riu. — Não é má ideia, realmente, ter esse tipo em meu lado. — Huntsman sentiu as palavras direcionadas a si.

— Mas- Eles são pessoas.

— Ah, poupe-me disso. — Ela levantou-se da cama com longos movimentos — Você mal é uma pessoa, e foi meramente tocado por lobos. — Ele tremeu de raiva ao ouvi-la — Ninguém realmente lhe respeita e os lobos- você não pode realmente acreditar quando fala que eles lhe entendem. Você é, no mais, um homem dos animais. — Ele quis mover-se e desafiá-la. Feri-la por ofender seus irmãos. Mas ele sabia melhor. — Imagine o que são esses lobisomens.

— São criaturas especiais. — Sua voz mascarou sua raiva. — Como nós humanos e como os lobos. — Ah, não exatamente. Mas ele nunca revelaria a tendência negra que uma criatura mestiça como aquela poderia possuir. Ele não arcaria com os estragos de Regina.

— Não, por favor. Não rebaixe tão gloriosa raça para justificar sua compaixão. — Então, ela já imaginara. — Eles são, apesar de tudo, monstros. Bestas presas entre homem e animal. Mais fortes que os dois. — Fora realmente ingenuidade pensar que Regina não entenderia. — Como não desejar uma presença dessas ao lado da sua? Ofereço-lhe um presente por simplesmente sugerir um aqui.

E o que Huntsman temia se fez audível.

— Um lobisomem? — Ele sentiu-se suar frio. Não. Ela não poderia. — Você vai caçar um lobisomem?

— Por que não? — A simplicidade da resposta foi ainda mais assustadora. — Você anda tão entediante ultimamente. Esse castelo está rebaixado a súditos armados e humanos submissos. Eu preciso de mais poder por entre esses muros. Algo que não se limite a um espelho mágico ou a laços familiares. — Ela enfim cruzou o grande quarto e pôs-se em frente ao grande vidro sobre a parede. — Malificent estava certa. Preciso de um pet.

— Não são pet! São human- — Com o levantar de um dedo, ela o calou. Sua voz presa dentro de sua garganta.

— Como você? Como os lobos? São os dois! E são nenhum. — Ela riu — Não se diferem quanto a isso. Estão no meu Reino e devem responder a mim!

Ele não queria mais ouvi-la.

—- Espelho, mostre-me um lobo.

O espelho então brilhou numa névoa azul e pareceu procurar por todas as superfícies refletoras do Reino. E lentamente uma ou duas figuras lupinas gigantes se formavam.

Aquilo não podia estar acontecendo.

— Rainha, pense no que está fazendo! -São seres com sentimentos. — Ele resolveu então implorar. — Não basta a mim, como seu animal de estimação? Não foi para isso que rendi minha liberdade, para que poupasse a dos outros?

— Entenda a sua situação deplorável, Huntsman: Você nunca rendeu sua liberdade, eu a tirei. E se a trocou por algo, foi pela estúpida falha em me entregar o coração de Snow White. Você nunca escolheu nada por você. — A verdade ainda lhe cortava a carne. — Assim como não terá direito algum minha nova adição. E, quem sabe assim, posso enfim lhe livrar do fardo de ser meu animal.


— Caiu da cama hoje de manhã, Madame Prefeita? — A garçonete tirou-lhe de seu pequeno transe com um sorriso dúbio e um pote de café quente nas mãos.

Ela massageou seu cenho, num suspiro profundo. De fato, Regina foi arrancada do conforto de seu sono naquela manhã e isto por consequência lhe arrancou um bom humor. Ela culpava seus constantes sonhos, que insistiam em transportá-la à outra terra. Sonhos, então, não exatamente. Eram memórias. Memórias vívidas que se repassavam em sua mente sem sua permissão, enquanto presa no seu inconsciente. E Regina não conseguia se livrar delas.

O mais pensava no quanto tudo aquilo lhe incomodava, o mais os sonhos tentavam lhe tirar do presente. Era frustrante ser forçada a recordar uma época tão suja. Mais frustrante ainda, ser impotente sobre seu próprio consciente. E, talvez, Regina tivesse uma explicação para tudo.

Desde a morte de Graham, ela começara a se sentir cada vez mais sozinha e solitária em suas noites mais… quentes. Sem mencionar que habitar aquela casa abandonada, sem o cheiro amargo daquele homem permeando suas roupas - isso a transportava a um tempo similar no passado. Um tempo em que Red foi sua.

Red.

Essa garçonete vulgar à sua frente não era Red. Era uma réplica mais imatura, insegura e frívola de sua grande Red. Era nauseante assisti-la flertar com qualquer cliente que possuísse a semelhança a um homem. Era simplesmente revoltante ver o corpo de sua Red emprestado a uma personalidade tão descartável e irrelevante como Ruby. Regina sentia-se culpada, por outro lado, ao entender que o que causara essa mudança fora ela mesma: sua maldição. A nuvem púrpura que tomou seu reino e apagou a memória de todos seus inimigos, também adormeceu Red.

Bem, era um preço a pagar. Ela finalmente vencera sua longa batalha contra Snow White. E, mesmo com essa nova e irritante xerife ao redor - Essa desprezível e rude Emma Swan -, Regina estava contente com o resultado de sua magia. Ainda assim, toda a manhã, quando entrava na lanchonete, sob olhos temerosos e desgostosos, para tomar um café, ela se arrependia um pouco. Quando Ruby - Ruby - lhe mostrava um sorriso torto e tentava uma conversa casual, ela se arrependia um pouco mais. Arrependia-se por ter apagado Red.

Oh, Red.

— Ah? Oh, sim. Algo desse tipo. — Seu tom em resposta ao comentário da garçonete fora rude e seco. Não que não o tivesse intencionado. Porque, você sabe, olhar para Ruby era só mais um lembrete do quanto ela sentia falta de Red. E aqueles sonhos, se repetindo incessantemente no fundo de sua mente… Ruby era a exata pessoa para irritar Regina no momento.

— O que a senhora vai querer? - Ruby, apesar do mesmo porte majestoso de Red, não possuía nenhum de seu poder natural. Não, era uma cópia visual imprestável e fútil. Sou tom era fraco e suas palavras eram trêmulas. Ruby não era Red.

— Só um café. E rápido. Eles não lhe pagam para entreter com os clientes, eu assumo. — Regina virou o rosto para fitar a porta, percebendo como - só para perturbar ainda mais seu humor - aquela mulher andava em direção a adentrar o restaurante. Emma Swan. Uma legítima ameaça a sua paz e soberania na pequena cidade. Ela detinha aquele mesmo olhar arrogante e intocável em seu rosto. Um traço que conseguia irritar Regina até os ossos.

— Bom dia, Madame Prefeita. — Seu usual tom sarcástico foi ainda mais palpável enquanto ela garantia seu lugar no assento logo ao lado de Regina. Com aquela postura masculinizada e impolida, Emma Swan virou-se na cadeira e debruçou-se sobre o balcão, tentando localizar Ruby. — Hey, Ruby!

Ruby pareceu ouvir seu nome sendo chamado, mesmo sob os barulhos altos e estridentes da cozinha. Um dos dotes de Red, Regina pensou. Uma habilidade sem função no corpo de Ruby.

— Hey, Emma! – Caminhando, quase que saltitando, Ruby pôs-se em frente à Emma, do outro lado do balcão. Ignorando completamente o pedido de Regina por um mísero café - E assim agravando ainda mais sua indisposição matinal -, a garçonete engajou-se numa conversa amigável com a loura ao seu lado.

— Mary Margaret está se sentindo um pouco para baixo ultimamente. Problemas com o tal do David. Eu pensei, talvez nós pudéssemos combinar alguma saída, só nós três? Eu poderia usar alguma distração desse novo trabalho de xerife. – A voz de Emma era limpa e simples, mas algo em seu rosto traiu sua suposta calma, e denunciou certa tristeza sobre a memória de Graham.

Regina suspirou novamente. Não bastava interferir na sua relação com Henry, e ativamente confrontá-la na sua autoridade sobre aquelas pessoas, Emma Swan também desestabilizara outro aspecto da vida de Regina: Graham. Uma influência tão forte e ultrajante, em fato, que contribuiu diretamente para a morte do antes Huntsman.

Sim. Emma Swan forçara Regina a esmagar o coração do Huntsman em suas mãos. Porque Emma Swan, essa grosseira desculpa de xerife, comprometeu não só a encantada lealdade de Graham para Regina, mas a integridade da maldição sobre o homem. Sobre ele e, possivelmente, toda a cidade. Não, Regina não poderia arriscar o menor dano sequer à sua nova realidade. Sua maldição deveria viver pela eternidade, ainda que Emma Swan, na sua ignorância e insubordinação, insistisse em ameaça-la.

Regina trocou Graham por sua maldição. Trocou seu pet – seu primeiro pet – por seu orgulho como dona. Sim, porque o Huntsman era de Regina e nada poderia mudar isso. Nem Emma Swan.

Fora uma decisão difícil, mas que deveria ter sido feita. Sem contar que, bem, o pobre homem-lobo deixara de ser seu principal animal de estimação há muito, muito tempo.

— Então você mudou de opinião sobre o Rabbit Hole? Eu achei que tinha dito que um bar como aquele não era bem seu estilo. — Ruby retrucou Emma com um tom brincalhão e infantil.

— E eu continuo achando o mesmo! Nada de Rabbit Hole, não. Não vou por os pés naquele lugar enquanto tiver escolha. Mas, eu não sei, pensei que pudéssemos fazer algo diferente? Mary Margaret também não está no humor para algo tão… animado assim. – Regina notou como Emma mantinha uma postura um tanto superior no tratar Ruby. Como se a visse como uma criança e nada mais. Limitada em sua inteligência como a garçonete aparentava ser, era razoável considerar que ela nunca perceberia a mesma coisa. Talvez fosse para o melhor. Continuar na sua ignorância, pensando que as pessoas realmente lhe apreciam. Mesmo se não for Red.

— M&M nunca realmente gostou de lá. Eu entendo. – Emma franziu o cenho em reação ao apelido. – Talvez possamos fazer algo diferente. Você tem algo em mente?

— Não! Eu não conheço nada por aqui. Pensei que você pudesse ser útil.

— Oh, então sou algo como uma gerente de lazer? – Ruby riu, aproveitando sua própria colocação.

— É, eu não poria a sim. Mas vamos dizer que, entre eu, Mary Margaret e você, talvez seja melhor deixar as decisões com você. – Aquele mesmo ar superior. Ninguém mais estava percebendo aquilo? Era só Regina que se irritava com os modos arrogantes de Emma? Era só ela que a via pelo que ela era? Isso era desconcertante, deveria admitir.

— É uma honra. – Ruby improvisou uma cortesia agradecida. – Vejamos… Acho que Billy uma vez me contou de um pequeno PUB perto da Biblioteca. Não é muito movimentado. Mas eu acho que seria um bom lugar para M&M relaxar a cabeça. – A garota deu de ombros, sua voz confortável ao mencionar Mary Margaret.

E, outra vez, a irritação que só Ruby – e não Red – poderia lhe provocar, encontrou um meio de voltar a coçar na pele de Regina.

Mary Margaret. A mais desprezível das pessoas por lá, condenada a passar uma eternidade no esquecimento de sua antiga glória como uma princesa mimada e utopicamente otimista. Snow, presa na personalidade passiva e incerta de Mary Margaret, uma mísera professora do fundamental, gastando seus anos na terra para construir duvidáveis casas de pássaros.

Mary Margaret era a prisão perfeita para Snow White. Mas, ainda de por trás das barras, era alarmante notar como sua atmosfera de líder, de amiga, conseguia tocar suas antigas companhias. Snow White sempre foi seu empecilho na vida, desde quando impediu seu amor por Daniel. Não era surpresa imaginar que ela também se intrometeria em quaisquer outras felicidades que Regina pudesse encontrar. E Red, por mais doentia que fosse sua atração pela lobisomem, devia-se admitir, fora uma pequena felicidade de Regina. Breve momento de alegria e satisfação que Snow White, com seus modos de heroína suprema, conseguiu arruinar.

Não. Ela não arruinara completamente. Red vivia. Red ainda era conectada a Regina, de uma maneira ou outra. Mas Red estava enjaulada em Ruby. E Ruby, como ficara evidente nesse momento, guardava um apresso quase inexplicável por Mary Margaret.

— É, eu acho que isso é algo com o qual Mary Margaret concordaria. – Emma Swan retornou à conversa com seu ar superior. – Eu vou avisá-la dos nossos planos; E nós poderíamos sair, o que você acha, no sábado?

Ruby entornou o nariz em desgosto. Quase um rosnado sem som que se instalou em sua face, tão semelhante à de Red. Isso forçou Regina, novamente, ao passado.

— Não vou poder no sábado. Granny me colocou trabalhando por mais tempo essa semana, para compensar, uh, outros dias. Mas eu tenho algumas horas que posso tirar na sexta? Eu termino meu turno mais cedo e encontro vocês no seu apartamento?

— Perfeito. – Emma não parecia tão entusiasmada com a ideia como Ruby mostrava estar. – Vou esperar você por lá então. – Ela tapeou de leve o balcão, levantando-se da cadeira. – Vou voltar para a delegacia. Ainda tenho muita papelada para acertar. Vejo se consigo trazer Mary Margaret aqui até o fim do dia. – Ela virou-se para sair quando Ruby a abordou.

— Emma, você não vai pedir nada? Para a viagem, quero dizer. – Ruby parecia ansiosa em deixar a amiga ir. Dado o semblante de total frieza e contida fúria nos traços de Regina, era compreensível o medo de ficar sozinha ali.

Emma pareceu entender a insegurança da amiga, mas não fez esforço para interferir. Ao invés disso, assumiu olhar apologético e mirou Regina pelas costas.

— Desculpa, Ruby. Dessa vez não. Talvez eu passe aqui no almoço. Até mais. – E desapareceu pela porta. O baque do metal e o bater no sino trazendo a atenção da garota para Regina.

A garçonete não se moveu, numa postura tensa e temerosa ao tratar a Prefeita. Ainda assim, um olhar desafiante em seu rosto. Como que receosa, mas confrontante.

— Novamente, — Regina ergueu sua voz, encarando Ruby em seus olhos esverdeados. A voz metálica de forma tão poderosa que causou a garota a pular de susto. — Eu não acredito que sua avó lhe pague para conversar com os clientes. De qualquer forma, estou aqui, esperando você terminar seu chat com a Srta. Swan. Esperando por um café, que não deveria levar tanto para ficar pronto. Não posso confiar nem uma tarefa tão simples a sua incompetência, Srta. Lucas?

O restaurante pareceu reduzir seu volume a um nível constrangedor, em compaixão à Ruby. A pobre garçonete perdera a cor de sua já clara pele, enquanto engolia seco e somente fitava Regina com olhos espantados. Quando sua reação inicial à exasperada rudez da Prefeita se esvaiu, algo mais escuro tomou lugar em seus olhos. Ruby respirou fundo, e seu peito se ergueu de leve. Era como se o ar preenchesse seu corpo com outra atitude, outra intenção.

Se Regina não estava enganada, viu os orbes verdes de Ruby piscarem dourados. Seu rosto, antes assustado e submisso, agora tinha um quê de raiva. Impossível negar, Regina foi imediatamente atraída à súbita mudança de postura da garota. Era como se Red estivesse voltado por uma fração de segundo.

Mas logo veio, foi embora. Ruby entendeu sua reação e logo a tentou corrigir. Ela abaixou os olhos para o chão e assentiu a cabeça, compreendendo sua falta de profissionalismo.

— Sim, senhora, Madame Prefeita. Me desculpe. Vou trazer seu café. – Ela tornou-se na direção oposta do balcão, reabastecendo a máquina de café e pondo a jarra de volta em seu lugar. Movimentos sempre rápidos e assistidos, mas que não conseguiam esconder considerável maestria em seu costume.

Quase que subitamente, Regina considerou como seria provar de uma comida feita por Ruby. Não por Red, mas por Ruby. Confeitada nas mãos habilidosas da experiente garçonete. O pensamento soou tão absurdo em sua mente que o rosto externou genuíno estado de espanto consigo mesma.

O que estava pensando? Perdera o juízo? Ou os sonhos e noites mal dormidas finalmente conseguiram lhe tirar do raciocínio normal? Ruby era valia seus pensamentos. Não. Ela pegaria seu café e sairia daqui, no futuro evitando qualquer tipo de interação com a garçonete. Porque Ruby não era Red.

Ruby não era Red. E esse mesmo pensamento, Regina forçou a repetir inúmeras vezes em seu consciente, até que se fizesse entender. Ruby nunca seria Red.

E enquanto Regina se perdia observando os movimentos da garota por suas costas, os sonhos ganhavam força.


— Você precisa de mais alguma coisa? Eu vou caçar essa noite. – Red perguntou, sentada na longa mesa de mármore no novo Palácio de Snow.

Desde que Charming aparecera e, em seu tempo, convencera Snow a retomar seu reino por direito, tudo se resumia a sobrevivência e estratégias de batalha. Não que Red não estivesse acostumada ao sistema de sobrevivência, não. Ela estava em seu elemento natural entre as árvores, na adrenalina da auto dependência. Ela não se importava em estar de volta ao constante perigo e o fervoroso desejo de viver mais um dia. Isso a mantinha viva, ela pensava.

E as batalhas? Elas também não eram assim tão ruins. Libertar sua fera depois de tanto tempo contida, e fluir com seus desejos de batalha e violência – Era excitante para alguém híbrido como Red. Mas ela nunca admitiria isso. Não enquanto todos ainda se mantinham tão incertos quanto a ela.

Eles a temiam, por mais persistentes que fossem em esconder esse receio. Os súditos, os soldados, os anões - até mesmo Charming, em seus momentos - temiam Red. E era isso que ainda lhe tirava o sono. Ter a consciência de que sua presença entre eles abalava uma harmonia, uma fidelidade e lealdade. Ela se preocupava em ser a força que pudesse comprometer a fé que todos tinham em Snow.

Por que Snow não temia Red. Snow aceitava Red em sua totalidade. Ela abraçava todas as partes de Red, até mesmo as mais sombrias e primais, que a própria camponesa tinha problemas em aceitar. Mas Snow, com uma infinita bondade e incrível compaixão, compreendia Red. Não. Snow não entendia como era dividir o corpo com um animal sanguinário. Mas Snow compreendia o receio de Red. Compreendia a bondade gigantesca em Red. E por isso, nunca a temeu.

Sua confiança em Red era quase alarmante para aqueles ao redor, que só recentemente tiveram a infelicidade em aprender que a garota da capa vermelha escondia outra natureza sob o manto.

Os súditos de Snow não tinham a mesma fé em Red que aquela tinha. Mas Snow não aceitava julgamentos. Ela não perdoaria alguém que viesse a ferir Red em seu preconceito. E nessa intensa confiança, Red se sentia em casa.

Só ao redor de Snow aquele castelo conseguia se tornar aconchegante. Só sob a presença da Rainha que todos evitavam olhares mais tortos. Com Snow, Red aceitava-se pelo que era, encorajada a integrar-se com seus dois lados e viver sem flagelar-se tanto. Red era feliz com Snow.

Em troca de tamanha segurança e conforto, Red lhe oferecia o que quisesse. Dedicou sua inteira lealdade a ela, jurou-lhe a vida para lutar pelo seu reino e pela sua causa. Prometeu proteger o povo de Snow como se fosse seu, contanto que assim Snow quisesse.

Ela não se via como subordinada a Snow. Nem tanto a outra lhe pedia tal posicionamento. Mas, no fundo de si, tanto seu lobo quanto sua parte humana mais sã, entendia: Snow é uma grande amiga a quem Red deve muito. E ela faria de tudo para honrar sua amizade.

Snow sabia disso. E permitia, mesmo que em vezes alarmada pelo altruísmo e cego heroísmo de Red, que aquilo continuasse. Tanto era, em fato, que ela escolheu preservar sua amizade na sua maior pureza, sem contaminá-la por ilusões de poder. As duas se tratavam como sempre o fizeram. Como se aquele imenso palácio fosse sua pequena e humilde cabana na floresta.

— Oh, Red. – Snow riu. – De forma alguma. Não preciso de nada. Você sabe, esse Reino funciona com pessoas que fazem esse trabalho com o maior prazer. Não há por que você insistir em nos fornecer comida.

Red suspirou.

— Velhos hábitos. Eu vou caçar hoje, então pensei que pudesse precisar de algo? Todos concordam que minha caça é mais proveitosa do que de qualquer outro.

— Não estou duvidando. – Snow lhe mostrou um sorriso, retirando-se da posição debruçada sobre a sacada e voltando ao interior da sala. Ela lhe serviu uma taça de água de uma das várias jarras sobre uma mesa lateral. Ofereceu-a para Red, silenciosamente perguntando se gostaria de uma para si, mas a outra negou. Ela pôs a jarra de volta e tornou a andar em direção à grande mesa a qual Red sentava. – Eu seria a primeira pessoa a confirmar isso. Sua caça é excelente! – Agradou a amiga, tentando sentar-se à mesa junto a ela. Mas suas pernas eram menores do que as de Red e a mesa conseguia ser ridiculamente alta. Três desajeitadas tentativas depois, em que Snow tentara pular e sentar-se, Red entendeu que deveria ajudar. Pegou a amiga pela cintura, numa naturalidade impressionante, e, com um pequeno impulso, colocou Snow sentada ao seu lado. Ela riu do estado da amiga. O contraste entre seu comportamento descontraído com sua aparência de realeza no momento.

Snow agora usava um longo vestido branco, com uma calda quase penada, plumosa. As mangas bufantes eram controladas, mas o colar brilhante em esmeralda compensou a extravagância.

Mas sua vestimenta especial tinha um motivo.

Elas haviam acabado de voltar de um anúncio real, em que declaram ao povo a situação entre o Reino de Snow e as intenções sujas da Rainha Má. Com firmeza e integridade, Snow comunicou ao seu povo sua posição contra Regina, e explicou-lhes que buscaria por nada além de justiça. Encantados por seu espírito bondoso e puro, as pessoas do Reino lhe aplaudiram e reforçaram sua fé e lealdade a nova Rainha. Charming, como sempre, abraçou-lhe com carinho, reconhecendo o poder de sua esposa. Os anões sorriram para sua amiga e Red contentou-se em lhe lançar um olhar orgulhoso.

O Reino estava então preparado para um combate. Todos estavam de acordo com aqui, e entendiam que enfrentar a tirania de Regina era necessário, apesar dos claros riscos. Eles tinham fé em Snow. Como Red.

— Tem algo em sua mente? Você parece preocupada. – Snow mudou o assunto de repente, pegando Red desprevenida.

— Não exatamente. Wolfstime está no seu pico hoje e… na noite passada eu não consegui me livrar da impressão de que alguém estava me vigiando.

— Vigiando? – Snow largou sua taça ao seu lado, virando o tronco para dar completa atenção à amiga. – Como assim? Você estava caçando nos arredores do Reino?

— Não. Um pouco mais além. A floresta estava deserta, eu chequei antes de me transformar, mas… Eu não sei, durante minha corrida, eu sentia olhos sobre mim.

— Você acha que pode ser outro lobo? Ou uma alcateia? – A voz de Snow parecia feliz com a possibilidade. Ela entendia quão deslocada Red se sentia em sua condição especial, e secretamente ela desejava que a amiga encontrasse novamente um dos seus, para que não se sentisse mais sozinha. – Ou… a alcateia de Anita?

O assunto nunca era antigo demais. A ferida de Red sobre Anita ainda era fresca e ainda lhe perturbava, por mais que tentasse esconder. Mas Snow não precisava vê-la tão desolada novamente. Ela devia se manter forte. Não precisava preocupar Snow com um detalhe desses.

— Eu sei o que aconteceu, mas – Snow insistia, mas agora adotava um tom mais cuidadoso em tratar do assunto delicado que era Anita. – Você acha que é possível que o Alpha dele esteja atrás de você?

Red riu um riso seco.

— Snow. Teoricamente, eu sou o Alpha daquela alcateia. No sistema em que eles operam, eles devem lealdade a mim. – Por mais que mantivesse um rosto suave e amigável, Red se sentia horrível por dentro.

— Talvez eles queiram que você volte e assuma seu lugar como líder-

— Snow. – Red pediu, a voz mais fiel ao que realmente sentia: séria e pesada. – Eu sei o que você está tentando fazer, mas eu não acho que está funcionando como você espera. – Ela novamente fingiu um sorriso para amiga, tentando não magoá-la.

— Desculpe. – Snow abaixou o rosto, fitando as próprias mãos. – É que eu sinto que você está sozinha ultimamente. Eu só queria que você se sentisse melhor.

Sinceramente tocada pela intenção carinhosa se sua amiga, Red vira seu corpo para ela, pegando as mãos de Snow entre as suas sem hesitar.

— Eu entendo. E eu agradeço. Eu poderia ter ficado como a líder deles se quisesse. Mas não teria sido certo. Meu lugar é aqui, com você. – Dessa vez seu sorriso foi honesto. Simples, mas poderoso, iluminando o rosto de Snow.

— Você é tão carinhosa comigo. Eu só me preocupo em você sentir-se sozinha. Quer dizer, com essa nova função, tantas novas responsabilidades, a iminente guerra contra Regina, eu-. É sufocante. E está tirando do tempo que costumávamos passar juntas – Snow abraçou o braço que Red mantinha para segurar suas mãos. Ela aconchegou-se perto da amiga, sua cabeça deitada no ombro da amiga.

— Hey, não se preocupe. Eu entendo o que está em risco aqui. Eu sei que as coisas não são mais as mesas e que você carrega a vida de um povo em suas mãos. Não ache que me incomodo com isso. É tão caloroso ver você honrando seu lugar de direito, como alguém da realeza, um líder. Isso a faz feliz. É o seu lugar. Eu não poderia me incomodar com isso. – Red beijou o topo da cabeça de Snow, aproveitando para inspirar seu cheiro delicioso.

Ela cheirava ao inverno. Ao frio, às flores, ao bosque, ao verde. Sua essência carregava Red a sua casa de infância, na pequena cabana que dividia com Granny; Nos coelhos e pássaros que passavam por lá de tempos em tempos. Snow lhe recordava o melhor de sua terra. Snow era a natureza a qual Red pertencia.

— Obrigada, Red. – A menor soltou um suspiro longo e profundo, como se estivesse segurando o ar no seu pulmão há dias, insegura e temerosa. E então lhe soltando, livrando-se do recente sentimento de culpa que lhe atormentava ao pensar em Red. – Mas, então. Se não é um lobo a seguindo, o que você acha que seja? – Ela ergueu-se de volta, receosa de que Charming pudesse adentrar a qualquer momento. Por mais que o homem fosse nobre e compreensivo, seus olhares desconfiados na direção de Red se tornaram cada vez menos discretos. Talvez essa fosse a única coisa realmente diferente do seu tempo juntas na cabana.

Red forçava a si mesma a entender. Snow e Charming eram Amores Verdadeiros. Charming era um homem virtuoso e gentil. Ele tratava Snow com carinho, exatamente como ela merecia. Red não iria reclamar. Se Snow estava feliz, Red aceitaria as mudanças. Mesmo que, no fundo, ver sua amiga limitar a amizade para preservar qualquer outra coisa, bem – Isso a machucava um pouco.

Então Red limpou a garganta antes de continuar. Engolindo o que acabara de adentar sua mente.

— Eu não sei. Como disse, eu chequei a floresta. Estava segura, ninguém estava por lá. Também não senti nenhum cheiro desconhecido ou novo. O que é estranho, por que meus sentidos são sempre confiáveis. Eu- Isso me deixou frustrada! Será que estou imaginando coisas? – Snow sorriu ao ver Red ser tão honesta a respeito do assunto. Ela estava sinceramente irritada com o fato de não entender o que acontecia; de não poder confiar em seus sempre tão confiáveis sentidos. E essa irritação inocente lhe entreteve por um segundo.

— Se eu fosse você, não me preocuparia tanto. É a segunda noite da Wolfstime. Você está estressada e cansada da noite passada. – Red tentou interrompê-la para argumentar, mas Snow continuou, como se a respondendo. – Não tente disfarçar. Eu conseguia ouvir os seus rosnados frustrados do fim do corredor quando chegou nessa manhã. Você não é tão discreta assim, para uma caçadora. – Snow riu. Red corou-se ao ser descoberta.

— É frustrante! A sensação de ser espionada me desconcentrou. Eu não consegui caçar o coelho e ainda bati contra uma árvore. Qualquer um sairia rosnando. – Ela desviou o olhar, legitimamente constrangida, mas tentando justificar-se a cima de tudo.

— Qualquer um que pudesse. – Snow riu novamente, adorando o lado mais infantil e natural de Red, sem a postura de guardiã e soldado. Era essa a Red que a encantara, ainda que sua versão mais madura fosse igualmente atraente.

— O que isso quer dizer? – Red virou o rosto para Snow, um bico moldando seus lábios rosados. O cenho franzido em discordância.

E Snow riu outra vez. Mas tentou monitorar-se, pois entendia as volatidade e força das emoções de Red em noite de lua cheia. Ela não iria querer acidentalmente provocar a amiga. Em vez de continuar sua brincadeira, resolveu por beijar a bochecha da mais alta e pular da mesa, pondo-se de pé no chão.

— Nada. Eu não quis dizer nada. – Snow levou as mãos para trás de seu pescoço, desprendendo o pesado colar de esmeralda que já começara a irritar seu peito. Ela segurou-o em uma mão, enquanto a outra se estendia para recolher a taça de água da mesa, ao lado de Red. Esta, que não tirava os olhos dourados de si. – Mas, falando em rosnar, talvez você devesse ir andando. A lua está surgindo e eu sei como você fica inquieta quando não se transforma. – Snow sorriu, como se um assunto como esse fosse o mais natural que uma Rainha pudesse discutir.

— Ah, — Red suspirou, fechando os olhos, ordenando-os a voltar à cor natural; Ela podia senti-los queimando mais claros. – Você tem razão. Vou ver se consigo dissipar isso na caça de hoje. Eu me prometi compensar por ontem. – Ela sorriu, também descendo da mesa.

— Lembre-se que, mesmo se não conseguir nada, ninguém vai morrer de fome. – Snow fez graça, apontando para o grande e luxuoso salão de jantar, que só esperava por uma ordem para ser recheado por um longo banquete.

Red solto o riso junto do deboche, fitando Snow com olhos teimosos.

— Vou tentar lembrar isso enquanto persigo um veado. E tento não derrubar uma árvore com a cabeça. – Ela se aproximou de Snow para dar-lhe um breve abraço de despedida. O carinho tornou-se costume antes de Red sair floresta adentro. Como se uma garantia de que ela fosse voltar ilesa.

— E não se preocupe com "ser vigiada". É provavelmente a Blue Fairy esperando alguém desejar em uma estrela. – Snow aconselhou, partindo o abraço com imediato sentimento de saudade.

— Ou uma coruja. – Red retrucou. Ela odiava corujas.

Snow riu.

— Ou uma coruja.