Implacável. Inatingível. Imprevisível.
Não deu nem tempo para se virar para ver o que era e se proteger. Aliás, não pôde nem ao menos sentir o que o perseguia quando foi atingido.
O golpe, tão bruto, não apenas o derrubou, como também o mergulhou num torpor semi-consciente. Era incapaz de dizer se a queda livre sob a qual estava submetido era real ou não. Apenas caía, caía, caía...
E então vieram. Imagens, palavras, sons, gritos, risos, choros. Rodopiavam na frente de seus olhos de modo distorcido por causa dos giros. Às vezes conseguia captar e identificar algum ou outro e associá-lo a um momento de seu passado. Depois de algum tempo – ou talvez nada, visto que sua noção sobre esse aspecto havia sido destruída –, começou a notar um padrão.
E isso, num pensamento magoado e frustrado, o fez querer não sair dali. Que não deveria sair.
Quando lhe disseram que dinheiro não trazia felicidade, não acreditara. Agora, no auge da carreira, cercado pelo que desejava e um pouco mais além, compreendia com uma perfeição que chegava a incomodar. Era a encarnação daquela premissa.
As memórias mostravam as pessoas que fizeram parte de sua vida, mas, na maioria, uma única pessoa se destacava. E a impressão que tinha era que as cenas foram escolhidas meticulosamente para destruí-lo até as cinzas. Brigas, gritos, choros. Também mostravam detalhes que achava nunca ter notado, como sempre diziam que era lhe característico: mãos, cabelos, rosto, sorriso, um gesto, um olhar, um corpo.
E o arrependimento acima de tudo. Uma dor impactante que lhe perfurou e provocou mais estragos do que o golpe propriamente dito.
Agora via seus erros, apontados por alguns, rejeitados fervorosamente por si. Via o que causara, os estragos que deixara, os caminhos que percorrera e que deixara inacabados, abandonados. As cenas continuavam passando, seguindo mais nenhum outro padrão além do já observado.
Então, mais uma onda clareadora.
Também lhe disseram que, quando um ser humano assistia a sua vida daquele jeito e pensava sobre ela, era porque o momento de sua morte estava chegando.
No mísero milissegundo após essa constatação, decidiu, numa firmeza que o assustaria se não estivesse naquela situação, que seria melhor assim, morrer. Seria uma retaliação por seus enganos, sua redenção, seu escape final. Mas não iria amargurado, iria tranquilo, feliz, em busca da paz que achava que atingiria ao ver que finalmente estaria aliviando aquelas pessoa.
E tudo que precisava para essa passagem entre a vida e a morte encontrava-se congelado a sua frente.
Os olhos dela.
NA: Mas da onde veio isso?! Acho que já era de uma vontade, uma ideia que existia lá no fundo... Aí de repente veio aquela inspiração e resultou nisso. Vamos ver até onde vai.
Sinceramente, ainda espero que tenham gostado :)
Até breve!
