Bucky saiu da água carregando um corpo. Ele carregava Steve desacordado. Quando já estava longe da água, se deu ao luxo de sentar um pouco. Estava cansado, machucado, não só por fora mas também por dentro. A briga dentro da aeronave tinha sido pior do que poderia imaginar. Estava lá com um propósito, mas não o cumpriu, pelo simples fato de que não podia. Não entendia o real motivo, sua mente estava confusa, sempre que fechava os olhos via fragmentos de momentos, todos eles com o homem desacordado ao seu lado. Aquilo estava mexendo com ele, no fundo sabia que o conhecia, e isso ocasionou em mais momentos de tortura, com aqueles desgraçados da Hydra mexendo com sua mente. Mas mesmo assim não tinha sido suficiente, a ligação com aquele homem era forte demais, não era fácil remover todas aquelas lembranças. Não sabia da existência delas, até ver aquele homem parado em sua frente, naquela rodovia, o chamando de Bucky.

Tudo parecia desmoronar, mas ele tinha uma missão, e tinha que cumpri-la. Mas dentro daquela aeronave, isso foi impossível. A cada palavra que o loiro dizia, mais imagens vinham a sua cabeça, imagens de guerra, imagens de Steve. Tudo pareceu ir por água a baixo quando Steve largou o escudo e disse que não lutaria com ele, mas ele continuou, por instinto do soldado que ele havia se tornado, mas estava se tornando cada vez mais difícil se convencer de que estava ali porque devia matá-lo.

"Cause I'm with you til the end of the line"

Parecia que uma bomba tinha explodido em sua mente, todas aquelas imagens em sua cabeça começaram a passar diversas vezes, como um filme, e assim ele não teve mais forças para continuar a fazer aquilo. A chão da aeronave cedeu e Steve caiu, e com isso mais lembranças invadiram sua mente. Lembranças dele criança se divertindo ao lado daquele que parecia ser Steve mais novo. Ele afastou a lembrança de sua mente e caiu da aeronave também, parando aonde estava nesse exato momento, sentado na beira de toda aquela imensidão de água ao lado de Steve. Se permitiu sorrir por um tempo quando aquele pensamento de estar ao lado dele lhe soou tão familiar. Mas sabia que não poderia ficar ali, não sabia o que poderia acontecer se aquele homem acordasse e o encontrasse ali. Não conseguiria encará-lo, não depois de ter fracassado, não depois de estar se sentindo tão confuso, não depois de perceber que não conseguiria ir embora caso aquele o pedisse para ficar. Se levantou, sentido seu corpo inteiro doer, sinais da briga na aeronave. Se agachou somente para se certificar de que o loiro estava realmente vivo, feito isso, se virou e foi embora.

Ficou andando por um longo tempo, até que ao adentrar no meio de uma mata encontrou uma casa aparentemente abandonada. Olhou pelas janelas, certificando-se de que estava vazia e entrou. Estava tudo uma bagunça, cadeiras pelo chão, pratos e copos quebrados, coisas espalhadas por todos os cantos, aparecia que tinha passado um furacão por ali. Ele atravessou a sala, deu uma olhada nos outros cômodos e foi de encontro a escada que levava até os quartos. Entrando em um dos quartos, viu que estava no mesmo estado que os outros cômodos, tudo revirado, roupas espalhadas pelo quarto, os aparelhos pelo chão, a cama totalmente desfeita. Ignorando totalmente toda a bagunça, se sentou na beirada da cama. Ficou encarando o ambiente. Engraçado como a bagunça daquele quarto podia se comparar a bagunça da sua mente, tudo revirado, coisas por todos os cantos, e quanto mais ia andando, mais coisas se encontrava. Suspirou exausto. Se sentia tão cansado. Só agora podia parar e ver tudo o que tinha feito, o mal que havia causado, se sentia mal, sujo, sentia um gosto amargo na boca, um peso nas costas ao se lembrar de cada pessoa que havia matado. Não queria ter feito aquilo. Jamais.

Agora refletindo, não gostava do que estava vendo, não gostava do que havia se tornado. Tudo estava tão errado, tudo machucava de uma forma tão grande. Mas nada se comparava a dor ao se lembrar do olhar de tristeza que Steve lhe lançou naquela rodovia, quando chamava por seu nome, e se deparava com a verdade de que todo aquele caos havia sido feito por ele. Por Bucky, seu melhor amigo. Sua cabeça começou a doer com todas aquelas lembranças. Queria pará-las, mas não conseguia, elas continuavam vindo, mais forte, mais nítidas. Ele se ajeitou naquela cama, deitando por cima de tudo que se encontrava nela, se permitiu relaxar, e foi vencido pelo cansaço.

Nisso as lembranças voltaram em forma de sonho, lembranças de um bar, os dois sentados um ao lado do outro rindo, lembranças de uma despedida seguida de um abraço, lembranças da época de escola, lembranças dele pendurado com um abismo abaixo de seus pés, Steve tentando a todo custo segurar sua mão, logo depois dele caindo, e Steve ficando distante, até tudo se apagar e ele acordar.

Ele suava frio, sua cabeça latejava ainda mais, estava ofegante, seu coração estava acelerado, essa última lembrança tinha sido forte demais, sua mente dava voltas, ele achou que ia vomitar. Se levantou e caminhou até a janela, e com certa dificuldade, pois esta estava emperrada, abriu-a deixando o vento bater em seu rosto e assim, podendo respirar com mais facilidade. Seu coração foi voltando ao ritmo, assim como sua respiração, e se viu podendo voltar para cama e em pouco tempo já estava dormindo novamente.

Acordou horas depois com o forte vento invadindo o quarto e com barulhos vindos do andar debaixo. Num salto, se levantou e foi em direção a porta. Desceu a escada com cautela e ficou estático quando viu a figura de Steve de costas, vasculhando a sala revirada. Quando Steve se virou e pode ver Bucky no alto da escada seu coração falhou algumas batidas. Sua aparência estava horrível, seus machucados expostos e inflamados, seu braço mecânico estava um tanto danificado, o que provavelmente estava sendo um incomodo.

-Bucky? -Steve ficou olhando a expressão confusa do moreno mudar para uma totalmente séria e psicótica.

-Quem diabos é Bucky?

-Você é o Bucky. Por favor, eu sei que você se lembra. Você é meu amigo.

-Não sou seu amigo, e não chegue perto de mim.

Steve ignorou o pedido de Bucky e continuou se aproximando. Bucky então resolveu agir e partiu para cima do loiro, lhe acertando um soco certeiro no rosto. Steve ficou um tanto desacreditado que Bucky começaria uma briga novamente, mas não teve muito tempo para pensar pois Bucky voltou a tentar acertá-lo. Steve dessa vez conseguiu se esquivar dos golpes do moreno. Ficaram alguns minutos nisso. Bucky tanto acertar Steve, e o loiro apenas se esquivando dos golpes. Bucky conseguiu acertar o rosto e a perna de Steve algumas vezes, mas não viu motivos para continuar vendo que Steve não havia revidado nenhum de seus golpes. Bucky parou a quatro degraus de distância do loiro e continuou a encará-lo.

-Bucky, por favor, eu sei que você se lembra, se não, porque teria me deixado vivo? -Steve voltou a se aproximar, parando dois degraus abaixo de Bucky, que matinha a mesma expressão séria, mas agora com um pequeno vestígio de confusão. -Olhe pra mim, você se lembra!

Bucky começou a refletir. Quem queria enganar, claro que se lembrava, se não, por qual outro motivo deixaria o loiro vivo? Por pena? Não, ele tinha aprendido a não ter pena de ninguém, pois ele mesmo não gostava que sentiam pena de si. Misericórdia? Não, para ele na vida não existe isso de ter misericórdia. Não havia outro motivo, a não ser que ele realmente se lembrava, e Steve não era idiota para não notar isso.

-Eu não sei do que me lembro, isso está... tão confuso, por favor não me toque. Não chegue perto, não quero te atacar novamente. -Ele começou a se afastar de Steve, mas o loiro continuava se aproximando, até que chegaram no topo da escada e Bucky parou, com Steve a sua frente. Eles ficaram se encarando, Steve com um sentimento de medo, medo de perder o moreno mais uma vez. Bucky com medo de machucar o loiro. Não queria fazer mau a ele.

-Você não vai me machucar Bucky, você não faria isso. Eu confio em você!

-Como não faria? Eu acabei de atacar você, além de que eu quase matei você a horas atrás. Como eu não poderia tentar isso novamente?

-Porque antes você estava confuso, você continua confuso, só que mais convicto do que está se lembrando, e como eu já disse, porque confio em você!

-Isso é uma das coisas que me lembro, você sempre procura o lado bom das pessoas, mesmo que elas não tenham.

Steve não evitou de sorrir quando ouviu tais palavras vindas do moreno, aquilo tinha sido uma confirmação, ele se lembrava. Não sabia ao certo do que ele se lembrava, mas isso era o bastante. Steve tentou se aproximar mais um pouco, porém viu o quanto Bucky ficou receoso com isso, e se afastou um pouco.

-Eu realmente acredito que você não vá fazer nada, mas eu te respeito. -Bucky abriu um sorriso tímido para o loiro, em retribuição a confiança. Se sentia melhor com ele confiando tanto em sua pessoa.

-Steve? Como vai ser? Eu fiz muita coisa ruim, eles virão atrás de mim.

-Bucky, eu sei, mas você não tinha noção do que estava fazendo, eles mexeram demais com em sua mente, você estava fora de si. Mexer com a mente das pessoas dessa forma nunca é bom, chega uma hora que você não tem mais controle. Foi isso que aconteceu com você, não se culpe tanto, e aliás, nada vai te acontecer, eu estou aqui. Até o fim da linha, lembra?

-Me lembro vagamente.

-Isso já é um começo