Título: Sob a sombra do mais silencioso carvalho

Autora: Kikis

Beta: Kikyou Priestess (aka Lally)

Par principal: Harry/Draco

Avisos: Slash, universo alternativo.

Disclaimer: Harry Potter e seus personagens não me pertencem e infelizmente nunca vão pertencer, não ganho nenhum dinheiro com isso, apenas algumas horas de diversão :D

Sumário: Harry acorda em uma casa no meio de uma floresta. Sem memória, sem marcas, apenas na companhia de um velho professor, um menino solitário, um lago, um carvalho sem pássaros e uma escolha.


Para Delamort


Estava nevando.

Era algo comum nas últimas semanas. Quando acordava, via os flocos brancos no batente de sua janela. O vento soprava continuamente, tornando o vidro frio demais para escorregar seus dedos sobre ele. Sempre gostara do inverno, principalmente da neve e sua solidão calma, uma tranqüilidade devastadora. Passava horas sentado em frente à janela, observando até que suas pernas começassem a formigar.

E era isso que fazia aquela noite. Observava a paisagem pela fresta da cortina, dessa vez, deitado em sua cama e coberto pelo edredom. Todos já estavam dormindo fazia algum tempo e sentia necessidade de ouvir alguma coisa, qualquer conversa boba ou música. Suspirou, quase agoniado quando o único som que seus ouvidos captaram foi o ronco do seu companheiro de quarto. Mais cedo,escutara duas garotas tagarelarem sobre como se divertiriam no feriado. E ele ficou lá, ouvindo, mantendo um sorriso educado em seus lábios.

Ele iria ficar lá, como sempre. Certas coisas nunca mudavam, assim como a neve. Já devia ter se acostumado.

Olhou o relógio que ficava do outro lado do cômodo. Dali a três horas todos seriam acordados, inclusive ele. Ajustou os óculos no rosto e viu os minutos passarem por um tempo, depois, virou-se para a janela de novo.

As luzes da cidade pareciam um pouco mais brilhantes do que de costume, seus olhos ardiam ligeiramente. As pálpebras fecharam-se e, devagar, os roncos suaves da pessoa do leito ao lado foram encobertos pelo seu próprio entorpecimento. De repente, não sentia mais nada, apenas a lembrança dos flocos sendo iluminados pelos postes na rua mantinha-se viva.

Algumas vozes para depois se instaurar o completo silêncio. Às vezes acordava, mas ficava com os olhos fechados. Além de sua cama ser muito macia e quente, tinha preguiça de levantar. Então, sempre decidia dormir mais um pouco, até que teve um momento que não conseguia mais fechar os olhos, tampouco ignorar o gosto enjoado em sua boca. Sentou-se.

A primeira coisa que notou foi a ausência de seus óculos. Bom, nada mais natural se não quisessem que fossem esmagados durante seu sono. Tateou o ar ao seu lado, esperando encontrar uma mesinha, mas não encontrou nada. Após alguns minutos de insistência, suspirou frustrado e tentou apertar as pálpebras para ver se melhorava a vista. Nada significante.

- Olá? – Perguntou.

Nenhuma resposta.

A esta altura do campeonato, suas mãos já agarravam o cobertor com nervosismo e olhava freneticamente para um lado e para o outro. De vez em quando, ousava chamar por alguém, mesmo que sua voz falhasse ou estivesse trêmula. Respirou fundo. Não era seu quarto. Não havia Neville falando ou Lavander entrando toda hora enquanto mostrava seus presentes. Não havia a janela do seu lado direito.

Pânico. Suas palmas começaram a suar.

- Oi?! – Tentou de novo.

Quase pulou da cama quando uma mão pousou em seu ombro. Tentou desviar-se, contudo, o aperto dos dedos tornou-se mais forte.

- Se você quiser ter seus óculos de volta, garoto, acho bom não tentar nada violento contra mim.

O rapaz congelou.o dono da voz profunda pareceu dar uma risada baixa com malícia e em instantes, seus óculos foi colocado em sua face.

Assim que seu mundo entrou em foco, piscou algumas vezes e foi se virar, mas o dono da voz não libertou seu ombro, ao contrário, infelizmente.

- Qual é seu nome?

Nome. Sua mente ficou em branco por alguns segundos. Era muito estúpido esquecer algo como o nome, mas por mais incrível que pudesse parecer, esse pensamento ainda não tinha passado por sua cabeça, como se fosse irrelevante. Cerrou os olhos e abriu os lábios para responder, mas ao invés de palavras, saíram apenas grunhidos incompreensíveis.

- Isso é para aprender a não gritar na minha casa. – Respondeu o homem, seco. – Água, tome. – Falou enquanto colocava um copo entre as mãos do garoto.

Bebeu apenas um gole, fazendo uma careta quando sentiu um ligeiro enjôo. Seu estômago devia estar miseravelmente vazio. Procurou ao redor algum relógio ou calendário para saber quanto tinha dormido, mas não encontrou nada. Apenas alguns quadros velhos nas paredes do que parecia ser um chalé. Havia uma janela e outra cama ao seu lado, vazia, com os cobertores embolados no final e a fronha amassada. Franziu o cenho.

- Seu nome? – Perguntou o homem novamente, dessa vez com impaciência.

- Harry... Harry James Potter. – Saiu de sua boca quase automaticamente.

- Sr. Potter, então. O que você estava fazendo antes de acordar aqui?

Harry respirou para responder, as palavras estavam na ponta de sua língua. É claro, ele estava... De repente, não havia nada. Nenhuma palavra, nenhuma lembrança, só um torpor estranho, uma nuvem. Balançou a cabeça em confusão.

- Não sei. Eu... não sei...

- Tente se lembrar.

Neve. Havia uma janela e neve caindo, iluminada pela luz de um poste. Um quarto e roncos.

- Neve, roncos e luzes... Algumas vozes. Só, eu acho. Por quê? O que aconteceu? Por que não consigo me lembrar de nada? Quem é você?

O homem soltou seu ombro e então pôde se virar, encarando-o. Sua respiração ficou presta enquanto observava o sujeito que havia dado água para umedecer sua garganta. Não era uma figura convidativa.

Seu primeiro pensamento foi que ele devia ser alto demais quando em pé. Seu cabelo era negro e parecia ser um pouco... pegajoso, como se não o lavasse há um tempo. O nariz era longo demais, os dentes um pouco amarelados. Tinha os dedos longos e impacientes enquanto segurava o copo vazio, possuía também um par de olhos cor de ébano quase aterrorizante. Engoliu em seco, porém, foi interrompido antes que pudesse falar.

- Quantos anos você tem, Sr. Potter?

- Dezesseis.

- Mais uma criança idiota. – Revirou os olhos, exasperado – Pelo menos tente ser útil.

Harry abriu e fechou a boca antes de balançar a cabeça, cerrando os olhos. Respirou fundo, um estranho zunido em seus ouvidos.

- Onde eu estou?

- Na minha casa. – Replicou o outro simplesmente, em tom sóbrio – Eu te achei desmaiado perto daqui e trouxe-o para cá. Você dormiu por muito tempo, uns três dias.

- Três... dias? – Murmurou, a voz fraca.

Por três malditos dias estivera na casa daquele sujeito. O zunido em seus ouvidos se intensificava, chegando quase a ser insuportável. Passou sua mão pela face e grunhiu. Tudo estava muito confuso, misturado. Podia não se recordar de muita coisa, mas sabia que nunca estivera naquele lugar antes. Remexeu-se, um tanto incomodado. Encarou novamente o homem e decidiu que ele merecia pelo menos seu respeito, afinal, havia o abrigado em sua casa quando inconsciente.

- Como cheguei aqui? Quanto tempo...? Como, senhor...?

- Não sei, Sr. Potter. Quando o achei, largado, no meio da floresta, estava em condições bem precárias. Ah, é professor Snape. – Harry ergueu as sobrancelhas quando ouviu o título, o que rendeu um sorriso malicioso do 'professor' – Sim, eu já fui professor, por mais incrível que este fato seja para sua pessoa. Ainda consegue falar?

- Sim... Professor. – E então ficou sem reação quando seus óculos foram tirados dele outra vez. O quadro que observava tornou-se um borrão azul e verde com alguns pontinhos amarelos.

- Muito bem. – Disse Snape ao se levantar abruptamente – Deve estar sentindo uma tontura leve. Isso é resultado do esforço em recuperar suas recordações logo depois de acordar. Não vai conseguir ficar acordado muito tempo.

Snape andou até a porta do quarto, sendo seguido pelo par de olhos verdes confusos. Parou ao lado da porta, seus dedos envolveram o batente e sorriu, tão desagradável quanto das outras vezes em que mostrava seus dentes.

- Durma, Sr. Potter. Por hora, vou deixar com que abuse de minha hospitalidade. Vai se sentir melhor quando acordar novamente.

Harry não conseguiu responder, sua cabeça latejava e suas pálpebras pareceram ficar pesadas demais. Contudo, isso não impediu pensamentos de correrem em sua cabeça. Cerrou a mão nos cobertores enquanto deitava-se novamente, a cadência de sua respiração diminuía vagarosamente. O cansaço quase sobrepôs sua preocupação que corroia o peito. Aquilo não estava certo. Num segundo, estava olhando a neve naquele outro lugar e depois, encontrava-se na casa de um completo estranho que não devia lavar o cabelo há um bom tempo.

Perguntou a si mesmo se naquele lugar não haveria muita água. Seu rosto contorceu-se em uma careta. Por mais que não se lembrasse, sabia que gostava bastante de água e banhos, assim como sabia seu nome e idade. Sorriu fracamente, nada em sua cabeça fazia mais sentido. A última frase que passou em seu cérebro antes de cair no sono completamente foi 'Como eu cheguei aqui?'.


- Neville? – Perguntou ainda meio grogue ao ouvir o som de passos. Ninguém respondeu. Resmungou alguma coisa e voltou a dormir.

Quando seus olhos se abriram de novo, o quarto encontrava-se em quase completa escuridão. Seu pulso acelerou e então acalmou-se alguns segundos depois quando reconheceu onde estava. A casa, o professor, suas memórias que haviam evaporado. Por força do hábito, tateou ao lado do leito para achar os óculos e para sua surpresa, achou. Não se lembrava de ter uma mesinha ao seu lado antes.

Ao colocar os óculos, viu que era apenas um banquinho.

Jogou os cobertores para o lado, mas congelou. Na cama ao lado, havia um tufo de cabelos claros – pelo que conseguia enxergar – aparecendo na ponta da manta, que subia e descia devagar. Hesitou um pouco antes de andar, temendo que o barulho do assoalho fosse acordar quem quer que fosse que ficava no quarto também. Devagar, colocou um pé no chão e caminhou até a porta. Rezou silenciosamente para que ela não estivesse trancada e deixou um suspiro aliviado sair quando ela abriu sem problemas.

Estava em um corredor que não era muito diferente do quarto. Feito de madeira, mas sem quadros. Caminhou pelo espaço curto e encontrou uma sala. Um pequeno sofá estava encostado na parede, na frente do móvel havia uma espécie de lareira, ao lado algumas cadeiras e uma janela. Andou até a janela e abriu as cortinas.

O céu não tinha lua, nem estrelas, apesar de estar sem nuvens. Devia estar perto de uma cidade, sabia que no lugar em que vivia também não conseguia ver muitos pontos no céu, e de certa forma aquilo o deprimia.

Havia algumas árvores ao redor, ainda com folhas verdes, mas sem flores ou frutos, como no final de verão.

- Ora, ora... Não sei de onde você vem, Sr. Potter. Mas eu garanto que não é educado sair pela casa dos outros se não foi convidado. – Disse uma voz atrás de si.

Harry virou-se num salto, seu corpo apoiando-se contra o vidro. Alguma coisa nessa situação fez com que Snape rir baixinho para então se aproximar, os seus olhos negros semi-cerrados.

- O que foi, ficou mudo? A perda de memória o fez esquecer as palavras?

- Não. – Respondeu.

- 'Não, senhor' ou 'Não, professor', garoto impertinente. Essa é a minha casa. Depois de resgatá-lo, o mínimo que você poderia fazer é me respeitar.

O garoto sentiu algo dentro de seu peito, borbulhando. Trincou os dentes e cerrou os punhos, levantando os olhos parar encarar o homem. Nada daquilo era justo. Queria sua casa... suas coisas, por mais que não lembrassem o que elas eram, sabia que eram importantes. Conseguia ver vislumbres de algumas faces, do que provavelmente era seu quarto.

- Eu nunca pedi para ser salvo, professor.

- Oh, é mesmo? Acho que você não estava em condições de reclamar. Ou preferiria acordar no meio da floresta e ficar vagando?

Harry sentiu suas bochechas esquentarem e sua cabeça começou a doer novamente.

- Por que eu pararia em uma floresta, professor? – Perguntou, tremendo. – Você pode ter me raptado para sei lá, trabalho escravo, pegar meus órgãos depois que eu melhorar para poder fazer transplante ilegal! Qualquer coisa. Isso tem que ser um sonho... Não é possível! – Exclamou, então, cerrou os olhos com força.

Snape ficou parado, olhando para o rapaz com uma expressão estranha no rosto. Cruzou os braços. Talvez devesse ter dado calmantes para o garoto, a falta de sono tinha afetado mais o seu cérebro do que havia imaginado.

- O que está fazendo? Tentando espremer suas pálpebras?

Harry abriu um dos olhos e mordeu o lábio inferior.

- O que foi agora, garoto? Tenho cara de idiota?

- Você não sumiu. – Respondeu, parecendo miserável, a dor de cabeça parecia quase esmagar seu crânio.

- Claro que não sumi! – Retorquiu ofendido. – Por que eu iria sumir? E é professor ou senhor, eu já te disse!

O garoto abriu e fechou a boca algumas vezes, sem encontrar uma resposta convincente. Respirou fundo e seus ombros tombaram.

- Sempre quando tenho sonhos, se aperto as pálpebras, acabo acordando. Pelo menos eu acho que faço isso. Professor. – Adicionou rapidamente quando viu o homem estalar os dedos de uma das mãos.

- Convencido de que não é um sonho agora? Depois de todo esse show de estupidez, acho que devia pelo menos descansar, se é que não acordou Draco com toda essa gritaria, Sr. Potter.

Harry franziu o cenho.

- Draco?

- O garoto que estava dormindo no seu quarto, Sr. Potter. Será que não é óbvio? Volte para a cama, mal consegue ficar em pé. – Apontou impacientemente para o corredor.

O menino estava quase se arrastando para andar. Sua explosão havia gastado muita energia, o mundo girava novamente e sua cabeça latejava tanto que era difícil pensar em qualquer coisa. Com muito esforço, alcançou o quarto. O garoto do tufo de cabelos claros estava sentando em sua cama, observando-o com curiosidade.

- Volte a dormir, Draco. – Falou Snape enquanto deitava-se.

- O que aconteceu, Severus? – Perguntou o loiro ao esfregar um dos olhos.

- Nervosismo por causa da perda de memória. Ele não consegue entender como chegou aqui.

- Ele ainda não-

- Não. – Cortou secamente. – Ninguém vai falar, entendeu? Foi esse o trato.

Uma risada rouca. O loiro ria, os ombros balançavam e cabeça pendia para o lado. Ele limpou o canto dos olhos.

- Trato. Desde quando você obedece a tratos, Snape?

O homem levantou-se, a princípio ignorando Draco. Harry estava quase dormindo quando ouviu a voz grave novamente.

- Uma palavra, Sr. Malfoy, e você sabe muito bem o que vai acontecer. Eu só preciso de uma palavra.

O moreno abriu os olhos e encontrou o outro garoto mirando a porta com uma expressão pensativa. Dessa vez, a última coisa que viu antes de ser vencido pela exaustão foi um par de olhos brilhantes na escuridão.


Quando Harry acordou, a outra cama estava vazia e a havia um bilhete no banquinho, pedindo para ir a cozinha assim que despertasse e que havia roupas limpas no armário ao seu lado. Trocou-se vagarosamente, tinha a impressão de que o vestuário de lá não era tão diferente do que usava antes de perder a memória. Um jeans, camiseta de algodão de manga comprida com e um casaco fino.

Caminhou até a cozinha e viu Snape tomando seu chá confortavelmente, com um dos cotovelos apoiados na mesa circular no meio do recinto. Seus músculos ficaram tensos, os últimos encontros com o homem não haviam sido exatamente agradáveis, aliás, muito longe disso. Ficou lá, perto da porta, até que fosse notado. Não demorou muito.

- Ah, você está ai, Sr. Potter. – Bebeu um pouco do chá – Sente-se.

O moreno sentou-se do outro lado da mesa e encarou seus joelhos, cerrando dos dedos na cadeira.

- Está se sentindo melhor? – Perguntou casualmente.

- Sim, professor. – Respondeu sem levantar seus olhos.

- Interessante. – Pareceu tomar outro gole, mas Harry não ousava certificar-se – O senhor estava um tanto valente na noite passada... Aconteceu alguma coisa? – Questionou cinicamente, sem réplica. – Não importa. Precisamos conversar sobre sua... Estadia.

Por mais estúpido que parecesse ser, o pensamento de que iria ter que ficar na casa de Snape ainda não passara por sua cabeça aquele momento. Seu estômago afundou e finalmente levantou o rosto surpreso. Certamente não tinha nenhum lugar para ir. Ou o professor poderia ter deixado-o em algum hospital ou coisa assim. Remexeu-se desconfortavelmente em sua cadeira.

- Já que vai ficar aqui por tempo indeterminad-

- Interminado? – Cortou Harry.

O homem revirou os olhos, gesticulando impaciente com a mão.

- Sim, até você recuperar sua memória, pelo menos.

- Não seria melhor se eu ficasse em um hospital ou algo assim?

Snape sorriu divertido e ergueu sua xícara até ficar um pouco abaixo de seus olhos. Balançou a cabeça enquanto fazia 'tsc, tsc'.

- Eu garanto, Sr. Potter, que não há nenhum hospital próximo daqui. O único jeito de sair desse lugar é se lembrando de quem você é. Até lá, vai ficar aqui.

- Onde é 'aqui', senhor? – Perguntou, estreitando os olhos. – Eu... Eu morava na Inglaterra, eu acho, mas não reconheço essa paisagem.

- Sr. Potter, – Disse ao levantar-se – curiosamente, eu também vivi na Inglaterra muito tempo, viajei o país inteiro. Não há nenhum lugar em terras inglesas que se pareça com isso daqui. A paisagem lembra muito mais a Nova Zelândia e nós não também não estamos lá. – O garoto ia abrir a boca, mas o homem interrompeu-o – Eu não posso falar onde é esse lugar.

- Como assim...?! Eu tenho direito de saber! Como vim parar aqui? Que eu saiba as pessoas não surgem num lugar do nada!

- É melhor rever seus conceitos, Sr. Potter. Já que está bom o bastante para sair gritando pela minha casa de novo, vai começar a fazer suas tarefas. Afinal, estará morando aqui também ou prefere ficar vagando pela floresta? – Sorriu – Achei que não. As regras são as seguintes, Sr. Potter: nada de gritarias, você vai limpar seu quarto, tirar o pó, varrer o chão duas vezes por semana. É responsável por sua própria roupa de cama, tudo que você precisa está no armário em que pegou os vestuários, se faltar algo, avise. Sem perguntas, entendeu? Não interessa onde eu arranjei tudo isso. Quem cozinha normalmente sou eu, então você lava a louça do almoço. Você faz seu próprio café da manhã. Tudo que sujar no café, limpa. Se não souber cozinhar e quiser que eu faça para você, vai ter que lavar minha louça do café também. Uma vez por semana vai ajudar na limpeza da casa inteira. É proibido entrar no meu quarto sem minha permissão. Você pode sair quando quiser, só não aconselharia tentar caminhar de noite, é muito fácil de se perder na floresta. Estou esquecendo algo? Ah sim, há um banheiro no final do corredor de seu quarto, deixe sua roupa usada no cesto quando for tomar banho. Alguma dúvida?

Harry ainda estava um pouco tonto com todo esse ataque de palavras. Piscou algumas vezes e meneou a cabeça.

- Bom. Todas as panelas estão no armário, embaixo da pia. Temos uma geladeira bem abastecida. Eu já terminei meu café, sabe cozinhar?

- Sim, senhor. – Murmurou.

- Ótimo. Estou no meu quarto, que é em frente ao seu. Bata na porta duas vezes se precisar de algo e só entre se ouvir minha voz dando permissão. Até o almoço. – E saiu.

Harry ficou estático por alguns minutos até seus membros recuperarem o movimento. Demorou um pouco até achar tudo que precisava: ovos, leite, pão, sal e óleo, além de uma frigideira. Ovos fritos. Era um pouco frustrante lembrar-se de como fazia ovo frito e não de quem era. Quando estava sentado comendo seus dois ovos teve a impressão que não comia aquilo há muito tempo, o que era estranho.

Suspirou, empurrando o prato e o copo de leite vazio para o lado e deitou a cabeça na mesa. Ainda estava cansado. Havia uma janela logo em frente à pia, pelo menos enquanto lavava a louça podia olhar as árvores. Ao mesmo tempo em que seus dedos cheios de sabão trabalhavam, seus olhos passeavam pela paisagem. Seu palpite sobre estarem no final de verão estava certo. Decidiu explorar os arredores quando terminasse.

Sem enxugar as mãos, caminhou para o quarto, mas para sua surpresa achou uma tabela perto do corredor. Chegou mais perto e pôde ler 'Potter' escrito em letra garranchada. Em cima podia ler 'Divisão de tarefas', o professor devia ser bem metódico para fazer uma tabela para aquilo. Fez uma careta ao ver o número de vezes em que aparecia.

De repente, seu dedo parou num nome que não era 'Potter' ou 'Snape'. Estava escrito: 'Malfoy' em letra caprichada com o m e y floreados. A imagem da segunda noite, do tufo de cabelos claros e dos olhos cinzentos surgiu no fundo de sua mente. Aquele era o outro morador.

Sentia-se um pouco melhor ao saber que alguém mais ou menos de sua idade – pelo que se lembrava – vivia lá, já Snape não era exatamente a melhor companhia. Esperou um pouco ansioso para conhecer a terceira figura da casa.

Já tinahm se passado quatro dias e nada do outro garoto. Sempre quando acordava a outra cama estava vazia e às vezes, bem tarde da noite, ouvia passos no quarto, mas estava cansado demais para despertar. Então, voltava a dormir como se nada tivesse acontecido, teria um dia razoavelmente ocupado no dia seguinte.

Estranhamente, começara a nutrir uma antipatia pelo outro morador, já que tinha que fazer bem menos tarefas que ele. Snape até entendia que não participasse muito da 'manutenção' da casa, mas o professor nunca havia mencionado que a casa tinha mais que um dono e o menino não parecia ser seu parente – não tinham o mesmo sobrenome e pelo pouco que se recordava, os dois não eram nem um pouco parecidos fisicamente. E ele, Harry, tinha acabado de chegar.

Snape se aborrecia profundamente quando reclamava do excesso de tarefas, retrucando que não eram tantas assim. Realmente, não eram, porém, podiam ser distribuídas de melhor forma. Claro que a única vez que ousou dizer isso em voz alta, teve que limpar a lareira. No final do dia estava coberto de fuligem misturada com suor, cansado e muito irritado. Contudo, para seu deleite, após ficar bastante tempo no banho e sair, ouviu Snape praguejar porque a água quente havia acabado.

No sexto dia, levantou mais cedo. A luz lá fora estava pálida e o tempo nublado, mesmo assim, não conseguia pegar no sono novamente. Espreguiçou-se de modo felino e sentou-se na cama, ainda em torpor. Ergueu-se e andou preguiçosamente até a cozinha, mas ao invés de encontrar a figura solitária do professor tomando seu chá, havia um rapaz no extremo oposto da mesa comendo uma torrada.

Pelo que podia observar, ele tinha os olhos cinzentos e o cabelo loiro curto. Malfoy, com o m e y floreados. Ficou estático na porta.

Sua primeira impressão do garoto foi a de que ele parecia um dos membros da nobreza, muito similar a algumas figuras aristocráticas de livros por seus traços finos, quase pontiagudos. E como todas as figuras nobres, ele irradiava arrogância. Censurou-se mentalmente por pensar assim de alguém que não conhecia, mesmo que seu nariz estivesse torcido em uma careta.

Entrou no recinto e percebeu que Snape lia enquanto bebericava de seu chá. Nenhum deles notou sua presença, não soube bem como agir. Antes que o nervosismo se alojasse permanentemente em seu estômago, resolveu seguir a rotina e fazer seu café, como se estivesse só. Porém, Malfoy de letras caprichadas foi mais rápido.

- Quem é ele, Severus? – Perguntou a Snape com a voz arrastada.

Sem tirar os olhos de seu livro, o homem respondeu simplesmente:

- Nosso ilustre hóspede, Harry James Potter, como sabe muito bem, Draco.

- Ah, claro. – Disse o loiro, por fim.

Harry cerrou os punhos. Os dois agiam como se o ignorassem ou tivessem esquecido que estava no cômodo. Uma das coisas que mais odiava era quando as pessoas metiam-se a falar dele como se não existisse, sendo que estava presente. Respirou fundo e passou a língua pelos lábios para falar.

- Com licença. – Por um breve instante, Snape o encarou, mas resolveu voltar a sua leitura. Somente os olhos de Malfoy continuaram pregados em sua figura – Acho que você já me conhece.

O jovem aristocrático ergueu uma sobrancelha rala.

- É mesmo? Não me lembro de ter sido apresentado a você

- Não falou. – Replicou, engolindo em seco – Você me viu no quarto uns dias atrás.

Malfoy riu. Sua risada era tão arrastada quanto sua voz.

- Entendi quando Severus disse que você apareceu aqui 'infelizmente'. Sem nenhuma classe, Harry Potter. – Cuspiu o nome com desdém – Só se 'conhece' uma pessoa quando ela é lhe apresentada devidamente.

O moreno sentiu que suas bochechas estavam ligeiramente enrubescidas. A discreta antipatia que tinha antes pelo outro rapaz triplicou naquele exato momento.

- Acho que não nos conhecemos, então, já que não fomos... Como você disse? Devidamente apresentados.

- Ora... Faux pas! – Riu - Queira me desculpar... Posso te chamar de 'Potter' ou tem algum apelido em especial? – Perguntou, o sarcasmo evidente em seu tom de voz.

- Potter é bom o suficiente. – Disse, quase num rosnado, o que fez Malfoy sorrir satisfeito.

- Claro que é. Meu nome é Draco Lucius Abraxas Malfoy. Draco Malfoy, simplesmente. Me chame de Malfoy quando me vir, o que não vai ser muito. Já sei que seu nome é Harry James Potter. Temos a mesma idade. Viu? A gente nem precisou apertar as mãos. – Comeu o último pedaço de sua torrada – Com licença. – E saiu.

Pasmado era pouco para descrever o estado de Harry quando Draco saiu pela porta da cozinha e desapareceu entre as árvores.A única coisa que conseguia pensar era em como Draco Malfoy era um idiota.

- Vai ficar parado para sempre, Potter? – A voz profunda de Snape o fez piscar. –Melhor fazer seu café, não gosto de gente no mesmo cômodo que eu enquanto estou cozinhando. Se estiver aqui quando eu vier para fazer o almoço, você não come.

Harry concordou com a cabeça e sentou-se, pegando o queijo, o presunto, o leite e o pão. Nunca admitiria para o homem em alto e bom som, mas o professor cozinhava muito bem. Estava na metade de seu sanduíche quando Snape foi se trancar em seu quarto.

Reclamara que fazia mais tarefas domésticas que todo mundo, mas isso acabou se provando uma vantagem. Ter alguma coisa para fazer o distraia e impedia que ficasse frustrado por não conseguir lembrar de quase nada além de detalhes insignificantes ou coisas muito vagas. Estar no meio do nada, sem ter idéia de como chegara lá também não ajudava. Recordara-se que se chamava Harry James Potter, tinha dezesseis anos, morava na Inglaterra antes de toda a confusão, em algum ponto da sua vida tinha lido 'Sherlock Holmes' e gostado, amava da torta de morango, tinha um amigo chamado Neville – do qual só lembrava-se do nome e rosto -, outro amigo ruivo e cheio de sardas que gostava de xadrez. Tinha também uma amiga de cabelo cacheado um pouco armado, mas de sorriso divertido.

Por mais que Snape sempre dissesse que as memórias voltariam se realmente quisesse, não conseguia evitar a inquietude.

Também apreciava explorar os arredores, mas caminhar permitia que pensasse no que o incomodava tanto. Apesar disso, gostava bastante das árvores, dos pequenos caminhos, das trilhas, dos riachos e da montanha que se estendia no final da paisagem. Era inspirador. Algumas vezes ficava em frente à casa e observava. Estranhamente, não havia encontrado quase nenhum bicho ou inseto. Snape dissera que eles não gostavam muito da região, mas não entrara em muitos detalhes. Harry também não insistiu. Lentamente, aprendia a lidar com os moradores daquele lugar.

Outro detalhe que despertava sua curiosidade era de onde tiravam a comida e as roupas, já que pareciam estar no fim do mundo. Tampouco perguntava. Não mais, pelo menos. As primeiras dez vezes haviam sido suficientes. Ainda não tinha desejos suicidas. O professor não gostava de falar muito, aparentemente. Algumas vezes conversava brevemente com Malfoy quando trombavam pelos corredores ou quando o loiro fazia sua parte dos serviços domésticos.

Draco Malfoy. Não conseguia chamá-lo pelo primeiro nome, apesar de sempre ouvi-lo da boca de Snape e também não recebera permissão para tal. A frase 'Me chame de Malfoy' estava fresca em sua mente. De qualquer forma, seria íntimo demais. Além de tudo, seu primeiro nome nunca era usado também, por isso, não se importava. Uma vez – duas semanas depois da sua chegada - havia perguntado por que insistiam em tanta formalidade com ele, já que Draco e o professor se chamavam pelos nomes de nascença. Como sempre, o homem dera um sorriso cínico e respondera que 'A companhia de Draco é mais suportável'. O morcegão só chamava o loiro de 'Sr. Malfoy' quando ele havia feito algo que considerava errada ou estúpida.

Malfoy. Ele era estranho e irritante. Sempre que podia dava um jeito do moreno fazer sua parte da limpeza – como se já não tivesse tarefas o suficiente - ou estava soltando algum comentário nada bem vindo sobre sua pessoa. Havia socado-o uma vez, para seu imenso prazer. Por alguma razão misteriosa, Snape não ficou sabendo ou não tinha certeza de que continuaria naquela casa. Malfoy e o professor se davam razoavelmente bem.

Mas era esquisito como a falta de ser chamado de 'Harry' o fazia sentir-se mais sozinho do que já se sentia normalmente. Havia os poucos pássaros, as árvores, as folhas e raros esquilos, no entanto, eles não conversavam ou eram domesticados para fingirem que estavam felizes em vê-lo ou para reconhecê-lo. Balançou a cabeça, censurando-se por pensar coisas tão tolas.

Só via o loiro no café nos dias em que acordava mais cedo e se arriscava a abrir um dos olhos quando ele chegava depois que havia deitado. Era comum encontrar a outra cama quase sempre vazia. Para ser sincero, não se importava nem um pouco. Não tinha muita paciência para ficar calado enquanto ouvia as provocações do outro.

Raramente, mas bem raramente, sentava em frente à janela até suas pernas formigarem e deixava a curiosidade espalhar-se por seu corpo enquanto tentava adivinhar onde Malfoy se escondia todos os dias. Não era uma opção perguntar a Snape, sem dúvidas receberia uma resposta 'amável'.

Os dias passavam devagar. Sempre a mesma coisa, a mesma rotina. Quando ninguém estava vendo, Harry deitava no sofá em posição fetal e em seu peito instaurava-se uma saudade dolorida: não sabia de quê, não sabia por quê, não conseguia descobrir. Às vezes, quase se curvava de tanta agonia ao pensar que estava destinado a ficar lá por toda uma eternidade, sem nunca se lembrar o que fazia antes de ser achado na floresta, jogado.

O tempo esfriava, isso era uma das poucas coisas que fazia seu humor melhorar ligeiramente. Cada manhã havia mais folhas secas espalhadas pelo chão. Devia estar perto de outubro começar. Não podia ser mais exato, já que na casa não havia relógio ou calendário. Só a tabela com as tarefas distribuídas pelos dias da semana. Toda vez que perguntara 'que dia é hoje'ou 'que horas são', um resmungo fora a resposta mais articulada. Não precisou de muito tempo ou inteligência para entender que naquela casa não existiam objetos que contavam o tempo.

Já fazia três semanas e dois dias. Harry encontrava-se mais ou menos bem adaptado à nova vida – não que possuísse algum padrão para comparar. Aos poucos, se cansava de sua tristeza, de sua apreensão e não agüentava mais sentir saudade. Quando seu peito começava a ficar dolorido, esforçava-se para ignorar a dor com razoável sucesso.

Havia descoberto um laguinho com peixes. Essas pequenas coisas o distraíram. Só que chegou um dia que elas não eram distração o suficiente. Então, reunira a devida coragem e perguntara a Snape se havia algum livro na casa que pudesse pegar emprestado. Tinha a impressão que nunca fora um amante da leitura, mas estava desesperado. Ainda ria internamente ao lembrar da única ocasião em que vira Snape pasmo. O homem respondera um pouco desajeitado que sim, e pela primeira vez, Harry olhou a 'caverna do morcego', como apelidara o quarto do anfitrião.

Estantes de livros. Muitos de química orgânica, botânica e bioquímica. Snape respondera secamente que fora professor de química. Harry dera de ombros, continuando a procurar algum livro que talvez gostasse. Fora com alegria pueril que saíra do recinto segurando duas histórias do Sherlock Holmes e algum outro livro sobre o Rei Arthur.

Assim sendo, a tristeza e a inquietação começaram a desaparecer enquanto o moreno incorporava de verdade aquela nova rotina.

Sua saudade deixou de fazer muito sentido e não possuía a mínima vontade arranjar um novo. Era bom estar daquele jeito, com um contentamento ignorante.

Um mês havia se completado. Estavam perto do inverno e quase todas as folhas estavam secas e douradas, abandonadas no chão. Já não era o bastante uma camiseta e um casaco fino para sair. Harry ficou muito feliz quando Snape o informou que normalmente nevava naquele lugar.

De repente, quem era, onde estava e como havia surgido lá eram questões sem importância.

A solidão ainda estava presente, sem dúvidas, mas ficou muito bom em ignorar certas coisas. E assim continuou.

Até que um dia encontrou Malfoy sozinho na cozinha. Piscou os orbes verdes e entrou, completamente mudo. Automaticamente pegou seus dois ovos, óleo, sal e uma frigideira para preparar seu café.

- Você quebra os ovos com a faca. – Observou Draco, interrompendo o silêncio. Harry franziu o cenho.

- É, fica mais difícil da gema furar quando colocada na frigideira.

Draco bebeu um pouco de seu café.

- Nah. Você só não sabe quebrar o ovo direito.

O moreno bufou e balançou a cabeça, já irritado.

- Aposto que faz muito melhor, não é, Malfoy? Quer ensinar? – Pediu com cinismo.

Alguma coisa na frase fez o loiro soltar uma risada fraca.

- Você é um caso perdido. Não vou perder meu precioso tempo.

Harry deu de ombros, colocando os ovos já fritos num prato. Sentou-se e pegou um dos pães no centro da mesa.

- Por que ainda não saiu, Malfoy? – Perguntou ao arrancar um pedaço do pão com os dedos.

- Hoje é meu dia de limpar os vidros, Potty.

- Ah. – "E como sempre, vão ficar uma porcaria" pensou e começou a comer, parecendo entediado depois de ouvir a resposta do outro.

Draco encarou o rapaz estranhamente, como se Harry tivesse dez cabeças. O moreno, como sempre, resolveu ignorar ao invés de estragar seu precioso dia e café com bobagens. Devia ter alguma coisa em seu nariz.

- Qual é seu nome inteiro? – Perguntou o loiro repentinamente. Harry engasgou e começou a tossir com violência. Bebeu todo um copo de leite antes de conseguir falar.

- Como? – Disse, ainda tossindo um pouco.

- Você não é surdo. Cristo! Qual é seu maldito nome inteiro?

O moreno sorriu de um modo engraçado.

- Harry James Potter, idiota. Você sabe disso.

Draco pareceu ficar pensativo por um instante.

- Certo, Harry James Potter. Responda-me: o que fazia antes de vir para cá?

O garoto arregalou seus olhos verdes, mas logo em seguida sua expressão suavizou-se. Sem pensar, falou quase num torpor:

- Eu sempre estive aqui.

A face de Draco perdeu sua pouca cor e seus olhos estreitaram-se perigosamente. Ele levantou-se, e andou devagar até Harry.

- O que fazia antes de vir para cá? – Ganhou um suspiro exasperado do moreno.

- Você tem algum problema, Malfoy?! Eu já te disse que eu sempre estive aqui.

O loiro pegou-o pelo colarinho e disse entre os dentes, as faces próximas:

- Pense, seu merda! Retardado! Estúpido! Tolo! Não se lembra do dia em que Severus o achou lá na floresta, jogado?

- De que porcaria você está falando, seu bosta? – Suas mãos apertaram os pulsos de seu agressor – NÃO SEI DE NADA DISSO!

- SEU IDIOTA! – O punho de Malfoy encontrou a face do outro com bastante força.

Harry cambaleou e deu alguns passos para trás. Tentando recuperar o equilíbrio, encostou-se na parede e limpou o filete de sangue no canto da boca. Um turbilhão de pensamentos passava por sua mente, um dos que mais gostava era o modo que mataria o adorável companheiro somente com suas mãos. Todavia, um arrepio correu por sua espinha e seu corpo ficou imóvel. Seus olhos se arregalaram.

Estava nevando.

- Neve. Eu lembro da neve. Estava assistindo-a cair e os postes da rua. Acho que alguém roncava... – Disse num sussurro.

De repente, não sentia mais nada, apenas a lembrança dos flocos sendo iluminados pelos postes na rua mantinha-se viva.

Escorregou pela parede, até estar sentado no chão. Draco ajoelhou-se em sua frente, sem a costumeira expressão de deboche. Ele estava... sério.

- Nunca, entendeu, Potter?! Nunca esqueça o que estava fazendo antes de vir para cá. Seu tolo! Eu não acredito que Severus não disse nada quanto a isso! – Grunhiu em frustração enquanto puxava uma mecha de seu cabelo.

E saiu pela porta da cozinha. Harry ouviu o 'creck' das folhas sendo pisadas se afastar rapidamente e ficou lá, sentado. O outro obviamente tinha esquecido que era sua vez de limpar os vidros. Não que fosse fazer muita diferença depois. Tocou sua bochecha machucada.Tudo era muito estranho.

Mais tarde, Harry tentou esperar Malfoy voltar, mas acabou adormecendo antes, exausto demais para se manter acordado. Quando o rangido da porta soou pelo quarto, ele estava em sono profundo. Draco o invejou. Ficou a noite inteira observando Potter dormir para sair bem antes que ele pudesse acordar.

Naquela noite, Harry sonhou com a neve.

As luzes da cidade pareciam um pouco mais brilhantes do que de costume, seus olhos ardiam ligeiramente. As pálpebras fecharam-se e, devagar, os roncos suaves da pessoa do leito ao lado foram encobertos pelo seu próprio entorpecimento. De repente, não sentia mais nada, apenas a lembrança dos flocos sendo iluminados pelos postes na rua mantinha-se viva.

Viva.

Continua...


N/a: Olá!

Bom, eu sou a Kikis e esse é um presente de amigo secreto para a Srta. Delamort. Espero que tenha gostado! Foi feito com muito carinho :D!

Espero que todos tenham gostado, na verdade. Nunca trabalhei com esses três personagens mais diretamente e foi uma experiência muito boa. Fazia tempo que não me envolvia com uma idéia como dessa vez... Mas não será longa. No máximo quatro partes.

Agradeço a Lally por ter ouvido minhas idéias, ajudado a definir quem seria o protagonista e por corrigir na velocidade da luz! Agradeço a Naru por me ajudar com o título e com o sumário também! Obrigada ;D

Se considerarem a história digna de reviews, a autora ficaria muito feliz em recebê-las! Tanto críticas quando elogios são bem-vindos!

Obrigada por lerem!

Beijos,

Kikis