DOCE DEZEMBRO

Disclaimer: Saint Seiya não me pertence, e sim a Masami Kurumada.

Essa fanfic é baseada no filme "Doce Novembro" (Sweet November), que tinha como protagonistas Keanu Reeves e Charlize Theron. A história que se segue, no entanto, gira em torno dos nosso queridos personagens: Ikki e Hyoga.

Espero que gostem!


Capítulo 1

Amanhecia. Mais uma vez. Mas para o belo moreno, aquela manhã não tinha nada de especial. Afinal, como todas as outras manhãs sempre anunciavam, esse seria apenas mais um dia. Cheio de reuniões a serem realizadas, clientes a serem convencidos, dinheiro a ser ganho. Nada mais que isso.

Como já era de praxe, levantou-se e foi direto ao banheiro. Tomou uma ducha rápida, suficiente para afastar o sono de seus belos olhos azuis escuros. Vestiu-se com elegância, como sempre, pois um executivo do seu nível precisava sempre estar apresentável. Deu uma olhada no espelho, sorriu para sua imagem como que testando sua faceta mais simpática – a que ele comumente usava para atrair e convencer clientes a fechar negócios com ele – e saiu do quarto.

Na sala de seu luxuoso apartamento, a organização era a palavra de ordem. Não que essa fosse uma característica marcante sua, mas Ikki aprendeu que a organização era necessária para qualquer pessoa que almejasse o sucesso. Uma vida cronometrada, com cada coisa em seu lugar, era o que havia ajudado o rapaz a crescer na vida e ser o que era hoje: um dos maiores e mais importantes executivos das empresas Kido. Em sua cabeça, não poderia querer mais nada. Sua vida era perfeita. Pegou a pasta repleta de papéis importantes que tinha deixado sobre a mesa de centro da sala, apanhou uma maçã que estava em um cesto cheio de frutas sobre a bancada da cozinha e saiu de seu apartamento pontualmente às 7:35 daquela manhã de terça-feira, como sempre fazia.

À medida que ia descendo as escadas de seu prédio, ele ia comendo apressadamente sua maçã, ao mesmo tempo em que checava seu relógio de pulso a fim de confirmar que estava dentro do horário. Apesar de morar no 6º andar de seu prédio, preferia descer as escadas em vez de tomar um elevador, pois já havia cronometrado quanto tempo gastava com cada um e o caminho pelas escadas mostrou-se mais rápido. Quando, finalmente, chegava ao estacionamento, às 7:38, a maçã já se encontrava quase pela metade e, todos os dias, era assim que ela era jogada na lixeira mais próxima. Ikki, enfim, entrava em seu porsche azul-marinho e saía rumo ao edifício principal das empresas Kido.

Chegava, todos os dias, às 8:00 em ponto ao seu escritório. No caminho, ia cruzando com alguns colegas com os quais trocava alguns poucos cumprimentos matinais, mais por educação que afeição. Ikki era uma pessoa de poucos amigos e preferia assim. Poupava-lhe tempo e... outras coisas.

Basicamente, as duas pessoas com quem mantinha mais contato eram seu irmão, Shun, que trabalhava como professor de música em uma escolinha infantil para alunos carentes; e Shiryu, seu colega de trabalho. Shun lhe era muito querido não apenas por se tratar de seu irmão, mas também porque era uma pessoa bastante afetiva, alguém difícil de não se gostar. E sua amizade com Shiryu teve início a partir do momento em que Ikki o respeitou, vendo que ele era sensato, inteligente e igualmente reservado. Descobriram que trabalhavam muito bem juntos, transformando-se assim na dupla de maior sucesso e prestígio dentro da empresa.

- Bom dia, Shiryu. – cumprimentou Ikki ao entrar no escritório que compartilhavam.

- Bom dia, Ikki! – respondeu o amigo, sorridente. – Adivinhe só...

- O quê? – disse Ikki enquanto ia retirando alguns papéis de sua pasta.

- Conseguimos fechar aquele contrato! Eu não disse que nossos esforços iriam dar bons resultados?

- Não diga... quer dizer que eles já enviaram uma resposta? – Ikki ia falando sem demonstrar muita empolgação enquanto tirava seu terno.

- Sim, acabo de receber por fax. – Shiryu levantou-se para entregar o papel ao amigo.– Por acaso, na reunião que teve com eles ontem, você...

- Claro... Eu os pressionei. Eles precisavam entender que necessitavam mais de nós que o contrário. E nessas horas, não sou muito delicado mesmo. Eu disse que, se não se decidissem logo, enviaríamos nossa proposta para a concorrente deles. Falei que já havíamos esperado tempo demais e que eles tinham até hoje para nos responder.

- Pelo visto, o que você disse surtiu efeito... Enviaram uma resposta logo cedo.

- É assim que o negócio funciona. – disse Ikki, sorrindo mecanicamente do modo que fazia ao fechar um negócio com clientes.

Os dois amigos foram interrompidos com uma chamada da secretária à porta do escritório:

- Senhores, a senhorita Kido convocou uma reunião às pressas para agora e pede que todos se encaminhem para o salão central com urgência.

- Obrigado, dona Miyuki. – agradeceu Shiryu.

- Saori já voltou de viagem? – perguntava Ikki, enquanto voltava a vestir seu terno, que há alguns minutos havia deixado sobre sua cadeira.

- Pois é, estranho, achei que ela fosse ficar fora mais algumas semanas. – falou Shiryu.

No salão central, já havia uma grande quantidade de pessoas reunidas e todos comentavam qual deveria ser o motivo para fazer a dona das empresas Kido voltar de sua viagem de férias mais cedo e ainda marcar uma reunião desse tipo às pressas. O burburinho foi silenciado com a entrada da própria dentro do salão.

- Senhoras e senhores. – disse ela, entrando altivamente. – Por favor, sentem-se.

Quando todos já estavam acomodados em suas cadeiras ao longo da enorme mesa circular que ocupava o salão, Saori prosseguiu:

- Imagino que todos aqui estejam se indagando sobre o que me fez trazê-los dessa forma para a sala de reuniões. Bem, prefiro não ter de dar longas e cansativas explicações. Assim sendo, quero apresentá-los agora a... Seiya Kido.

Nesse instante, o burburinho voltou a preencher a sala. Todos cochichavam perguntando uns aos outros se o que tinham ouvido estava certo.

- Seiya... Kido? – disse Ikki, piscando os olhos como se isso fosse ajudá-lo a compreender melhor o que se passava. – Mas Saori não tem irmãos... ou primos...

- Não creio que se trate de parentes, Ikki. – falou Shiryu, apontando com os olhos a cena que esclareceria tudo aquilo. Naquele momento, entrava no salão um jovem de estatura mediana, cabelos e olhos castanhos, jeito desembaraçado e jovial, apesar da roupa bastante formal. Assim que entrou, recebeu vários olhares inquisitórios sobre sua pessoa.

- Esse é Seiya Kido. – continuou falando Saori. – Meu marido e novo diretor-geral das empresas Kido.

Seiya acenou para todos com um sorriso amarelo no rosto. Shiryu permaneceu impassível, enquanto Ikki resmungava algo por entre os dentes.


À noite, depois de mais um cansativo dia, Ikki chegou a sua casa, precisamente às 21:30, como era de costume. Deixou sua pasta sobre a escrivaninha, a fim de trabalhar mais um pouco depois do jantar. Em seguida, dirigiu-se à cozinha.

Estava já terminando de cozinhar uma macarronada quando tocou o interfone. Olhou no relógio. 22:00 . "Bem na hora", pensou Ikki. Apertou o botão do interfone e destrancou a porta. Alguns minutos depois, entrou por ela um jovem de cabelos esverdeados.

- Ikki! Você nunca pergunta quem é antes de abrir a porta?

- Eu já sabia que era você, Shun. – disse Ikki, enquanto levava à boca uma colher para experimentar o molho.

- Ora, irmão! – continuava o mais jovem. – Poderia ser outra pessoa... até mesmo um ladrão.

Ikki sorriu ante o comentário de seu irmão caçula. Às vezes, parecia que ele era o irmão mais velho, preocupando-se com essas coisas.

- Não, Shun, não teria como ser qualquer outra pessoa... E se fosse um "ladrão", eu saberia me defender.

- É... – respondeu Shun, melancolicamente. – Olha, irmão... eu não gosto de saber que sou a única pessoa que visita você.

Ikki começava a se impacientar.

- Shun, essa conversa de novo, não. Por favor. Tive um dia difícil hoje.

- Você sempre tem um dia difícil, Ikki. E nunca quer falar sobre isso.

- Mas é porque não tem o que falar, Shun! – gritou Ikki, atirando com força a colher de madeira dentro da pia – Quantas vezes eu preciso dizer a você que sou feliz? Porque eu sou, e muito! O problema é que você acha que não existe felicidade diferente do modo como você a concebe! Se as pessoas não forem felizes da forma que você acha que devem ser, então está errado! Pois saiba que nem tudo é como você gostaria que fosse, está bem?

Shun olhava para o irmão, sem se mexer. Os olhos estavam arregalados. Não estava com medo, pois conhecia o irmão bem o suficiente para saber que, por mais nervoso que estivesse, jamais o machucaria. Porém, Ikki havia explodido, e por conta de um comentário inofensivo. Estava claro para o rapaz de olhos cor de esmeralda que seu irmão era uma bomba-relógio. Ele estava prestes a explodir, mas não percebia. E Shun tinha medo de não ser capaz de ajudá-lo quando isso acontecesse.

Ikki percebeu que tinha extrapolado. Calou-se, pegou dois pratos no armário e serviu a macarronada. Ao colocar o prato diante de seu irmão, começou a falar, como que explicando-se:

- Hoje não foi um dia como outro qualquer. Fomos apresentados ao novo diretor-geral da empresa. Um tal de Seiya Kido.

- Seiya Kido? – Shun percebeu que o irmão precisava mudar de assunto e resolveu dar corda, pois era o melhor que podia fazer naquele momento. – Mas... a dona não se chama...

- Saori Kido. Sim, eles têm o mesmo sobrenome e não, eles não são parentes. Bom, não eram até ontem.

- Como assim? – perguntou Shun, enquanto ia enrolando o macarrão em seu garfo.

- Saori estava viajando de férias quando conheceu esse tal Seiya. Ao que tudo indica, eles se apaixonaram de tal forma que se casaram depois de um mês de namoro.

- Nossa, que paixão avassaladora! – sorriu Shun.

- Pouco me importa a paixão desses dois. O que eu não gostei nem um pouco foi de ela ter nomeado esse cara para diretor! Eles mal se conhecem!

- Você acha que ele é incapaz de ficar nesse cargo, irmão?

- Não sei. Acho que não. Dei uma pesquisada para saber mais sobre esse cara. É verdade que ele possui um bom currículo, já trabalhou em grandes empresas, em cargos de confiança...

- Ah, então não foi só uma loucura de amor da Saori... Ela deve ter achado que ele é bem capaz.

- ... Mas mesmo assim, Shun! Colocá-lo como diretor, desse jeito? É um exagero!

- O amor tem dessas coisas, Ikki. E... vamos dar um crédito a Saori. Ela não é do tipo que faz negócios sem pensar nas conseqüências. Ela sempre foi bem racional, ponderada. E ela não iria jogar a empresa que o avô dela construiu nas mãos de qualquer pessoa. Se ela confia nesse tal Seiya – e pelo visto confia muito, pois até se casou com ele – vamos dar um voto de confiança também.

- Agora você está falando igual ao Shiryu. – resmungou Ikki.

- Por isso que eu gosto dele! – brincou Shun – Ele é um cara que sabe as coisas que diz! Aliás, você deveria sair mais com ele, Ikki. Fazer com que a amizade de vocês não fique só no ambiente de escritório. Quem sabe assim, você começa a sair e se divertir mais...

- Shun! – Ikki cortou a fala do irmão, muito sério – Não vamos começar com isso de novo. Já disse que estou bem assim. E minha amizade só funciona com Shiryu porque ele respeita meu espaço. E eu prefiro tê-lo como colega de trabalho, não como um amiguinho para passear por aí.

- Você fala como se sair para se divertir fosse algo ruim...

- Eu tenho coisas mais importantes para fazer com meu tempo, Shun.

Shun abaixou a cabeça com ar tristonho. Seu irmão conseguia ser tão cabeça-dura quando queria...

- Seiya Kido... nem para esse cara ter mantido o próprio sobrenome... - Ikki continuou a falar.

- Ora, Ikki. A Saori é que não podia mudar. O sobrenome Kido já tem muita tradição no mercado...

- É, e ele deve ter adorado ganhar toda essa tradição de graça, sem fazer o menor esforço.

Percebendo que aquela discussão não os levaria a lugar nenhum e que só parecia estar aborrecendo ainda mais o seu irmão, Shun decidiu mudar de assunto:

- Ah, eu falei para você sobre o concerto de Natal que nós vamos fazer esse ano?

- Qual? Aquele que vocês fazem todo ano? – disse Ikki, de forma depreciativa.

- É, Ikki, esse mesmo! – falou Shun, sem deixar sua empolgação se afetar pelo mal-humor do irmão – Mas esse ano, vai ser diferente!

- É mesmo? Por quê? – perguntou Ikki, mas sem demonstrar grande interesse em ouvir uma resposta.

- Porque, nesse ano, em vez de cantarmos as célebres canções de Natal já conhecidas, vamos cantar músicas próprias, originais! Os meninos adoraram a idéia! O coral de Natal desse ano vai ser uma maravilha, vai entrar para a história, você vai ver!

Ikki continuava comendo e agora sustentava um olhar perdido em algum ponto invisível na parede atrás de Shun. Para chamar de volta sua atenção, o garoto de cabelos verdes disse:

- Mas, para tudo dar certo, eu vou precisar da sua ajuda. Queremos que nossas músicas tenham qualidade, e para isso, vamos contratar o serviço de um escritor aqui das redondezas...

- E eu com isso?

- Bom, é que eu estou atarefadíssimo amanhã, mas precisava falar com esse escritor o quanto antes. Aí, pensei que você poderia fazer isso para mim.

- O quê? Shun, você esqueceu que eu trabalho o dia inteiro? Que mal tenho tempo para mim? Que minha agenda é lotada e...

- Ikki, calma. Eu sei de tudo isso. Mas é que a casa dele é meio afastada daqui, porém fica no caminho que você pega todo dia para ir trabalhar. Então, pensei que você poderia dar uma passadinha lá para dar uma palavrinha com ele...

- Shun, você não pode estar falando sério. Você sabe que não tenho tempo para essas brincadeiras...

Nesse momento, Ikki arrependeu-se profundamente do que havia dito. Sabia que não havia nada que magoasse mais o seu irmão que fazer pouco caso de seu trabalho. E, na verdade, ele não fazia pouco caso. Admirava o que seu irmão fazia, via nele uma pessoa que se doava por inteiro para as causas sociais em que ele acreditava. Porém, quando ficava nervoso, sempre acabava falando alguma besteira que feria seu irmão.

- Desculpe, Shun... Você sabe que não é isso que penso do seu trabalho... mas é que ando muito ocupado ultimamente...

- Como sempre, não é, Ikki? E acaba nunca tendo tempo para mim... Se eu não viesse jantar com você todo dia, não nos veríamos nunca. Você por acaso percebe o esforço da minha parte para estar com você? Eu janto tarde todo dia só para termos um momento juntos. E tudo bem, eu aceito jantar tarde porque sei que você só pode estar em casa neste horário. Eu não ligo de fazer um sacrifício. Mas você, da sua parte, não parece valorizar nada disso, pois se eu peço um favor, é sempre a mesma desculpa...

Shun sempre sabia por onde atacar o irmão. O peso na consciência. Era o único meio de atingi-lo. Não gostava muito de chantagens emocionais, mas era o jeito...

- Ai, Shun, não é nada disso... Aliás, para que tanto estardalhaço? Para que ir a casa desse tal escritor? Por que simplesmente não conversa com ele por telefone?

- Porque ele não tem telefone. Nem celular. Ele parece não gostar muito dessas coisas...

- E-mail então está totalmente fora de cogitação?

- É, ele não curte muito essa "parafernalha tecnológica", como ele mesmo diz. Li numa entrevista que ele é bem... diferente.

- Para mim, isso se chama frescura. – dizia um já aborrecido Ikki, levantando-se para pegar o suco de laranja na geladeira.

- Tenho apenas o endereço dele, que pedi para a revista. Foi super difícil conseguir, disseram que ele é muito reservado; mas depois de explicar para que eu queria, eles me passaram tudo que eu precisava. – falou Shun, orgulhoso em saber que seu projeto de criar canções de Natal com crianças carentes era bem visto até pela mídia.

- Manda uma carta para ele, então. – falou Ikki, enchendo um copo de suco para seu irmão.

- Ikki! Isso demoraria demais. Preciso de uma resposta da parte dele com urgência, pois caso ele não queira ajudar, vamos atrás de outra pessoa! Mas espero que ele aceite, ele seria perfeito para o que queremos...

Vendo que estava acuado, que não tinha mais argumentos para fugir do pedido do irmão, Ikki voltou a sentar-se em sua cadeira, em frente a Shun e, com um ar derrotado, disse:

- Tudo bem... Eu passo na casa dele amanhã.

Shun sentiu seu coraçãozinho explodir de alegria! Por um momento, tinha pensado que não conseguiria convencê-lo...

- Obrigado, irmão! Muito, muito obrigado! Você nem sabe o que isso significa para mim!

Tirou um papel do bolso e o estendeu a Ikki.

- Esse é o endereço dele...

Ikki pegou o papel e passou os olhos por ele. Viu que a casa ficava realmente no caminho para seu trabalho, de modo que, se ajustasse seu relógio para despertar mais cedo no dia seguinte, não se atrapalharia.

- Ah, já ia me esquecendo... - disse Shun, de repente - O nome dele é Hyoga Yukida.

Ikki ouviu aquele nome sem dar qualquer importância. Shun viu o irmão levantar-se para colocar o papel dentro de sua pasta. Enquanto isso, Shun mergulhou em algumas perguntas que tomavam conta de seus pensamentos. Se fosse verdade o que ele tinha ouvido a respeito desse escritor, talvez ele tivesse finalmente encontrado um meio de ajudar o seu irmão. A ele, agora, restava apenas esperar... e torcer.

- Hyoga Yukida. – falou Shun, para si mesmo, em tom de voz baixa – Espero que consiga salvar o meu irmão... dele mesmo. – dizendo isso, sorriu, misteriosamente.

Continua...