Capítulo 1
Odiava-se por ter caído nessa armadilha, sim era essa a palavra, armadilha, do inglês 'trap', do espanhol 'trampa', do alemão 'falle', está ai uma língua que odeia, alemão. No que estava pensando antes mesmo? Ah sim, armadilha!
Olhou para a grande janela ao lado de sua cama, ainda era noite? O tempo passa devagar de mais, principalmente na situação que se encontrava. Olhou o céu pelo vidro da vitoriana janela, céu limpo, como o das outras noites. Virou o rosto para o lado oposto, encarou a bolsa de sangue pendurada ao lado de sua cama, era o quê? A quinta do dia? Não, sétima. Seguiu com os olhos o tubo vermelho que terminava em seu braço esquerdo já bem roxo por espetadas de agulha.
"Só mais um mês" pensou antes de suas pálpebras pesarem.
Voltou a abrir os olhos para dar de cara com a bolsa de sangue já pela metade.
"Sanguessugas" pensou alto antes de virar o rosto para a direita a fim de olhar o céu, teve a visão barrada por algo em sua cama.
"Será melhor aprendiz que a policial, pelo menos. Se alimentará decentemente." Alucard deu um de seus sorrisos cínicos antes de apoiar os braços na cabeça e se acomodar melhor na cama ficando parcialmente deitado, com as pernas para fora do leito.
"Não agüento mais ficar presa a essas transfusões" Integra virou para o outro lado, já tinha desistido de expulsa-lo de seu quarto mesmo.
"Sem elas já estaria morta no terceiro mês" Ele simplesmente respondeu com os olhos fechados, como se quisesse dormir.
"Você sabia disso?" Ela perguntou como se isso estivesse entalado há muito.
"Suspeitei que a criança fosse se alimentar do sangue da mãe" apontou para a bolsa de transfusão "Mas a solução se mostrou bem simples" Respondeu deitando-se de vez na cama.
"Não falo disso" Ela esperou que ele entendesse, mas não houve resposta "Você sabia que podia conceder a vida?"
"Já disse que não mas que problema há nisso? Ambos fomos beneficiados, a rainha mão a incomoda mais, não lhe oferece mais em um baile e eu não tenho mais que ameaçar e amedrontar almofadinhas insolentes que ousam corteja-la" ele abriu um grande sorriso "Ah, e consegui o que queria"
"Você conseguiu o que queria e eu consegui infinitos questionários"
Sir Hellsing lembrou-se do dia em que teve que fazer o anúncio formal a Rainha. Era uma bela tarde de quarta-feira, foi convidada para a hora do chá com Vossa Alteza. No jardim interno do palácio, esse local fresco, colorido e repleto de alegria infantil só podia significar uma única coisa: provavelmente a velha queria empurrar-lhe outro parente ou um nobre qualquer. Antes ela escolhia os da idade de Integra, mas como foram todos rejeitados (por ela ou por Alucard) passou a procurar jovenzinhos. Esses não duravam nem dez minutos perante a Dama de Ferro, eram abestalhados de mais para sequer ter algo decente para conversar. Depois do fracasso dos garotos de fraudas, a Rainha Casamenteira decidiu partir para os de sua idade, ou seja, velhos viúvos ou divorciados. Desses, Alucard adquiriu especial ódio, mataria, sem pensar duas vezes, o velho que tentasse qualquer contato físico com sua mestra. Podia ler suas mentes podres, todos eram pervertidos nojentos, bem piores que os garotos com hormônios à flor da pele.
De qualquer maneira, a Hellsing foi obrigada a contar-lhe a sua situação, gravidez. Como os espanhóis dizem mesmo? Estava 'embarazada', fazia todo o sentido.
"O que acha de um baile de máscaras?" A anciã começo a adorável conversa durante o chá que por sinal estava doce demais para Integra. "Esta sexta-feira é ruim? Já entreguei os convites"
"Estou grávida, Vossa Majestade" saiu assim, seco, rápido, quase indolor.
"Isso..." A Senhora deu um pequeno salto na cadeira disfarçando um quase engasgo "Isso é inesperado" Ela arrumou os óculos pequeninos "Deveras inesperado" completou um tanto confusa.
Nem imagina o quanto.
"Então..." A Mãe da Inglaterra bebericou o chá não indicado para diabéticos "Nossa busca findou então"
SUA busca, quer dizer. Integra não pode deixar de pensar áspero outra vez.
"Nesse caso" Prosseguiu a mais velha "Sugiro casamento imediato, não aparenta mais de dois meses"
Ela é advinha agora?
"Quem é o felizardo?" Olhou Integra com ar curioso de mais.
É ruim mentira para a Rainha da Inglaterra?
"Morreu em batalha" Por dentro furiosa, por fora fria e confiante, só podia ser talento.
"Morreu servindo..." A outra repetiu.
"Sim"
Não é bem uma mentira, é?
"Um soldado, então. Velho conhecido talvez?"
"Sim"
Velho, bem velho por sinal.
"Boa patente?"
Como se fala Príncipe em romeno mesmo?
"A mais alta"
"Nome?"
Um nome, claro, estava fácil demais.
"Perdoe-me, Vossa Majestade, mas não estou em condições psicológicas para entrar no assunto referente a..." foi interrompida.
"Claro, impetulancia minha Sir Hellsing" Ela encostou a xícara na mesa percebendo que a mais nova não havia tocado em nada "Vá, não parece disposta" Levantou uma sobrancelha "Quando estiver, conte-me todos os detalhes"
Integra suspirou aliviada preparando-se para levantar.
"Se bem que..." A Rainha a fez sentar-se novamente "Não me lembro de nenhum soldado inglês, de considerável patente, ter morrido nos últimos meses, Sir Hellsing"
Touché.
"Ele não era inglês" E a grávida ainda não tinha mentido.
"Pois bem, a família dele deve comparecer à corte para as devidas procedências"
"Estão mortos, era o único herdeiro" Respondeu de prontidão.
A Anciã levantou uma sobrancelha, derrotada, colocou o guardanapo na mesa.
"Creio que encontrou a cara metade, Sir Hellsing"
Integra agradeceu aos céus por ter sido bem fácil criar documentos falsos que comprovasse a existência de seu amigo imaginário. Nada que algumas libras, algumas ameaças e algumas trocas de favores não possam resolver, afinal, não é a primeira e nem será a última nobre que usa de sua influência (financeira ou não) para burlar sistemas.
Agora com os documentos, estava mentindo para a Rainha, mas correr o risco de ser descoberta era melhor do que ter de admitir, não só à Rainha, mas à corte toda, que acabou por cair nos braços de um vampiro milenar.
Qual era a nacionalidade do falso marido mesmo? Indiano, russo... não lembrava mais, mas uma coisa é certa, romeno era dar muito na cara. De qualquer forma, os meses passaram sem ninguém causar-lhe problemas tocando no assunto na expectativa de conseguir alguma fofoca. Por respeito à grávida viúva e de certa forma solteira? Tinham medo de ser baleados, isso únicos que sabiam de toda a confusa história, excluindo detalhes quentes, é claro, eram: Walter, Seras e Pip.
O mordomo porque sabia, de mais, da vida de sua senhora para cair em conversas de duplo sentido. O Anjo da Morte aposentado não deixou de ficar furioso com o verdadeiro pai da criança, Integra já esperava por isso, Walter era como seu segundo pai, e ele a via como filha. Sendo assim, é claro que o velho declarou a mulher inocente e acusou Alucard das mais diversas maneiras. Pobre velho! Se soubesse da história completa e com maiores detalhes...
Seras não permaneceu na ignorância porque ia acabar descobrindo de uma maneira ou outra. Poderia ler a mente da mestra sem querer, ou não, e encontrar coisas que aos olhos de Integra deveriam ficar somente entre ela e Alucard. Pip ficou sabendo porque Seras acabou por abrir a boca, mas não cometeu esse erro novamente depois de ter uma conversa em particular com seu mestre, Integra não sabia o servo havia falado para a garota policial, mas deve ter-la assustado bastante, o que já basta.
Parou para refletir. Nunca havia dito a Alucard que estava grávida, e não pretendia faze-lo, uma hora ele ia ter que perceber, provavelmente quando ela estivesse de cinco meses ou mais. Toda via, a loira desconfiava que vampiro havia descoberto seu estado muito antes dela mesma. Parando para pensar nunca chegou a falar coisas como 'eu te amo' para ele, e com certeza não o faria tão cedo, se bem que o que fizeram era considerado uma espécie de declaração. Ele, por outro lado, deixou bem claro seus sentimentos por ela, sentimentos, como se ele tivesse algum tipo. Não esperava que ele fosse se tornar o pai exemplar, mas estava um tanto curiosa, mesmo que não queira admitir. Talvez ela nem dê a ele a chance de ser um pai, provavelmente vai fazer a criança engolir a mesma mentira que toda a Inglaterra foi forçada a engolir. Falando em Alucard, ele estava no quarto, não?
Integra acordou de seus devaneios percebendo a claridade. "Já de dia?" ou será finalmente? Olhou para a direita de sua cama encontrando um vampiro encolhido na parte da cama que ainda não batia sol, ele estava colado ao seu corpo, dormindo? Mais pareci morto assim frio e sem respiração. Quando o sol avançar mais provavelmente ele irá se materializar no porão, como fez na noite em que seu filho foi concebido. Depois daquela noite, seu servo usava e abusava da nova intimidade e liberdade, se bem que ele sempre o fizera.
