Vampirinhos

- Ah,não! Sakura, pelo amor de Deus. Crepúsculo de novo?

- Sim, Sasuke. Crepúsculo de novo. E se reclamar, te obrigo a ver a saga inteira.

- …

- Pare de revirar os olhos para mim! Isso é feio e grosseiro.

- Eu sou feio e grosseiro.

- Não é não. Pare de agir como um. Agora, cala a boquinha e senta a bunda nesse sofá.

Sasuke nem pôde retrucar, porque sua melhor (e única) amiga jogou-o contra o sofá, obrigando a ver aquele filme de menininha mais uma vez. Pelas barbas do profeta, Sakura já tinha todas as falas decoradas! Por que rever aquele filme idiota de novo? E pior: por que envolver o pobre Sasuke nessa história?

- Dublado ou legendado, Sasuke?

- Oi?

- Dublado ou legendado? Responde, moleque!

- Ah, tanto faz! É só a droga de um filme, Sakura.

A mocinha o encarou com um olhar indignado, como se Sasuke houvesse ofendido a sua mãe.

- Como assim, "só um filme"? É o melhor filme de todos os tempos, a melhor saga! Como você não consegue gostar? É a história mais linda do mundo!

- Fala sério...

- Tô falando! Olha, um vampiro lindo e sexy se apaixona por uma humana. Não é lindo?

- Não.

Dessa vez, quem revirou os olhos foi Sakura. Bufando, ligou a televisão e sentou-se ao lado de Sasuke, pronta para mais uma maratona de seu filme favorito. Ou, no ponto de vista do amigo, mais uma sessão de tortura psicológica.

Ambos tinham a mesma idade. Conheceram-se quando ainda eram crianças, no jardim de infância. Desde então, eram inseparáveis, apesar da gritante diferença de personalidade e temperamento. Contrastando com a tagarelice e jeito espontâneo de Sakura, Sasuke era taciturno, tímido e reservado. Completando-se como um quebra-cabeças, eles tornaram-se melhores amigos. Agora, com quinze anos, Sakura era a única amiga que Sasuke teve na vida, e que provavelmente teria.

Ajeitando os óculos que escorregavam pelo nariz, o rapazinho encarou a tela à sua frente. O filme mal havia começado e ele já sentia sono. Sakura, por sua vez, não continha a empolgação. Cantava as músicas da trilha sonora alegremente e vibrava a cada vez que o vampirinho brilhante dava as caras.

No fundo, Sasuke entendia porque sua amiga gostava tanto daquele filme infantil. Era a história de uma garota comum, com baixa autoestima e extremamente introvertida e sem graça. Sakura, assim como tantas outras meninas, se identificava com a personagem principal: além do baixo amor próprio, sonhava em encontrar um príncipe encantado, o carinha perfeito.

Ele não pôde evitar uma pontada de ciúmes. Sasuke queria ser o príncipe, o cara com quem Sakura sonhava. Há meses ele estava apaixonado pela amiga, mas não queria admitir e nem contar a ela; além da timidez, não queria estragar a amizade tão bonita que os dois mantinham.

Ali, quietinho, Sasuke observava atentamente o rosto de Sakura. Os traços delicados, o nariz fininho, a testa larga e os lábios vermelhos. Tudo era tão lindo, tudo era tão... Ela.

Ele amava o jeito que Sakura mordia o lábio inferior quando estava tímida ou concentrada em alguma coisa, e amava o sorriso que ela abria toda vez que se encontravam. O sorriso que formava covinhas em suas bochechas. Ah, e ele também amava quando Sakura brincava com as pontas do cabelo quando estava chateada, e quando mordia o dedo indicador para segurar uma risada. E Sasuke também adorava a sua risada, mesmo quando era escandalosa. E os olhos dela... Aqueles olhos verdes, tão brilhantes quando uma joia preciosa. Tão expressivos... Ele conseguia ler o seu olhar quando não havia palavras. Ele sabia que Sakura era chocólatra e viciada em coca-cola, mesmo quando ela tentava esconder esse fato. Ele sabia que ela queria ser médica, mas que também tinha vontade de ser professora (um segredo que só Sasuke tinha conhecimento). E ele também sabia que Sakura era louca por livros de romance histórico, principalmente medievais.

Ela era assim: cheia de particularidades. E eram os pequenos detalhes que o deixavam mais apaixonado pela amiga de cabelo rosa. Quando Sakura ria, ele tinha vontade de rir junto. Quando ela chorava, ele queria abraça-la e segurá-la até a dor passar.

- Por que você está me encarando há tanto tempo, Sasuke? - a mocinha indagou, estranhando o comportamento inatípico do amigo. Sasuke corou e desviou o olhar rapidamente.

- N-nada. Não é nada.

- Tem alguma coisa no meu dente?

- Não. Esquece, não é nada.

Sakura deu de ombros e voltou sua atenção ao filme. Sasuke bem que tentou, mas não conseguia desviar o olhar do rosto de Sakura.

- Veja, Sasuke! O Edward vai beijar a Bella agora! Sabia que é o primeiro beijo dele em 109 anos?

Os olhos negros voltaram-se para o filme. O vampirinho beijava a mocinha, mas deu um pulo e jogou-se contra a parede. Idiotão. Quem, em sã consciência. Interrompia um beijo dessa forma? Ah, se ele beijasse Sakura, com certeza iria continuar.

Droga, droga, droga! Agora ele estava com muita vontade de beijar Sakura. Os lábios dela eram tão bonitos, tão... Tentadores. E para piorar sua situação, ela estava mordendo o lábio inferior, sem ter ideia do efeito que estava causando em seu melhor amigo. Droga, mil vezes droga! Sasuke não conseguia desviar o olhar daquela boca. Ele queria... Não, ele precisava beijá-la.

Agora.

Respirou fundo, procurou coragem dentro de sua alma e decidiu: é agora. Eu vou beijar Sakura. Eu vou beijar Sakura.

Mas como ia fazer isso? Não podia chegar nela e dizer "Sakura, eu quero te beijar". Provavelmente levaria um tapa.

Ele pensou, pensou... E uma ideia brilhou em sua cabeça. Por que não usar o filme idiota ao seu favor? Parabéns, Sasuke. Você é brilhante.

Só precisava de coragem. Era o seu primeiro beijo, tinha que dar tudo certo!

- S-Sakura... - Não passou de um sussurro. Limpou a garganta. - Sakura!

- Hum? - A mocinha virou o rosto para ele.

- Eu... - Vamos, jovem Sasuke. Coragem. Você consegue! - Eu...

- Você?

- Eu quero experimentar uma coisa.

Sakura estranhou, mas sua curiosidade piscou. Assentiu com a cabeça.

- Fica quietinha, tá?

A mocinha arregalou os olhos e o coração disparou. Sasuke estava falando como o Edward! Será que... Será que ele queria beijá-la? Ai, meu Deus... Meu Deus! Era o seu primeiro beijo. Será que Sasuke iria gostar? Será que ela iria beijar bem? E se... E se desse alguma coisa errada, e se batessem os dentes? E se abrisse a boca demais e começasse a babar?

Suas suspeitas foram confirmadas quando Sasuke aproximou-se de seu rosto, bem devagar. Os corações estavam acelerados. As mãos dos jovens tremiam de expectativa e nervosismo.

E então, os lábios se encontraram. Os olhos se fecharam. Sakura mantinha as mãos no colo, sentindo-se extremamente tímida. Sasuke, devagarzinho, colocou a mão no rosto da amiga, em um gesto carinhoso.

O beijo tímido não durou mais que alguns segundos, mas foi o suficiente para fazer os coraçõezinhos dispararem nos peitos. Constrangida, Sakura abaixou o olhar, fitando suas próprias mãos trêmulas.

Por um momento, Sasuke pensou que ela não havia gostado. Mas ao notar o sorriso envergonhado que surgia nos lábios femininos, ele percebeu que estava tudo bem. Sim, Sakura havia gostado do beijo. E Sasuke também.

A mocinha mordeu o lábio, sem conter o sorriso feliz. Por sua vez, Sasuke voltou os olhos à televisão, como se nada tivesse acontecido. Mas em seus lábios também havia um discreto repuxar, mostrando que o jovenzinho estava contente também.

Para o alívio de Sasuke, Sakura não achou estranho. Pelo contrário, ela gostou. Quem sabe, sua amiga também não tinha algum sentimento amoroso por ele? De qualquer forma, deixaria as águas rolarem.

Ele ainda não acreditava que havia beijado sua linda melhor amiga.

Bendito seja ov filme de vampirinhos brilhantes.