- Katekyo Hitman Reborn® e seus personagens pertencem à Amano Akira;

- Essa é uma fanfic yaoi, ou seja, contém relacionamento homossexual entre os personagens. Se você não gosta ou sente-se ofendido com esse tipo de conteúdo sugiro que vá ser feliz lendo shoujo;

- Esta fanfic é continuação de Between you and me, Family Business e Io, tu e loro;

- A postagem continuará semanal, como todas as minhas longfics;

- Enjoem :)


"Lost in the pages of self made cages

Perdido nas páginas de suas próprias jaulas

Life slips away and the ghosts come to play

A vida se esvai e os fantasmas vêm se divertir

These are hard times

Estes são tempos difíceis

these are hard times for dreamers

estes são tempos difíceis para sonhadores

And love lost believers

E os crentes no amor perdido" — Ms Mr, Bones.

Prólogo

A garota pousou o lápis sobre a mesa e Alaudi inclinou-se, observando o que ela havia escrito. A letra era caprichada e levemente tombada para a direita, criando uma maneira romântica e bela de se expressar. Ivan escreve da mesma forma, o louro sentiu seus lábios se repuxarem em um quase inexistente meio sorriso. Os olhos azuis então pousaram sobre sua companhia, que o olhou temerosa. Ela sempre tem a mesma expressão enquanto estuda, como se temesse que um erro pudesse lhe custar muito mais do que uma repreensão. Isso também vem de Ivan, o Guardião da Nuvem sentiu-se levemente embaraçado, pois aquele momento não era sobre seu amante, os dois detestam ser repreendidos.

"Você fez um ótimo trabalho, Catarina." O Inspetor de Polícia notou poucos erros. "Eu acredito que você esteja pronta para frequentar a escola."

A expressão tornou-se pior e foi como se de repente a garota de cabelos ruivos fosse envolvida por uma forte dor de estômago. Os olhos castanhos fitaram a folha de papel e Alaudi suspirou. Ele sabia exatamente o que se passava dentro daquela cabecinha.

"Você não poderá evitar a situação por muito tempo." O louro ajoelhou-se ao lado da cadeira, ficando da altura de sua pequenina companhia. "Você precisa ir para a escola, Catarina."

"Mas durante todos esses anos eu venho aprendendo com vocês, então qual o problema?" A garota parecia realmente aborrecida. "Você me ensina Italiano, Mario Matemática, Peppe História e Geografia e eu adoro aprender Literatura com pappà! Ah! E Ugetsu prometeu que me ensinará japonês quando tiver tempo livre. Eu não entendo porque preciso ir à escola."

"Nós não sabemos tudo." Dizer aquilo foi difícil. Uma parte do Guardião da Nuvem concordava totalmente com Catarina. Aquela mesma parte, porém, não poderia ser dominante. Sua própria vida escolar havia sido péssima até conhecer Giulio e então tudo se tornou diferente. Entretanto, havia aquele lado dentro dele que gostaria de proteger sua filha de qualquer tipo de experiência negativa. Ela não é como eu costumava ser. Catarina tem uma personalidade dominante e provavelmente não passará por nada daquilo, mas quem pode me garantir? "E você precisa interagir com outras crianças. Você vive em uma casa basicamente de adultos. Adultos e homens."

"Eu não me importo e você sabe disso, pappà". A garota ruiva soltou um longo suspiro. "Francis e Enrico brincam comigo, e eu não me sinto sozinha, nem um pouco sozinha! As outras crianças são estúpidas e eu não quero falar com as garotas. Elas são ainda mais estúpidas."

Eu não deveria me sentir orgulhoso por vê-la achar que todos são tolos, embora eu concorde com essa afirmação. O Inspetor de Polícia sabia que não poderia deixar suas opiniões pessoais se sobreporem à sua função como pai. Ouvir-se chamado de pappà fez seu coração pular uma batida, como sempre acontecia. Todavia, era difícil. Há pouco mais de duas semanas ele e Ivan tentavam convencer Catarina de que eventualmente ela precisaria ir à escola. No fundo, ambos sabiam que a garota iria de qualquer forma, contudo, nenhum deles se sentia realmente inclinado a obrigá-la a ir. Se eu não conseguir convencê-la tudo o que nos resta fazer é contar com Giuseppe. Ele será nossa última esperança. Alaudi levantou-se e suspirou. Quando o assunto eram os herdeiros dos Cavallone, Giuseppe era sempre a pessoa certa para conseguir as coisas.

"Quanto tempo eu tenho até que as aulas comecem?" Catarina saiu da cadeira de Ivan, atrás da larga mesa. Sua voz soou resignada.

"Alguns meses. As aulas deste ano já começaram, então você entraria somente em setembro." O louro tentou ao máximo esconder sua surpresa. Eles ainda estavam no meio de março, e a pequena teria pelo menos cinco meses de férias.

"Certo. Então até setembro eu não quero mais ouvir falar nisso." A garota ruiva ergueu os olhinhos castanhos. "Eu posso ir agora?"

O Guardião da Nuvem dos Vongola entreabriu os lábios, no entanto, não completou seu pensamento. Sua resposta foi um breve menear de cabeça e Catarina afastou-se, deixando o escritório sem olhar para trás uma única vez. Eu não posso passar a mão na cabeça dela. O Inspetor soltou um último longo suspiro. Ele nunca achou que viveria para ter aquele tipo de problema e lidar com a pequena estava sendo muito mais complicado do que havia sido com Francesco. Na época, o rapaz não havia criado problemas, e partiu dele mesmo a iniciativa para entrar na escola. Ele tinha um amigo, Alaudi precisou lembrar-se. O herdeiro dos Cavallone era amigo do filho do médico da Família, porém, Catarina não possuía ninguém. Seria um mundo totalmente novo para alguém acostumado a lidar com adultos.

O louro permaneceu mais algum tempo no escritório, pensando e ponderando sobre a situação. O dia estava parcialmente bonito do lado de fora e era agradável observar as estações mudarem. O inverno se despedia, deixando para trás uma montanha de neve. O jardim estava diariamente úmido, mas o céu já se tornava azul vez ou outra, anunciando a primavera. Em um mês mais ou menos poderemos ver as flores. A visão deste lugar é um dos mais belos durante a primavera, então a paisagem valerá à pena. O Guardião da Nuvem deixou o escritório, cruzando o longo hall. Alguns subordinados passavam pelo local, abaixando a cabeça e desejando boa tarde. O Inspetor retribuiu aos cumprimentos com um menear de cabeça, subindo a escadaria e imaginando se Ivan ainda estaria trabalhando. Desde cedo seu amante estava na escrivaninha do quarto, relendo relatórios e repassando correspondências. Ele deve estar de mau humor. Ivan odeia trabalho de escritório.

O último degrau da escadaria coincidiu com o barulho da porta do hall de entrada sendo aberta. Alaudi parou e virou o rosto, observando o momento em que Francesco adentrava. Giuseppe vinha ao seu lado e, pela expressão em seu rosto, ele tentava carregar a maleta do Chefe, contudo, o rapaz de cabelos castanhos claramente não permitia.

"Alaudi!" O futuro Chefe da Família abriu um largo sorriso ao vê-lo na parte de cima da casa. O Braço Direito fez uma polida reverência, oferecendo um meio sorriso.

"Como foi sua aula, Francesco?" O louro esperou sua companhia subir as escadas para iniciar o diálogo. Ele parece feliz. Se ao menos Catarina compartilhasse metade dessa animação...

"O mesmo, nada demais." Francesco vestia o uniforme azul escuro da escola. Havia um brasão do lado esquerdo, e vestido daquela forma ele parecia uma versão mais jovem de Ivan. "Meu pai ainda está trabalhando?" Os olhos cor de mel encararam a porta do quarto principal e ele fez uma careta. "Mario está com ele?"

"Sim." O Guardião da Nuvem respondeu somente à primeira pergunta. O único motivo que o fazia ainda estar ali era justamente o homem de cabelos ruivos.

"Eu preciso falar com meu pai." O rapaz de cabelos castanhos coçou a nuca, enquanto olhava para Alaudi. "Enrico me convidou para passar o sábado em sua casa. Você acha que teria algum problema?"

Era difícil para o Inspetor de Polícia ouvir aquele tipo de coisa e não se sentir lisonjeado. Muitas vezes ele não acreditava que fizesse parte daquela família a ponto de ser consultado para decisões importantes. O herdeiro, em particular, era uma pessoa que não se importava em pedir permissão ou a opinião de Alaudi. Sempre que ele não sabe como pedir algo diretamente para Ivan ele vem primeiro a mim. Francesco tornou-se esperto. A resposta para aquele pedido saiu natural, como se ele soubesse exatamente o que dizer:

"Se não for inconveniente para a família de Enrico eu não vejo problemas." O louro respondeu cortês. Seus olhos azuis fitaram a figura de Giuseppe, um pouco atrás de seu Chefe, e o jovem homem meneou a cabeça em positivo, mostrando que concordava com aquela ideia.

"Ótimo!" O sorriso que o rapaz de cabelos castanhos esboçou era de pura felicidade. Ele e Enrico haviam se tornado mais unidos depois que entraram na adolescência. O filho de Ottavio tinha a ambição de seguir a profissão do pai, e o Guardião da Nuvem até mesmo ouvira sobre uma promessa entre os garotos de que Enrico continuaria a ser o médico da Família. "Eu falarei com meu pai quando ele estiver livre. Obrigado, Alaudi!"

O herdeiro da Família ofereceu outro sorriso antes de seguir na direção de seu quarto. Giuseppe meneou a cabeça ao passar pelo louro, acompanhando seu Chefe. Quando a porta foi fechada, o Guardião da Nuvem encarou o final do corredor, sentindo o estômago dar voltas. Eu preciso voltar para casa esta noite, então não tenho muito tempo. Aquela havia sido uma visita inusitada. Geralmente o Inspetor de Polícia aparecia somente aos finais de semana, no entanto, naquela quinta-feira, em especial, Alaudi dirigiu-se à mansão por não ter nada muito relevante para ser feito na sede. Sempre existirá trabalho, o louro engoliu seco e decidiu seguir pelo corredor, entretanto, está cada vez mais difícil me afastar desse lugar.

Aquela realização não era nenhuma novidade. O Guardião da Nuvem sabia melhor do que ninguém a maneira como seu peito doía todas as segundas-feiras, quando ele precisava retornar para Roma. Sua mente vagava durante a semana, e muitas vezes ele se pegava contando os dias para a nova sexta-feira chegar, sabendo que retornaria para aquele lugar. A porta do quarto principal apareceu diante de seus olhos e o Inspetor encarou a maçaneta dourada. Se ele ainda estiver ocupado eu retornarei mais tarde. A mão direita foi esticada, todavia, antes que ele pudesse girá-la, alguém parecia ter feito o mesmo do lado oposto.

A face que o encarou pertencia à última pessoa que ele gostaria encontrar. Mario levantou as sobrancelhas ruivas, olhando-o com uma mistura de surpresa e falsa amabilidade. Ele vestia um conjunto social negro, com exceção da camisa branca. Os cabelos estavam soltos naquela tarde, e tudo naquela pessoa fazia com que o humor de Alaudi se tornasse pior.

"Vê, Ivan?" O Braço Direito virou metade do corpo e dirigiu-se para a pessoa que se espreguiçava próxima à janela. "Eu disse que trabalho árduo sempre é recompensado!" O ruivo voltou-se para o louro e abriu um amável e insolente sorriso. "Ele é todo seu."

Mario deixou o quarto, carregando em mãos dois envelopes que pareciam recheados de documentos. O Guardião da Nuvem entrou no cômodo, fitando a escrivaninha e vendo-a totalmente livre dos documentos. Ivan havia caminhando próximo à cama, e abriu um largo e sincero sorriso ao vê-lo. O Inspetor fechou a porta, olhando ao redor apenas para disfarçar os passos que também o levavam na direção de seu amante.

"Você já pretende ir?" O moreno desabotoou as mangas de sua camisa.

"Não. Eu irei mais tarde." O Inspetor encarou a janela. O céu ainda estava claro, logo, ele teria algumas horas antes de retornar para o centro de Roma.

"Eu só preciso de um banho e depois poderemos fazer o que você quiser." O Chefe dos Cavallone abriu a camisa. "O que acha de darmos uma volta pela propriedade? Podemos ir de carro ou a cavalo, se preferir. Mario disse que em alguns locais a neve derreteu e já é possível trafegar sem problemas."

Alaudi permaneceu imóvel ao lado da cama. Ele havia pegado gosto por passeios a cavalo, e muito lhe agradava cavalgar um pouco. Sua mente sempre se tornava mais clara depois daqueles passeios, entretanto, o louro não se sentia inclinado a certas aventuras naquele dia. Eu prefiro ficar aqui... o Guardião da Nuvem abaixou os olhos. Ele não conseguiria dizer claramente aquelas coisas. Palavras nunca foram o seu forte.

"... ou você poderia me acompanhar durante o banho."

A voz veio de algum lugar ao lado e o Inspetor deu um passo para trás ao notar que Ivan havia caminhado até ele. Os olhos azuis fitaram seu amante, encarando o belo rosto e descendo pelo pescoço e peitoral. A camisa azul clara estava aberta e o contraste fez Alaudi desejar aquele banho.

"Um banho?" O louro ergueu uma sobrancelha. As mãos do moreno tocaram sua cintura, retirando a camisa de dentro da calça.

"Podemos começar com um banho..." O Chefe dos Cavallone abriu um meio sorriso. Seus dedos desabotoavam com pressa a camisa branca que o Guardião da Nuvem vestia. "Eu não farei nada que você não queira."

O Inspetor de Polícia sabia que havia perdido aquela luta antes mesmo de ter decidido lutar. Sua camisa deslizou por seus ombros, sendo jogada ao chão sem nenhuma importância. Ivan tocou seu ombro e sua mão desceu pelo peitoral pálido de Alaudi, parando apenas para tocar a corrente dourada que pendia pelo pescoço. A peça foi puxada e com ela o corpo do louro moveu-se. Os lábios do moreno o receberam com um longo beijo, que foi impossível de não ser correspondido. O Guardião da Nuvem sentiu suas mãos segurarem o rosto de seu amante, enquanto sua língua envolvia a do Chefe dos Cavallone. A carícia durou o tempo suficiente para que qualquer pensamento negativo que o Inspetor de Polícia ainda possuísse fosse esquecido. Ivan depositou um casto beijo sobre a franja loura, puxando-o pela mão e seguindo na direção do banheiro.

A primeira coisa que o moreno fez foi andar até a outra extremidade do banheiro e abrir as torneiras que encheriam a banheira. O Guardião da Nuvem ficou um pouco surpreso, pois, geralmente, quando ambos tinham o intuito de tomar banho e fazer outras coisas, o Chefe dos Cavallone sempre optava pelo chuveiro, por ser mais prático. Ele não está com pressa. O Inspetor fechou a porta, passando a chave e garantindo que eles não seriam importunados. Ivan retornou até ele, um sorriso ainda maior em seus lábios e os mesmos olhos brilhantes de excitação. Ele parece uma criança. O momento infantil, porém, passou rapidamente e Alaudi espantou-se novamente com a capacidade que seu amante tinha de tornar-se sério e composto quando o assunto era de seu interesse. O moreno retirou a camisa azul e os olhos azuis estiveram o tempo todo naquele rápido movimento. Seu corpo respondeu à visão de seu amante parcialmente nu, e o louro passou a dar atenção para o cinto de sua calça. As peças foram retiradas, mas foi impossível para ele prosseguir ao chegar à roupa de baixo. Aqueles dez anos não o ensinaram a perder completamente a vergonha.

O Chefe dos Cavallone aproximou-se, fazendo com que o Guardião da Nuvem erguesse os olhos. Ivan era mais alto, no entanto, naqueles momentos ele parecia muito maior. Havia um meio sorriso naqueles lábios rosados e o moreno piscou antes de dar meia volta e seguir na direção da banheira. O Inspetor engoliu seco, observando seu amante cruzar o banheiro completamente nu. As longas pernas, os ombros largos e as costas bem definidas... eram em momentos como aquele que Alaudi não acreditava que realmente pudesse ser o interesse amoroso daquele homem; o mesmo homem que esteve em sua cama na última década. A roupa de baixo branca foi retirada e o louro não perdeu tempo em seguir seu amante. O Chefe dos Cavallone havia entrado primeiro na banheira, contudo, ofereceu a mão para o Guardião da Nuvem. O gesto foi aceito e o Inspetor sentiu a água quente quando se sentou entre as pernas de Ivan.

"Confortável?" A voz do moreno soou baixa e ele encostou-se um pouco mais à borda da banheira.

"Sim." Alaudi não mentiu. Ele estava realmente confortável. Seu corpo deixou-se pender para trás, e ele sentiu a o calor da pele do moreno.

"Quer escolher?" O Chefe dos Cavallone apontou para o lado esquerdo. Aquela parte formava uma espécie de pequena escadaria, contendo três degraus. Cada degrau era forrado por produtos que iam de sabonetes líquidos a sais de banho. As embalagens mudavam de cor e de linguagem. As favoritas do louro eram as mais simples e que adicionavam um aroma floral ao ambiente. Naquela tarde a escolha foi um frasco indiano que ele sabia ter cheiro de frutas. Um pouco do conteúdo foi despejado à água e o Guardião da Nuvem não pôde evitar olhar para outro frasco ao fundo. O óleo lubrificante levou uma coloração rosada às suas bochechas e foi impossível não pensar se eles o utilizariam em algum momento do banho. "Você está bem, Alaudi? Seu rosto está vermelho."

"Estou ótimo." O Inspetor desconversou. "Precisamos falar sobre Catarina e Francesco."

"Agora?" Havia uma pitada de desanimo na voz de Ivan.

"Catarina aparentemente aceitou ir à escola." Alaudi entendia aquele desanimo. Convencer a pequena garota acabou mostrando-se um desafio.

"Você fala sério?" O moreno o segurou pelo braço e o louro virou um pouco o corpo, pois era difícil conversar naquela posição.

"Sim. Ela ainda não gosta da ideia, mas pareceu menos irredutível quando conversamos. Talvez com o incentivo certo ela possa abraçar a causa."

"Hm... acho que deixarei para Giuseppe esta parte. Da última vez que tentei, ela se trancou o dia inteiro no quarto e você lembra como foi difícil tirá-la de lá."

"Compartilho da mesma opinião. E ela irá com Francesco e Enrico, então não ficará totalmente sozinha. Eu tenho certeza de que eles a protegerão." Embora eu acredite que o contrário soe mais plausível...

"Certo, e o que Francesco aprontou dessa vez?" O tom desanimado tornou-se gracioso.

"Nada... por enquanto." O Guardião da Nuvem tocou a espuma que havia se formado na superfície da água. O banheiro cheirava a salada de frutas e aquilo muito o agradava. "Ele pediu para passar o sábado na casa de Enrico e eu disse que não via problemas."

"Então está tudo acertado." O Chefe dos Cavallone depositou um estalado beijo na bochecha direita de seu amante. "Se você não vê nenhum problema eu estarei mais do que feliz em concordar. Sem contar que será um a menos para nos perturbar durante o fim de semana."

"Você realmente tem atenção seletiva, não?" O Inspetor de Polícia apertou os olhos. Uma parte dele também havia pensado sobre a ideia de poder, talvez, ter algumas horas particulares com aquele homem. Desde que Francesco entrou na adolescência e Catarina... bem, continuou a ser Catarina, os momentos privados entre eles haviam diminuído consideravelmente. Eu sinto falta dos dias em que passávamos o tempo todo dentro do quarto. Nós descíamos somente para comer alguma coisa e depois retornávamos. Eu não consigo me lembrar da última vez que fizemos isso.

"Seja claro, Alaudi. Eu não entendi o que você quis dizer." Ivan não pareceu perder o bom humor.

"Francesco já tem 15 anos; é praticamente um homem. E talvez seja hora de conversarmos com ele sobre certas coisas."

"Oh! Você fala de garotas..." O moreno riu. "Eu acho que ainda é muito cedo para falar sobre isso."

"Eu não me referia somente às garotas." O louro abaixou os olhos. A espuma era branca e batia na altura de seu peitoral. A água estava constantemente quente e o calor do corpo do Chefe dos Cavallone junto ao seu criava uma agradável sensação. "Nós temos que falar com ele sobre garotos também."

O sorriso desapareceu dos lábios de Ivan e ele, por um breve momento, tornou-se sério. Sua cabeça pendeu para trás e os olhos cor de mel encararam o teto antes de voltar a atenção para o Guardião da Nuvem.

"Você acha que ele e Enrico podem estar juntos... juntos?"

"Não." O Inspetor de Polícia sabia que ouviria aquilo, então a pergunta não o surpreendeu. "Contudo, acredito que Francesco precise saber de algumas coisas. Sobre certos assuntos... Pois, se algum dia ele se encontrar dividido, possa saber que você estará ao lado dele."

"Nós, não? Nós estaremos ao lado dele." A mão pesada tocou a cabeça de Alaudi, molhando seus cabelos. "E eu entendi o que você quis dizer e concordo. Depois do fim de semana nós pensaremos sobre isso, está bem?"

O louro balançou a cabeça, achando que aquela conversa havia sido promissora. Seu corpo voltou a deitar-se sobre o peito do moreno, e ele fechou os olhos e permitiu-se relaxar um pouco. Somente algumas horas. Amanhã à noite eu retornarei. A saudade antecipada o deixava ansioso, todavia, o Guardião da Nuvem sabia melhor do que ninguém que tais sentimentos eram inúteis. Ele não abandonaria seu trabalho, assim como não deixaria sua família em segundo plano. Era apenas... complicado.

Uma breve conversa iniciou-se após alguns segundos. Há algum tempo o Chefe dos Cavallone colocara na cabeça que ambos precisavam de férias, e tentava incentivar o Inspetor de Polícia a aceitar seu convite para viajarem, somente os dois, para qualquer lugar. Alaudi já perdera a conta de quantas vezes havia declinado o convite, no entanto, ultimamente ele pegou-se ponderando sobre aquela ideia. Quatro dias longe de tudo. Somente nós dois. O pensamento o fez fechar os olhos, imaginando se eles sairiam dos limites da cama ou passariam o tempo todo ocupados demais com outras coisas. A data ainda não havia sido sequer estipulada, porém, pelo tom de voz de seu amante, Ivan planejava ir durante o verão.

"Eu pensarei a respeito." Foi tudo o que o louro conseguiu dizer. Uma afirmativa deixaria o moreno em estado de êxtase, e infelizmente ele teria de ouvir sobre aquilo diariamente; a negativa acabaria com o humor do momento, logo, o Guardião da Nuvem optou pelo talvez que trazia consigo um mundo de possibilidades.

"Certo." O Chefe dos Cavallone pareceu animado com a incerteza. Desde que não fosse um não definitivo aquele homem jamais perderia a esperança.

As mãos de Ivan deslizaram por seus ombros e o Inspetor de Polícia abriu os olhos. Os lábios tocaram seu pescoço, depositando pequeninos e delicados beijos. Alaudi sabia muito bem até onde aquelas carícias o levariam e ele não se importava. Na noite anterior eles trocaram apenas curtos beijos, pois, como a visita não fora planejada, o moreno não pôde desvencilhar-se de seu trabalho e Mario garantiu que seu Chefe permanecesse boa parte na noite no escritório. Seu corpo virou-se devagar, até que ambos estivessem frente a frente novamente. O Chefe dos Cavallone deslizou as pontas dos dedos pelo rosto pálido do louro, deixando que o toque descesse pelos ombros e peitoral. Ele não conseguia ver além da superfície por causa da espuma, logo, não haveria motivos para se envergonhar... ainda.

O beijo iniciou-se quando Ivan aproximou o rosto e, como resposta, o Guardião da Nuvem fechou os olhos, correspondendo à carícia. Sua língua movia-se devagar, saboreando o interior da boca de seu amante e deixando que suas mãos tocassem o largo peitoral do moreno. A pele estava quente e a água tornava tudo escorregadio e um pouco divertido. Seu corpo foi trazido um pouco mais para cima, e então o contato se tornou direto. O Inspetor ajeitou-se melhor, sentando-se sobre o colo do Chefe dos Cavallone e apoiando um joelho de cada lado do fundo da banheira. As mãos de Alaudi desceram um pouco e, embora soubesse que aquilo era ousado demais para ele, havia uma estranha necessidade por contato que o louro não sabia explicar de onde vinha. Ivan gemeu baixo entre o beijo ao sentir as mãos de seu amante tocarem seu membro; a surpresa pareceu genuína e o moreno abriu os olhos, oferecendo um largo e maldoso sorriso.

"Oh! Não pare." O Chefe dos Cavallone subiu a língua pelo pescoço do Guardião da Nuvem ao notar que os movimentos cessaram. O Inspetor suspirou, arrepiando-se com a carícia. Suas mãos voltaram a tocar o membro de seu amante, sentindo-o crescer entre seus dedos. "Quer ir para o quarto?" Ivan lambeu novamente o pescoço de Alaudi. "Por mais que eu goste desse ambiente, tudo tem gosto de sabonete."

O louro precisou se esforçar para não rir. Seu corpo ficou em pé e ele virou-se no mesmo instante, saindo da banheira. O piso estava escorregadio, entretanto, ele cruzou o espaço rapidamente, pegando a toalha que estava próxima à porta e a passando pela cintura. O quarto estava iluminado demais para o seu gosto, mas seria impossível se dar ao trabalho de abaixar as cortinas. O Guardião da Nuvem não teve tempo de sentar-se na cama, pois, assim que se aproximou da larga mobília, uma grande mão puxou sua toalha, jogando-a para o lado, enquanto outra mão o aproximava pela cintura, iniciando um segundo beijo. O Inspetor de Polícia deixou-se cair sobre a cama, suspirando quando os corpos se encontraram, úmidos e sedentos por prazer. A ereção do moreno estava tão visível quanto a sua, então seria difícil negar tal necessidade. A língua do Chefe dos Cavallone desceu por seu pescoço, porém, ela ignorou o peitoral, indo direto ao prato principal. Alaudi moveu-se na cama, juntando as sobrancelhas e mordendo o lábio inferior. Ele jamais conseguiria explicar a sensação de ter seu membro provocado daquela forma. Desde a primeira vez que dormiu com Ivan, o louro nunca mais conseguiu encontrar conforto em seus momentos privados. Dizer que ele não se tocava quando estava longe do moreno seria uma gigantesca mentira, entretanto, havia uma colossal diferença entre masturbar-se em sua casa e ter aquele homem tocando-o de todas as maneiras possíveis e imagináveis.

Os gemidos começaram a ecoar em poucos minutos. O Guardião da Nuvem puxava a roupa de cama, tentando prolongar um pouco mais aquela sensação. O Chefe dos Cavallone havia trazido o frasco de óleo lubrificante, e um de seus dedos já se movia com facilidade dentro do Inspetor. Não é suficiente... Alaudi queria pedir para que Ivan adicionasse mais dois dedos, contudo, seria impossível. Somente sobre a influência de álcool o louro conseguia dizer certas coisas e, infelizmente, ele estava totalmente sóbrio naquele momento. O desejo do Guardião da Nuvem seria realizado após algum tempo, e então seus gemidos tornaram-se mais altos. O moreno conhecia seu corpo e sabia exatamente onde tocar. Nas mãos do Chefe dos Cavallone ele tinha plena certeza de que encontraria prazer e aquela dependência um dia o incomodou, no entanto, depois de todos aqueles anos seria difícil fazer seu corpo, e principalmente seu coração, não aceitar aqueles momentos.

O Inspetor de Polícia suportou todos aqueles longos minutos de tortura. Em vários momentos ele achou que seu corpo cederia, todavia, foi somente quando Ivan afastou um pouco mais suas pernas e o penetrou que Alaudi simplesmente desistiu de lutar. O orgasmo o fez inclinar a cabeça para trás e o gemido que deixou seus lábios foi agudo e necessitado. O louro não sentiu as primeiras estocadas, totalmente absorto no prazer que seu corpo ainda experimentava. Foram necessários alguns preciosos segundos até que ele pudesse voltar a se situar no que acontecia, porém, quando isso aconteceu, não havia nada a fazer além de gemer alto para cada vez que a ereção de seu amante tocava em seu ponto especial.

Há dez anos, quando ambos iniciaram aquele relacionamento, o Guardião da Nuvem jamais teria se permitido aquele tipo de ousadia. Sexo entre eles só acontecia durante a noite, mesmo que eles possuíssem oportunidades de se envolveram a luz do dia. Entretanto, pouco a pouco o moreno foi encontrando pequeninas brechas na sólida resolução do Inspetor. Um beijo aqui e ali, um abraço displicente no escritório... foram as pequenas ações que conquistaram Alaudi, até ele perceber que estava perdendo tempo com suas negativas. Quando Catarina chegou a casa a rotina inteira foi mudada e o louro viu-se muitas vezes sem suas horas de carícias. O Guardião da Nuvem não tinha ilusões de que aquele tempo retornaria, ainda mais porque era fácil perceber que, quanto mais velhas as crianças se tornavam, mais difícil seria encontrar tempo para eles. Então, para o sempre sério e centrado Inspetor de Polícia ter permitido que o Chefe dos Cavallone o possuísse no meio da tarde e com as cortinas abertas, era porque Alaudi aprendera a dar valor aqueles raros e doces momentos.

Ivan moveu-se mais duas vezes e o louro soltou a roupa de cama. Seu corpo foi puxado um pouco para cima e ele sentiu o momento exato em que seu amante depositou o orgasmo dentro dele. Eu vou precisar de outro banho... O Guardião da Nuvem tinha os olhos fechados, sentindo as mãos do moreno segurarem seu quadril. O toque tornou-se menos apertado, até transformar-se em gentileza. O Chefe dos Cavallone retirou-se devagar e deitou-se sobre o Inspetor. Os olhos azuis se entreabriram, recebendo em troca um par de belos e semicerrados olhos cor de mel. Ivan passou a língua sobre os lábios de Alaudi, pedindo passagem e invadindo sua boca com um longo beijo. As línguas se encontraram, mas infelizmente a carícia foi interrompida quando o louro deixou escapar um inusitado gemido. Seu rosto virou-se para a esquerda e ele voltou a segurar a roupa de cama, envergonhado demais para encarar seu amante diretamente.

As mãos do moreno subiram e desceram pelo membro. A ereção do Guardião da Nuvem havia retornado no meio do ato e ele sabia que seu amante jamais o deixaria naquela situação, contudo, em sua mente ele achou que não seria tão rápido. Os movimentos eram fortes e o Chefe dos Cavallone não poupava esforços em fazer o Inspetor contorcer-se sobre a cama. Os lábios de Ivan mordiscaram a orelha direita de Alaudi, claramente provocando-o.

"Você quer que eu o toque... aqui?"

As palavras foram cantadas por uma rouca voz. A outra mão do moreno tocou a entrada do louro, no entanto, ele não a penetrou. O Guardião da Nuvem queria protestar, mandar aquele homem parar de dizer aqueles absurdos, mas seria humanamente impossível. O Inspetor de Polícia conhecia seu corpo e há muito tempo ele sabia que não conseguiria chegar ao orgasmo apenas com um único estímulo. O que o aborrecia era saber que aquela pessoa também tinha conhecimento... de suas fraquezas, de seus medos e do que era capaz de fazê-lo feliz. Alaudi virou o rosto meneando a cabeça em positivo. O Chefe dos Cavallone o penetrou no mesmo instante e os dois dedos foram direto ao ponto especial do louro. O clímax aconteceu após a segunda estocada e o Guardião da Nuvem achou que perderia a consciência. Tudo se tornou escuro e de repente nenhum som chegou aos seus ouvidos. Todavia, quando Ivan depositou um gentil beijo em sua testa, o Inspetor abriu os olhos, completamente despertado.

"Quando foi a última vez que fizemos isso? Dessa forma?" O moreno ainda tinha a voz rouca. Alaudi tentou recordar-se e, realmente, havia sido há algumas semanas. "Eu mal posso esperar pelo sábado... As coisas que eu farei com você, Alaudi." Havia uma estranha e convicta certeza naquelas palavras e o louro engoliu seco. Ele estava um pouco ansioso por aquele final de semana.

O Chefe dos Cavallone o tomou nos braços e o beijo que trocaram foi longo e teve gosto de saudade, tanto pelos dias que eles permaneceram afastados, quanto as mais de 24 horas que separavam o dia atual do final de semana. O Guardião da Nuvem retornaria na noite seguinte, mas ele entendia aquela necessidade por contato. Suas mãos subiram devagar pelas largas costas de Ivan, sentindo a pele úmida e principalmente o homem que estava sobre ele. O Inspetor amava fazer sexo. Foi no corpo do moreno que ele descobriu que, apesar de não gostar de ter contato com pessoas no geral, Alaudi não se importava quando quem o tocava era seu amante. Entretanto, os momentos pós-sexo muito lhe agradavam também. Ele não sabia se era a tranquilidade ou a sensação de extrema satisfação, no entanto, não havia sensação mais agradável do que sentir-se nos braços do Chefe dos Cavallone. Era seguro. Uma estranha e inexplicável sensação de pertencer a algum lugar. Uma peculiar certeza de que ele havia encontrado o único local que poderia chamar de seu. E, quando Ivan interrompeu o beijo e ergueu o rosto, o louro sentiu como se não houvesse passado apenas dez anos, mas uma vida inteira. Ele sentia como se houvesse conhecido aquele homem durante toda a sua vida.

O Guardião da Nuvem deixou a mansão depois do jantar e como todas as vezes que precisou se despedir de sua família, o Inspetor de Polícia fez o possível para não deixar transparecer nenhum sentimento. Catarina havia corrido até o veículo, pendurando-se na janela e perguntando várias vezes se Alaudi realmente retornaria no dia seguinte. A garota de cabelos ruivos só se afastou quando o louro respondeu, com um meio sorriso, que nada no mundo o faria não voltar. A pequena então esboçou um largo sorriso, acenando e desejando uma boa noite. O Guardião da Nuvem lançou um último olhar na direção de seu amante e então o carro deu a volta pelo chafariz em forma de dois cavalos alados, seguindo rumo à saída da mansão.

O caminho de volta foi feito sem nenhum imprevisto. Os quarenta minutos que o Inspetor passou na estrada foram gastos com trabalho e, ao estacionar na frente de sua casa, Alaudi sentia-se cansado. O local estava do jeito que ele havia deixado e isso incluía os jornais sobre a mesinha de centro e dois ternos sobre a cama. Ele ficara em dúvida, no dia anterior, se deveria ir com roupas mais grossas. O inverno estava no fim, contudo, imprevistos aconteciam a qualquer hora. As roupas foram recolocadas no guarda-roupa e o louro vestiu seu pijama escuro. Ele havia se banhado e jantado na mansão, então não restaria nada a fazer além de dormir. O relógio marcava pouco mais de 21h quando o Guardião da Nuvem se deitou, embora só conseguisse mesmo dormir algum tempo depois. E, quando seus olhos se fecharam e o Inspetor finalmente dormiu, mal ele sabia que os acontecimentos do dia seguinte o fariam perder o sono por muitas e muitas noites.

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O trabalho não era tão difícil quando as pessoas envolvidas decidiam cooperar.

A regra número um da sede de Polícia era que cada um seria responsável pelo próprio trabalho. Alaudi era um Chefe generoso, e os subordinados sabiam que receberiam os méritos devidos pelo trabalho bem feito. As últimas semanas estavam calmas e não houve nenhum caso realmente relevante ou preocupante em Roma. Entretanto, o mesmo não poderia ser dito sobre o que acontecia fora daquela cidade. Pois, no último mês, o louro havia perdido a conta de quantas vezes lera a mesma manchete nos jornais.

"Eles encontraram outro morto, desta vez uma mulher." Os olhos azuis fitaram o jornal, mas o Guardião da Nuvem não se deu ao trabalho de ler a matéria. Ele já imaginava do que ela se tratava. "Você a conhecia?"

"De vista. A mulher estava no baile, naquela noite." A voz de Giulio tinha uma pitada de tristeza. O Inspetor pousou a caneta sobre a mesa, apoiando o queixo na mão esquerda. "Você acha que isso tem relação com a visita?"

"Eu não tenho dúvidas." Alaudi ergueu os olhos. O relógio do outro lado de sua sala marcava quase 16h. "Os homens já foram embora?"

"Quase todos." O moreno moveu a perna de maneira inquieta. Ele estava nervoso.

"Você não precisa ficar, Giulio. Eu posso resolver isso sozinho."

"Eu não irei a lugar algum, Alaudi." Giulio esboçou um meio sorriso, mas logo sua expressão se tornou séria novamente. "Você contou a ele?"

O louro meneou a cabeça em negativo. Ele provavelmente já sabe e nós não falamos sobre trabalho. Há um mês o Guardião da Nuvem vinha ignorando as manchetes dos jornais, como se elas pudessem simplesmente desaparecer do dia para a noite. Nas últimas quatro semanas várias pessoas importantes começaram a morrer de maneira misteriosa, todas em solo italiano. Veneza, Nápoles, Turim... todos os lugares menos Roma. O Inspetor de Polícia não acreditava em coincidências. Naquele ramo de trabalho, por mais anos do que os dedos de sua mão poderiam contar, Alaudi sabia muito bem que alguma coisa estava acontecendo e isso o deixava simplesmente possesso. Minha cidade, minhas regras. A simples ideia de que alguém poderia estar aprontando, ou prestes a aprontar, bem debaixo de seu nariz o enfurecia, ao mesmo tempo que o preocupava. Havia um padrão em todas aquelas mortes. Um detalhe que poderia passar despercebido para um cidadão comum, no entanto, que jamais seria ignorado pelo louro: todos os mortos eram poderosos Chefes da máfia italiana. Todos, sem exceção.

Stefano Costelle, Vincent Cirillo, Nicholas Gigante, Domenico Gambino...

Em uma sexta-feira normal o Guardião da Nuvem estaria se preparando para deixar a sede de polícia, todavia, naquele dia em especial, seus olhos permaneceram no relógio por mais tempo do que seria necessário e, quando o ponteiro marcou 16h em ponto, acompanhada por três leves batidas na porta, o Inspetor sentiu um incomodo frio na espinha. O Braço Direito ficou em pé, lançando um rápido olhar na direção do homem sentado atrás da mesa. A porta foi aberta e Alaudi postou-se de pé para receber as visitas. O primeiro a entrar foi um homem com cerca de seus 60 anos, cabelos parcialmente grisalhos e perfeitamente penteados. Seus olhos eram castanhos e embaixo dos traços marcados pela idade era possível ver um resquício de beleza da juventude. Marco Apollo era seu nome e aquele homem era o temido e respeitado Chefe da Força Policial Italiana, e também a pessoa que havia recrutado o louro há muitos anos. Atrás vinha um homem mais jovem, com cerca de 30 anos. Os cabelos eram negros e pendiam na altura das orelhas, arrumados e lustrosos. Os olhos eram azuis e havia algo naquela pessoa que não agradou ao Guardião da Nuvem, ou melhor, que o fez lembrar-se de alguém que ele detestava... O mesmo olhar. Aposto que são farinha do mesmo saco. A figura de Mario desapareceu de sua mente quando a porta foi fechada e o Inspetor retornou à realidade.

"Boa tarde, senhor." Alaudi ofereceu a mão, ficando um pouco tímido quando o cumprimento foi retribuído.

"Desculpe aparecer tão de repente, mas a situação pede medidas imediatas." Marco Apollo tinha a voz grossa, porém, uma pitada de amabilidade. Ele havia se sentado em uma das cadeiras enquanto seu Braço Direito permanecia em pé, ao lado do Vice-Inspetor. Próximo a Giulio esse homem parece uma criança...

"Estou a par da situação." O louro sentou-se, entretanto, seus olhos permaneceram no homem à sua frente.

"Nós temos um problema, Alaudi, e eu espero poder contar com a ajuda de Roma. Eu entrei em contato com as demais sedes, mas jamais perderia a chance de vê-lo pessoalmente." O senhor de cabelos grisalhos esboçou um meio sorriso. "E onde estaria o jovem rapaz que coloquei no cargo de Inspetor? Tudo o que vejo agora é um homem!"

O Guardião da Nuvem sentiu o rosto corar. Não havia melhor sensação do que ser elogiado por aqueles que ele admirava. Marco havia oferecido a função a ele, na época um ninguém, uma pessoa sem experiência alguma. Foi a maior oportunidade que o Inspetor recebera na vida e ele sempre seria grato a aquele homem.

"Eu sei que as coisas não são exatamente como as notícias pintam, então quero que me diga com sinceridade o quão ruim está a situação." Alaudi pousou as mãos sobre a mesa, entrelaçando os dedos.

"Ruim, meu filho... muito ruim." O senhor apertou o cabo da bengala. "Hoje mais duas pessoas morreram, mas eles não publicarão isso nos jornais. Nós estamos seguindo as mortes desde que elas começaram e por esse motivo estou aqui hoje, Alaudi."

O louro manteve a expressão indiferente. Quando chegou ao escritório, naquela manhã, Giulio estava em sua sala vestindo uma expressão tão séria que por um momento o Guardião da Nuvem achou que algo pudesse ter acontecido com eles. As novas sobre a visita do Chefe Principal o surpreenderam, no entanto, também o deixaram aliviado. E durante aquele dia o Inspetor se pegou imaginando se aquele inusitado encontro teria alguma relação com os laços quase inexistentes entre ele e os Vongola. Eu não faço parte daquela Família. Todavia, aquele não parecia ser o caso então Alaudi não fazia ideia do que poderia existir por trás daquela visita. A situação está perigosa, porém, até agora nada relevante aconteceu em Roma. Não seria necessária uma visita formal apenas para um aviso. Algo não cheira bem...

"Você sabe que eu estou me aposentando, não é?" Marco esboçou um sorriso cansado. "Quarenta anos servindo este país, mas acredito que é hora de deixar a responsabilidade nas mãos dos mais jovens." Os olhos castanhos se tornaram apertados, fitando o louro com uma direta proposta. "O que me diz, Alaudi?"

"Ser o Chefe Principal?" As palavras deixaram seus lábios, contudo, o gosto não foi doce. Não como ele achou que seria. Tornar-se o Chefe sempre fora a ambição pessoal do Guardião da Nuvem. Ele estaria em todos os lugares, e poderia ampliar suas regras ao país inteiro. Seria simplesmente perfeito. Entretanto, por que ele não se sentia realmente feliz? Por que é que, ali, naquele momento, o Inspetor desejou nunca ter ouvido aquela proposta?

"Depois que esta missão for realizada eu passarei oficialmente o cargo a você. Escolha qualquer cidade como escritório principal. Eu sugiro Veneza... um belo local, excelente gastronomia e as mulheres são graciosas." Diz o homem que se casou três vezes... e enterrou todas as esposas. "Mas tire o tempo que precisar para pensar. No momento o foco é a missão."

"Estou ouvindo." Alaudi recostou-se melhor e suas mãos apoiaram-se sobre os braços da cadeira.

"Nós sabemos quem está por trás dos ataques, no entanto, precisamos de provas. Ele está em Roma e gostaria que você fosse o mandante da investigação. Assim que obtiver provas ele será preso e condenado."

"Quantos anos?" O louro gostou de ouvir a última parte. Ele sentia uma sádica felicidade em uma prisão em flagrante, ainda mais quando a pessoa era realmente podre.

"Anos? Não, meu filho, aquele homem não merece ser preso. Os impostos pagos serão muito mais bem empregados em outra coisa. O homem irá morrer."

O Guardião da Nuvem não soube explicar porque seus dedos apertaram com mais força os braços da cadeira ou porque sua respiração tornou-se mais longa.

"Quem é o homem?" O Inspetor perguntou, porém, seus lábios mal se moveram.

Marco esboçou um meio sorriso. Alaudi jamais esqueceria aquele sorriso. Ele o assombraria para sempre.

"Ivan Cavallone." A voz soou no mesmo timbre, entretanto, dentro dos ouvidos do louro as palavras gritaram. "O homem por trás dos assassinados é o Chefe da Família Cavallone. Eu o quero morto, Alaudi."

"O homem tem filhos." Giulio deu um passo à frente e sua voz soou baixa e aparentemente indiferente, contudo, o Guardião da Nuvem notou facilmente a indignação.

"Eles não são importantes." O Chefe Principal respondeu sem emoção. "A Família não irá continuar após a morte do Chefe. Eu planejo enviar os filhos daquele homem para bem longe."

O Inspetor abaixou os olhos.

Ele nunca soube as expressões daqueles que o observavam, mas ele sentia os olhos de seu amigo, penetrando-o fundo, como se pudessem ver através de sua máscara. Por um breve momento Alaudi sentiu como se todos houvessem desaparecido da sala e ele estivesse sozinho, porém, quando seus olhos se ergueram tudo o que o louro fez foi encarar o homem que ele mais respeitava, enquanto cada fibra de seu corpo ansiava para puxar a arma que estava em uma das gavetas e depositar uma única bala entre os cansados olhos castanhos. Eu jamais conseguirei abrir a gaveta. O pensamento era terno e derrotista. Na verdade, o Guardião da Nuvem não conseguiria sequer mover os dedos. Ele sentia o sangue escorrer no exato local em que as unhas haviam apertado a madeira da cadeira. O Inspetor de Polícia abaixou os olhos novamente, encarando sua própria mesa, enquanto um único pensamento cruzava sua mente. Desculpe Catarina, mas eu não poderei retornar esta noite.

Continua...