"Ninguém morre, as pessoas despertam do sonho da vida."

Raul Seixas


Souvenirs d'un Autre Monde

CAPÍTULO ÚNICO: Morrer é despertar.

No âmago de sua profunda solidão, imersa; sequer prestava atenção ao que lhe cercava. Há muito, aquela profunda melancolia a acompanhava; desde que a morte levara o brilho mortiço daqueles olhos negros que tanto apreciava, a vivacidade dos seus orbes verdes já não era mais a mesma. O sofrimento agira como inúmeras lâminas e a ferira de maneira brutal. A hipocondria fizera-se sua rotina, seu ópio. Nada mais importava.

Amparada sob um grande sobretudo preto, caminhava desolada sobre o concreto umedecido pela garoa. Uma das mãos no bolso; a outra levava aos lábios mais um dos inúmeros bastões cancerígenos daquele dia.

Um aperto comprimiu-lhe o peito.

Um beijo gélido tocou-lhe a testa.

Sua travessia à avenida cessou. Tombara agonizante, sobre o concreto. O cigarro entre os dedos escorregara: deitara-se afetuoso a seu lado. A fumaça penetrava-lhe as narinas, consolando-lhe; os carros freavam bruscos e frenéticas buzinas ecoavam distantes, tão distantes de seus tímpanos entorpecidos; as pálpebras cerravam-se vagarosas. O peito pesava; faltava-lhe ar. A garoa caía; atrevida, uma das gotículas deitou-se sobre o cigarro aceso; outras repousavam sobre a tez empalidecida da jovem, acariciando-lhe.

Os olhos semicerrados.

As gotículas da fina garoa caíram-lhe sobre as pálpebras, obrigando-lhe a cerrar de vez os olhos.

Não havia luz, não havia trevas, não havia anjos, tampouco anjos de Deus esperando-lhe ao lado de algum cipreste branco; tampouco Lúcifer a aguardava à entrada do inferno. Não havia mais tristeza, sequer veículos buzinando ou qualquer cigarro aceso. O pesar abandonara-lhe o peito e a respiração tornara-se tão leve que parecia não respirar; a paz interior dominou-lhe por inteiro.

Ah! Se as pessoas soubessem o quão serena é a morte! Como era tranqüilo, como era aprazível, como era bonito morrer...

Daquele momento em diante, dera-se conta de que tristeza, cigarros, noites em claro, eram apenas lembranças de outro mundo que deveriam ser completamente esquecidas.

Exceto aqueles olhos que há tanto a esperavam daquele lado da vida.


NOTA: Oneshot escrita por Ingrid/Konha e postada na comunidade Fics Sakura e Sasuke.