Disclaimer – Harukanaru e seus personagens não me pertencem, mas eu estava precisando de novas vítimas para minhas torturas e... Err... Harukanaru não me pertence!
N.A. – Outra resposta ao desafio 140 temas do Fórum Mundo dos Fics.
Tema – Pesadelo.
Broken Promise
Era sempre o mesmo sonho.
Nada. Nenhum detalhe. Nem mesmo uma pedra mudava de lugar.
Sonhei tantas vezes com aquele cenário nos últimos anos que ultimamente simplesmente sei que é sonho. Sei qual será o desfecho, mas não consigo fazer nada para mudá-lo.
Deve ser por essa razão que chamam esse tipo de sonho de pesadelo.
A primeira coisa que vejo é o céu alaranjado, o sol poente ofusca meus olhos por alguns minutos, mas finalmente consigo ver o local.
Tenho a nítida sensação de que conheço esse lugar. É quase como estar em casa. E se não fosse o pequeno fato de que minha casa fica na cidade, eu me deixaria levar por esse sentimento.
Não consigo nomear essa sensação de 'lar', apenas sei que reconheço o lugar e que por alguma razão deveria estar ali. Sinto-me feliz, realmente feliz. É quase estranho porque há muito tempo não sei o que é isso.
E é então que tudo começa a desmoronar.
Passo pelo grande portal no final da estrada, e tenho que piscar para acreditar que não existe nada lá. Nada para explicar aquela sensação de 'estar em casa'. Alguns prédios irreconhecíveis estão no final da estrada estreita que percorri. Quase completamente destruídos. Não há telhados visíveis, apenas meias paredes.
Dói, não é mesmo?
Percorro todo o local em pouco tempo, não há muitos lugares para se esconder no que restaram dos dois prédios. Finalmente me dou por vencido, e paro no meio do que um dia fora um grande jardim.
Perder tudo.
Meus olhos observam cada pequeno detalhe, sinto meu peito apertado.
Família. Amigos. Segurança.
No fundo da minha mente, algo me diz que algo está errado. Tem alguma coisa faltando. Algo que deveria estar esperando por mim. Alguém que deveria estar ali... Em segurança.
Destrói seu coração.
Meu peito se aperta, a inevitável sensação de perda parecendo esmagar meu coração e ameaçando me sufocar. Culpa. Culpa por algo que não consigo entender.
Sua alma.
O som de algo caindo me desperta, e por alguns segundos penso que não pode estar tudo perdido. Viro-me rapidamente na direção do som e vejo uma silhueta familiar.
Naquele momento tudo faz sentido, e por alguns segundos a felicidade volta a me envolver. Encontrei o que estava procurando. A parte que faltava. O que provocava àquela sensação de estar no lugar certo. Estar em casa.
Um sorriso curva meus lábios, estendo a mão em sua direção, e isso parece assustá-la.
Franzo o cenho, tentando me aproximar, e ouço com dolorosa clareza. Um meio grito de medo, antes que ela se vire e comece a correr.
Observo chocado a dona da silhueta correr para longe de mim, para fora do meu alcance. Levando todo e qualquer resquício de felicidade que eu tenha experimentado.
Eu sei que tenho que alcançá-la. Protegê-la. Cuidar para que seja feliz. Cumprir a promessa que fiz quando a deixei sozinha.
Vejo-a cair uma ultima vez, e grito seu nome. Isso parece paralisá-la. Alcanço-a enquanto ainda está se levantando, seguro seu braço, forçando-a a se virar em minha direção.
Sorrio tolamente, percebendo que não há nada naqueles olhos assustados que lembrem a pessoa que deixei para trás. Abro a boca, pensando em me desculpar pelo engano, mas nenhum som soa.
A dor aguda em meu estomago é tudo que posso sentir, baixo a cabeça, observando as mãos pequenas segurando o cabo da pequena espada que perfurou meu corpo, o sangue encharcando minhas roupas e manchando a pele dela.
Caio de joelhos, ainda segurando-a, sem lhe dar outra opção além de imitar meus movimentos. Não consigo falar, seja pela dor ou pela dificuldade de respirar. Minhas pálpebras ficam pesadas, e a ultima coisa que vejo é o rosto dela, coberto por lágrimas e arrependimento.
Tudo fica escuro, e eu me sinto cair.
A dor desaparece, mas não a sensação de perda.
Dói demais, não é?
Tachibana Tomohisa acordou assustado, cada respiração parecia ser a ultima. As cobertas escorregaram da cama e caíram no chão, enquanto lutava para se livrar dos resquícios do conhecido pesadelo. Podia sentir o suor encharcando suas roupas, as longas mechas escuras grudadas em seu rosto.
'É apenas um sonho.' Disse para si mesmo, passando as mãos pelos cabelos, e afastando-o do rosto. 'É apenas um sonho! Deixe de ser tolo.' Repetiu, suas mãos de maneira quase inconsciente tocaram o local em que sentira a lâmina afiada cortar seu corpo.
A sensação parecia real demais para que pudesse esquecê-la facilmente. Balançou a cabeça, tentando fixar sua atenção nos homens adormecidos a poucos metros de distancia. 'Está vendo, Tomomasa? Não passou de um sonho.' Fechou os olhos, finalmente conseguindo controlar seu corpo novamente. 'O mesmo maldito sonho!'
Levantou-se o mais silenciosamente possível, caminhando até a janela da pequena cabana onde os homens que sobraram de seu destacamento se abrigaram naquela última noite antes de retornarem para casa.
'Casa...' Sorriu, observando a neve caindo do lado de fora. 'Parece mais assustador do que qualquer pesadelo.'
- Teve um pesadelo, Tomomasa?
O rapaz se virou, fitando o amigo. Levou alguns segundos para reconhecê-lo.
- Vai acordar os outros, Takimichi. - Concordou com um aceno antes de lhe dar as costas novamente.
Não queria que seus homens descobrissem que seu comandante sofria com um pesadelo idiota que o deixava momentaneamente desligado da realidade. Não existiam muitas coisas que o assustassem, muito menos a própria morte.
Há muito tempo passara a encarar a possibilidade como algo natural. Passara quase dez anos lutando por alguma razão tola e idealista que nem ao menos se lembrava mais.
'Fui realmente tolo. Até mesmo convenci Takimichi a me acompanhar.' Balançou a cabeça, rindo da própria estupidez. Lembrava com dolorosa clareza de sua própria voz dizendo que nada aconteceria, seriam apenas alguns meses, no máximo, até que retornassem para casa. 'Com algumas belas histórias para entreter as damas.'
- Vai passar quando voltarmos para casa. – Takimichi disse em voz baixa, aproximando-se do amigo.
- Foi o mesmo sonho.
- Reconheceu o lugar?
- Não. – Sua voz deixava claro que não queria continuar aquela conversa. Era no mínimo desagradável pensar como um simples sonho poderia lhe deixar aterrorizado.
Tomomasa, como os amigos costumavam chamá-lo, não se assustava com facilidade, a guerra o fizera endurecer. Perdera através dos anos toda àquela inocência juvenil, a capacidade de se impressionar com cada pequeno detalhe. Muitos diziam que havia perdido parte de si mesmo.
Pouco ou nada havia restado do rapaz que não se preocupava com os acontecimentos ao seu redor. Não podia agir despreocupadamente quando havia vidas sob seu comando em perigo a cada decisão que tomava.
- Volte a dormir, Takimichi.
- E você?
- Não conseguiria dormir agora. – Tomomasa balançou a cabeça novamente, virando-se para o amigo com um sorriso. – Descanse, sairemos assim que amanhecer.
- Vou com você buscar Fuji.
- Fico realmente emocionado com sua preocupação, mas sou perfeitamente capaz de apanhar Fuji e voltar para casa sozinho.
- Por favor, Tomomasa... – Takimichi estreitou os olhos. – Diga que não tem nenhum plano indecente com a garota.
-...
- Ela é quase uma irmã para nós.
- Para você talvez, nunca a considerei parte da minha família. – Tomomasa riu – Ao menos não dessa forma.
- Tomomasa.
- Volte a dormir antes que acorde os outros, Takimichi.
Ouviu o amigo resmungar enquanto voltava para a própria cama, virou-se em sua direção, um sorriso ainda curvando seus lábios.
- Se lhe servir de consolo, meu amigo, garanto-lhe que minhas intenções são as mais inocentes possíveis com a doce Fuji.
- Já ouvi essas palavras antes e tiveram o mesmo efeito que neste momento. – Takimichi deitou, puxando as cobertas sobre si. – Não acredito em nenhuma delas.
Tomomasa riu, voltando-se para a janela novamente. Não podia culpar Takimichi por duvidar de suas palavras, ele mais do que ninguém conhecia sua reputação, mas estava falando sério quando dizia que suas intenções para com Fuji eram inocentes. 'Foi minha promessa. Palavras tolas de um casal tolo, mas ainda assim uma promessa.'
