Rosas no Inverno

Parte I


Disclaimer - Spiral não me pertece... Por que? Por que? Por queeee?

Fanfic - Naru-L

Dedicado - Gao-chan, a per...Err... O Gafanhoto feliz!

Eu realmente odeio esse site às vezes... depois de arrumar o texto pela segunda vez


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O ser humano é engraçado, vive buscando por coisas que não pode ter.

Felicidade eterna. Amor eterno. Vida perfeita.

Sempre tão arisco quanto às coisas que com certeza vai obter. Dor, desilusão, sofrimento. Eles buscam por coisas demais, esperanças altas demais, aspirações altas demais... E sempre, em algum ponto do caminho, acabam conseguindo a única coisa que não desejam.

Sofrimento.

Perdi minha família ainda muito jovem – jovem demais para entender, mas não para sentir. A dor é algo além da incompreensão, ela sempre nos atinge. Perdi meus amigos, sonhos, esperança.

Perdi tudo, antes mesmo de compreender como essas coisas eram importantes e, quando finalmente racionalizei toda aquela escuridão que ameaçava me sufocar, entendi que a única maneira de não me decepcionar era... Parar de me importar.

Acho que perdi a esperança duas vezes.

Quando você pára de acreditar que existe essa força invisível que está sempre pronta a te ajudar a superar as dificuldades, você deixa de ter esperança e passa a ser apenas um tolo que se julga superior aos demais mortais.

Abandono.

Eu nunca quis ser abandonado. A razão primordial para deixar de ter esperança nas pessoas foi exatamente não precisar enfrentar sua indiferença... Foi para não precisar vê-los partir!

Desejei tanto ser o primeiro a partir, àquele que não se importava. Desejei tanto ser o que detinha o controle. Acreditei ser um Deus... Apenas para perceber quanto estava enganado quando aqueles que têm o poder maior mostraram sua presença.

Dor. Dor. Dor. Dor.

Tudo o que resta é dor.

Inominável. Inabalável. Insuportável.

Tudo o que resta é essa odiosa dor.

Tudo o que quero é parar de sentir dor.

Fui um tolo desejando ser um Deus, e acabei com a certeza de que sou apenas mortal.

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- Qual a situação?

- Não reage a estímulos dolorosos.

- Pupilas arreativas.

- Peça uma tomografia.

O rapaz franziu o cenho, os olhos ainda fechados enquanto sentava-se lentamente. As vozes soavam cada vez mais claras à medida que ele deslizava da maca para o chão. Passou as mãos pelo rosto, tentando inutilmente fazer as vozes diminuírem de intensidade. Com certeza toda aquela algazarra não estava fazendo sua dor de cabeça diminuir.

- Os sinais vitais estão caindo.

- Ele está tendo uma parada cardíaca.

O rapaz baixou as mãos, virando-se rapidamente para o grupo de pessoas ao redor da maca que acabara de deixar. A dor de cabeça aumentou de intensidade e ele conseguiu finalmente ver a pessoa ali deitada enquanto o som estridente do monitor cardíaco ecoava pelo quarto.

'Isso não pode estar acontecendo.'

Assistiu a cena como se o ritmo frenético repentinamente se transformasse em câmera lenta. Enfermeiras ministrando medicamentos enquanto médicos davam ordens que ele não conseguia compreender.

- Façam alguma coisa! – Ao contrário do que esperava, sua voz não ecoou no quarto. As pessoas ali ignoraram sua ordem e continuaram a trabalhar. Um gemido abafado escapou de seus lábios enquanto se afastava da cena, fechou os olhos esperando sentir suas costas baterem contra a parede, mas nada aconteceu. Quando voltou a abri-los estava parado no meio do corredor e a única coisa visível era a parede do quarto de onde as vozes continuavam a escapar.

Secas. Ríspidas.

'Esse não pode ser o fim.'

Deixou-se cair de joelhos, os olhos ainda fixos na parede imaculadamente branca, esperando que alguém o acordasse daquele pesadelo. Estremeceu quando duas enfermeiras passaram por ele.

- Ayumu...

O rapaz ergueu a cabeça para a voz conhecida murmurando seu nome. Um quase sorriso curvou seus lábios enquanto levantava-se, caminhando na direção da mulher.

- Você não pode me deixar sozinha.

- Estou aqui, Madoka.

- Você disse que não me abandonaria como seu irmão fez. - A mulher abaixou a cabeça, afundando o rosto nas mãos enquanto seus ombros sacudiam levemente.

O rapaz deu um passo para trás ao ouvir aquelas palavras. Como não notara que a cunhada se tornara tão dependente?

Provavelmente porque estivera ocupado demais tentando se afastar de tudo e de todos. Preocupado demais em não sofrer para se preocupar com o sofrimento das pessoas que o rodeavam.

- Madoka...

- Ele tem pulsação.

Madoka ergueu a cabeça, o rosto manchado de lágrimas, demonstrando uma fragilidade que ele nunca vira antes. Ela sorriu, enxugando as lágrimas rapidamente, e retornando a costumeira expressão de frieza e controle enquanto esperava que o médico deixasse a sala de emergência.

'Como não notei que isso era apenas uma máscara?'

- Senhora Narumi?

- Ele vai ficar bem?

- Está estável por enquanto, agora só podemos esperar.

Ayumu se afastou, voltando para dentro do quarto. Não queria ouvir o que tinham a dizer sobre suas condições.

'Acho que estava preocupado demais em manter minha própria máscara.'

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Ayumu estava sentado no parapeito da janela, os olhos fixos no horizonte, alheio ao movimento das pessoas lá embaixo.

Quanto tempo havia se passado desde que 'acordara' daquele modo? Duas semanas? Talvez três... Não três semanas atrás fora a ultima vez que Madoka estivera no hospital, o rosto impassível explicando como pagaria os melhores médicos e ficaria a seu lado... Sorriu. Estranha promessa já que não retornara ao hospital.

A porta abriu e fechou as suas costas, e ele continuou parado, de costas para a pessoa de passos leves que entrou. Estava cansado demais para tentar fazer com que o ouvissem. Fechou os olhos, ajeitando-se no parapeito, ouvindo o cantarolar baixinho da enfermeira enquanto verificava suas condições.

Aquele não devia ser um hospital muito bom se permitiam que garotas tão novas e malucas cuidassem dos pacientes...

- Nagareboshi... Kirakirakirari...

Sorriu, era quase engraçado ouvir aquela voz suave cantarolar palavras tão tolas.

- Suishou no shizuku ni natta... Você logo vai melhorar, Ayumu. – A garota falou, arrumando os lençóis – Minhas fontes me disseram que tem lindos olhos castanhos. – Ela riu baixo. – Eu certamente gostaria de vê-los.

- Garota maluca. A enfermeira parou os movimentos e virou-se lentamente, os olhos vasculhando o quarto antes de balançar a cabeça e voltar sua atenção ao paciente.

- Aozora ni... Pukapukapukari...

- Se você parasse de cantar, quem sabe me convencesse a voltar.

A garota parou novamente, virando-se na direção da janela. Estreitou os olhos, colocando as mãos na cintura.

- Essa brincadeira não tem graça. Quem está ai?

Ayumi piscou, virando-se rapidamente para a garota parada com cara de poucos amigos, olhando para a janela irritada.

- Você me ouviu?

- Não vai falar?

- Ei, você me ouviu? – Ele pulou para o dentro do quarto, aproximando-se da enfermeira que continuava procurando algum sinal da presença de alguém no quarto.

- Seja quem for eu vou descobrir. – Ela falou convicta. – E vou denunciar ao...

- Ei, garota estranha! – O rapaz balançou a mão na frente do rosto da garota sem que ela sequer piscasse em resposta. – Você pode me ouvir? – Girou os olhos enquanto ela continuava a fazer ameaças para a pessoa invisível. – Você é mesmo inútil.

- Eu não sou inútil! – Protestou indignada.

- Isso ela ouve... – Ayumu suspirou.

- Hiyono? – A garota virou-se para a porta, piscando confusa para o médico parado na entrada. – O paciente acordou?

- Não...

- Com quem está falando?

- Eu não sei...

- Estava falando sozinha?

- Não! – Hiyono cobriu os lábios com as mãos, percebendo que sua voz soara alta demais. Fechou os olhos, sentindo o rosto aquecer. – Alguém me chamou de inútil.

- Porque você é inútil... – Ayumu suspirou, observando a garota com interesse. – Por que só ouve quando é desnecessário?

- Só você e o Senhor Narumi estão aqui, Hiyono, e se ele continua em coma...

- Eu sei o que ouvi, Doutor Kanone. – Ela cruzou os braços, olhando decidida para o médico. – Aposto como tem alguém escondido aqui tentando me pregar uma peça!

- Hiyono...

- Se me deixar procurar...

- O que conversamos semana passada sobre a sua teoria do ladrão de pudim?

- Ladrão de pudim? – Ayumu girou os olhos.

- O senhor disse que eu estava sendo 'criativa' demais novamente.

- Ótimo eufemismo para maluca... – Ayumu deixou-se cair na cadeira, atraindo a atenção da dupla quando esta escorregou um pouco.

- Viu? – Hiyono perguntou, apontando para o móvel. – Eu disse que tem alguém escondido aqui!

- Hiyono, já chega. – O médico segurou a enfermeira pelo braço para fora do quarto. – Eu termino aqui, vá... Comer alguma coisa.

- Falta pelo menos uma hora para o meu intervalo.

- Sua taxa de açúcar deve estar baixa, esqueça o horário e vá comer algo doce.

- Se o ladrão não atacou a geladeira novamente, você quer dizer

- Hiyono... A garota bufou, dando meia volta e marchando para fora do quarto. Ayumu virou-se para a janela novamente, ignorando o médico que checava os aparelhos em volta de seu corpo.

- Isso é mesmo ótimo. – Atirou a cabeça para trás, fixando os olhos no teto. – De todas as pessoas que vêm aqui, a única que consegue ouvir o que digo é uma maluca obcecada por desaparecimento de doces...

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- Doutor? – A recepcionista chamou, sorrindo quando conseguiu a atenção do rapaz – Detetive Narumi na linha dois.

- Obrigado, Sayoko. – O médico sorriu para a garota loira. – Vou atender na minha sala. – Abriu a porta do consultório e virou-se para a recepcionista. – Não fique ouvindo a ligação. – A garota corou, confirmando com um aceno rápido enquanto o rapaz fechava a porta. – Detetive Narumi?

- O senhor pode me chamar de Madoka.

- Em que posso ajudá-la, Madoka-san?

- Eu... – A jovem respirou fundo antes de continuar. – Gostaria de saber se Ayumu teve alguma melhora.

- Por que não vem até aqui e vê com seus próprios olhos?

- Não, obrigada.

- Não houve mudanças na ultima semana. – O médico falou seco depois de alguns minutos em silencio. – Ayumu continua estável, mas sem sinais de que vá acordar.

- Entre em contato comigo se houver alguma mudança.

- Farei isso. – Kanone falou antes de desligar. Ajeitou-se na cadeira, viando-a para a janela, não conseguia entender aquela mulher. Será que ela não compreendia que o jovem cunhado poderia nunca acordar? – Mulher egoísta.

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Ayumu estava começando a se acostumar com aquela vida solitária. Não era muito diferente de antes do acidente e não era como se tivesse alguma escolha. Fora muito mais fácil sair de seu corpo do que voltar para ele... Apenas gostaria de ter algo para fazer ali do que contar quantas manchas existiam no teto branco ou a quantidade de pessoas caminhando despreocupadamente lá fora.

A vida era mesmo cheia de ironias; passara toda a vida fugindo do contato com as pessoas e agora daria tudo para poder ser visto e ouvido.

A porta rangeu baixinho, anunciando a entrada da enfermeira. Mais um maravilhoso começo de dia onde ele se esforçaria para ignorar o fato de uma garota lhe dando banho.

- Bom dia, Ayumu. - Hiyono falou animada enquanto fechava a porta.

- Está chovendo, não é um bom dia.

- Está um lindo dia lá fora. – A garota continuou, enquanto afastava as cobertas. – Poderíamos sair um pouco se você acordasse.

Ayumu piscou, olhando para o céu cinzento.

- Mentirosa.

- Vamos lá, não gostaria de dar uma volta e respirar um pouco de ar fresco?

- Está chovendo! – Ele quase gritou, virando-se para a garota que continuava tagarelando enquanto deslizava a esponja úmida por seu corpo. Piscou, confuso por se sentir quente repentinamente. 'Bobagem, não tenho corpo...' Balançou a cabeça, tentando afastar a visão da garota.

- Sabe... – A garota continuou, rindo baixinho e chamando a atenção do rapaz novamente para o movimento de suas mãos. – As garotas e eu fizemos uma aposta sobre como você mantém sua forma... – Ela se virou, afundando a esponja na bacia. O rosto um pouco corado. – Quando vai acordar e—

- VOCÊS FAZEM APOSTAS SOBRE MIM?

Hiyono pulou, derrubando a bacia. Virou assustada para o rapaz deitado na cama que continuava imóvel.

- O que... – Ela balançou a cabeça, os olhos percorrendo o quarto freneticamente - Quem está aí?

- Claro que sou eu, sua desmiolada!

- Eu? – Ela piscou, aproximando-se da janela.

- Você não! – Ayumu continuou, exasperado, sem perceber que pela primeira vez a garota continuava a ouvi-lo - Eu! Eu!

- Certo... – Hyono balançou a cabeça. – Você. – Ela puxou as cobertas sobre o rapaz na cama. – Acho que seu banho vai ter que... – Parou de falar, erguendo os olhos quando notou o movimento do outro lado da cama. – O que...

- Você é a pessoa mais irritante, mais insuportável, mais... – O rapaz parou de falar quando a garota gritou, os olhos fixos nele enquanto o rosto empalidecia. – O que foi... Ei! – E dessa vez foi ele quem arregalou os olhos ao vê-la desabar no chão. – Droga, acho que matei a maluca.

Apenas quando a porta se abriu, e duas enfermeiras correram na direção da garota desmaiada, foi que ele percebeu que ela continuara respondendo até... Desmaiar por vê-lo.

- Inferno! – Ajoelhou-se ao lado da garota, os olhos fixos em seu rosto enquanto as outras duas tentavam fazê-la acordar. – Vamos, maluca, ouvi sua musica idiota por mais de um mês, não pode morrer agora.

- Talvez seja melhor chamar o Doutor Kanone.

- Hiyono? – A enfermeira morena continuou chamando, ignorando as palavras da outra. – Hiyono, acorde.

- O que será que aconteceu?

- Hiyono?

- Acorde, garota! – Ayumu falou entre dentes, aproximando o rosto do dela. – Acorde ou arrumo uma maneira de roubar seu pudim!

- Não! – Hiyono gritou, assustando as duas garotas quando sentou-se repentinamente – Deixe o pudim onde está!

Ayumu girou os olhos, enquanto as duas enfermeiras ajudavam Hiyono a levantar.

- Você está se sentindo bem, Hiyono? – A enfermeira morena perguntou, tentando não rir.

- Sim, acho que estou... – A garota continuou caminhando com a ajuda das outras duas. – Preciso pegar mais água para o banho dele.

- Vou pedir para alguém fazer isso por você. – A garota loira disse com um pequeno sorriso. – Precisa descansar agora.

- Não, eu... – Hiyono lançou um ultimo olhar para o quarto, estremecendo ao ver o vulto parado ao lado da cama. – Talvez você tenha razão...

Ayumu sorriu, sentando-se na cadeira lentamente. Pela primeira vez desde que acordara naquele estado não se sentia mais tão sozinho... Balançou a cabeça, sentindo-se aquecido pelo olhar da garota.

- Aozora ni... – Ele cantarolou baixinho.

- Pukapukapukari.

- O que disse, Hiyono? – A garota loira arqueou a sobrancelha depois de fechar a porta.

- Nada, Sayoko. – Ela fechou os olhos, balançando a cabeça. – Nada mesmo!

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Hiyono estava sentada na pequena e desconfortável cama, abraçando as pernas contra o corpo. Os olhos fixos na parede a sua frente, exatamente como vinha fazendo na ultima semana. O pequeno quarto que os médicos normalmente usavam para descansar no plantão noturno tornara-se seu esconderijo particular. Sempre que era designada para cuidar de Ayumu, ela conseguia trocar com alguma das outras enfermeiras e se escondia ali. Estremeceu, aquele cômodo era extramente frio e silencioso.

'Não muito diferente do resto do hospital', suspirou, esfregando os braços na esperança de que isso fizesse desaparecer aquela sensação de frio que sentia. Estremeceu novamente, suspirando desanimada e ajeitou-se na cama sem conseguir controlar o tremor do próprio corpo.

A maior parte das pessoas estaria tremendo de medo se visse um... fantasma, mas a razão de sua reação era diferente da maior parte das pessoas. Não estava com medo, apenas sentindo um frio inexplicável que parecia não cessar.

'Você é estranha.'

Hiyono fechou os olhos, abraçando as pernas com mais força. Ouvira isso tantas vezes durante toda a vida que estava acostumada com o som das palavras, até aprendera a sorrir, considerando aquilo um elogio ao invés do insulto velado que era.

- Eu sei.

Baixou a cabeça, encostando a testa nos braços sobre os joelhos e suspirou cansada. Não poderia se esconder para sempre, tinha que voltar a seus afazeres, mas como conseguiria superar aquela sensação de pânico que sentia toda vez que se aproximava do quarto?

'Não estou com medo...' Respirou fundo, levantando a cabeça. 'Então por quê sinto meu coração tão apertado quando...'

'-NÃO!'

Hiyono piscou, balançando a cabeça levemente. Ajoelhou-se na cama, verificando o pequeno quarto freneticamente em busca do vulto que vira na semana anterior. 'Estou enlouquecendo.'

Não podia estar ouvindo aquela voz ali. O quarto de Ayumu era do outro lado do andar. Fechou os olhos, sentindo o peito apertar com aquela sensação conhecida; lágrimas deslizaram de seus olhos sem que notasse e ela abraçou o próprio corpo tentando dissipar aquela sensação gélida que parecia envolver seu corpo.

'- Eu não quero morrer.'

- Ayumu. – A garota murmurou, fechando os olhos lentamente. Deixou-se cair sobre a cama, o frio que a envolvia era forte demais para que conseguisse resistir. O sono a envolveu em um casulo quente e confortador antes mesmo que percebesse.

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Ayumu andava de um lado para o outro dentro do quarto. Impaciente. Irritado. Solitário demais tendo apenas o silencio como companhia. A enfermeira estúpida não voltara mais para cuidar de seu corpo depois do incidente de três dias atrás, e todas as outras que entravam ali não respondiam suas perguntas.

- Inútil! São todas inúteis!

Deixou-se cair no chão, sem se importar quando esbarrou na cama. As coisas seriam tão mais fáceis se ao menos conseguisse deixar aquele maldito quarto, mas, não importava quantas vezes tentasse sair, aquela espécie de barreira o empurrava de volta.

Fechou os olhos, desejando poder dormir, ao menos desse modo não teria que suportar a solidão, o silêncio e escuridão que ameaçavam engoli-lo. Aquilo só podia ser um pesadelo.

Abriu os olhos rapidamente, assustado ao sentir seu 'corpo' entorpecido. Sentou-se, percebendo a parede branca desaparecer. Sua mente gritou enquanto tentava inutilmente erguer-se novamente.

- NÃO!

A porta se abriu quase que instantaneamente e ele pode ouvir passos em sua direção. Escondeu o rosto nas mãos, tentando sem sucesso respirar e manter-se acordado.

- Eu não quero morrer.

- Você tem que se acalmar. – A voz suave chamou sua atenção para a garota agachada a seu lado.

- Você... – Ele murmurou com dificuldade, duvidando que sua voz soasse de maneira compreensível para a garota de uniforme branco.

- Acalme-se ou vai realmente morrer. – Ela continuou calmamente, apontando a cama rodeada por enfermeiras.

- Eu não... – O rapaz baixou a cabeça, forçando-se a respirar em um ritmo normal. – Você não sabe o que está pedindo, eu não consigo respirar!

- Fantasmas não respiram. – A voz da garota soou divertida, cada palavra mais baixa que a outra.

- Fantasma? – Ayumu ergueu a cabeça, olhando o quarto silencioso assustado. – Hiyono? – Balançou a cabeça, esfregando os olhos. – Foi um sonho?

- Não, você desapareceu por alguns dias. – A voz da garota soou da cama vazia o que o fez levantar-se de um pulo. – Pensei que tinha cansado de tentar me assustar e ia finalmente acordar.

- Eu desapareci?

- Sua irmã esteve aqui, pobrezinha, pensou que você ia morrer.

- Não diga isso!

- Então não quer morrer?

- É obvio que não! – Ayumu cruzou os braços – Importa-se de parar de se esconder?

- Por que? – A garota riu. – Incomoda você?

- É claro que sim! Quem gosta de falar sozinho?

- Ótimo. – O riso soou novamente e ela se levantou. – Agora sabe como me sinto.

- Você estava embaixo da cama? – Ele piscou incrédulo.

- Sentada na cadeira. – Deu de ombros apontando o móvel parcialmente escondido pela cama. – Não tenho culpa se você não me viu.

- Quanto tempo?

- O que?

- Não disse que eu sumi por alguns dias? – Ele perguntou impaciente. – Quanto tempo?

- Uma semana. – Um sorriso vago apareceu nos lábios da garota. – Pensei que tinha desistido de viver.

- PARE DE FALAR ISSO!

- Eu não disse 'morrer'.

- Acabou de dizer!

- Não conta, só estava explicando!

- Kami, você é irritante!

- Você acha? – Ela colocou um dedo sobre os lábios. – As pessoas dizem que sou adorável.

- Eufemismo! – Ele protestou – Você é irritante, tonta, e tão absurdamente—

- Estou cansada. – A garota o interrompeu, fechando os olhos.

- Você estava dormindo, como pode... Ei! – Ayumu aproximou-se rapidamente quando a viu cair, piscou quando seus braços fecharam em torno da cintura delicada e a garota sorriu, tocando seu rosto. – Como?

- Eu queria ficar mais tempo, mas você demorou tanto... – Hiyono murmurou com suspiro cansado. – Prometa dizer meu nome novamente.

- Como assim... – Abriu mais olhos, surpreso quando o corpo dela desapareceu. – Hiyono? – Ele balançou a cabeça, confuso com o que acabara de acontecer. O som monótono do monitor cardíaco chamou sua atenção para a cama e ele finalmente a viu, sentada na cadeira, os braços apoiados na cama. – Hiyono? – Aproximou-se lentamente da garota adormecida e tentou tocá-la.

- Hiyono? – A porta se abriu, revelando a enfermeira loira. – Hiyono! – Chamou novamente, sorrindo quando a garota pulou. – Seu turno começa em meia hora.

- Começa? – Ayumu repetiu, franzindo o cenho. Se o turno dela começaria em meia hora o que a garota estava fazendo ali?

- Obrigada, Sayoko. – Hiyono sorriu, espreguiçando-se.

- Vai ficar doente se continuar sem dormir direito. – Sayoko lançou um rápido olhar para o corredor vazio. – Isso sem contar o que aconteceria se alguém te pegasse fazendo isso.

- Está tudo bem. – Hiyono ergueu-se da cadeira, passando as mãos pelo uniforme. – Vou para casa hoje.

- Mas você disse que ia esperar ele acordar.

- Já encontrei o que procurava. – A garota sorriu. – Pode arrumar um pouco de café?

- Claro, espero você no refeitório. – Sayoko disse antes de sair.

- Você ficou aqui o tempo todo? – Ayumu perguntou, os olhos fixos na expressão cansada da garota.

Hiyono terminou de arrumar as roupas e estendeu a mão para a porta, sem dar qualquer sinal de que o ouvira.

- Ei, irritante!

- Pedi que me chamasse de Hiyono.

- Eu fiz uma pergunta.

- E eu um pedido, que você não realizou. – Hiyono abriu a porta e sorriu antes de sair. – Tire suas próprias conclusões.

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Hiyono suspirou, tomando um gole de café distraidamente. A comida em seu prato nunca parecera tão desagradável quanto nos últimos dias. Por mais que tentasse não conseguia deixar de pensar no rapaz em coma. 'Ayumu' Corrigiu-se mentalmente.

Passara a ultima semana esgueirando-se para o quarto dele assim que seu turno terminava. A troca de equipe era sempre um momento em que as pessoas baixavam a guarda e assim era fácil dizer que iria verificar o estado do paciente e simplesmente não sair de lá até a manhã seguinte.

Não conseguia explicar a razão de arriscar o emprego por algo que poderia ser apenas um sonho, a não ser aquela horrível sensação de vazio que sentira depois que o estado dele estabilizara novamente... Era quase uma necessidade ficar naquele quarto, esperando que ele voltasse a falar novamente.

Talvez fosse apenas aquele estúpido desejo infantil de tocá-lo. Saber se o verdadeiro Ayumu era tão frio quanto seu corpo parecia.

'Acho que estou ficando louca' Hiyono balançou a cabeça levemente, tentando afastar tais pensamentos.

- Hiyono? – A garota piscou, dedos surgiram no seu campo de visão, e a outra a chamou novamente. – Hiyono!

- Desculpe, Sayoko. – Hiyono sorriu, remexendo a comida em seu prato. – Acho que estava longe.

- Longe? – A garota loira girou os olhos. – Você acabou de recusar a sobremesa!

- Eu fiz o que? – Hiyono olhou esperançosa para o balcão de doces apenas para encontrá-lo vazio. – Que droga.

- O que pode ser tão importante para você esquecer de comer? – Sayoko pegou o pote de pudim da mesa e começou a comer, ignorando o olhar da amiga para a guloseima.

- Um sonho... – A enfermeira suspirou, deixando os talheres sobre o prato – Acho que vou voltar, me atrasei hoje e o Doutor Kanone me passou um sermão.

- Isso porque ele não sabe o que você tem feito durante a noite.

- Ele sabe. – Hiyono deu de ombros, levantando-se.

- Como conseguiu que não te despedisse?

- Se-gre-do. – A garota sorriu.

- Foi o que disse quando perguntei por que estava dormindo no quarto do paciente em coma.

- Eu tenho pena dele, a irmã recusa-se a vir visitá-lo. – Hiyono começou a se afastar da mesa e a outra garota a seguiu.

- Existem muitos pacientes na mesma circunstancia e não vejo você passando a noite no quarto deles.

- Ayumu é especial.

- Você o chama pelo nome?

- Não deveria? – Hiyono deu de ombros. – Se posso conversar com ele, por que não... – Parou, virando-se para a garota parada alguns passos atrás. – Que foi?

- Por favor, diga que 'Posso conversar com ele' significa que você fica falando sozinha esperando que ele acorde.

- Err... Claro que sim, Sayoko. O que mais poderia ser? – Hiyono riu disfarçando e apontou para a garota. – Você precisava ver a sua cara agora.

- Hiyono...

'Enfermeira Yuizaki, por favor compareça a sala do Doutor Kanone.'

- Tenho que ir, conversamos depois! – Ela disse, correndo para o elevador. Assim que as portas se fecharam, a garota encostou-se na parede fria e suspirou. – Essa foi por pouco.

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Ayumu estava sentado na beirada da cama, fitando o próprio corpo. Não restava mais nada para fazer naquele quarto e o céu nublado não colaborava com seu único passatempo: Contar estrelas.

Suspirou, desviando os olhos para o monitor cardíaco. Estava começando a acreditar em fantasmas assombrando casas. Acredite, depois de passar tanto tempo naquele minúsculo e enfadonho quarto, a perspectiva de arrastar correntes pelos corredores era até divertida. Claro que primeiro ele teria que arrumar uma corrente e conseguir arrastá-la... Não, primeiro ele teria que conseguir sair do maldito quarto!

Talvez pudesse se esconder atrás da porta e gritar 'BU' para cada pessoa que entrasse no quarto... Mas, novamente, ninguém o via além daquela garota irritante. Droga! Estava começando a sentir falta de sua presença... Mesmo que fosse para ouvi-la cantar aquela música estúpida.

A porta abriu lentamente e a garota entrou abraçada a um embrulho. Ayumu se virou, pensando se ela conseguia ler pensamentos ou tinha apenas muita sorte em aparecer quando ele queria.

- Boa Tar—

- Bu! – Ayumu fechou os olhos ao ouvir a própria voz. Só podia culpar o tédio por aquilo.

Hiyono encostou-se a porta, arqueando a sobrancelha direita lentamente. Olhou para o vulto sentado na cama e para o corpo ligado a aparelhos.

- O que está fazendo?

- Eu devia saber que você não se assustaria... – Ayumu suspirou, erguendo-se – É estranha demais até para me divertir.

- O que exatamente esperou que eu fizesse?

- Gritasse? Ou Empalidecesse? – O rapaz deu de ombros. – Sei lá, algo que alguém normal faria quando entra em um quarto e alguém grita 'Bu'.

- Você não gritou.

- Detalhes. – Deu as costas à garota e caminhou até a janela. – O que veio fazer aqui?

- Achei que estivesse entediado.

- E veio conversar comigo? Quanta bondade...

- Vim lhe trazer um livro, ingrato. – Hiyono jogou o livro sobre a cama, colocando as mãos na cintura. – Será que não—

- Você jogou o livro em mim? – O rapaz virou-se para a garota ao ouvir o som do volume batendo em algo.

- Você sentiu?

- Não.

- Que pena. – A garota deu de ombros. – Continuando... Não posso ficar aqui hoje, passei duas horas ouvindo sermão porque o Doutor Kanone me pegou saindo daqui hoje pela manhã e—

- Como espera que eu leia o livro? – Ayumu interrompeu a garota.

- Você não saber ler?

- Acho que você não pensou nos detalhes - O rapaz girou os olhos e se aproximou da cama, apontou a própria mão e tentou pegar o livro. Sorriu quando a garota baixou a cabeça desanimada.

- Como consegue sentar sem passar pela cama?

- Como é que eu vou saber?

- Você não está colaborando, Ayumu... – Hiyono esfregou as têmporas, tentando pensar em alguma solução. – Você tem que conseguir—

- Você poderia ficar e ler para mim.

- Pensei tê-lo ouvido dizer que minha voz era irritante.

- Sua música estranha é irritante, posso suportar sua voz se apenas falar.

- Minha música não é... – Ela cruzou os braços, franzindo o cenho. – Eu disse que não posso ficar e você tenta me convencer a ficar, arriscando meu emprego devo acrescentar, com insultos?

- Certo, vá embora. – Ayumu sentou-se novamente na beirada da cama. – E leve o livro com você.

- Eu já entendi que foi uma idéia estúpida. – A garota marchou até a cama e pegou o livro. – Você não precisa...

- Se você o deixar aqui provavelmente descobrirão que não cumpriu suas ordens. – Ele falou calmamente. Quando a garota não se afastou o rapaz virou-se para observá-la. – O que?

- Você é tão fofo se fazendo de forte.

- O que?

- Vou ficar por alguns minutos. – Hiyono puxou a cadeira para o outro lado da cama e sentou-se, abrindo o livro. – Posso ler para você.

- Eu não sou fofo! Homens não são fofos! – Ayumu protestou, sem dar atenção para o que a garota fazia. – Cachorros, gatos, bebês são fofos!

- Se vai continuar resmungando eu vou embora.

- Eu não sou fofo!

- Ok! – Ela fechou o livro e encarou o rapaz sentado a sua frente. – Eu já entendi! – Ela continuou a fitá-lo até que ele bufou e baixou a cabeça contrariado. – Agora, onde eu estava?

- Ia ler para mim.

- Isso mesmo. – Hiyono sorriu, voltando a abrir o livro. – Só por meia hora ou perderei o ônibus para casa.

- Se perder o ônibus vai ter que dormir aqui novamente?

- Não, apenas esperar por duas horas até que o próximo passe. – A garota ajeitou-se na cadeira – Agora pare de me interromper.

'Ficaria presa aqui por mais duas horas?' Ayumu sorriu, ouvindo a voz melodiosa narrando a história de uma pobre órfã que desejava apenas encontrar o amor – a razão dela imaginar que aquele tipo de historia o interessaria era um mistério – enquanto ele pensava em maneiras de fazê-la se esquecer do horário do ônibus. Uma pequena parte de sua consciência o alertou como aquilo era tremendamente egoísta, mas ele logo suprimiu esse pensamento. 'Estou cansado de ficar sozinho.'

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Ayumu olhava pela janela, ouvindo o suave ressonar da garota que adormecera há alguma horas debruçada sobre a cama. Os primeiros raios de sol começavam a iluminar a cidade e ele estava lutando contra aquela tentação idiota de ficar observando a enfermeira tola que acabara passando a noite ali... Depois de reclamar que provavelmente seria despedida se a descobrissem.

Não fora um adolescente normal, sempre buscando a atenção dos outros. Popularidade estava longe de seus desejos em qualquer época de sua vida que conseguisse lembrar. Quando criança estava mais preocupado com a morte dos pais que ninguém lhe explicava como ou porque tinha acontecido. Depois de alguns anos o irmão conhecera Madoka e se casara com ela, mesmo que dissesse que nada mudaria, que ainda ficariam juntos... Não fora bem assim que acontecera. Dois anos depois de casarem o irmão havia desaparecido e, por mais que Madoka colocasse todos os seus esforços no caso, não conseguira encontrá-lo. Abandonado. Esse era o único sentimento que lembrava de sentir desde pequeno. Como poderia desejar popularidade quando desde criança tudo o que se lembrava era das pessoas que amava o deixando de uma maneira ou outra?

Passara pela vida sem deixar-se prender por ninguém, carregando apenas o fardo de cuidar da cunhada que se tornara uma irmã. Sabia que ela se ressentia por seus grandes períodos de ausência, mas não conseguia ser diferente.

Madoka também iria abandoná-lo quando chegasse o momento.

Sorriu sem humor ao notar a ironia da situação. Tentara manter-se afastado para poupar a si mesmo do sofrimento de ficar sozinho, mas nunca pensara que ele poderia ser aquele que partiria primeiro... Ou como se arrependeria de todas as chances que desperdiçara na vida. A palavra impotente nunca tivera um significado tão amplo e real como naquele momento.

Ayumu piscou ao sentir braços delicados circundando seu corpo. Se fechasse os olhos poderia sentir o perfume de flores que se tornara conhecido naquele ultimo mês. Colocou as mãos sobre as dela, pensando em afastá-las, mas não conseguiu. Como aquela garota irritante poderia saber quando estava vulnerável o suficiente para que aceitasse o que ela quisesse?

- Pode me soltar? – O rapaz se assustou por ouvir o som da própria voz tão seca e forte quando seus próprios sentimentos eram tão confusos e fracos.

- Estou com frio. – Hiyono falou simplesmente.

- Deveria ter ido para casa.

- Como posso deixá-lo sozinho quando todas as vezes que nossos olhos se encontram eu sinto meu peito apertar?

- Pare de ler romances trágicos e melosos.

- Não, essa sensação vem de você.

Ayumu fechou as mãos, apertando as da garota sem que percebesse. Pensou em protestar que não se sentia daquele modo, mas sua voz desaparecera. Uma única palavra ressoando em sua cabeça.

'Abandonado.'

- Hiyono...

Naquele momento a porta as suas costas se abriu e o calor da garota desapareceu. Ayumu virou-se, observando a fraca luz que penetrava no quarto. Passos leves soaram e ele viu o médico que a garota chamava de Kanone aproximar-se da cama e balançar a cabeça para a forma adormecida na cadeira antes de voltar sua atenção para os equipamentos que monitoravam os sinais vitais.

Ayumu observou com inveja o médico terminar a inspeção e colocar um cobertor nas costas da enfermeira antes de sair do quarto tão silenciosamente quanto havia entrado.

O rapaz fechou os punhos, tentando ignorar aquele sentimento tolo apenas porque o médico havia feito algo que ele mesmo não podia. 'Algo tão simples quanto cobri-la... Patético!' E mesmo assim ele daria tudo para realizar esse simples ato patético no lugar do intruso.

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Hiyono acordou sobressaltada, o cobertor escorregou de suas costas para o chão sem que percebesse, e olhou o quarto confusa até lembrar que passara mais uma noite no hospital ao invés de voltar para casa. Espreguiçou-se, sentindo o corpo dolorido pela posição que dormira.

- Você ronca.

A garota pulou da cadeira, colocando a mão direita sobre a boca para conter um grito. Encarou o rapaz, irritada, e abaixou-se para pegar a pequena mala com o uniforme que escondera embaixo da cama.

- Bom dia para você também. – Ergueu-se com o uniforme sobre o braço, esperando que ele virasse de costas.

- Onde arrumou essa mala? – Ayumu perguntou sem notar o olhar da garota – Não lembro de você.

- Estava aqui antes, ok? – Hiyono cruzou os braços – Pode se virar? Eu não vou trocar de roupa com você me encarando!

- Não seria nada que eu já não tivesse visto. – O rapaz girou os olhos, dando as costas para a garota. – E você me vê com muito menos quando está me dando banho.

- Não tenho feito mais isso. – Hiyono trocou de roupa o mais rápido que conseguiu. – Você pode pensar que é a coisa mais importante aqui, mas é apenas mais um paciente.

- Apenas mais um paciente... – Ayumu repetiu lentamente, tentando ignorar a pontada incomoda que aquelas palavras lhe causaram.

- Agora seja bonzinho. – A garota continuou sem notar a reação do rapaz. – E não tente assustar ninguém enquanto trabalho. – Guardou o livro dentro da pequena mala.

- Não faria diferença se eu tentasse, ninguém pode me ouvir além de você.

- Não tente me assustar também. – Hiyono completou, alisando o uniforme antes de colocar a mão na maçaneta. Virou-se novamente para o vulto ao lado da cama ao perceber que pela primeira vez ele não estava tentando discutir com ela. – Ayumu?

- Não vou tentar assustar ninguém, garota maluca.

- Você não é apenas mais um paciente para mim. – A garota sorriu, saindo do quarto o mais depressa possível.

Ayumu sorriu, quase sem querer, encarando a porta. Xingou-se mentalmente, mas isso não fez o sorriso desaparecer de seu rosto. 'Pela primeira vez, eu não quero ser apenas mais um...'